Emendas ao projeto de lei orçamentária anual


Ultimamente a mídia tem dado destaque à questão das emendas apresentadas por Deputados, sugerindo que algumas delas foram objetos de negócios segundo denúncia de um dos parlamentares contrário a essas emendas.


O assunto convém ser juridicamente esclarecido para não dar a impressão de que as negociações entre o Executivo e o Legislativo na discussão e aprovação do Projeto de Lei orçamentária Anual é algo anormal.


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A fixação de despesas anuais do Poder Público submete-se ao princípio da legalidade, tanto quanto a instituição de tributos (art. 167, I , V e VI da CF).


Assim como o povo há de consentir previamente na instituição e  arrecadação de tributos[1], deve o mesmo povo consentir no direcionamento dos recursos financeiros transferidos ao Poder Público. É o princípio da legalidade das despesas, que é um corolário do princípio da legalidade tributária.


Assim, a interferência do Legislativo na fixação de despesas públicas é um imperativo constitucional.


Só que a apresentação de emendas pelo Legislativo ao Projeto de Lei Orçamentária Anual, de iniciativa exclusiva do Poder Executivo (art. 165 da CF), é limitada.


A Constituição Federal impõe limites à atuação dos parlamentares na aprovação do plano de ação governamental refletido na Lei Orçamentária Anual.


Cabe à Comissão mista permanente de Senadores e Deputados receber e emitir parecer sobre as emendas (§ 2°, do art. 166 da CF).


Entretanto, nos termos do § 3°, do art. 166 da CF as emendas só poderão ser aprovadas caso:


“(…) II – indiquem os recursos necessários, admitidos apenas os provenientes de anulação de despesa, excluídas as que incidam sobre:


a) dotações para pessoal e seus encargos;


b) serviço da dívida;


c) transferências tributárias constitucionais para Estados, Municípios e Distrito Federal; ou


III – sejam relacionadas:


a) com a correção de erros ou omissões; ou


b) com os dispositivos do texto do projeto de lei.”


Com tantas limitações não será possível viabilizar qualquer emenda sem prévia negociação com o Poder Executivo, salvo para efetuar correções ou suprir as omissões. Qualquer tentativa de anulação parcial de determinada despesas por um parlamentar encontrará oposição de outro parlamentar interessado em aumentar aquela despesa.


Dessa forma, no redirecionamento das despesas públicas a sistemática constitucional leva necessariamente à negociação com o governo. Para tanto, o § 5°, do art. 166 da CF faculta ao chefe do Executivo enviar mensagem modificativa do projeto de lei enquanto não iniciada a votação na Comissão Mista da parte cuja alteração é proposta.


Daí a absoluta normalidade dessas negociações que permitem aos parlamentares representar os interesses da população no direcionamento das despesas públicas. E é compreensível, também, que cada parlamentar pretenda favorecer por vias de emendas a localidade onde ele tem a sua base eleitoral, pois, em última análise estará atendendo especificamente ao interesse de seus eleitores a par do interesse geral da sociedade que incumbe a todo parlamentar perseguir.


Negociação não quer dizer negociata envolvendo venda de emendas como salientado por um dos deputados paulista, o que deve ser uma exceção que não pode ser generalizada ao ponto de inibir as tratativas dos parlamentares com o governo por via de emendas que são legítimas e constitucionais.



Nota:

[1] Daí a inconstitucionalidade de instituição de tributo por Medida Provisória.


Informações Sobre o Autor

Kiyoshi Harada

Especialista em Direito Tributário e em Ciência das Finanças pela FADUSP. Professor de Direito Tributário, Administrativo e Financeiro em várias instituições de ensino superior. Conselheiro do Instituto dos Advogados de São Paulo. Presidente do Centro de Pesquisas e Estudos Jurídicos. Ex Procurador-Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.


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