A justiça na guerra

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O artigo aborda o conceito e os aspectos históricos e legais da guerra justa, diferenciando a agressão da legítima defesa; aborda aspectos do Direito Internacional Humanitário, apresentando as convenções de Genebra e seus Protocolos, ressaltando a importância dessas normas para minimizar o sofrimento das pessoas e a perda de bens. Por fim, dá noções sobre os crimes de guerra e a atuação dos governos e forças armadas perante esses crimes.

1. A GUERRA JUSTA

Os critérios de justiça na guerra não são um fundamento legal para o uso da força, pois esta não se justifica, mesmo se usada para um fim nobre. O direito de um Estado fazer a guerra pressupõe a existência de normas das quais possa derivar aquele direito.

No passado uma guerra era justa quando autorizada por um soberano, considerando, ainda, os  fins para os quais ela era travada. As duas Guerras Mundiais trouxeram uma nova idéia em relação à justiça na guerra, considerando justas as atitudes defensivas, isto é, aquelas travadas para resistir a uma agressão.

A Carta das Nações Unidas relaciona o conceito de injustiça com agressão e de justiça com autodefesa. Em seus artigos, explicitamente, recusa a ameaça ou o uso da força contra a independência política ou a integridade territorial de qualquer Estado, enquanto permite o uso da força em legítima defesa.

A paz pode ser considerada, de acordo com a visão jurídica, como um pacto ou acordo para não lutar. A paz é rompida somente quando a força é usada em violação a esse acordo. Não é o uso da força armada que constitui a agressão, mas o uso da força de maneira que viola os direitos estabelecidos por uma ordem jurídica ou moral, constituindo-se não só um mero fato, mas um erro. O uso da força para responder a esta violação é justificado, porque é um meio de conter e punir um erro.

A agressão é um ataque contra determinado Estado e um crime contra a própria sociedade internacional, enquanto que a resistência à agressão é um ato de aplicação da lei internacional e de autodefesa.

Na noção de guerra justa, a premissa é de que todas as partes têm seus devidos direitos e a guerra é um meio de punir a violação de direitos e assegurar a harmonia entre as partes. A concepção jurídica da guerra, como instrumento da lei, caracteriza-se quando essa é utilizada como um ato de justiça, empreendido em defesa da lei ou para a punição de atos criminosos.

2.  O DIREITO INTERNACIONAL HUMANITÁRIO

As regras humanitárias surgiram com as primeiras lutas entre os homens. Na História houve inúmeros exemplos de atitudes de bondade entre os beligerantes, mas se tratava sempre de atos ou de acordos isolados, válidos somente para um conflito ou para uma batalha.

Ao longo dos séculos, a repetição de tais atitudes e comportamentos começou, no entanto, a constituir costumes reconhecidos por todos. Após dolorosas experiências em conflitos, a comunidade internacional decidiu desenvolver o “Direito da Guerra.”

O Direito Internacional Humanitário ou o Direito da Guerra é um conjunto de normas internacionais, que se originaram em convenções ou em costumes, destinados a serem aplicados em conflitos armados, internacionais ou internos, que limitam, por razões humanitárias, o direito das partes em conflito de escolher livremente os métodos e os meios utilizados no combate e que protegem as pessoas e os bens afetados.

Estas normas buscam assegurar o respeito pela pessoa humana em caso de conflito armado. Inspirando-se no sentimento de solidariedade, aceita-se o princípio de que os beligerantes não devem causar ao adversário males exagerados em relação ao objetivo da guerra, cuja finalidade é a destruição ou o enfraquecimento do potencial militar do inimigo.

Em tempo de guerra, os soldados devem observar certas regras de humanidade, mesmo em relação ao inimigo. Estas estão principalmente incluídas nas quatro Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949 e nos seus Protocolos adicionais de 08 de junho de 1977.

As Convenções de Genebra têm por base o respeito pelo Homem e pela sua dignidade. Elas determinam que as pessoas não participantes diretamente das hostilidades ou afastadas do combate por doença, ferimento, cativeiro ou qualquer outra causa, sejam respeitadas, protegidas, socorridas e tratadas sem distinção.

As quatro Convenções de Genebra foram aprovadas em 1949:

– I Convenção – proteção de militares feridos ou doentes no campo de batalha.

– II Convenção – proteção de militares feridos ou doentes no mar.

– III Convenção – proteção de prisioneiros de guerra.

– IV Convenção – proteção de civis em tempo de guerra.

Nos conflitos armados ocorridos no interior de um país foram estabelecidas regras humanitárias mínimas, consubstanciadas em cada Convenção.

