Emparedamento Previdenciario

Resumo: O presente trabalhofaz uma análise acerca do impasse pelo qual passa o trabalhador/contribuinte, nos casos de auxílio doença ou aposentadoria por invalidezquando recebe altapela autarquia previdenciária por ter sido considerado apto para retornar ao trabalho.Entretanto,no seu retorno à empresa,por exigência do empregador, é submetidoa uma segunda avaliaçãomédica pelo Médico do Trabalho,que o considera ainda inapto para voltar as suas atividades laborativas. Havendo então, a recusa pelo empregador à sua reintegração ao trabalho. Nesta situação específica, ocorreo que a doutrina e a jurisprudência denominam de “emparedamento” ou “limbo previdenciário”, ou seja, o trabalhador fica deslocado do trabalho e da Previdência, não recebendo salário e nem benefício. Concluí-se que a causa deste fenômeno decorre da implantação,através de um ato normativo, da Alta Programada, a qual está sendo muito contestada em face de sua ilegalidade e inconstitucionalidade.O mecanismo da Alta Programada afronta o princípio da dignidade da pessoa humana e por consequência vem comprometendo a efetividade dos direitos fundamentais dos trabalhadores. Verifica-se que a solução para tal impasse não advém de uma produção legislativa para disciplinar a situação doemparedamento, mas sim de uma posição dos nossos tribunais quanto à ilegalidade e inconstitucionalidade da Alta programada.

Palavras-chave: Alta Programada;Reintegração ao Trabalho;Recusa pelo Empregador; Emparedamento; Dignidade da Pessoa Humana.

Sumário: 1- Introdução. 2- Desenvolvimento. 2.1-Da Concessão do Benefício do Auxílio-Doença: Acidentário e Previdenciário. 2.2-A Suspensão do Contrato de Trabalho pelo Gozo do Auxílio-Doença ou Aposentadoria por Invalidez. 2.3- Perícia Médica e Alta Programada: Cessação do Benefício. 2.4- Recusa do Empregador à Reintegração do Empregado ao Trabalho. 2.5- Ilegalidade e Inconstitucionalidade da Alta Programada.2.6-Limbo Jurídico: Posições Jurisprudenciais

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1.Introdução

Os termos “emparedamento” e “limbo trabalhista previdenciário” têm sido utilizados por nossa jurisprudência em situações recorrentes que chegam aos nossos tribunais. São termos utilizadospara descrever a mesma situação.

Ocorre o emparedamento ou limbo previdenciário quando o empregado é afastado de seu posto de trabalho, por motivos de doença pela Previdência Social e, posteriormente,recebe alta médica pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS). Entretanto, no seu retorno a empresa,o empregador, após submetê-lo ao corpo médico dotrabalho por determinações normativas,é impedido de se reintegrar as suas funções por ter sido considerado inapto. Nesta situação o empregado fica “emparedado”, sem salários e sem o benefício do INSS.

Diante de tal fenômeno, encontra-se o trabalhador desamparado,ou seja, à margem da lei. Ocorrendo o que a doutrina e a jurisprudência denominam de “limbo jurídico”. O limbo jurídico, refere-se a falta de uma legislação para disciplinar esta situação específica.

Duas são as opções das quais pode valer-se o trabalhador/contribuinte: ou recorre administrativamente ao INSS ou procura o Poder Judiciário.Contudo,ambos os procedimentos levam tempo e o trabalhador resta prejudicado.

Diante desta situação específica, duas são as posições doutrinárias e jurisprudenciais: a primeira entende queao empregador não é dado recusar o retorno do trabalhador às suas atividadesapós a alta médica do INSS, mesmo sendo considerado inapto pelo Médico do Trabalho. Justificam que, após a alta médica do trabalhador pelo INSS, o contrato de trabalho automaticamente passaria a vigorar com todos os seus efeitos.Cabendo, portanto, ao empregador o ônus de seu afastamento.

