Resumo: A imposição de multa penal em caso de descumprimento contratual vem sendo tratada pela doutrina e jurisprudência pátria desde o Código Civil de 1916. O referido instituto tem como objetivo primeiro o reforço para que a parte cumpra sua obrigação de maneira pontual e integral. Por sua vez, essa imposição penal sofre severas limitações em virtude de uma busca maior de uma justiça distributiva. Esse limitador, que na verdade representa uma clara limitação na liberdade de contratar, em pró do princípio da dignidade humana tem como objetivo a não imposição de multas severamente excessivas que inviabilizem a formação de novos negócios ou que possa levar uma das partes a uma situação de perigo social. Diversos dispositivos legislativos disciplinaram o tema sendo certo que, sua redução para patamares aceitos pelos usos e costumes locais cabe sempre ao Judiciário desde que não contrarie expressamente dispositivo legal.
Palavras chave: multa contratual – limitação
Abstract: The imposition of contractual penalty in case of contractual breach comes being treated for the doctrine and native jurisprudence since the 1916`s Civil Code. The related institute has as objective first the reinforcement so that the part fulfills its obligation in prompt and integral way. In turn, this contractual penalty suffers severe limitations in virtue from a bigger search of a distributive justice. This limitor, that in the truth represents a clear limitation in the freedom to contract, in favor of the beginning of the dignity human being has as objective not the imposition of severely extreme penalties that make impracticable the formation of new businesses or that it can take one of the parts to a situation of social danger. Diverse legislative devices had disciplined the subject being certain that, its local reduction for accepted platforms for the uses and customs always fit to the Judiciary one since that it does not oppose legal device express.
Keywords: contractual penalty – limitation
Sumário: 1. Introdução. 2. Limitação a imposição de multa. 3. Conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Um tema bem discutido no Direito Contratual atual refere-se à discussão sobre a limitação de imposição de multa em caso de descumprimento contratual, seja ele de qualquer natureza e, desde que não contemplado pelas hipóteses de justa causa o que poderia afastar a aplicabilidade de tal instituto, como por exemplo, o caso fortuito e a força maior.
O legislador pátrio vem se preocupando, de maneira histórica e sistemática, em tratar do assunto sempre com o prisma da preservação da dignidade humana e por assim dizer da preservação da continuidade dos negócios também.
Seu objetivo é de estabelecer previamente o valor indenizatório e quais as suas hipóteses de incidência, de modo a proporcionar uma economia de tempo, além da prevenção do desgaste advindos de uma negociação posterior sobre as formas de compensação advindas do inadimplemento.
2. LIMITAÇÃO A IMPOSIÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA
Por sua vez, cláusula penal, também denominada pena convencional ou multa contratual, é uma cláusula acessória ao contrato na qual se pretende estipular uma consequência em virtude de uma ação ou omissão, de caráter econômico. O dispositivo tem por finalidade estimular o devedor a cumprir a obrigação quando o mesmo tenha a ciência acerca da sanção relativa caso ocorra à insatisfação desta. Trata-se de uma obrigação coligada à obrigação principal pactuada.
Segundo os ensinamentos de Limongi França[1]:
“A cláusula penal é um pacto acessório ao contrato ou a outro ato jurídico, efetuado na mesma declaração ou declaração à parte, por meio do qual se estipula uma pena, em dinheiro ou outra utilidade, a ser cumprida pelo devedor ou por terceiro, cuja finalidade precípua é garantir, alternativa ou cumulativamente, conforme o caso, em benefício do credor ou de outrem, o fiel cumprimento da obrigação principal, bem assim, ordinariamente, constituir-se na pré-avaliação das perdas e danos e em punição do devedor inadimplente”.
Cumpre-nos ressaltar uma distinção entre institutos para fins elucidativos, pois juros são frutos devidos ao credor a título rendimento, ao passo que a multa contratual incide apenas quando houver atraso no cumprimento da prestação. Por sua vez, a multa contratual compensatória difere da indenização, pois deriva de uma previsão anterior ao inadimplemento, mutuamente acordado pelas partes contratantes.
O assunto hoje disposto pela legislação pátria, em especial o Código Civil que em seu artigo 412, repetiu o artigo 920 do Código Civil de 1916, que assim dispõe: “O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.”.
Nesse mesmo sentido caminhou a legislação portuguesa, em especial o artigo 811 e 812 do código civil português[2], ao estabelecer tratamento idêntico ao legislador brasileiro.