Os Protocolos adicionais de 1977 estendem esta proteção a toda e qualquer pessoa afetada por um conflito armado. Naquele ano, foram aprovados o Protocolo I para ser aplicado em todos os conflitos armados internacionais e o Protocolo II para os conflitos armados não internacionais de grande intensidade. Esses acordos não substituem as Convenções, mas as complementam.

O Brasil ratificou em 29 de junho de 1957 as Convenções de Genebra e aderiu em 05 de maio de 1992 aos seus dois Protocolos Adicionais. Dessa forma, o País se comprometeu a respeitar o Direito da Guerra, obrigando-se a difundir e cumprir as suas normas.

Convém ressaltar algumas regras gerais do Direito da Guerra, a fim de dar uma noção daquilo que se espera que seja adotado num conflito armado: lutar só contra combatentes; atacar somente objetivos militares; respeitar e proteger as pessoas e os bens civis; limitar os danos e as destruições ao necessário para a operação militar; respeitar os combatentes inimigos que se renderem; proteger os feridos, doentes ou fora de combate e respeitar o pessoal, instalações e equipamentos dos serviços de saúde militar ou civil e da Cruz Vermelha.

Essas regras não são incompatíveis com a eficácia militar, pois conciliam as necessidades militares e as exigências humanitárias. Esse Direito é realista e não pretende impedir as guerras, mas sim aliviar, atenuar ou evitar os sofrimentos delas decorrentes.

A violação dessas regras não somente é punível, mas desonra o seu autor e a unidade militar a qual pertence. As infrações ao Direito da Guerra são parâmetros de debilidade e de falta de disciplina da tropa. Este Direito exige que cada Estado signatário das convenções de guerra estabeleçam sanções efetivas para reprimir as violações.

Enquanto existirem situações de conflito armado no mundo, é importante que existam regras, procedimentos e mecanismos que permitam ao Ser Humano viver ou sobreviver sem nenhuma discriminação de nacionalidade, de raça, de religião, de condição social ou de credo político e que se fundamentem no respeito à sua qualidade de membro deste grande conjunto ao qual todos pertencemos: a Humanidade.

3. CRIMES DE GUERRA

O emprego de uma força armada na defesa externa de um país, não pode deixar de considerar os acordos internacionais assinados pelo seu governo, que visam proteger os Direitos Humanos, de modo a manter um controle sobre o comportamento de seu pessoal militar, conforme os princípios de Direito Humanitário.

Medidas preventivas e repressivas devem ser adotadas contra as violações graves do Direito da Guerra e os aspectos jurídicos, que envolvem os crimes de guerra, previstos na lei internacional, devem ser conhecidos por todos os envolvidos nas operações militares.

A primeira categoria de infrações, que os Estados devem sancionar são os atos que não estão de acordo com o prescrito nas Convenções de Genebra e nos seus Protocolos Adicionais. Essas infrações são puníveis, no direito interno do Estado, por sanções administrativas, disciplinares ou penais e, no âmbito mundial, são aplicados os mecanismos de responsabilidade internacional, em matéria de não cumprimento dos compromissos assumidos.

A segunda categoria refere-se às infrações graves ao Direito Internacional Humanitário, que se ficarem impunes, significará a total ineficiência de toda a legislação humanitária.

Entende-se por infrações graves qualquer um dos atos que as Convenções e o Protocolo I de Genebra estipulam como tais. O Protocolo I classifica as infrações graves como Crimes de Guerra. Nesse sentido, são considerados crimes de guerra os atos graves cometidos contra pessoas ou bens protegidos pelos instrumentos de Genebra.

Os governos devem tomar as medidas necessárias, para determinar as sanções penais adequadas, que serão aplicadas às pessoas que deram as ordens para cometer ou cometeram essas infrações, seja por ação ou omissão, garantindo-lhes sempre um julgamento legal e justo.

Em relação ao julgamento dos crimes de guerra, instituiu-se a Competência Penal Universal de todos os Estados signatários dos Acordos de Genebra, onde a regra adotada é julgar ou dar para julgar. Esse sistema universal de repressão obriga o Estado, que não tenha julgado os culpados de crime de guerra perante os seus próprios tribunais, a extraditá-los com todas as garantias do devido processo legal.

Convém ressaltar que o funcionamento e a eficiência desse sistema de sanções dependem da vontade política dos Estados, pois as regras internacionais necessitam estar incluídas no ordenamento jurídico interno de cada país para surtirem os efeitos desejados.

