Embargos infringentes

Resumo: Objetiva-se com o presente trabalho analisar a efetividade do processo diante da permanência dos embargos infringentes no Direito Processual Civil Brasileiro.

Palavras-chave: Embargos Infringentes. Direito Processual Civil

Sumário. I. Introdução. II. Breve histórico. III. A efetividade do processo diante dos embargos infringentes.  IV. Singularidade como pressuposto dos embargos infringentes. V. Momento de interposição do recurso especial e do recurso extraordinário quando não oferecidos embargos infringentes. VI. Limitações à interposição de embargos infringentes.  VII. Procedimento dos embargos infringentes. VIII. Conclusão.  IX. Referências bibliográficas.

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I. INTRODUÇÃO

O titulo X. Livro 1. da Lei 5.869 de 11 de janeiro de 1973 foi a parte que mais sofreu alterações ultimamente.[1] Portanto, é interessante que se faça um estudo sobre essas alterações. Como o tema é bastante vasto o presente trabalho monográfico faz uma análise pontual, isto é, estuda as alterações relativas aos embargos infringentes, tendo em vista que essas alterações são significativas, sobretudo, para a advocacia nos tribunais.

Os Embargos infringentes tem origem no Direito Português e eram inicialmente denominados de reconsideração[2]. No Brasil, já era previsto expressamente no Código de Processo Civil de 1939. Atualmente não encontra paralelo no direito comparado.[3]

Algumas das alterações realizadas nos embargos infringentes pela reforma de 2001 foram previstas no anteprojeto do Código de Processo Civil de 1973, mas naquela época as propostas, então inovadoras, não progrediram. [4]

No presente trabalho monográfico será abordado um breve histórico sobre os embargos, como ficou a efetividade do processo diante da manutenção dos embargos infringentes, a singularidade como pressuposto dos embargos infringentes o momento de interposição do recurso especial ou extraordinário quando não oferecidos embargos infringentes e as limitações ao cabimento dos embargos.

A exposição será feita de forma simples procurando reunir opiniões de notáveis doutrinadores e ressaltando o posicionamento da jurisprudência dominante.

 II. Breve Histórico

A doutrina diverge quanto ao momento em que surgiram os embargos infringentes. De acordo com Pontes de Miranda e Moniz de Aragão, os embargos tiveram origem no Direito lusitano e precedem às Ordenações Afonsinas. Moacir Lobo da Costa, entretanto, ensina que os embargos já eram conhecidos no reinado de D. Afonso III (1248- 1279) e que as Ordenações Afonsinas ocorreram no reinado de D. Affonso V (1446 ou 1447).[5]

No Brasil, o primeiro diploma legal a tratar do assunto, segundo Herman Homem de Carvalho (1997:108), foi a Disposição Provisória, de 29.11.1832 e em seguida o Regulamento n° 737. O Código de Processo Civil de 1939 trazia os embargos de nulidade e infringentes, os quais no Código de 1973 passaram a se chamar embargos infringentes.

A inclusão ou permanência dos embargos infringentes no Código de Processo Civil sempre foi motivo de inúmeras críticas. A doutrina diverge muito sobre a necessidade de sua existência: para Pedro Batista Marfins era um recurso que tenderia a desaparecer: Fadei o classifica como recurso de grande importância nos tribunais; Lavenhagen, apesar de não elogiar o instituto, manifestou-se pela sua inclusão no Código; Carlos Silveira Noronha o considera sucedâneo da apelação nas causas julgadas em única instância, quando há competência originária dos tribunais; Athos Gusmão Carneiro explica sua existência pela extinção do recurso de revista; Sérgio Bermudes e Moniz de Aragão sugerem o seu desaparecimento[6]

Atualmente, criticados ou não, os embargos infringentes permanecem no sistema processual e o seu conhecimento é necessário principalmente por aqueles que militam nos tribunais.

III. A efetividade do processo diante dos embargos infringentes

A efetividade do processo consiste na efetiva prestação jurisdicional, consoante preceitos constitucionais, ou seja, o Estado proporciona a parte requerente uma resposta tempestiva. Não só no Brasil, mas também em outros países, a efetividade é sempre um assunto atual que tem como seu maior entrave o formalismo processual. Muitas vezes ocorre a brevidade do processo diante da flexibilização de algumas técnicas processuais pelos magistrados ou pela sua escorreita observância por parte dos advogados.

