A Responsabilidade da Nova Empresa no contexto Globalizado

Resumo: Diante das recentes mudanças ocorridas no mundo empresarial, mais especificamente com respeito à humanização do ambiente de trabalho, as organizações começaram a assimilar novas práticas voltadas para metas e resultados, porém sob um novo ponto de vista: a transformação social. A preocupação com os valores, meio ambiente, ética, geração de emprego, renda e desenvolvimento sustentável fizeram com que as empresas trabalhassem de forma sistemática as questões sociais em consonância com o planejamento e estratégias de sustentabilidade das organizações empresariais e da sociedade. A partir dessa nova postura adotada pelas empresas surgiu a Responsabilidade Social Corporativa como solução para as questões relacionadas as empresa e comunidade, que além de despertar a consciência social, impulsiona as estratégias nos negócios, incluindo a tangibilidade e o fortalecimento da marca.


Palavras-chave: Responsabilidade Social Corporativa. Globalização. Meio ambiente.


Abstract: Ahead of the recent changes in the enterprise world, more specific with respect to the humanization of the work environment, the organizations had started to assimilate new practical come back toward goals and results, however under a new point of view: the social transformation. The concern with the values, environment, ethics, generation of job, income and sustainable development had made that the companies worked of systematic form the social matters in accord with the planning and strategies of support of the enterprise organizations and the society. From this new position adopted for the companies, the company appeared the Corporative Social Responsibility as solution for the related questions and community that beyond awaking the social conscience, stimulates the strategies in the businesses, including the tangibilidade and the reinforcement of the mark.


Keywords: Corporative Social Responsibility. Globalization. Environment.


Sumário: 1. Notas introdutórias. 2. Alguns Efeitos no Trabalho Advindos da Globalização. 3. A Idéia de Desenvolvimento Sustentável no Contexto da Globalização. 4. O Desenvolvimento Sustentável da Empresa: a Responsabilidade Social Corporativa. 5. A Responsabilidade Social Corporativa: um conceito ainda em construção. 6. Os Conteúdos Integrantes da Responsabilidade Social Corporativa da Empresa: a triple bottom line. 7. Breve Análise dos Conteúdos Incorporados como Parte da Política de Responsabilidade Social Corporativa. 8. Dimensão Interna e Dimensão Externa da Responsabilidade Social Corporativa. 9. Voluntariedade x Obrigatoriedade da Responsabilidade Social Corporativa. 10. Instrumentos de Articulação da Responsabilidade Social Corporativa. 11. Códigos de Conduta. 12. O labelling social. 13. A Publicação dos Informes de Responsabilidade Social Corporativa. 14. Considerações Finais. Referências bibliográficas.
1. Notas introdutórias


Vários são os fatores que contribuíram para modelar uma realidade que penetra profundamente na vida do ser humano no século 21. Entre estes, talvez os mais importantes sejam os avanços realizados pelas novas tecnologias de informação e comunicação, que fazem com que as notícias possam ser conhecidas em qualquer lugar do mundo praticamente em tempo real, e a melhora dos meios de transporte, capazes de


permitir que pessoas e mercadorias possam ser transportadas sem problemas, de forma rápida e segura em todo o território mundial. Evidentemente esta mudança substancial do modo de vida da sociedade causou uma infinidade de efeitos, trazendo claras vantagens, como o aumento da qualidade e nível de vida da sociedade, mas não podemos esquecer que também trouxe uma série de perigos e inconvenientes[1]. Talvez os principais sejam os derivados de um sistema produtivo juntamente com o consumo indiscriminado, não diretamente provocado pela globalização que se agravou e acelerou de forma notável nos últimos tempos em sua forma depredadora de produção, comercialização, consumo e estilo de vida (Falk, 2002, p. 236). As conseqüências desta ação da sociedade podem ser notadas em diversos âmbitos. Em primeiro lugar, trazem certa influência no meio natural: é evidente a alteração climática provocada pela emissão de gazes, juntamente com o avanço do desmatamento do meio ambiente, contaminação, diminuição da camada de ozônio, redução da biodiversidade e a certeza do caráter limitado dos recursos naturais, alguns deles imprescindíveis para a própria vida do ser humano, como a água, que poderá levar a futuros conflitos.


Os efeitos sociais causados são importantes, podendo-se observar de forma evidente a intensidade das modificações. Em geral os Estados ricos aparecem como os principais receptadores dos benefícios derivados da globalização, permitindo obter mão de obra barata e flexível, ocupando postos de trabalho desejados pelas pessoas naturais do país de acolhida, vendo rejuvenescer sua população, obtendo maiores ingressos fiscais e enriquecendo culturalmente com a diversidade. Em algumas ocasiões o conflito social derivado da falta de integração pode criar problemas bem conhecidos, ou seja, a falta de emprego, a precariedade laboral e a falta de oportunidade para os imigrantes do país de destino (Fernández Domínguez; Hidalgo. 2005, p. 43). De forma contrária, a população de regiões em desenvolvimento e subdesenvolvidas sofre inevitavelmente uma pobreza extrema, em contraste com a abundância dos recursos naturais que não conseguem diminuir a fome e as doenças, cuja situação é agravada por um sistema econômico que submete a uma dívida externa impagável e à inobservância de alguns direitos fundamentais. É um conjunto de problemas que mostram de forma clara como a evolução da sociedade entra em uma fase de contrastes extremadamente perigosos, fazendo-se necessário articular meios para diminuir a distância que separa os seres humanos pelo simples fato de pertencerem a um determinado lugar no mundo (Forstater; MacDonald; Raynard, 2000, p. 45 et seq.).