A segunda corrente defende que,enquanto o trabalhadoraguarda o pedido de prorrogação do benefício e este lhe for negado, poderá solicitar então reconsideração, neste período, o afastamento do trabalhador continua pendente de análise pelo órgão previdenciário e, portanto, seu contrato de trabalho ainda deve ser considerado suspenso, eximindo o empregador de qualquer ônus.

Tecemos algumas considerações sobre o tema, com o objetivo de analisar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade do ato normativo queintroduziu a Alta Programada no âmbito da Previdência Social, ocasionando o emparedamento previdenciário e como a jurisprudência tem se posicionado no sentido de dar segurança jurídica a seus jurisdicionados diante deste impasse.

2. Desenvolvimento

2.1 Da Concessão do Benefício do Auxílio-Doença: Acidentário e Previdenciário

Quando o empregado sofre acidente de trabalho ou é acometido por alguma doença ocupacional equiparada a acidente de trabalho, cumpre a empresa emitir uma Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) e o empregado, pode beneficiar-se do auxílio doença por acidente de trabalho, concedido pelo Intituto Nacional de Seguridade Social (lNSS) sob espécie 91. As demais patologias são enquadradas na espécie 31 (auxílio-doença previdenciário). (MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2015)

De acordo com art. 19 da Lei n° 8.213/91, doravante chamada de Lei de Benefícios, com nova redação dada pela Lei Complementar nº 150 de 2015:acidente do trabalho é o que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço de empresa ou de empregador doméstico ou pelo exercício do trabalho dos trabalhadores segurados, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.(BRASIL, 1991)

São consideradas também acidente do trabalho: a) doença profissional, assim entendida a produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade e constante da respectiva relação elaborada pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social (MTPS); b) doença do trabalho, assim entendida a adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente, constate da relação elaborada pelo MTPS.(BRASIL, 1991)

Não são consideradas como doença do trabalho:a) a doença degenerativa; b) a inerente a grupo etário; c) a que não produza incapacidade laborativa; d) a doença endêmica adquirida por segurado habitante de região em que ela se desenvolva, salvo comprovação de que é resultante de exposição ou contato direto determinado pela natureza do trabalho.(BRASIL, 1991)

 Em caso excepcional, constatando-se que a doença não está incluída na relação prevista na Lei de Benefícios como acidente do trabalho, mas queresultou das condições especiais em que o trabalho é executado e com ele se relaciona diretamente, a Previdência Social deve considerá-la acidente do trabalho. São as chamadas doenças equiparadas a acidente te trabalho

O benefício doAuxílio-Doença previdenciário e o benefício doAuxílio-Doença acidentário na essência não se distinguem, diferem apenas em alguns aspectos, quanto aos efeitos no contrato de trabalho e quanto aos sujeitos beneficiados.

O benefício do Auxílio-Doença Previdenciário abrange todos os segurados vinculados a Previdência Social: segurado empregado, individual, facultativo, doméstico e especial. Já, o Auxílio-Doença Acidentário, não abrange todos os segurados da Previdência Social, apenas os empregados, segurado especial e trabalhadores avulsos (artigo 18 da Lei de Benefícios).

2.2DaSuspensão do Contrato de Trabalho pelo Gozo do Auxílio-Doença ou Aposentadoria por Invalidez

A legislação brasileira adotou nomenclatura própria (suspensão e interrupção) para designar os períodos de sustação de algumas ou quase todas as cláusulas contratuais trabalhistas.

A maior distinção entre suspensão e a interrupção é que na suspensão não há o pagamento total ou parcial do salário, enquanto que na interrupção há pagamento de salário. Em regra, na suspensão, o tempo de serviço não é computado nem é devida qualquer contraprestação, enquanto na interrupção, ao contrário, o tempo do serviço é computado para todos os efeitos e as parcelas salariais são devidas integral ou parcialmente. (CASSAR, 2009)

2.3Perícia Médica e Alta Programada: Cessação do Benefício

O perito do INSS e o Médico do Trabalho são dois profissionais habilitados que podem avaliar a capacidadelaboral do empregado. Num primeiro momento, é o médico da empresa quemexamina e constatada a incapacidade por mais de 15 dias, e, encaminhado para o INSS, será examinado pelo peritomédico da respectiva Autarquia.