Ressalte-se que a extinção dos embargos infringentes não seria primordial para conciliar a segurança jurídica com a cognição plena e garantir a efetividade processual. Entendemos não ser a manutenção dos embargos infringentes óbice à efetividade do processo. Ademais, a finalidade do instituto tem a sua relevância e chegou até a ser exaltado por Ulderico Pires dos Santos (1977: 269):

“Conquanto combatido por alguns processualistas é ao nosso ver, o melhor de todos os recursos ordinários estatuídos pelo legislador, pois o voto vencido que lhe dá origem constitui sempre um alerta aos componentes do órgão que deva julgá-lo, obrigando os seus componentes a procederem a um estudo mais acurado da matéria nele ventilada.”

Realmente, a razão do instituto ainda é importante para uma prestação jurisdicional segura e justa, pois como ressalta o referido autor o voto vencido, que dá origem aos embargos, chama a atenção dos julgadores para o assunto objeto da controvérsia. Diante de uma nova oportunidade de reexaminar a matéria de direito e primordialmente, de fato, tem-se um maior numero de juízes decidindo a questão e, por sua vez, proporcionando um maior acerto na prestação jurisdicional.

Embora tímida as alterações trazidas pela lei 10 352, de 26 de dezembro de 2001 relativamente aos embargos infringentes, pode-se dizer que essas alterações possibilitaram uma maior efetividade na prestação jurisdicional. A redação dada ao art. 498, do CPC buscou essa efetividade quanto ao prazo para a interposição do recurso especial e extraordinário, in verbis:

“Quando o dispositivo do acórdão contiver julgamento por maioria de votos e julgamento unânime e forem interpostos embargos infringentes, o prazo para recurso extraordinário ou recurso especial, relativamente ao julgamento unânime, ficará sobrestado até a intimação da decisão nos embargos.

Parágrafo único. Quando não forem interpostos embargos infringentes, o prazo relativo à parte unanime da decisão terá como dia de inicio aquele em que transitar em julgado a decisão por maioria de votos”

Assim, facilitou-se o trâmite do recurso especial, extraordinário e embargos infringentes quando interpostos em face de uma mesma decisão. Antes da reforma, interpostos recurso especial ou extraordinário e embargos infringentes, àqueles ficavam sobrestados até o julgamento deste. Se os embargos fossem improvidos caberia, ainda, a interposição de outro recurso especial ou extraordinário o que poderia acarretar a interposição de dois recursos excepcionais.

A redação atual permite que após a intimação do julgamento dos embargos possa ser interposto, no prazo de 15 dias, apenas os recursos extraordinários englobando tanto a parte unânime do acórdão quanto a impugnada pelos embargos infringentes, de sorte que está superada a Súmula 355 do Supremo Tribunal Federal que entendia tardio o recurso extraordinário interposto, quanto a parte unânime da decisão, após o julgamento dos embargos. Desse procedimento resultou não só uma maior efetividade processual, mas também economicidade e acesso à justiça, já que não é necessário efetuar o pagamento das despesas do recurso mais de uma vez.

IV. Singularidade como pressuposto dos embargos infringentes

Apesar do Código de Processo Civil não dizer expressamente, a doutrina e a jurisprudência são unanimes em descrever a singularidade ou unirrecorribilidade como um

dos pressupostos processuais dos recursos, tendo em vista que em face de uma decisão deve-se interpor apenas um recurso.

Por isso, a maioria dos doutrinadores entendia serem os embargos infringentes uma exceção ao princípio da singularidade[7]. De fato, tratava-se de uma exceção que causava alguns transtornos, por exemplo, acórdão contendo parte unânime e parte não unânime em que somente houvesse recurso de embargos infringentes, o recorrente não poderia posteriormente valer-se de recurso especial ou extraordinário no que tange à unanimidade da decisão.

A nova sistemática trazida pelo art. 498 do CPC pôs fim a essa situação, pois a interposição de embargos infringentes interrompe o decurso do prazo para a interposição dos recursos extraordinários. Trata-se de interrupção, embora o referido artigo traga a expressão “sobrestado”. Vejamos os comentários de Luiz Rodrigues Wambier sobre o assunto (2002:129):

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“É necessário que se faça aqui uma observação que não fizemos na edição anterior, no sentido de que o fenômeno que ocorre é o de que o prazo para a interposição dos recursos especial e extraordinário nem começa a fluir no que tange à parte unânime da decisão, apesar de a lei ter usado a expressão “fica sobrestado”. O emprego desta expressão poderia, ao intérprete mais apressado, dar a impressão de que de suspensão de prazo se tratasse, no sentido de se contatem os dias do prazo de interposição do recurso extraordinário e do recurso especial da parte especial, que teriam ocorrido antes da interposição dos embargos infringentes da parte não unânime Não e o caso”.