Porem, todo o posicionamento atual é fruto de uma construção doutrinária cujas origens remontam a primeira metade do século passado. O legislador há tempo vem se preocupando com a limitação da cominação penal em contratos e até mesmo na relação entre fisco e contribuintes.
Segundo Maria Helena Diniz[3]:
“Se o valor da penalidade for manifestamente excessivo, em face da natureza e da finalidade do negócio e ainda que dentro dos limites do Art. 412, poderá o juiz, de ofício, determinar a redução. Essa regra não estava presente no Código Civil de 1916 e representa considerável inovação, afastando, completamente, o princípio da imutabilidade da cláusula penal.”
Inicialmente, como percussor dessa limitação, trazemos alguns dispositivos pertencentes ao Decreto 2262[4] de 1933, conhecida como Lei da Usura, editada com a finalidade de complementar o Código Civil de 1916 que ao contrario do atual de 2002, nada dispunha a respeito de multa a qual entende o Superior Tribunal de Justiça que alguns de seus artigos ainda estão plenamente em vigor.
Posteriormente, o Código Tributário Nacional[5], Lei 5.172 de 1966, também veio a debruçar-se sobre o tema ao limitar a imposição de multa tributária pelo Fisco ao contribuinte de modo a disciplinar a relação e indo mais além, irradiar a todo o sistema o embrião de uma limitação mais impositiva, pois a Lei da Usura limitava somente a multa contratual, nada dispondo a respeito da incidência mensal de juros sobre o valor.
Com o advento da Constituição Federal de 1988 e, alguns anos mais tarde, na década de 90 com o Código de Defesa do Consumidor[6], a questão foi novamente abordada, dessa vez sob um prisma consumerista que limitou a aplicação da multa em 2% sobre o valor do débito e repetiu o que dispunha o CTN ao limitar a cobrança dos juros em 1% ao mês.
Uma questão a parte é no tocante a limitação dessa imposição de multa nos contratos de locação, qual instituto deve ser aplicado? Primeiramente, a aplicação do CDC deve ser afastada, pois, entende grande parte dos tribunais pátrios que esse tipo de relação já possui sua lei própria que a regula que é a Lei do Inquilinato, Lei 8.245 de 1991. É o que dispõe o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que editou a súmula n° 61[7] tratando do tema. Salientamos que à época da edição da referida súmula, o código civil de 2002 ainda não estava em vigor e a intenção do dispositivo citado seria de “dirigir” a interpretação sobre o tema afetado.
Considerações preliminares feitas, passamos novamente a questão e, caminhamos no sentido de admitir a estipulação superior ao patamar de 10%. Nesse sentido, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (vide Recurso Especial 324.015/SP) e de vários Tribunais estaduais tem admitido à fixação de multa moratória em patamar superior a 10% do valor do aluguel (vide Apelações Cível nº 2008.001.09749, nº 2006.001.10270, nº 2003.001.29498, nº 2003.001.36084 e nº 2002.001.22529 do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro; Apelações nº 1054993-0/2, nº 1061978-0/0, nº 1101732-0/3 e nº 851997-0/4 do Tribunal de Justiça de São Paulo).
3. CONCLUSÃO
O instituto da clausula penal encontra pleno abrigo no sistema jurídico nacional, inclusive, em virtude de nosso aspecto cultural, se o mesmo não existisse, acreditamos que muito difícil seria o cumprimento de obrigações assumidas, principalmente no tocante a pontualidade desse cumprimento.
Com o advento da clausula penal, o credor da obrigação tem mais um forma de “estimulo” pra que essa seja cumprida, pelo menos na data avençada para tal, trazendo assim certa segurança jurídica a todo o sistema.
Acontece que o valor determinado pela cláusula não pode superar o da obrigação principal, limite legal acima disposto. Se ocorrer a disposição em cláusula de valor que excede o da obrigação principal, faz-se necessário que o juiz avalie a redução do valor, reparando o excesso, sem declarar ineficácia da cláusula. Essa redução conferida pelo juiz será efetuada quando a obrigação principal tiver sido parcialmente cumprida, assim dispõe o Art. 413 do Código Civil[8].
Por fim, vêm os tribunais entendendo que o índice máximo da multa cominatória orbita a esfera de máxima de 20%[9], reforçado por inúmeros julgados dos tribunais superiores[10] que reduzem o índice a esse patamar quando excedido.
Informações Sobre o Autor
Gustavo Nori Testa
Mestrando em Direito – sub área : Direito Constitucional na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo