Análise da ADPF N. 347 que trata da violação dos direitos fundamentais dos encarcerados no Brasil

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Resumo: Este estudo tem o escopo de avaliar a Análise de Descumprimento de Preceito Fundamental de nº 347, processo que postula o reconhecimento da violação dos direitos fundamentais dos encarcerados no Brasil, tendo assim, o intuito de atacar pontos que indiquem problemas e soluções para que seja possível ao menos minimizar o atual estado de calamidade em que se encontra o sistema prisional brasileiro. Ademais, a partir da verificação dos pedidos da ação, dos votos dos ministros, das medidas cautelares deferidas, será abordado sobre a inexistência das audiências de custódia, do abuso da prisão preventiva, dos maus tratos e da violência física e psicológica que sofrem os encarcerados no sistema prisional brasileiro atual, revelando ainda aspectos sobre o principal motivo da superlotação carcerária, a qual se configura pelo excesso de presos, tornando o maior responsável por toda a degradação de direitos humanos e fundamentais dos detentos. Portanto, emergencial a necessidade da implantação de um sistema diferente, que funcione, um sistema em que os presos não saem mais perturbados e violentos após cumprirem suas penas no regime fechado.

Palavras-chave: Direitos Fundamentais, Violência, Superlotação Carcerária.

Abstract: This study has the scope of evaluating the Analysis of Breaches in Fundamental Precepts nº 347, a process which postulates the recognition of a fundamental rights’ violation in Brasil’s incarcerated populace, thus aiming to attack points that indicate trouble as well as the solution for it to become at least feasible to minimize the current state of calamity in which the Brazilian prison system finds itself. Moreover, from the verification of various calls to action, of minister’s votes, and of deferred precautionary measures,  the absence of custody hearings will be broached, as well as abuses in probations, mistreatment, physical and psychological violence suffered by the incarcerated populace in the current Brazilian prison system, revealing the horror of prison overcrowding, which is set up by an excess of prisoners, making it responsible for the greatest degradation in inmates’ fundamental human rights. Therefore, the need to implement a different, working system becomes essential so that inmates don’t exit prison more disturbed and violent after serving their sentences

Key-Words: Fundamental rights, Violence, Prison Overcrowding.

Sumário: 1. Introdução 2. Dos pedidos da ADPF nº 347 2.1. Dos votos dos ministros 2.2. Das cautelares deferidas 3. Da inexistência das audiências de custódia no Estado, abuso da prisão preventiva, maus tratos e da violência física e psicológica dos presidiários 4. O terror da superlotação carcerária brasileira.  5. Considerações finais 6. Referências.

Classificação da área abordada no artigo: Direito Constitucional, Direito Penal e Direitos Humanos.

1. Introdução

A arguição de descumprimento de preceito fundamental é uma ação autônoma interposta exclusivamente no Supremo Tribunal Federal e que tem a finalidade de evitar ou reparar prejuízo a preceito fundamental resultante de comissão ou omissão do poder público.

Em meados de 2015 foi ajuizada pelo Partido Político Socialismo e Liberdade, a Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental de nº 347, processo que postula o reconhecimento da violação dos direitos fundamentais dos encarcerados no país.

De tal modo, tem o intuito de atacar pontos que indiquem problema e a solução para que seja possível ao menos minimizar o atual estado de calamidade do sistema prisional brasileiro.

Com efeito, o presente trabalho tem a função fulcral de analisar minuciosamente os votos dos ministros do STF sob a ótica da Constituição Federal e da Lei de Execução Penal, proferindo o estudo das cautelares requeridas e dos julgamentos ocorridos no trâmite da ADPF até o momento da elaboração deste.

Cautelares como o contingenciamento do Fundo Penitenciário Nacional, Penas alternativas à prisão preventiva e mutirões carcerários, tudo no intuito de abordar o tratamento inconstitucional que tem os detentos nas carceragens brasileiras sem o mínimo de direito à dignidade da pessoa humana.

Nesse entendimento, dar ênfase ao abuso da prisão preventiva, na inexistência das audiências de custódia, bem como nos maus tratos, na violência física e psicológica das quais sofrem os presidiários e da falta de assistência à educação e ao trabalho.