Acerca do tema, Flavio Cheim Jorge acrescenta, ainda, que há uma tendência em privilegiar a interrupção em detrimento da suspensão”. Ademais, o parágrafo único do art. 498 do CPC esclarece que a norma do caput diz respeito à suspensão e não a interrupção ao mencionar que, o prazo para a interposição do recurso extraordinário ou especial. quando não forem interpostos embargos infringentes, “terá como dia de início aquele em que transitar em julgado a decisão por maioria de votos”.

Acrescente-se, porém, que no caso de julgamento unânime, o prazo dos embargos declaratórios não fica também sobrestado, mas flui normalmente. Quanto à parte não unânime do julgado, os embargos declaratórios seriam desnecessários porque o limite dos embargos infringentes é a porção qualitativa trazida pelo voto vencido sobre a matéria em julgamento.

V. Momento de interposição do recurso especial e do recurso extraordinário quando não oferecidos embargos infringentes.

Nos termos dos arts. 102, III e 105, III, ambos da Constituição Federal, são cabíveis, respectivamente, recurso extraordinário e especial das decisões proferidas em única ou última instância. Portanto, esses recursos não serão admissíveis quando a decisão couber embargos infringentes, pois, ainda, não houve o esgotamento das instâncias (Súmulas 281 do Supremo e 207 do Superior Tribunal de Justiça). Interessante observar algumas nuances trazidas pela reforma quanto ao prazo de interposição dos recursos extraordinários quando não oferecidos embargos infringentes.

Imaginemos uma situação em que caiba a uma das partes litigantes a interposição de embargos infringentes e, a parte contrária, a interposição de recurso especial. Observe que o prazo para a interposição do recurso especial terá início após a intimação do julgamento dos embargos infringentes. Se a parte a quem cabia interpor os embargos infringentes não os interpuser, o prazo para a interposição do recurso especial será àquele a iniciar-se após o trânsito em julgado da decisão tornada por maioria dos votos, ou seja, no 16° dia da publicação do acórdão da apelação.[8]

Discorre Flávio Cheim Jorge (2002:68) que cabe a parte verificar no tribunal a existência de embargos infringentes interpostos pela outra parte, pois o art. 498 do CPC nada menciona sobre como a parte contrária será intimada da decisão dos embargos ou, caso não haja esse recurso, sobre a intimação do trânsito em julgado para a sua interposição. A esse respeito o referido autor faz a seguinte crítica.

“Tal fato causará, por certo, grande dificuldade. Principalmente para aqueles que não possuem escritórios onde se localizam os tribunais, pois terão que se deslocar até a capital de seu respectivo Estado e verificar no 16° dia se a parte contrária interpôs embargos infringentes. Isso sem levar em conta o caso, muito comum, de se advogar em mais de um Estado.”

Poder-se-ia entender, nos casos em que cabe a mesma parte a interposição tanto dos recursos extraordinários quanto de embargos infringentes e esta parte se abstém de interpor este último recurso, que teria o prazo em dobro para interpor os recursos extraordinários. Flávio Cheim Jorge, porém, rechaça esse tipo de interpretação (2002:69):

“A mera circunstância de uma decisão estar exposta aos embargos infringentes não possibilita concluir que esse recorrente possa ter o prazo de trinta dias para interpor o seu recurso excepcional. Somente faz sentido a aplicação da regra do parágrafo único quando o interessado pela interposição dos embargos infringentes for a parte contrária. Apenas dessa forma é que terão sido atingidas as razões idealizadas pelo legislado para a nova redação do art. 498.”

Convém ressaltar que a regra do prazo unificado (prazo relativo à parte unanime do acórdão e prazo contra acórdão proferido nos embargos infringentes) prevalece, ainda que os embargos infringentes sejam julgados inadmissíveis, ressalvados àqueles casos em que haja manifesta má-fé da parte embargante.