2. Alguns Efeitos no Trabalho Advindos da Globalização


A globalização trouxe alguns problemas evidentes que afetam de forma especial o fenômeno do trabalho humano em geral e, de forma particular, o setor do ordenamento jurídico encarregado de normatização, que é o Direito do Trabalho. Com o novo contexto mundial, este setor do ordenamento jurídico enfrenta cada vez mais dificuldades para garantir condições mínimas de trabalho de acordo com os parâmetros básicos da justiça social. Cabe advertir que a globalização dos mercados de mão de obra, permitiram um aumento da capacidade de decisão das empresas e grupos multinacionais (Barrientos, 2003, p. 23 et seq.), trazendo como conseqüência indesejável uma evidente precarização das condições de trabalho em amplos setores da população ativa mundial e uma diminuição dos direitos dos trabalhadores que foram conquistados com muita luta em épocas passadas (Standing, 2000, p. 95). Diante dessa realidade cabe ao Direito do Trabalho adaptar-se de forma permanente às novas realidades para conseguir proporcionar respostas aos problemas da classe trabalhadora.


Os Estados ocidentais sofreram uma maciça fuga de empresas como consequência da deslocalização da produção (offshoring), em direção aos países nos quais os custos são substancialmente mais reduzidos. Com objetivo de evitar a fuga destas empresas e com a intenção de combater o dumping social vinculado à busca de bandeira de conveniência, em alguns casos pode ser observada uma diminuição das condições de trabalho existente nesses países para proteger suas empresas e permitir que continuem localizadas em um concreto território nacional. Enfim, confecciona-se um modelo em que as empresas especializam-se e reduzem ao mínimo seu capital humano, criando ao seu redor um ciclo produtivo externo por meio de relações comerciais e alianças com outras organizações produtivas que trazem elementos complementares juntamente com a dificuldade de localizar os centros de imputação de responsabilidade jurídica (Del Rey Guanter, 2005, p. 103).


3. A Idéia de Desenvolvimento Sustentável no Contexto da Globalização


O contexto geral que foi descrito resumidamente mostra um panorama caracterizado pela inviabilidade natural e humana do sistema econômico capitalista globalizado, confirmando algumas previsões efetuadas há alguns anos e que ressurgem neste momento. Nos últimos anos foi sendo reforçada a ideia de modificação dos modelos de vida, produção e de consumo para poder proporcionar o denominado “desenvolvimento sustentável”. Esta expressão surge pela primeira vez no Relatório Brundtland, elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento da ONU, em 1987, em que se definia como “as formas de progresso que satisfazem as necessidades da geração presente sem comprometer a capacidade das futuras gerações para satisfazer suas próprias necessidades” (Hellwing, 2005, p. 193). Ainda que em algumas ocasiões o conceito fosse associado a posições esquerdistas, o certo é que o desenvolvimento sustentável constitui uma vocação universal da humanidade, alheio a ideologias que toda pessoa com independência de qualquer convicção, política ou religiosa, pode sentir como conveniente, quase como um instinto de sobrevivência perante a degradação nas condições naturais e sociais.


O critério de sustentabilidade tem de mostrar especial relevância na empresa, influenciando o meio ambiente natural e social e alcançando ações notavelmente destacáveis. Semelhante necessidade terá a empresa para poder assumir os parâmetros de sustentabilidade que encontra sua manifestação por meio do conceito de Responsabilidade Social Corporativa, que pode como conseqüência ser interpretado como uma versão empresarial do princípio geral de desenvolvimento sustentável (Brugger, 1998, p. 75).


4. O Desenvolvimento Sustentável da Empresa: a Responsabilidade Social Corporativa


A idéia da existência de uma responsabilidade social derivada da atividade empresarial surge de uma maneira quase intuitiva, como uma forma de reação lógica a favor de uma humanização do mundo econômico-produtivo (Jenkins, 2005, p. 526). Esta noção é bastante antiga, talvez pela própria atividade produtiva humana organizada, provavelmente ligada a épocas de esplendor em que o gasto abusivo de alguns contrastava com a pobreza e a necessidade extrema de outros, obrigando a mostrar um contraponto ético na atuação dos agentes econômicos. De forma concreta no século 20 notam-se algumas manifestações relativas ao mundo anglo-saxônico. Um exemplo característico são as inversões socialmente responsáveis, impulsionadas por grupos organizados para boicotar a atividade de empresas dedicadas a atividades consideradas indesejáveis, como as relacionadas com o tabaco, álcool e os jogos de azar. Uma versão mais atual surgiu nos anos 60 do século passado nos EUA, como resposta da sociedade norte-americana a uma série de acontecimentos que envergonhavam a consciência coletiva, como a Guerra do Vietnã e o regime do apartheid, que levou a exigir das corporações um posicionamento moral férreo, para que não deixasse margem de dúvidas a respeito da probidade da organização, de seus gestores ante seus cidadãos e a sociedade (Rodríguez, 2005, p. 627).


A partir daquele momento, a evolução em sentido amplo podia chamar-se de “ética empresarial” (Berember, 2006, p. 627), que conseqüentemente passou por diversas etapas. Em um primeiro momento foi dada ênfase ao cumprimento das obrigações legais como paradigma para conseguir o progresso e a satisfação de todos os interesses. Em seguida ficou claro que a observância dos preceitos normativos não era suficiente para garantir o interesse coletivo, no momento em que os Estados haviam perdido força como organização política, sendo muito difícil para o Estado controlar as organizações empresariais que desenvolviam sua atividade além de suas fronteiras territoriais. Podemos afirmar que o atual discurso da Responsabilidade Social Corporativa surge nos anos 90 e se consolida no início dos anos 2000 a partir de uma série de fatores que podem ser assim sistematizados:


1) A preocupação com a destruição do meio ambiente (em razão de determinados desastres naturais particularmente significativos, como o relacionado com o petroleiro Exxon Valdez), que deixou clara a necessidade de conseguir a integração de determinados critérios ecológicos na gestão da empresa, com objetivo de evitar um desastre.