Sob outro ponto de vista, abordar a triste realidade das penitenciárias brasileiras, a qual é a superlotação carcerária, tema também abordado na ADPF estudada, sendo que o excesso de presos é o maior responsável por toda a degradação de direitos humanos e fundamentais dos detentos.

Nesse ínterim, se provará ao final da pesquisa que o Brasil necessita de novos entendimentos, da implantação de um sistema diferente, que funcione, um sistema em que os presos não saem mais perturbados e violentos após cumprirem suas penas no regime fechado.

Portanto, com as medidas solutivas abordadas pela dita ADPF concomitante com uma resposta do poder público, haverá de existir uma saída, uma solução que diminua o número de presos nas penitenciárias.

Assim, no tocante ao descaso com os encarcerados, se evidenciará uma alternativa para enfraquecer essa realidade tão desumana que é o sistema prisional brasileiro.

2. DOS PEDIDOS DA ADPF Nº 347

Ajuizada no mês de junho do ano de 2015, a ADPF nº 347 postula o reconhecimento do “estado de coisas inconstitucional” a qual vive o atual sistema carcerário brasileiro por atos de omissão e comissão praticados pelo poder público e que ferem os direitos fundamentais dos apenados.

Nessa senda, a ação tem a maior finalidade de além do deferimento das cautelares interpostas, que seja providenciado um novo método abrangente a todo o sistema, uma nova realidade para a prática da execução penal.

Nesse seguimento, a possibilidade do réu que for condenado a cumprir pena em regime fechado, esgotadas todas as demais alternativas de pena, esta servirá de ressocialização do apenado, com um trabalho direcionado à assistência de saúde física e psicológica, um lugar onde esta pessoa tenha seus direitos constitucionais garantidos pelo Estado, que não fique só no papel, mas na prática também.

Com esse intuito, entre as deficiências estudadas pelo Partido Político Socialismo e Liberdade, foram tema dos pedidos da ADPF em comento oito medidas que solucionariam mais da metade da inconstitucional realidade carcerária, pedidos que passem a ser analisados um a um.

Primeiramente, que os julgadores de todas as instancias, expliquem o motivo de na maioria dos casos, não aplicarem as penas alternativas a privação da liberdade provisória, prevista no artigo 319 do código de Processo Penal. Senão vejamos:

“Art. 319. São medidas cautelares diversas da prisão: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

I – comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

II – proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

III – proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).

IV – proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

V – recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

VI – suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VII – internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi- imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

VIII – fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial; (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

IX – monitoração eletrônica. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).

…(revogados)

§ 4o A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares. (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).”

Em segundo, o cumprimento dos artigos 9.3 do Pacto dos Direitos Civis e Políticos e 7.5 da Convenção Interamericana de Direitos Humanos para que seja realizado dentro de noventa dias a audiência de custódia do preso preventivo, possibilitando a este o comparecimento perante o juiz no prazo de vinte e quatro horas, a contar do momento da prisão.

Em terceiro, quase um clamor para que os juízes e tribunais consideram a verdadeira situação do sistema prisional brasileiro, analisando o grau de intensidade dos delitos cometidos e visando a necessidade da aplicação das medidas cautelares penais na execução de cada caso concreto.

O quarto pedido, reforçando o primeiro postulado, é no sentido de que sejam impostas medidas alternativas à prisão preventiva, que seja seriamente usado o já mencionado artigo 319 do CPP, deixando para aplicar a prisão preventiva em casos mais severos e que causem de fato algum risco para a vítima ou para a sociedade.

Nessa perspectiva, foi citada também a abrangência dos requisitos temporais para a utilização, em tempo certo, dos direitos e benefícios dos apenados quando verificada a situação mais severa aplicada ao preso do que a prevista no ordenamento jurídico, como por exemplo, a progressão de regime, o livramento condicional e a suspensão condicional da pena.

O sexto pedido é no sentido de que o juízo da execução penal progrida a pena nos casos de constatação de qualquer irregularidade estatal, como a prevista no item anterior.

Logo, foi requerido também que o Conselho Nacional de Justiça providencie mutirões carcerários com o fim de revisar a execução penal dos encarcerados brasileiros para que seja averiguada a ocorrência de presos irregulares, conforme já discutido nos pedidos anteriores.