VI. Limitações à interposição de embargos infringentes 

Diz a redação do art. 530, do CPC:

“Cabem embargos infringentes quando o acórdão não unânime houver reformado, em grau de apelação, a sentença de mérito, ou houver julgado procedente ação rescisória. Se o desacordo for parcial, os embargos serão restritos à matéria objeto da Divergência”.

Essa redação já havia sido antes preconizada por Barbosa Moreira em sua obra Comentários ao Código de Processo Civil (1993:473):

“Nas três primeiras edições deste livro, enunciamos conclusão desfavorável à sobrevivência dos embargos infringentes. A experiência judicante levou-nos a atenuar o rigor de nossa posição. De lege ferenda, manteríamos o recurso, mas lhe restringiríamos o cabimento, excluindo-o em alguns casos, como o de divergência só no julgamento de preliminar, ou em apelação interposta contra sentença meramente terminativa, e também o de haver o tribunal confirmado (embora por maioria de votos) a sentença apelada, à semelhança do que se dava no sistema primitivo do estatuto de 1939, antes do Dec.-lei n°8.570, de 8.1.1946.”

No que tange à apelação, a redação anterior exigia apenas um requisito para a interposição dos embargos infringentes que consistia no julgamento por maioria. Atualmente, requer três requisitos: recurso interposto em face de sentença de mérito; reforma da sentença recorrida e que essa reforma seja por maioria. O limite dos embargos infringentes continua sendo a matéria apreciada no voto vencido.

A redação atual, ao mencionar sentença de mérito parece demonstrar que a intenção do legislador foi que os embargos infringentes não seja meio idôneo para impugnar acórdão proferido em apelação interposta contra sentença terminativa que não seja de mérito.

Cândido Rangel Dinamarco (2002:203) discorre que o legislador equivocou-se caso tenha entendido que a sentença ou acórdão que extingue o processo, sem julgamento de mérito, sempre dá a parte vencida a oportunidade de ajuizar urna nova ação em busca do bem da vida pretendido:

“…(a) nem sempre é meramente terminativo o acórdão que julga apelação contra sentença terminativa, (b) nem é necessariamente de mérito o acórdão que julga apelação contra sentença de mérito. Consequentemente, (c) nem sempre é suscetível de coisa julgada material, o acórdão que julga apelação contra sentença de mérito e (d) nem sempre é incapaz de obter essa autoridade o que julga apelação contra sentença terminativa. Por isso, se a intenção do legislador foi realmente a de negar os embargos infringentes quando o processo tem fim sem a formação da coisa julgada material, e portanto sem que o autor fique impedido de tornar a juízo com outra demanda (‘arts. 28 e 268), outro deveria ser o critério para a nova redação do art. 530 do Código de Processo Civil. Deveria fazer referência aos acórdão que decidem sobre o mérito, não às sentenças que o fizeram.”

Vale lembrar que o Tribunal, com a redação atual do art. 515, § 3°, do CPC, poderá, sem a necessidade de retomar os autos à instância, julgar o mérito da causa quando houver apelação de sentenças terminativas e o processo estiver “maduro’ (independer de produção de provas). Surge então a dúvida se, nesse caso, os embargos infringentes serão inadmissíveis Luiz Rodrigues Wambier faz a seguinte consideração (2002:177):

“Interessante observar-se que no caso de incidir o art. 515,§ 3º, jamais caberão embargos infringentes, já que um dos pressupostos da incidência dessa nova regra é ter havido sentença de mérito.”

Não é esta a posição de Candido Rangel Dinamarco (2002 204)

“Certamente o legislador não levou em conta algo que veio à ordem jurídico-processual brasileira por obra da própria Reforma da Reforma e no contexto da própria lei responsável pela nova redação do art. 530 do Código de Processo Civil -— o que é a possibilidade de a reforma da sentença terminativa incluir o julgamento do mérito da causa lá pelo tribunal, sem necessidade do retorno dos autos à instância inferior (art. 515, § 3 red. Lei a. 10.352, de 26.12.2001 supra, n. 101). Dirão os tribunais se também nesse caso os embargos infringentes serão inadmissíveis, como resulta da interpretação puramente literal do art. 530 (exegese), ou se sua interpretação sistemática deve conduzir à admissibilidade daqueles. A segunda resposta é mais coerente coma o sistema e com a garantia constitucional do due process of law, sendo autorizada pelas palavras do próprio legislador -o qual, na justificativa do projeto, afirmou que só é conveniente manter os embargos infringentes nos casos “em que a divergência tenha surgido em matéria de mérito, não simplesmente em tema processual.””