2) A necessidade de buscar transparência na gestão empresarial por certos escândalos financeiros vinculados à ocultação de informações financeiras por parte de administradores, que levaram à quebra de empresas de grande importância, como a Parmalat, Enron e a Arthur Andersen, com a consequente perda de milhares de empregos (Sims, 2003, p. 23).


3) A indignação provocada na opinião pública pelo descobrimento de exploração no trabalho, incluídas formas de trabalho forçado e trabalho infantil realizadas por numerosas empresas ocidentais localizadas nos países em vias de desenvolvimento aproveitando-se da falta de legislação apropriada nesses lugares.


4) O surgimento de uma sensação geral com respeito ao novo papel da empresa, que considera que esta obtém um benefício econômico da sociedade e conseqüentemente tem de assumir um compromisso além da gestão de seus próprios interesses, devolvendo para a sociedade parte do recebido mediante contribuições para o bem comum. Sob este ponto de vista, a organização empresarial não pode resultar indiferente à situação da comunidade local em que está integrada, em particular às necessidades e interesses de seus trabalhadores, clientes e distribuidores que podem ser afetados por sua atividade desenvolvida, criando determinadas expectativas com relação ao comportamento empresarial. Esta é a justificativa que deve levar a empresa, por exemplo, a ter uma preocupação com o impacto social que pode apresentar as fusões e reestruturações empresariais, que geralmente trazem reduções no número de trabalhadores ou mesmo pela integração social de grupos desfavorecidos em situação de exclusão social.


Nos últimos anos o conceito de Responsabilidade Social Corporativa foi notavelmente revisado e aumentado, talvez para vincular a atividade da empresa com o emergente conceito de desenvolvimento sustentável e humano, e deste ponto de vista trata de conseguir estabelecer uma maior harmonia da empresa com o restante do mundo (Jáuregui Atondo, 2004, p. 131). Vários são os estudiosos que querem ver na Responsabilidade Social Corporativa uma possível forma de contribuição desde o mundo empresarial ao anunciado objetivo de desenvolvimento sustentável que, deste ponto de vista, proporcionaria uma resposta razoável e moderada a alguns riscos advindos da globalização.


De fato o conceito de Responsabilidade Social Corporativa foi criado para tratar de frear as atividades das grandes multinacionais cujas atividades produtivas estavam submetidas a grandes processos de deslocalização e subcontratação. Na atualidade este é um dos objetivos da Responsabilidade Social Empresarial que busca conseguir a aceitação por parte da pequena e média empresa (Forstater; MacDonald; Raynard, 2000, p. 45). Sendo assim, uma empresa socialmente responsável seria aquela capaz de contribuir, desde sua esfera de atuação, para a satisfação de algumas necessidades humanas (próprias de sua atividade produtiva), assim como a criação de empregos de qualidade, desenvolvimento local e regional, progresso social em geral. Partindo desses critérios de atuação permitirá qualificar a atividade como sustentável tanto do ponto de vista global quanto do ponto de vista particular e a atuação coerente permitirá uma maior sobrevivência da própria empresa no futuro.


Trata-se de um novo ou ao menos renovado modelo de empresa: a empresa sustentável, ética ou cívica (Rodríguez-Piñero, 2006, p. 5), que vai além da tradicional visão de rentabilidade econômica (centrada na obtenção do máximo benefício possível para os proprietários do capital social) e que inclui entre seus objetivos obter outras vantagens e a realização de outros valores em beneficio de diferentes grupos interessados e afetados pela atividade desenvolvida, tratando de desenvolver um comércio justo, evitando um empobrecimento das partes envolvidas na relação.


A atuação sustentável de uma determinada empresa traz com ela um compromisso que provavelmente trará uma série de gastos ou mesmo a renúncia de certos benefícios, mas também uma oportunidade evidente de consolidação e ganho a médio e longo prazos, porque evidentemente esta atuação permitirá que a empresa melhore sua reputação social e ao mesmo tempo ganhe novos clientes e investidores atraídos pelos seus critérios éticos de atuação. Estudos econômicos3 revelam que a adoção de uma política de responsabilidade social corporativa pode contribuir para a rentabilidade e sustentabilidade da empresa. Com uma visão voltada ao futuro as empresas sustentáveis possuem uma maior “esperança de vida” comparativamente a outras empresas que somente visam a estratégias econômicas especulativas com tendências a obter o maior benefício possível de forma imediata.


Surge assim um novo modelo de empresa denominada socialmente responsável com base em uma sociedade de conhecimento, com empregos de qualidade que investe em recursos humanos e que é capaz de melhorar a exigência das normas jurídicas, não somente as normas relativas ao Direito do Trabalho, mas também a normas econômicas, ambientais e sociais (Merino Segovia, 2005, p. 53). Ainda que possa parecer de difícil exeqüibilidade por parte das empresas, Rodriguez (2005, p. 627) propõe um processo produtivo ecologicamente menos agressivo, com empregos de maior qualidade garantindo a dignidade nas condições de trabalho, uma maior preocupação com a comunidade local para evitar um crescimento assimétrico, uma participação ativa da empresa na vida da coletividade buscando diferentes objetivos sociais, devolvendo para a sociedade parte dos benefícios obtidos e ao mesmo tempo favorecendo um desenvolvimento real e sustentável.