Por fim, como medida cautelar foi solicitada que a União libere o valor contido no Fundo Penitenciário Nacional para que não mais haja o retardamento ou a inexecução de parte da programação de despesa prevista na Lei Orçamentária.

Por conseguinte, no mérito da demanda foi requerido que haja a declaração do “estado de coisas inconstitucional” do sistema penitenciário brasileiro, bem como a deliberação para que o Governo Federal encaminhe ao STF, dentro do prazo de três meses, um plano nacional que proponha uma solução, no decorrer dos próximos três anos, para o abominável sistema prisional brasileiro. Plano este que contenha soluções para os principais problemas de violação aos direitos fundamentais e humanos dos detentos e que será, depois de devidamente aprovado, encaminhado para os Estados e Distrito Federal.

2.1. DOS VOTOS DOS MINISTROS

No dia 27 de agosto de 2015 se iniciou o julgamento das cautelares. O primeiro a votar foi o relator, ministro Marco Aurélio, o qual fez a observação que o Brasil é o terceiro país no mundo com a maior população presidiária. Ressaltou que o déficit prisional é gigantesco e um dos maiores males do sistema carcerário.

Sendo assim, a falha no sistema é geral, ocorrendo a mais vasta violação dos direitos fundamentais dos detentos no tocante à dignidade da pessoa humana, aos princípios constitucionais e ferindo de morte direitos adquiridos como o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e a Convenção contra a Tortura, além da própria Lei de Execução Penal.

No entendimento do relator, para que seja reconhecido o estado de inconstitucionalidade é necessária a responsabilidade do executivo, Legislativo e Judiciário, além da União, Estados e Distrito Federal, uma vez que a formulação e a implementação de políticas públicas quanto de interpretação e aplicação da lei penal é carente quanto a sua aplicabilidade correta.

Após o voto do ministro Marco Aurélio, o julgamento foi suspenso, retornando no dia 03 de setembro do mesmo ano com o voto do ministro Edson Fachin, que concordou, em parte, com o relator.

Ato contínuo, Fachin considerou que a ação deve ser admitida, no tocante as cautelares, se pronunciou a favor da realização de audiências de custódia, no prazo máximo de noventa dias, de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante o juiz em até vinte e quatro horas contadas do momento da prisão; dos mutirões carcerários, com a finalidade de viabilizar a revisão de todos os processos de execução penal em curso no país e do contingenciamento dos valores contidos no fundo penitenciário.

Em seu voto, o Ministro Luís Roberto Barroso também concordou com os dois primeiros votos ministrais nos três pontos, entretanto, expandiu o prazo de cumprimento para um ano. Ademais, concedeu de ofício a cautelar para determinar que o Governo Federal envie ao relator, no prazo de um ano, análise da situação em termos quantitativos e pecuniários, para que a Corte tenha elementos adequados para julgar o mérito da ADPF em comento.

O ministro Teori Zavascki, também foi a favor da realização de audiências de custódia o mais breve possível, bem como deferiu o pedido quanto ao fundo penitenciário.  Em suas palavras: “Aparentemente o problema está na falta de projetos, e não na falta de dinheiro, mas essa tese eu já ouvi em outras oportunidades, e concordo que seja uma medida adequada”.

Na sequência, a Ministra Rosa Weber seguiu o relator ao conceder o pleito quanto à audiência de custódia, com observância dos prazos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça e ao descontingenciamento de recursos do Fundo penitenciário, acolhendo o prazo sugerido pelo Ministro Edson Fachin.

Adiante, o Ministro Luiz Fux concordou integralmente com o relator. Ponderou que alguns magistrados não motivam suas decisões, apesar de ser regra prevista no ordenamento jurídico. “Portanto, há um estado de coisas inconstitucional”.

A Ministra Carmen Lúcia também seguiu o entendimento do ministro relator, enfatizou ainda, a necessidade de haver um diálogo com a sociedade a respeito do tema. Nesse sentido, a ministra demonstrou expectativa de uma melhora na atual situação carcerária do país com a elaboração de projetos que dará efetivo cumprimento as leis existentes.