Realmente, por uma interpretação puramente literal, a vontade da lei é que haja o cotejo entre a sentença e o acórdão da apelação de forma que esse deve reformar a sentença de mérito.

Todavia, não se deve esquecer os ensinamentos de Carlos Maximiliano (1965:141) que defende uma interpretação sistemática que consiste na conexidade entre partes do dispositivo e entre este e outras prescrições que compõem o ordenamento jurídico:

“A verdade inteira resulta do contexto, e não de uma parte truncada, quiçá defeituosa, mal redigida; examine-se a norma na íntegra (2), e mais ainda, o Direito todo, referente ao assunto. Além de comparar o dispositivo com outros afins, que formam o mesmo instituto jurídico, e com os referentes a institutos análogos; força é, também, afinal pôr tudo em relação com os princípios gerais, o conjunto do sistema em vigor.”

Assim, tendo a justificativa do projeto, no dizer de Cândido Rangel Dinamarco, demonstrado que a intenção do legislador consistia em admitir os embargos infringentes somente nos casos em que a divergência tenha surgido em matéria de mérito, mas a lei exigido que a sentença fosse de mérito e não o acórdão que reformasse a sentença, entendemos que caberá ao aplicador da norma, através de uma interpretação sistemática, admitir os embargos nos casos do art. 515, § 3, do CPC.

A jurisprudência[9] tem posicionado nesse sentido, in verbis:

“PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS INFRINGENTES. ACÓRDÃO QUE, POR MAIORIA, REFORMA SENTENÇA TERMINATIVA E ADENTRA OJULGAMENTO DO MÉRITO. CABIMENTO. – Nem sempre é meramente terminativo o acórdão que julga apelação contra sentença terminativa, eis que, nos termos do § 3º do art. 515, “nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito (art. 267), o tribunal pode julgar desde logo a lide, se a causa versar questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento”. – Se apenas o Tribunal julga o mérito, não se aplica o critério de dupla sucumbência, segundo o qual a parte vencida por um julgamento não-unânime em apelação não terá direito aos embargos infringentes se houver sido vencida também na sentença. – Assim, em respeito ao devido processo legal, o art. 530 deve ser interpretado harmoniosa e sistematicamente com o restante do CPC, em especial o § 3º do art. 515, admitindo-se os embargos infringentes opostos contra acórdão que, por maioria, reforma sentença terminativa e adentra a análise do mérito da ação. – Aplica-se à hipótese, ainda, a teoria da asserção, segundo a qual, se o juiz realizar cognição profunda sobre as alegações contidas na petição, após esgotados os meios probatórios, terá, na verdade, proferido juízo sobre o mérito da questão. – A natureza da sentença, se processual ou de mérito, é definida por seu conteúdo e não pela mera qualificação ou nomen juris atribuído ao julgado, seja na fundamentação ou na parte dispositiva. Portanto, entendida como de mérito a sentença proferida nos autos, indiscutível o cabimento dos embargos infringentes. Recurso especial conhecido e provido.”

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De fato, essa parece ser a interpretação mais acertada, pois o processo já estava pronto para ser julgado em primeira instância e a busca da efetividade processual não pode prejudicar a parte pelo simples fato do mérito ter sido apreciado na segunda instância e não na primeira.

Se um dos demandantes, estando de boa-fé, aguardar que a parte contrária interponha embargos infringentes para após o transito em julgado interpor os recursos extraordinários, o mesmo não poderá ser prejudicado, caso o tribunal entenda ser inadmissível os embargos. Nesse sentido assevera Flávio Cheim Jorge (2002 70)

“Existindo ‘dúvida objetiva’, isto é, divergência no âmbito doutrinário e jurisprudencial quanto ao cabimento dos embargos infringentes, não achamos que o recorrente deva ser penalizado pelo fato de ter aguardado a interposição, pela parte contrária, de seu recurso.”

A nova redação do art. 530 do CPC ao exigir como requisito dos embargos a reforma da sentença recorrida, retoma ao sistema previsto originalmente no Código Processual Civil de l939[10], o qual determinava que a sentença ou acórdão sujeitos aos embargos infringentes são aqueles que em grau de recurso conhece da apelação e da ação rescisória e lhes dão provimento.