5. A Responsabilidade Social Corporativa: um conceito ainda em construção


Existe um notável problema para conseguir encontrar um conceito exato de Responsabilidade Social Corporativa. Há múltiplas noções, algumas utilizadas pela doutrina acadêmica, outras pelos stakeholders[2], outras ainda pelas próprias organizações empresariais e nenhuma delas pode afirmar que nos dias atuais seja aceita de uma forma absolutamente consensual e que tenha plena validez universal. Existem também inúmeros conceitos relacionados, como cidadania corporativa, ética empresarial e competitividade responsável, todos levando a complicar ainda mais a intenção de definir tal conceito. Como conseqüência, é possível afirmar que a Responsabilidade Social Corporativa ou Empresarial constitui-se um conceito que em certa medida encontra-se em fase de construção, suficientemente amplo, podendo ter diferentes interpretações e inclusive contradições entre os principais implicados, deixando suas limitações e potencialidades em um nível teórico e prático em grande parte por definir (Rodríguez- Piñero, 2006, p. 5). Há quem defenda que esta ambigüidade deriva do próprio conceito de Responsabilidade Social Corporativa, que apresenta diversas interpretações em sua origem e natureza[3], que por sua vez deve ser necessariamente variável, ou ao menos adaptável em seus conteúdos, atendendo às circunstâncias concretas da organização que decide em um determinado momento instituir uma política de RSC ou a situação política e socioeconômica do país em que desenvolve sua atividade produtiva (Merino Segovia, 2005, p. 54). A partir dos numerosos conceitos surgidos nos últimos tempos, o conceito elaborado pelo Livro Verde da Comissão Européia tem grande importância na atualidade, tendo sido definido como “a integração voluntária por parte das empresas com as preocupações sociais e ambientais em suas operações comerciais e as relações com seus interlocutores”.


O Conselho Mundial de Desenvolvimento sustentável define como: “o compromisso contínuo das empresas de comportar-se eticamente e contribuir com o desenvolvimento econômico, melhorando por sua vez a qualidade de vida dos trabalhadores e suas famílias, assim como a comunidade local e a sociedade em geral”. Nesse sentido, pelas diversas interpretações podemos afirmar que a Responsabilidade Social Corporativa é um compromisso da empresa assumido voluntariamente em virtude da decisão de contribuir para uma sociedade melhor, um meio ambiente mais limpo, satisfazendo as expectativas econômicas, sociais e ambientais das distintas partes interessadas[4].


Assumir esta perspectiva de responsabilidade social, no entanto, exige estender o campo de sujeitos considerados como partes interessadas por serem afetados de alguma forma pela atividade da empresa, os denominados stakeholders. Não se trata somente de avaliar a posição dos acionistas, não se trata de atender às demandas mais ou menos tradicionais ou às reclamações de seus trabalhadores, trata-se de satisfazer às expectativas sobre o funcionamento da organização sobre todas as partes, que de um modo ou de outro possam ver-se afetadas como seus clientes, distribuidores, contratados, administrações públicas, organizações de consumidores e usuários, ONGs e em geral a sociedade em que está localizada a empresa em particular (Cordero, 2004, p. 229). Certo é que a Responsabilidade Social Corporativa traz na atualidade uma interessante perspectiva na busca da justiça social e em conseqüência seu estudo e análise não podem deixar de fora os operadores do Direito do Trabalho (Rodríguez, 2005, p. 627).


6. Os Conteúdos Integrantes da Responsabilidade Social Corporativa da Empresa: a triple bottom line


Uma vez analisado o conceito de Responsabilidade Social Corporativa, é necessário investigar alguns de seus âmbitos de extensão e atividade concreta em que pode ser materializado e anunciado o compromisso empresarial. Resulta complicado articular um conceito geral aceito de Responsabilidade Social Corporativa, mas também resulta difícil no momento definir quais são os conteúdos de ações empresariais que podem ser determinadas como socialmente responsáveis. Neste sentido pode-se afirmar que a Responsabilidade Social Corporativa faz referência a uma tripla dimensão, que deve abordar conjuntamente aspectos econômico-financeiros, sociais e ambientais relacionados com a atividade da empresa. Trata se da triple bottom line ou a tripla conta de resultados da empresa socialmente responsável, a partir do qual o valor real de uma organização não é dado exclusivamente por seu patrimônio e resultados, mas sim por toda sua atividade positiva que seja capaz de realizar em beneficio do meio ambiente e da coletividade humana (De La Costa et al., 2002, p. 37).


Em termos gerais, pouco a pouco o conteúdo da Responsabilidade Social Corporativa foi adquirindo padrões mais definidos, juntamente com as contribuições oferecidas pela doutrina científica e pela criação de determinados índices e modelos de memória (Global Reporting Initiative), que ao incorporarem determinadas matérias em seu catálogo, incentivam as empresas que queiram ser consideradas socialmente responsáveis a incorporarem parte de seus modelos, ainda que seja somente com o propósito de poder informar sobre as atividades realizadas e objetivos alcançados. Com o passar do tempo, juntamente com a consolidação das políticas de RSC em um maior número de empresas pode ser observada uma série de matérias que constituem o que hoje poderíamos chamar de conteúdo habitual ou típico da Responsabilidade Social Corporativa.


7. Breve Análise dos Conteúdos Incorporados como Parte da Política de Responsabilidade Social Corporativa


1 — Aspectos econômico-financeiros e de gestão: desde logo qualquer discurso de teoria política define que a principal finalidade de uma empresa é obter lucros econômicos e apresentar um bom funcionamento financeiro que permita a sobrevivência a médio e  longo prazo. Esta é a idéia de qualquer justificativa sobre Responsabilidade


Social Corporativa, mas este objetivo não pode ser desenvolvido e atingido de qualquer forma, tem de ser por meio de um comportamento ético e ajustado a parâmetros equitativos de comportamento (Unceta, 2005, p. 122 et seq.). A empresa socialmente responsável necessita possuir informações transparentes de sua gestão. Isto significa que além do estrito cumprimento de suas obrigações financeiras estabelecidas pelo ordenamento jurídico, deve tornar transparentes os resultados da sua gestão, tratando de fazer que sejam partícipes no desenvolvimento da empresa. Este dever corresponde fundamentalmente aos diretores e conselheiros da empresa e trata de impedir ou evitar a ocorrência de escândalos financeiros, como os que atingiram empresas como a Parmalat, a Enron, a Lehman Brothers, cujas origens devem-se à falta de transparência por parte de seus gestores ao considerarem que resultava mais oportuno, desde uma visão estratégica, ocultar perdas sofridas para não quebrar a confiança de clientes e investidores, de tal forma que o rombo financeiro foi crescendo até ficar insustentável, provocando a quebra das empresas e a perda de milhares de postos de trabalho (Unceta, 2005, p. 122).