Por conseguinte, o voto do Ministro Gilmar Mendes foi pelo deferimento da realização das audiências de custódia e em relação ao descontingenciamento do fundo penitenciário. Ainda, aferiu que a utilização da tecnologia da informação na execução penal proporcionaria benefícios como a estatística confiável da situação prisional do país. Nessa continuidade, sugeriu a criação de plano de trabalho para apresentar treinamento aos juízes sobre o sistema prisional e medidas alternativas a restrição da liberdade.

O Ministro Celso de Mello foi mais um que acompanhou integralmente o voto do relator. Afirmou ainda, que os valores do fundo penitenciário nacional não podem ter outra finalidade senão aquela para qual foi criada.

Por fim, o Ministro Ricardo Lewandowski da mesma maneira adotou totalmente o voto do relator, reconhecendo o "estado de coisas inconstitucional" em que se encontra o Brasil na atualidade quando se trata de execução penal.

Diante de todo o exposto, se vislumbra que todos os ministros que participaram do julgamento reconheceram o atual ‘estado de coisas inconstitucional’ do sistema carcerário brasileiro.

Não se manifestaram quanto à imposição da preparação e implementação de planos pela União e Estados, sob monitoramento judicial. Do mesmo modo, sobre a exigência de fundamentação das decisões que não aplicarem medidas cautelares diversas da prisão e a imposição de penas adequados ao agravamento do injusto cometido.

Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

2.2. DAS CAUTELARES DEFERIDAS

Por mais que, como disposto acima, todos os ministros tenham reconhecido o atual “estado de coisas inconstitucional” em que vive os detentos que cumprem pena nos presídios brasileiros. Das oito cautelares postuladas na petição inicial da arguição de descumprimento de preceito fundamental em análise, apenas duas foram deferidas no julgamento do dia 09 de setembro de 2015.

O Supremo Tribunal Federal deferiu parcialmente as cautelares postuladas no tocante às audiências de custódia e no que diz respeito ao Fundo Penitenciário Brasileiro.

Para tanto, decidiu por outorgar aos Juízes e Tribunais o comando para que passem a realizar audiências de custódia, no prazo culminante de noventa dias, de modo a viabilizar o comparecimento do preso perante a autoridade judiciária em até vinte e quatro horas contadas do ato da prisão.

Como segunda cautelar deferida, os ministros abrangeram a liberação do saldo cumulado no Fundo Penitenciário Nacional para ser utilizado com o fim para o qual foi criado, vetando novas inexecuções ou o retardamento das despesas previstas na lei orçamentária.

Por multiplicidade de votos, o Supremo aceitou proposta do Ministro Luís Roberto Barroso para determinar à União e ao Estado de São Paulo que forneçam informações sobre a situação do sistema carcerário no prazo de um ano, para que os elementos da pesquisa sirvam como parâmetro para o julgamento do mérito da ação.

3. DA INEXISTÊNCIA DAS AUDIÊNCIAS DE CUSTÓDIA NO ESTADO, ABUSO DA PRISÃO PREVENTIVA, MAUS TRATOS E DA VIOLÊNCIA FÍSICA E PSICOLÓGICA DOS PRESIDIÁRIOS.

 Primeiramente, para se tratar de audiências de custódia, como passo primordial é necessário ter o conhecimento de que é um projeto criado pelo presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Ricardo Lewandowski, em outubro de 2015.

Tal projeto tem a finalidade de tornar possível um primeiro contato do acusado com a autoridade judiciária, apresentado- o, em um período de no máximo vinte e quatro horas a um juiz.

Na audiência de custódia o magistrado poderá analisar se houve algum tipo de tortura ou maus tratos ao acusado, bem como a legalidade ou ilegalidade do ato da prisão em flagrante, se esta preenche ou não os requisitos necessários para sua efetivação, observados as garantias constitucionais e os direitos fundamentais da pessoa humana.

Logo, após manifestação da defesa constituída ou da defensoria pública, bem como parecer do Ministério Público, o juiz analisará o caso e notará se existe a possibilidade de conceder a liberdade provisória, com ou sem fiança, a probabilidade de relaxar a prisão, caso constatada alguma ilegalidade ou substitui-la por algumas das medidas cautelares diversas constantes no artigo 319 do Código Penal.

Ainda, converter a prisão em flagrante em prisão preventiva, no caso de o juízo encontrar indícios de que o acusado traz risco para o convívio social.