Portanto, não caberão embargos infringentes na hipótese do apelante ou autor da rescisória ter vencido o mérito da demanda anterior, mas ter sucumbido em juízo de admissibilidade, seja da apelação, seja da ação rescisória.

A inadmissibilidade dos embargos, nesses casos, tem por argumento o fato de que sendo a maioria dos juízes a favor do que foi decidido, na sentença recorrida ou na sentença ou acórdão sujeitos a ação rescisória, haveria um acerto na prestação jurisdicional.

Se, a doutrina pode ser considerada pacífica quanto ao não cabimento de embargos infringentes em face de decisão em apelação que confirmou a sentença de primeira instância e em ação rescisória julgada improcedente, o mesmo não ocorre quanto ao cabimento de embargos infringentes no julgamento de agravo de instrumento e remessa necessária.

Em se tratando de agravo, Luiz Rodrigues Wambier (2002:180) ensina que nas decisões que extingue o processo por reconhecer a decadência e a prescrição serão cabíveis embargos infringentes:

“Pensamos continuarem cabíveis embargos infringentes em se tratando de decisão de agravo em que se ponha fim ao processo por decadência ou prescrição. Neste caso, dispensa-se o requisito de haver sentença anterior de mérito julgando procedente a ação, por impossive1 de ser preenchido Mas parece que a ratio essendi do novo art. 530 recomenda que o recurso de embargos infringentes continue a ser cabível nesta hipótese.”

Para Fredie Didier Júnior e Leonardo José Carneiro Cunha[11], a admissibilidade dos embargos infringentes seria apenas contra acórdão não unânime que reformar sentença de mérito. Assim, “é curial sua inadmissibilidade quando o acórdão acolher agravo de instrumento para extinguir o processo sem julgamento de mérito.”[12]

Relativamente à remessa oficial, de acordo com a técnica jurídica, não ha falar se em embargos infringentes, uma vez que não o considera recurso. Mas, mesmo assim, por uma interpretação sistemática, deve-se conhecer dos embargos infringentes em face de sentença que reforma o mérito nos acórdãos proferidos em remessa necessária[13].

Segundo Fredie Didier Júnior e Leonardo José Carneiro Cunha[14], a questão da admissão dos embargos infringentes em reexame necessário ainda é controvertida no âmbito do Superior Tribunal de Justiça.

Serão cabíveis embargos infringentes em acórdão que julga embargos declaratórios, somente se o conteúdo desse acórdão passar a integrar o acórdão proferido em apelação ou ação rescisória, além de preencher os demais requisitos legais.[15]

Aspecto interessante consiste em saber se haveria a possibilidade da interposição de embargos infringentes por ambas as partes. A esse respeito, Dinamarco tece as seguintes considerações (2002:199’):

“Serão improváveis e raríssimos os casos em que um acórdão possa ser objeto de embargos infringentes por ambas as partes, ainda quando contenha capítulos favoráveis a uma delas e capítulos favoráveis à outra, todos julgados sem unanimidade. Como o apelante nunca terá direito a esse recurso, nem o autor da ação rescisória (regra da dupla sucumbência,), o capítulo em que um desses sujeitos sucumbir poderá ser suscetível de recurso extraordinário ou especial, mas de embargos infringentes, jamais. Só poderão ambas as partes embargar nos casos em que a sentença apelada já contivesse capítulos desfavoráveis a um e capítulos desfavoráveis a outro (sucumbência recíproca em primeira instancia), apelando ambas as partes e cada um dos apelantes obtendo provimento por maioria. Na ação rescisória, essa situação só poderá configurar-se se tiver havido reconvenção, o que é extremamente improvável”.

VII. Procedimento dos embargos infringentes

A redação anterior do ar 531, do CPC estabelecia que o relator exercia o juízo de admissibilidade e, caso fosse os embargos admitidos, realizar-se-ia o sorteio do novo relator e, somente após esses procedimentos, o embargado era intimado para impugnar o recurso.

A redação atual simplificou esse procedimento, de forma que, interpostos os embargos, o embargado, desde já, apresenta contrarrazões e só depois o relator apreciará a admissibilidade do recurso. Com isso, ganhou-se tempo no trâmite do recurso e facilitou a atividade do relator, pois nas contrarrazões do embargado poderá encontrar indicativo que ensejara a inadmissibilidade dos embargos infringentes.