A comprovação da doença se faz através de atestado médico emitido por serviço médico próprio do empregador ou em convênio e, sucessivamente, emitido pela Previdência Social por órgãos credenciados ao Sistema Único de Saúde (SUS), não existindo estes é que o empregado pode escolher médico particular (art. 60, § 4°, da Lei n° 8.213/91 c/c art. 6°, § 2° da Lei n° 605/49 c/c art. 131, III da CLT) — Súmulas n°s. 15 e 282 do Tribunal Superior do Trabalho (TST). (CASSAR, 2009)

Quando o pedido do benefício é indeferido, se o segurado não concordar com a decisão da perícia médica, pode apresentar um Pedido de Reconsideração (PR) na forma do Art 304 § 2º II da IN77/15. Um novo exame será marcado e realizado por outro perito médico do INSS.

De acordo com o que dispõe o art. 78, do Decreto 3.048/99, o auxílio-doença cessa pela recuperação da capacidade para o trabalho, pela transformação em aposentadoria por invalidez ou auxílio-acidente de qualquer natureza, neste caso se resultar sequela que implique redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia.

Destaca-se que a aposentadoria por invalidez é provisória e enquanto perdurar, o contrato permanece suspenso — art. 475 da CLT c/c art. 43 da Lei de Benefícios.

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Com a implantação dosistema da alta programada instituído em 13 de Julho de 2006, no âmbito da Previdência Social, por intermédio do Decreto nº 5.844, que alterou o art. 78 do Regulamento da Previdência Social (RPS), foram introduzidas alterações no modelo médico-pericial, para a concessão do auxílio-doença.Essas alterações acabaram com a necessidade de sucessivas perícias para a manutenção do auxílio-doença e buscaram adequar a data de cessação do benefício ao tempo necessário para a recuperação da capacidade de trabalho. (DATAPREV, 2015)

Conforme, dispõe os §§ 1º e 2°, do art. 78 do Decreto 3.048/99, bem como o Art. 304 da IN77,o INSS poderá estabelecer, mediante avaliação médico-pericial, o prazo que entender suficiente para a recuperação da capacidade para o trabalho do segurado, dispensada nessa hipótese a realização de nova perícia.Caso o prazo concedido para a recuperação se revele insuficiente, o segurado poderá solicitar a realização de nova perícia médica, na forma estabelecida pelo Ministério da Previdência Social. (DATAPREV, 2015)

Cessado o benefício previdenciário de auxílio doença, cessa a suspensão do contrato de trabalho. E o empregado deve apresentar-se a empresa. A sua não apresentação, ou a falta de comunicação quanto aos motivosde não o fazer pode acarretar em sua demissão por abandono de emprego.

Nesse sentido é o entendimento firmado pela Súmula n° 32 doTST (Res. 121/2003, DJ 19, 20 e21.11.2003):Presume-se o abandono de emprego se o trabalhador não retornar ao serviço no prazo de 30 (trinta) dias após a cessação do benefício previdenciário nem justificar o motivo de não o fazer.

Importa aqui destacar que o laudo medico-pericial emitido pelo INSS considerando o trabalhador apto é uma decisão que emana de um órgão público. Deste modo, considerado um ato administrativo e como tal, goza de presunção de legitimidade.

A decisão emitida pelo INSS suspenderia o beneficio e, automaticamente, o contrato de trabalho do trabalhador passaria a surtir todos os efeitos. Não havendo, portanto, justificativa para a recusa do empregador à reintegração do trabalhador as suas funções laborativas.

Contudo, por determinações normativas o empregador tem se recusado a reintegrar o trabalhador, nos casos em que o empregado é considerado inapto pelo laudo médico emitido pelo Médico do Trabalho.

Destaca-se que o sistema da Alta Programada não leva em consideração as condições subjetivas do trabalhador, ou seja, não se verifica o verdadeiro estado atual do trabalhador infortunado.