Nesse ínterim, após deixar claro o que é a audiência de custódia, bem como é o seu proceder, vale lembrar que ela também está prevista no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e na Convenção Interamericana de Direitos Humanos.

Assim, a luz do constante nos pactos e tratados elencados acima e na efetivação do projeto criado pelo ministro Lewandowskis, se vislumbra a ampla diferença que a realização das audiências traria ao sistema prisional brasileiro caso fossem utilizadas por todos os Estados.

 O CNJ celebrou com alguns Estados brasileiros um termo de compromisso que constava que os estados começariam a executar as audiências de custódia, o que na verdade já ocorreu, mas não se trata de uma “praxe” na execução penal, nos Estados em que foi implantado o projeto, há casos de presos preventivos esperando há mais de seis meses pela realização da audiência de custódia.

Dessa maneira, se verifica que o projeto apenas existe na teoria, pois que na prática, em alguns Estados, as audiências de custódia não passam de dados irrisórios, uma vez que os acusados esperam com sua liberdade cessada por meses ou até anos e muitas vezes acabam se tornando vítimas do sistema, quando após responderem todo o processo criminal decreta-se sua inocência.

Outro ponto a ser abordado é referente ao abuso da prisão preventiva. Inicialmente, também importante ressaltar que a prisão preventiva é uma medida cautelar que depende de no mínimo três requisitos para sua decretação. Quais são eles:

Prova da existência do crime (materialidade) + indício suficiente de autoria + uma das situações descritas no artigo 312 do Código de Processo Penal, a saber: a) garantia da ordem pública; b) garantia da ordem econômica; c) conveniência da instrução criminal; d) garantia de aplicação da lei penal. (NUCCI, 2010, p. 601).     

Assim, devidamente preenchidos os requisitos elencados acima o juízo deve atentar se houve a ocorrência de uma ou das três condições básicas que configuram a necessidade da decretação ou manutenção da prisão preventiva, uma vez que omissa essa análise pode se configurar abuso da medida cautelar em comento.

 Nesse entendimento, Nucci diz que “como regra, o ideal é respeitar a ocorrência conjunta dos três fatores (gravidade do crime + repercussão social + periculosidade do agente)” (NUCCI, 2010, p. 603).

De tal sorte, a autoridade que conduz o inquérito ou a instrução criminal, precisa ter em mente que tudo deve ser analisado cuidadosamente, a gravidade do delito, as circunstâncias do fato, se este realmente existe, sua materialidade, tudo na intenção de não prender ou manter preso quem poderia ter sua pena substituída, ter sua liberdade concedida, mesmo que provisoriamente.

Consequentemente, é notório que atualmente existe o acontecimento de uma série de constrangimentos ilegais causados aos presos provisórios, uma vez que muitos são encarcerados e esquecidos, se quer são analisadas profundamente a gravidade do delito, a repercussão social do caso ou se essa pessoa presa realmente traz riscos à sociedade caso seja posta em liberdade.

Portanto, nas palavras do autor “a prisão preventiva tem a finalidade de assegurar o bom andamento da instrução criminal, não podendo está se prolongar indefinidamente, por culpa do juiz ou por atos procrastinatórios do órgão acusatório” (NUCCI, 2010, p. 600).

Noutra banda, como se não bastasse a inexecução das audiências de custódia cumulada com a prisão preventiva “perdida de vista”, os encarcerados do sistema prisional brasileiro ainda passam por diversas situações de violação dos seus direitos humanos e fundamentais previsto na Carta Magna.

A Lei nº 7.210/84, chamada de Lei de Execução Penal, traz no seu artigo primeiro o seguinte: “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar decisões para a harmônica integração social do condenado e do internado”

Todavia, diante da realidade fática das penitenciárias brasileiras não precisa ser nenhum especialista na área para se saber que tal norma não é eficaz. A prisão não cumpre o seu dever de punir e ressocializar como institui a LEP.

Nesse sentido, se observa a violação dos direitos constitucionais garantidos pela Carta Magna em seu artigo 5º e que deveriam ser respeitados, mas que não é o que acontece. Senão vejamos:

“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral;

L – às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;”

 Logo, basta uma pesquisa na rede mundial de computadores, uma lida nos jornais e vista de casos que aparecem todos os dias na televisão para se notar que a sociedade fecha os olhos para os absurdos desumanos que acontecem dentro das penitenciárias.