Importante lembrar que o relator irá negar seguimento ao recurso quando verificar ser o caso de manifesta inadmissibilidade por estar em desacordo com súmula ou com jurisprudência dominante dos tribunais Superiores. Quanto à aplicação dessa norma aos embargos infringentes, Luiz Rodrigues Wambier tece a seguinte crítica (2002:183):

“Na verdade, realmente soa estranho poder o relator, sozinho, decidir justamente esse recurso, caí/o único objetivo é o de aprimorar a qualidade da prestação jurisdicional, aumentando o número de juízes que integram o órgão julgador”

Segundo o entendimento de Cândido Rangel Dinamarco, o disposto no art. 557, § 1°-A, do CPC não se aplica aos embargos infringentes, sob pena de proporcionar a um só julgador poder de revisão de um órgão colegiado.

O Superior Tribunal de Justiça tem entendido que o relator da apelação, impugnada por embargos infringentes somente pode decidir monocraticamente pela inadmissibilidade desse recurso, não podendo adentrar no juízo de mérito[16].

Quanto aos demais procedimentos dos embargos, serão eles adaptados à organização interna dos tribunais, é o que determina a nova redação do art. 533, do CPC: “Admitidos os embargos, serão processados e julgados conforme dispuser o regimento do tribunal”.

VIII. Conclusão

Pode se dizer que a existência dos embargos infringentes no processo civil brasileiro, ainda é benéfico para a realização da Justiça.

Embora os embargos infringentes sejam vistos por alguns autores como motivo de prolongamento da prestação jurisdicional, o certo é que ainda são considerados um instrumento de aperfeiçoamento da Justiça, pois permitem a rediscussão da matéria de direito e principalmente de fato, no âmbito das instâncias ordinárias. Prevalecendo a segurança jurídica, tendo em vista que o prolator do voto vencido muitas vezes é quem mais se atém a análise da causa.

A ausência de preclusão da parte unânime, já que há apenas uma contagem de prazo e o fato de serem cabíveis os embargos no acórdão proferido em apelação somente se esta decorrer de sentença de mérito foi uma forma de ponderar a segurança jurídica e buscar a celeridade processual.

Quanto às hipóteses de cabimento, a jurisprudência tem-se direcionado no sentido de buscar a efetividade do processo sem afetar o devido processo legal assegurado constitucionalmente.

 

Referências bibliográficas
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Notas
[1] Vide Leis 5. 925/73; 6 314/75; 8 038/ 90; 8 950/94; 9 139/95; 9 756/98 e 10 352/01.
[2] CHEIM. 2002, p 259
[3] Justificativa do projeto fl. 3 do PL n° 274 de 12 de julho de 2000.  Relator Ministro de Estado da Justiça José Gregori.
[4] DINAMARCO, 2002, p 199.
[5] ROENICK . 1997, p. 107.
[6] Orlando de Assis Corrêa. Os recursos no código de processo civil. p. 124.
[7] No sentido contrario a exceção, Nelson Nery Júnior. Princípios fundamentais. Teoria geral dos recursos, p. 100.
[8] DINAMARCO, 2002, p. 212.
[9]  (STJ, 3ª Turma, REsp. 832.370/MG, rel. Min. Nancy Andrighi, publicado no DJ de 13.8.2007.
[10] Justificativa do projeto, fl. 4 do PL n° 24 de 12 de julho de 2000. Relator: Ministro de Estado da Justiça José Gregori.
[11] DIDIER JR., 2009, p. 229-230.
[12] STJ, Corte Especial, EREsp n. 276107/GO, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j. em 04.06.2005, p 366.
[13] Nesse sentido, Barbosa Moreira, José Frederico Marques, Celso Agrícola Barbi, Ennio de Barros, apud Barbosa Moreira. Ob., cit. p. 477.
 [14] DIDIER JR., 2009, p. 231-232.
[15]  STJ. REsp 465.763-BA, Rel. Min. José Delgado, j. em 27.5.2003, publicado no Informativo n. 174, 26-30 de maio de 2003.
[16] STJ, REsp. 226.748/MA, 3ª Turma, publicado no DJ de 11.09.2000, p. 250.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Leidiane Mara Meira Jardim

 

Advogada da União em Minas Gerais- Pós-graduanda em Direito Público pelo CEAD/UNB

 


 

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