Existe ainda a possibilidade de criação de tribunais internacionais, com competência para julgar os crimes de guerra ou de reconhecer essa competência nos tribunais já existentes, tal como a Corte Internacional de Justiça de Haia e o recém-criado Tribunal Penal Internacional.

As normas legais consagram o princípio da responsabilidade pessoal pelos crimes de guerra. Esse princípio procura evitar a impunidade de uma pessoa, pelo fato de ter agido na qualidade de representante ou de órgão do Estado, cumprindo ordens superiores, de modo a fugir de sua responsabilidade pessoal.

O Direito da Guerra, conforme visto anteriormente, não padece, de nenhuma maneira, de ineficiência a respeito da repressão de suas violações ou crimes de guerra. Ele contém sanções efetivas que podem garantir sua aplicação e castigam adequadamente sua inobservância. As carências desse Direito são devidas não à inexistência de um aparato jurídico, mas sim às falhas da vontade política de cada Estado.

O Estado, signatário das normas internacionais do Direito da Guerra, deve procurar adequar sua legislação interna para prevenir ou coibir, de modo claro e objetivo, os crimes de guerra, deixando as Forças Armadas cientes de suas responsabilidades humanitárias, de modo a contribuir para o engrandecimento e desenvolvimento dos valores humanos universalmente aceitos por todas as nações.

Atualmente o terrorismo internacional e as técnicas da guerra irregular desrespeitam as regras humanitárias no seu mais elevado grau, fazendo vítimas inocentes, buscando com suas ações desumanas atingir seus objetivos a qualquer preço. Aqueles que utilizam este tipo de atitude não se importam com as conseqüências de seus atos, desde que atinjam suas metas.

O Direito Internacional deve buscar mecanismos adequados para coibir essas práticas e punir os responsáveis, de modo a minimizar o sofrimento dos que são afetados pelos conflitos armados atuais.

4. CONCLUSÃO

O conceito jurídico de guerra justa está baseado na autodefesa, isto é, na resistência a uma agressão como uma maneira de punir o agressor e restabelecer a harmonia entre os países.

Conceituada como uma exteriorização máxima da violência entre as nações, a guerra também tem suas regras e princípios, consubstanciados no Direito Internacional Humanitário, para manter a dignidade da pessoa humana acima do ser irracional. A adesão do Brasil às Convenções de Genebra e aos seus Protocolos conduz as forças militares do país a respeitar essas normas, contribuindo para um maior desenvolvimento da sociedade humana.

O atual contexto do mundo exige dos organismos internacionais, principalmente da ONU, uma posição mais firme em relação aos conflitos existentes e potenciais, a fim de aumentar a segurança e a paz no mundo. A existência de normas jurídicas na guerra é importante para minimizar o sofrimento humano e frear o seu instinto belicoso, entretanto torna-se essencial que todos os povos compreendam a necessidade de alcançar um período duradouro de paz no planeta, tendo como respaldo legal as normas internacionais e os acordos celebrados pelas nações.

 

Referências
1. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Promulgada em 1988.
2. ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA. Manual Básico. Edição 1993. Rio de Janeiro.
3. NARDIM, Terry. Lei, Moralidade e as Relações entre os Estados. Editora Forense RJ. 1ª Edição.1987.
4. ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Carta das Nações Unidas. Assinada em 26 Out 1945.
5. PESSOA, Mário. O Direito da Segurança Nacional. Editora Biblioteca do Exército.1971.
6. SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Positivo. 6ª Edição. Editora Revista dos Tribunais. 1990.
7. SWINARSKI, Christophe. A Norma e a Guerra. Editora Sete Mares 1991.
8. __________. Introdução ao Direito Internacional Humanitário. Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Editora Escopo. Brasília.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Fernando Carlos Santos da Silva

 

Coronel do Exército. Formado em Ciências Militares pela Academia Militar das Agulhas Negras em 1978 e em Direito pela Faculdade de Direito de ITU – SP em 1984. Mestre em Aplicações Militares em 1988 e Doutor em Aplicações, Planejamento e Altos Estudos Militares em 1998. Possui Pós-Graduação“Lato-Sensu” em Educação, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1999/2000; em Gerência Executiva de Logística e Transporte (Post-Baccalaurete), pela Universidade de Miami – Miami – EUA, em 2004 e em Direito Civil e Processo Civil, pela Universidade Cândido Mendes em Brasília – DF, em 2004. Observador Militar da ONU na Operação de Paz em Moçambique – África, Professor, Palestrante, Consultor de Qualidade e Excelência Gerencial, Consultor de Logística e Transporte, Professor-Autor de apostilas para concurso público na área jurídica

 


 

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