2 — Os aspectos relacionados com o meio ambiente constituem a segunda grande matéria de conteúdos da Responsabilidade Social Corporativa: a evidente degradação do meio ambiente e os inegáveis perigos das alterações climáticas evidenciam a necessidade de colocar em prática uma mudança substancial no comportamento humano, pondo um freio nesta situação que, segundo alguns, é praticamente irreversível. Não se pode duvidar do papel fundamental que as empresas possuem, tratando de colocar no seu esforço de sobrevivência a tentativa de reduzir e limitar o efeito sobre o meio ambiente, conseqüência do processo produtivo, criando o que se chama uma ética global da Terra, fazendo uso razoável dos bens públicos existentes na natureza e tratando de garantir um futuro comum contra os enormes riscos que decorrem da má utilização pela sociedade dos bens naturais (Jiménez, 2004, p. 215).


Este é sem dúvida um dos principais aspectos que marcaram o surgimento da Responsabilidade Social Corporativa, que possui como foco o compromisso empresarial pela utilização de mecanismos e matérias-primas que resultem menos agressivos à natureza e apostando em energias limpas e renováveis (Fernández de Gatta, 2004, p. 27). Nos informes anuais de RSC devem ser incorporados os dados relativos ao esforço com a proteção do meio ambiente relatando os recursos naturais e matéria-prima utilizada, juntamente com a intenção de economizar tais recursos, melhorando o desenvolvimento ambiental da empresa (por exemplo, reciclando os materiais utilizados na produção, substituição do correio em papel pelas comunicações eletrônicas internas da empresa, políticas de economia de energia), e a utilização de novos equipamentos limpos, ou seja, equipamentos não poluentes no processo de produção da empresa, realizando também um trabalho de conscientização desenvolvido entre os trabalhadores, clientes e distribuidores[5].


3 — Aspectos sociais: este último aspecto da Responsabilidade Social Corporativa tem como objetivo contribuir para o desenvolvimento e benefício social do meio em que desenvolve sua atividade, conseguindo satisfazer às expectativas dos stakeholders. Deste ponto de vista, a empresa socialmente responsável tem de destinar parte de seu esforço à sociedade.


Algumas empresas alcançam um grande volume de benefícios e, por conseqüência, devolvem parte do lucro aos acionistas. Seu compromisso social, assim, estrutura-se com o objetivo de conseguir certos benefícios para a sociedade em que desenvolve sua atividade, principalmente a sociedade local. Não é de estranhar que algumas pessoas tenham confundido no início e outras continuam a confundir Responsabilidade Social Corporativa com obras beneficentes ou filantrópicas. O conceito é mais complexo e envolve diretamente a dinâmica de gestão da empresa, que deverá possuir um espaço reservado para realizar os objetivos sociais. Questões relacionadas como o investimento responsável nas comunidades locais, o respeito pelos direitos e tradições, a participação na cultura, no esporte e na pesquisa, a cooperação com as autoridades locais, o financiamento de projetos de desenvolvimento social e econômico fazem parte, sem dúvida, do compromisso de uma empresa socialmente responsável. Desta perspectiva social e de forma destacada surge a preocupação por parte da empresa com um dos seus principais grupos de interesses, ou seja, os trabalhadores assalariados. Outros grupos, como os que lhe prestam serviços — os clientes, os distribuidores, as empresas contratadas — também devem fazer parte das preocupações da empresa socialmente responsável, buscando conseguir que todos gozem de boas condições de vida e de trabalho.


8. Dimensão Interna e Dimensão Externa da Responsabilidade Social Corporativa


A dimensão interna diz respeito àquelas atividades que de modo direto e imediato podem ser controladas pela organização produtiva em sua dinâmica ordinária de funcionamento (Urcelay, 2005, p. 34 et seq.). Trata-se principalmente de satisfazer às demandas dos acionistas e trabalhadores como integrantes da organização produtiva e também das expectativas gerais que a sociedade local espera por parte do comportamento empresarial.


Sob este ponto de vista, a dimensão interna faz referência principalmente aos aspectos de controle da atividade da empresa, com relação aos responsáveis pela administração dos recursos humanos (contratação responsável, prevenção de acidentes no trabalho…), a articulação do processo produtivo sustentável (incentivando a criação de produtos de qualidade) e a gestão razoável e responsável dos recursos naturais utilizados na produção, apostando sempre em produtos que sejam menos agressivos ao meio ambiente (Merino Segovia, 2005, p. 59).


A dimensão externa da Responsabilidade Social Corporativa faz referência ao conjunto de atividades que ficam de fora do âmbito de gestão e controle direto da empresa, mas que de algum modo podem influenciar em sua atividade. A dimensão externa tem seu foco na relação da organização empresarial com seus clientes, prestadores de serviços e distribuidores, tratando de estender este compromisso ético a todos os grupos que de certa forma possuem alguma relação com a empresa, e em tal caso exigir que seus sócios comerciais respeitem também alguns dos valores próprios de Responsabilidade Social Corporativa, os quais compreendem preservação do meio ambiente, luta contra a corrupção e abolição da exploração no trabalho, sobretudo quando a atividade produtiva da empresa tenha lugar em países que estão em desenvolvimento.