Não existe dignidade da pessoa humana, não existem condições físicas e psicológicas dentro de um lugar onde as facções criminosas comandam, onde os colegas de celas violam a integridade física do outro, onde o próprio agente penitenciário quer mandar e desmandar nos apenados, obrigando-os a cometerem abusos sexuais com os demais, por exemplo.

As penitenciárias brasileiras atualmente não passam de um lugar onde se semeia o ódio, a vingança e a injustiça. Os apenados são tratados da pior maneira possível, sem nenhuma condição de saúde, higiene, alimentação e vestuário precário.

É evidente o descaso com os encarcerados. O sistema prisional atual é falho desde o início, quando o apenado coloca seus pés pela primeira vez dentro do estabelecimento prisional. São ofensas, discriminações, preconceitos, espancamentos diários, uma verdadeira afronta e que fere de morte os direitos conquistados pelo país ao tratar da convenção internacional dos direitos humanos cumulada com o descumprimento dos princípios constitucionais elencados na Carta Máxima.

4. O TERROR DA SUPERLOTAÇÃO CARCERÁRIA BRASILEIRA.

A maior causa da crise do sistema carcerário brasileiro é sem sombra de dúvidas a superlotação. A falta de investimento cumulada com o abandono pelo poder público traz como consequência a reincidência, as rebeliões e tudo o que de negativo pode aprender um ser humano encarcerado no Brasil.

Na verdade, a suspensão da liberdade, do direito de ir e vir do apenado não funciona na prática como aduz a teoria, onde o preso deveria ter acesso à educação e ao trabalho, para ter a oportunidade de voltar a conviver com a sociedade sem trazer riscos a ela. O que acontece atualmente é o aperfeiçoamento para o crime, onde é impossível, diante de tanta desumanização ressocializar alguém.

Importante destacar a violação dos direitos fundamentais dos apenados, bem como o descumprimento da Lei de Execução Penal. Nesse enfoque, cabe lembrar a falta de fiscalização judicial no cumprimento das penas.

Ora, os direitos fundamentais elencados na Carta Magna deveriam ser postos em prática com maior satisfação por quem quer que seja perante um apenado. A sociedade, como dito anteriormente, fecha os olhos para o descaso com os encarcerados brasileiros.

Sendo assim, tanto as autoridades governamentais como as judiciárias ao invés de contribuírem para a recuperação dos que cumprem pena em regime fechado, só ajudam a piorar o sistema. A realidade é cruel, em casos de crimes mais violentos os presidiários são tratados como verdadeiros lixos dentro das carceragens, mas o que não é lembrado é que esse indivíduo já abalado pelo delito cometido ou por qual razão cometeu tal delito, com o tratamento desumano que lhe é fornecido jamais sairá do “mundo do crime”.

Nas palavras de Araújo, um breve entendimento sobre direito fundamental:

Os direitos fundamentais têm um forte sentido de proteção do ser humano, e mesmo o próprio caput do art. 5º faz advertência de que essa proteção se realiza “sem distinção de qualquer natureza”. Logo, a interpretação sistemática e finalística do texto constitucional não deixam dúvidas de que os direitos fundamentais se destinam a todos os indivíduos, independentemente de sua nacionalidade ou situação no Brasil. (ARAÚJO, 2005, p.117).

Nesse sentido, os direitos fundamentais têm a mais primordial função de estabelecer a humanidade, a igualdade e a dignidade entre as pessoas.

A essência desses direitos se encontra em sentimentos como a solidariedade e a fraternidade, construindo mais uma conquista da humanidade no sentido de ampliar os horizontes de proteção e emancipação dos cidadãos. (ARAÚJO, 2005, p.116).

Noutro aspecto, a LEP se cumprida como redigida, não teríamos essa abominação carcerária brasileira. No que tange a ressocialização do apenado a norma é cristalina ao elencar o rol de direitos assistenciais que os encarcerados deveriam ter para que posse possível o seu retorno a sociedade da melhor maneira possível.

“Art. 10 – A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade.

Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

Art. 11 – A assistência será:

I – material;

II – à saúde;

III – jurídica;

IV – educacional;

V – social

VI – religiosa.”

