O princípio da segurança jurídica possui seu fundamento legal insculpido no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, e está intimamente ligado à confiança que o cidadão possui em um ordenamento que está sempre em mutação.
De acordo com o doutrinador Lucas Rocha Furtado (Curso de Direito Administrativo, Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2007, p. 125), “por mais contraditório ou sem sentido que possa parecer, o princípio da segurança jurídica surge para conter ou limitar a aplicação do princípio da legalidade administrativa, sobretudo em relação à possibilidade de a Administração Pública anular atos ilegais que tenham, todavia, gerado benefícios favoráveis a terceiros”.
O administrador deve primar pela observância de um ponto de equilíbrio entre três princípios quase sempre associados: segurança jurídica, legalidade e proteção da confiança.
O cidadão deve ter a segurança de que pode confiar nos atos e decisões públicas incidentes sobre os seus direitos e nas posições jurídicas emanadas da Administração, afastando-se a ideia de que estas são modificadas por motivos circunstanciais.
Como o princípio da segurança jurídica é resultado de uma construção que ocorre a partir da interpretação sistemática da Constituição Federal, obtida com fulcro em dispositivos que garantem a legalidade, a irretroatividade e a anterioridade, presume-se que tem o condão de garantir ao cidadão o amparo que ele necessita para poder esboçar a confiança que, teoricamente, deveria ter na Administração que conduz seus interesses.
Ademais, a segurança jurídica que se espera do Estado não é somente no tocante a proteção da vida, incolumidade física ou do patrimônio, mas, acima de tudo, a segurança jurídica estabelecida entre o Estado e o cidadão, especialmente do ponto de vista jurisdicional, pois ela é a expectativa mínima que deve ser oferecida a este.
Dentre tantas normas inseridas no ordenamento jurídico pátrio, cita-se o artigo 2º, XIII, da Lei 9.784/1999 (regula o processo administrativo no âmbito federal), que dispõe estar a Administração sujeita, dentre outros, ao princípio da segurança jurídica. Tal dispositivo é taxativo ao expressar que “nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de (…) interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação”.
Pela leitura do dispositivo vislumbra-se o cuidado que a norma teve em tentar garantir a proteção dos direitos dos administrados e o melhor cumprimento dos fins da administração.
Mais adiante, a mesma lei trouxe em seu artigo 54 o seguinte texto: “o direito da administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé”.
Assim, o direito-dever de a Administração anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em 5 (cinco) anos, salvo se se tratar de ato de nulidade absoluta, porquanto em relação a estes seria desproporcional cogitar da aplicação do referido prazo decadencial.
Veja-se que, conforme ensina o doutrinador Jorge Ulisses Jacoby Fernandes (Tribunais de Contas do Brasil, 2ª ed. Belo Horizonte: Ed. Fórum, 2005, p. 579), a norma em comento “representa garantia para os administrados, em especial, contras mazelas eternas, que situam a administração em descompaso com o tempo, no que tange ao cumprimento de obrigações e na prática de atos que lhe competem”. Ainda, para o ministro, este dispositivo é “a consagração, no plano legislativo, do princípio da segurança das relações jurídicas, há muito reclamado no plano doutrinário administrativo”.
Fortemente ligado aos direitos e garantias fundamentais do Estado Democrático de Direito, o princípio da segurança jurídica é uma ferramenta de demonstração de uma dinâmica do Direito, assim como das atividades legislativas, na busca pelo acompanhamento das mutações nas relações, sobretudo, sociais.
A importância do princípio em análise é tão acentuada que se trata por garantia de preservação de direito do cidadão quando, por exemplo, o Poder Executivo, para cumprir seu plano de governo, apresenta propostas de reformas constitucionais que podem macular direitos já consagrados, momento no qual aquele manifesta sua insatisfação e invoca os motivos que ensejam o estudo da segurança jurídica.
Assim, o princípio da segurança jurídica é um vetor na busca pela justiça e prima pela observância de institutos consubstanciados, principalmente, no respeito aos direitos adquiridos, no devido processo legal e na irretroatividade da lei, ensejando, desta maneira, imposição de limites e a segurança, propriamente dita, do cidadão ao deparar-se com as invalidações dos atos administrativos considerados ilegais ou inconstitucionais.
Informações Sobre o Autor
Tatiana de Oliveira Takeda
Advogada, assessora do Tribunal de Contas do Estado de Goiás – TCE, professora do curso de Direito da Universidade Católica de Goiás – UCG, especialista em Direito Civil e Processo Civil e mestranda em Direito, Relações Internacionais e Desenvolvimento