9. Voluntariedade x Obrigatoriedade da Responsabilidade Social Corporativa


Talvez um dos debates mais árduos na atualidade em torno da Responsabilidade Social Corporativa seja aquele relativo à natureza voluntária ou obrigatória, e conseqüentemente o papel a ser desempenhado por parte dos poderes públicos com relação à promoção das políticas de RSC (Unceta, 2005, p. 635). Em diferentes âmbitos empresariais tem se defendido que a própria essência da Responsabilidade Social consiste em uma iniciativa estritamente voluntária da organização produtiva, significando que é a empresa que decide se adota ou não uma política de RSC, e nesse caso, a extensão e os limites da mesma (Parkinson, 1993, p. 45 et seq.). Esta concepção que parte da voluntariedade empresarial como princípio básico que ilustra o conceito de Responsabilidade Social Corporativa parece amplamente aceita como algo intrínseco a sua própria natureza, sendo expresso em prestigiosos fóruns, como o Livro Verde elaborado pela Comissão Europeia, em que se afirma que “sua responsabilidade social é assumir voluntariamente compromissos que vão mais além de suas obrigações legais e convencionais, as empresas devem contribuir para elevar os níveis de desenvolvimento social, proteção ambiental e respeito aos direitos humanos” (Rodríguez-Piñero, 2006, p. 5).


A Responsabilidade Social Corporativa não deve ser imposta pelo Direito, pelo simples fato de que ser socialmente responsável significa ir além do estrito cumprimento das obrigações legais e morais, ainda que não faltem opiniões, certamente minoritárias, que em um sentido lato possam chegar a defender a conveniência de que o ordenamento jurídico imponha determinadas obrigações legais para as empresas[6]. Segundo esta tese, resulta difícil aceitar que as organizações empresariais por si sós proporcionem tudo o que a sociedade espera e necessita delas.


Ao aceitar uma política de responsabilidade a empresa vê-se obrigada a incorporar em sua planificação estratégica alguns requisitos importantes, como a justiça social, o desenvolvimento sustentável e a melhoria da sociedade. Ao assumir responsabilidades sociais e ambientais não é mais suficiente para as organizações produtivas buscar a sobrevivência econômica mediante políticas de preço e produtividade. É necessário demonstrar para as partes interessadas envolvidas no negócio sua preocupação com a qualidade, não só do produto, mas também do meio ambiente e da vida, da atual e das futuras gerações. A Responsabilidade Social Corporativa, por fim, deve ser vista como uma forma plural de gestão da corporação, que leva em consideração o interesse das várias partes envolvidas e afetadas pelo negócio.


10. Instrumentos de Articulação da Responsabilidade Social Corporativa


A efetivação de uma política de Responsabilidade Social Corporativa implica uma série de atividades a serem realizadas pelas empresas. Algumas destas obrigações dizem respeito a possuir certa documentação que possa permitir sua constatação rápida e segura pelas partes interessadas. Neste sentido pode-se destacar vários instrumentos como forma de gestão da Responsabilidade Social Corporativa: de um lado e em primeiro lugar, a decisão de adotar uma política de Responsabilidade Social Corporativa por parte da empresa deve estar documentada de forma escrita. É freqüente encontrar este tipo de documento na forma de código de conduta interno da própria empresa, e nele são descritos os comportamentos que devem ser evitados e os que devem ser incentivados dentro da atividade ordinária da organização empresarial.


Em segundo lugar a empresa necessita contar com instrumentos que comprovem as atividades socialmente responsáveis realizadas, para assim poder oferecer confiabilidade aos seus stakeholders e ao mesmo tempo aproveitar os benefícios advindos do conhecimento por parte da opinião pública do caráter socialmente responsável da organização empresarial. Este documento de comprovação pode ser obtido de duas formas: por meio de um certificado emitido por um organismo que tenha uma reputação reconhecida que comprove o comportamento adequado da empresa ou mediante mecanismos próprios de comunicação que dêem publicidade às atividades responsáveis desenvolvidas, utilizando de forma periódica um documento de Responsabilidade Social Corporativa desenvolvido pela própria empresa (Jáuregui Atondo, 2004, p. 277).


11. Códigos de Conduta


Quando, de forma voluntária, uma empresa decide pôr em prática uma política de Responsabilidade Social Corporativa, deve expressar sua intenção em um documento escrito que possa dar conhecimento ou publicidade de sua vontade, que conseqüentemente servirá para fixar as bases de suas atuações futuras. A forma mais frequente de dar conhecimento a essas políticas é a elaboração unilateral de algum tipo de código de conduta e boas maneiras. Nele é expresso o compromisso ético da organização, e neste documento irá expressa uma série de comportamentos que deverão ser respeitados por diretores, empregados e em determinadas ocasiões estendidos a seus distribuidores e clientes (Barrientos, 2003, p. 61 et seq.). O seu surgimento histórico pode ser distinguido em dois momentos bem diferenciados: em sua origem, os primeiros documentos apenas continham algumas declarações de princípios que se limitavam a mostrar o compromisso da organização, como não utilizar mão de obra infantil, não admitir trabalho forçado e respeitar a legislação social e do meio ambiente do país em que está localizada a organização empresarial. Com o passar do tempo ganhou certa complexidade e nos dias de hoje os instrumentos utilizados compreendem vários aspectos da atividade empresarial, como as relações e comportamentos que a integram (Diller, 1999, p. 113 et seq.).


É freqüente encontrar nos códigos de conduta a rejeição a comportamentos corruptos, a defesa da utilização de processos de produção seguros que não causem danos à natureza e a busca pela transparência na relação das partes interessadas. De modo particular, em matéria de Direito do Trabalho os códigos de conduta costumam estar nos convênios da Organização Internacional do Trabalho sobre matérias concretas e tratam de desenvolver uma cadeia de valores dentro da própria empresa (Merino Segovia, 2005, p. 71).