Contudo, o sistema prisional não funciona, é preso provisório encarcerado junto com preso sentenciado, é maus tratos, humilhação, abuso sexual e moral, discriminação, falta de condições mínimas de higiene, vestuário, saúde. Outro índice que contribui e muito para a superlotação é a demora no julgamento dos recursos, ou os presos que já cumpriram suas penas, mas que por falta de mutirão carcerário continuam presos.

Por fim, diante de tudo, o que se observa é a falta de comprometimento do Estado, de regularização da administração presidiária, uma mistura de comissão e omissão do poder público. Nesse segmento o Brasil só tende a aumentar os índices de superlotação carcerária o que se observa e que o sistema prisional este abandonado, existem apenas projetos de lei, mas nada emergente que realmente mude essa triste realidade.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após o curso da análise que trata este trabalho, foi possível verificar que os direitos fundamentais dos encarcerados brasileiros são violados diariamente em um sistema que não funciona, que não ressocializa o preso, pelo contrário, o devolve ainda mais violento e sem nenhuma condição básica de saúde e humanitária para o convívio em sociedade.

No entanto, das cautelares deferidas na referida ação, estão mencionadas primeiramente a realização de audiência de custódia, a qual possibilitaria ao preso em flagrante a averiguação da real necessidade de mantê-lo encarcerado e se há a probabilidade de sair da prisão mediante o pagamento de fiança ou a aplicação de uma medida punitiva de caráter educativo. Sendo assim, dando ao apenado o direito de ter seu caso reanalisado por um juiz, que verá a legalidade da sua prisão em tempo excessivamente curto.

De outro lado, o que mais foi frisado no que diz respeito as medidas cautelares deferida foi a possibilidade do arbitramento de medida alternativa a prisão, conforme elencado no artigo 319 do CPP, analisando sempre a gravidade do delito cometido pelo réu, o que também de qualquer sorte não ocorre nos tribunais brasileiros. Razão pela qual as penitenciárias se encontram superlotadas.

Quando se entra no mérito da demanda, importante salientar que o intuito de analisar a presente ADPF está na possibilidade de mudança do sistema prisional futuro, ao passo que hoje em dia se verifica a falta de respeito para com o ser humano que se encontra com sua liberdade privada.

Conforme se verificou no decorrer do trabalho, é desumano o tratamento que o preso tem dentro da cadeia, onde não há as condições mínimas do básico de saúde, higiene e alimentação, onde os mesmos sofrem a violência física e psicológica, tanto pelos demais detentos como pelos agentes públicos que lá trabalham.

Nesse ínterim, por óbvio que o sistema suplica por melhorias, no mais, de que adianta ter a ação interposta, as cautelares deferidas se o governo não apoia. O que o sistema prisional brasileiro necessita é de uma reforma geral, onde os presos novos não se comuniquem com os antigos e considerados mais perigosos, para que não acabem se tornando vítima das facções existentes dentro das penitenciárias, como vem ocorrendo até então.

Por isso, não basta apenas se ter a legislação em mãos, se precisa de uma maior atenção do poder público para que a liberdade do indivíduo seja cessada em última instancia, devendo sempre ser analisado o grau de gravidade do ilícito cometido. Entretanto, não podendo ser alterado o regime da prisão, que seja sempre realizado nos complexos prisionais o mutirão carcerário, para que os presos não fiquem “esquecidos” dentro das cadeias, que haja uma melhor administração dos presídios do país, para que o Pacto dos Direitos Civis e Políticos, juntamente com a Convenção Interamericana de Direitos Humanos sejam devidamente cumpridos, obtendo assim uma melhor execução do processo penal.

 

Referências:
ARAUJO. Luiz Alberto David. Curso de direito constitucional. 9ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2005;
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988;
Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941;
Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984;
NUCCI. Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 6ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010.
SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA, disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp. Acesso em: 10 18,30 e 31 de março de 2016;
COSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, disponível em:http://www.cnj.jus.br/sistema-carcerario-e-execucao-penal/audiencia-de-custodia. Acesso em: 26 de abril de 2016, 20:20;

Informações Sobre o Autor

Flavia Garcia Barros

Acadêmica do último semestre do curso de Direito da faculdade Anhanguera do Rio Grande-RS


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!
logo Âmbito Jurídico