Esta tendência de elaboração de códigos de conduta pode contribuir para evitar certos abusos por parte das grandes multinacionais, como é o caso relacionado com empresas que, se aproveitando do clima de corrupção em determinados países, utilizam a exploração de trabalhadores e desenvolvem processos produtivos lesivos ao meio ambiente amparados pela impunidade derivada da falta de controle quase que absoluto em algumas regiões do mundo (Jenkins, 2005, p. 87). De acordo com critérios gerais, resulta admissível que os conteúdos estejam dirigidos a descrever os comportamentos no trabalho dos próprios trabalhadores e fixar condutas, como estabelecer a proibição de trabalhadores de solicitar ou aceitar favores, compensações ou presentes que possam influir no desempenho de seu cargo, vedar o oferecimento ou entrega de presentes às autoridades e funcionários da administração com o objetivo de obter decisões favoráveis à organização empresarial e finalmente fazer a comunicação para a empresa de qualquer classe de atividade que seja realizada por um trabalhador sempre que seja considerada uma concorrência desleal ou conflito de interesse com a organização empresarial.


12. O labelling social


Os mecanismos de certificação de determinados aspectos da atividade empresarial proliferaram bastante nos últimos tempos, revelando se uma forma fácil e rápida de mostrar à opinião pública, principalmente aos consumidores, a sua conduta global e ética de gestão empresarial. Basicamente esta técnica de atuação conhecida como labelling social consiste em reunir determinadas condições socialmente benéficas em algum aspecto da gestão, recebendo um certificado de alguma entidade que reconheça as atividades benéficas e conseqüentemente trazendo um efeito positivo para a empresa em forma de publicidade e valorização social em razão do prestígio e reconhecimento que tal instrumento tenha alcançado (Diller, 1999, p. 113 et seq.). Estes mecanismos demonstram de algum modo a ética e a qualidade da gestão da empresa, e se mostram de grande utilidade no momento de fazer valer a condição de socialmente responsável perante a opinião pública, porque nos dias de hoje não existe um indicador específico que valorize de forma global o desenvolvimento da empresa (Rodríguez- Piñero. 2006, p. 8). Entre os distintos tipos de certificados existentes podemos destacar alguns por sua importância, como é o caso dos certificados de conteúdo ecológico, as chamadas eco-etiquetas emitidas pela União Europeia, que reconhece os sistemas de produção ecológicos de até 23 grupos de produtos. Para cada um existe um critério específico de concessão, dando certo valor ao impacto ambiental da produção, durante todo o ciclo de utilização, eliminação e reciclagem do material utilizado, incentivando a pesquisa de técnicas menos contaminantes para o meio ambiente. A norma ISO 14000 (com seus complementos ISO 14001, 14031 e 14063) constitui na atualidade o certificado mais reconhecido e empregado internacionalmente como critério para reconhecer a instituição de sistemas de gestão ambientais.


13.  A Publicação dos Informes de Responsabilidade Social Corporativa


Quando uma empresa decide estabelecer uma política de Responsabilidade Social Corporativa, deverá fazê-lo por meio de instrumentos de comunicação que tornam públicas as atividades a serem realizadas e os principais resultados a serem alcançados que ela qualifica de responsáveis, tornando efetivo o princípio da transparência, que é um dos pilares da RSC (Merino Segovia, 2005, p. 52). Esta tarefa costuma ser realizada por meio de um informe com uma determinada periodicidade, normalmente anual. Nesses informes as empresas que adotam uma política de responsabilidade social informam a seus stokeholders (clientes, acionistas, distribuidores, empregados e a sociedade em geral) suas atividades desenvolvidas em matéria econômica, ambiental e social. Entre os diversos modelos, talvez o mais importante na atualidade seja o Global Reporting Initiative, cuja origem data do ano de 1997, tendo se iniciado pela ONG Ceres (Coalition for Environmentally Responsible Economies) e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e que constitui um guia para a elaboração de informes de sustentabilidade, valorizando um amplo conjunto de indicadores (Cordero, 2004, p. 227 et seq.). Este guia converteu-se em um referente fundamental para várias empresas, entidades, ONGs e está em permanente evolução. Desta forma o atual modelo realiza a distinção qualificando de “in accordance” as empresas que respeitam fielmente o modelo de memória proposto, formado por um sistema de quatro níveis (starter, baseline, progressin, leading) que realiza a distinção de cada empresa segundo seu estado de adequação em que se encontra com respeito aos novos critérios revisados.


14. Considerações Finais


No contexto dado por um mundo cuja economia, sistema de produção e relações tornaram-se globalizados na última década, provocando sérias alterações e transformações, tanto no processo de deslocalização (offshoring) e descentralização produtiva (outsourcing), quanto na criação de grandes grupos empresariais, multinacionais formadas por grandes estruturas de franquias e sucursais espalhadas por todo o mundo. O resultado é que expressiva parte da atividade produtiva, juntamente com os empregos, foi transferida para além das fronteiras dos países ocidentais, onde o custo social é consideravelmente mais baixo, aproveitando-se assim de uma vantagem competitiva que em determinadas ocasiões gera uma verdadeira exploração laboral (trabalho forçado e trabalho infantil), onde a legislação trabalhista não alcançou um grau suficiente de desenvolvimento e a estrutura estatal não garante condições mínimas de vida e de trabalho. Com o passar do tempo é possível detectar uma evidente precarização nas relações de trabalho. A preocupante situação laboral aparece unida a problemas derivados do sistema de vida e consumo indiscriminado, ligado ao deterioramento do meio ambiente e ao empobrecimento crônico de grandes regiões do mundo, que contam com abundância de recursos naturais, mas se vêem dentro de um modelo de produção que as condenam a serem meros comparsas no desfrute do aumento da riqueza e qualidade de vida dos países exploradores.


Quando ainda não existia uma concepção unânime de Responsabilidade Social Corporativa, ganhou grande destaque o conceito realizado pelo Livro Verde da Comissão Europeia, que definia a Responsabilidade Social Corporativa como “a integração voluntária por parte das empresas com as preocupações sociais e ambientais em suas operações comerciais e nas relações com seus interlocutores”. Nesse sentido é correto considerar que a Responsabilidade Social Corporativa faz referência a uma tripla dimensão (a conhecida triple bottom line) abordando e valorizando conjuntamente a atuação da organização produtiva no âmbito econômico-financeiro, social e ambiental, valorizando não apenas o benefício financeiro, mas também outras formas de atuação da empresa em favor da coletividade.


São várias as opiniões que defendem que a idéia de Responsabilidade Social Corporativa é uma resposta “quase-publicitária” proporcionada por grandes empresas multinacionais com intenção de limpar sua reputação gerada a partir de danos (Parmalat, Exxon Valdez, Enron) causados ao meio ambiente e à sociedade. Em conseqüência, a atividade desenvolvida em favor de diferentes objetivos que não sejam os econômicos não deixa de ser uma atitude que cobre o verdadeiro desejo de perpetuar uma situação de privilégio, proporcionando um caminho razoável para a continuação do progresso humano (econômico e social), e ao mesmo tempo incorporando objetivos éticos na gestão da empresa, com a intenção de buscar um mundo mais justo e melhor.


São várias as organizações empresariais que vêem na Responsabilidade Social Corporativa um caminho para o futuro, articulando a sobrevivência sustentável das atividades empresariais na própria sociedade. Talvez o elemento fundamental que determina a natureza da Responsabilidade Social Corporativa seja sua voluntariedade, ou seja, sua livre capacidade para decidir o desenvolvimento ou não de uma política de Responsabilidade Social, melhorando sua atuação na parte social e ambiental mínima exigida pela legislação aplicável. Sendo assim, as atividades a serem desenvolvidas ficariam ao livre-arbítrio da empresa, dando forma aos códigos ou declarações internas e em um momento posterior realizar a publicidade de seus comportamentos qualificados como socialmente responsáveis por meio dos informes ou memoriais elaborados com total liberdade.


A Responsabilidade Social da empresa não deve ser imposta pelo Direito, por que ser socialmente responsável significa ir além do estrito cumprimento das obrigações legais. A observância da lei constitui somente o ponto de partida, uma condição necessária, mas não suficiente para poder classificar uma empresa como socialmente responsável. Uma simples vontade manifestada de se ajustar aos conteúdos legais em um contexto caracterizado pelo não cumprimento, no entanto, pode ser um primeiro indício de responsabilidade social corporativa. A Responsabilidade Social Corporativa deve ser uma atividade de desenvolvimento e gestão empresarial atuando de acordo com os padrões éticos, cívicos e sociais, para tratar de obter um benefício econômico, mas ao mesmo tempo mostrar respeito pelo meio ambiente e tratar de favorecer o desenvolvimento social, cooperando com sua própria atividade para a consecução de determinados objetivos em benefício da coletividade. Esta perspectiva trará alguns gastos ou mesmo a renúncia a um benefício econômico imediato, mas a médio e longo prazo levará a uma séries de vantagens evidentes que revelam a conhecida face dos custos sociais, que ao longo do tempo produzem um benefício maior do que o esforço realizado.


 


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Notas:

[1] É realmente curioso ver como a erradicação da pobreza na base da pirâmide (formada por aproximadamente um terço da população mundial que tem de sobreviver com menos de 4 dólares por dia) proporciona uma oportunidade para as empresas ampliarem seu mercado de clientes, o qual está tratando de exportar um modelo de vida ocidental a amplas zonas do planeta, contribuindo para tornar um modelo insustentável (Prahalad, 2005, p. 20 et seq.). 

[2] Stakeholder significa em português parte interessada ou interveniente, é um termo usado em Administração que se refere a qualquer pessoa ou entidade que afeta ou é afetada pelas atividades de uma empresa. De maneira mais ampla, compreende todos os envolvidos em um processo, que pode ser de caráter temporário (como um projeto) ou duradouro (como o negócio de uma empresa ou a missão de uma organização). 

[3] A Responsabilidade Social Corporativa apresenta numerosas perspectivas. De um lado, há quem defenda como uma mera teoria de gestão empresarial para tratar de alcançar resultados satisfatórios em um plano econômico a médio prazo e longo prazo; para outros, trata-se de uma doutrina filosófica que se forma diretamente com a necessidade de encontrar um caminho sustentável para a sociedade, enfim, há quem defenda que se trata de uma forma de atuação política de redistribuição de riqueza e poder (Garriga; Melé, 2004, p. 51). 

[4] Conceito sintético elaborado pelo Livro Verde da Comissão Europeia: fomentar um marco europeu para a responsabilidade social das empresas.

[5] Este tipo de informação é comum nos informes de Responsabilidade Social Corporativa das empresas.

[6] Desde um ponto de vista geral, nada pode pôr em dúvida a legitimidade do Direito para ordenar tais aspectos como os critérios de atuação ecológica da empresa. Em sentido mais concreto, e segundo a atividade a que se dedica a empresa, pode ser imposta determinadas obrigações sociais: por exemplo, a potencial obrigação da indústria farmacêutica de fornecer medicamentos abaixo dos preços de mercado para atender às necessidades dos países mais pobres (Cowe, 2003, p. 26 et seq.).


Informações Sobre o Autor

Alexandre Vicentine Xavier

Professor de Direito, Advogado e Doutor em Direito do Trabalho pela Universidade de León/Espanha.


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