A Alta Programada funciona da seguinte forma, como explica Marcel Thiago de Oliveira:

“Na prática, a alta programada dá-se da seguinte forma: o trabalhador passa por uma perícia na qual o médico confronta o código da enfermidade ou lesão diagnosticada com o tempo estimado de permanência em gozo do benefício apresentado pelo programa de computador utilizado pela autarquia e que se baseia em estudos estatísticos de diagnóstico, tratamento e tempo de recuperação de milhares de benefícios concedidos, sendo lançado no sistema informatizado do INSS a data de alta do segurado e o consequente encerramento do benefício”.(OLIVEIRA APUD BONADIMAN, 2015)

Alcançada a data prevista, o sistema acusa a "capacidade" do beneficiário para retornar à sua atividade laborativa.

Na visão do Professor Carlos Alberto Vieira Gouveia (2015, p. 88)
"tal procedimento é odioso e perverso, posto que fere por completo o devido processo legal previsto no Art. 5º, inc.LV da CF88".

Diante de tal situação, fica a cargo do trabalhador, impedido de se reintegrar as suas funções na empresa, entrar com pedido de reconsideração junto ao INSS ou, por meio judicial, entrar com ação de reintegração ao trabalho.

2.4Recusa do Empregador àReintegração do Empregado ao Trabalho

No seu retorno a empresa, após ter sido considerado apto pelo laudo emitido pelo médico perito do INSS, o trabalhador é encaminhado ao médico do trabalho para uma avaliação, isso em razão da obrigatoriedade prevista na NR7 (Norma Regulamentadora7— Programa de Controle Médico e Saúde Ocupacional)ítem 7.4.3.3 e artigo 168 Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

Todo trabalhador regido pela CLT, sendo facultativo ao empregado doméstico, deve submeter-se aos exames médicos ocupacionais, sendo estes obrigatórios na admissão, no retorno, na demissão e periodicamente no curso do vínculo empregatício. Os custos dos exames são de responsabilidade do empregador.

Entendendo o médico do trabalho (contratado pela empresa) que o empregado está inapto para retornar as suas atividades laborativas, requerendo mais tempo para a sua recuperação, o trabalhador se encontra na situação do “emparedamento previdenciário”, ou seja, foi considerado apto pelo INSS e,deste modo, não faz mais jus ao benefício. E, por outro lado, considerado inapto pelo empregador,e impedido de se reintegraras suas funções, não fazendo jus ao salário.

Lembrando que, a decisão do perito INSS, é um ato administrativo e goza de presunção de legitimidade. Além dessa presunção, quesó pode ser afastada mediante provas contrárias, o perito do INSS, está amparado pela Lei n° 11.907/09. Já, o médico da empresa, pela NormaRegulamentadora 7 – Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional.

Assim, temos uma Lei Ordinária Federal que determina acompetência do perito médico do INSS quanto à “emissão de parecerconclusivo quanto à capacidade laboral para fins previdenciários” (art. 30, § 3º, I, daLei n° 11.907/09).E, por outro lado temos a Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-Lei n° 5.452/43) e uma Portaria do Ministério do Trabalho que determina a obrigatoriedade do exame médico, por conta do empregador nas situações já apontadas.

Informa ainda Fernando Paulo da Silva Filho (2015) que,no que concerne a responsabilidade do empregador, o art. 76-A do RPS (Decreto 3.048, de 6/5/99), prevê apenas a faculdade de a empresa protocolizar requerimento de auxílio-doença de seu empregado, não há na lei menção alguma conferindo qualquer obrigação no sentido de requerer prorrogação de benefícios e/ou reconsideração de decisões, nem de informar o empregado sobre a cessação de benefícios e/ou decisões do órgão previdenciário, por este motivo cabe ao empregado a iniciativa de buscar a manutenção de seu benefício que julga indevidamente cancelado pela autarquia previdenciária.

2.5Ilegalidade e Inconstitucionalidade da Alta Programada

A alta programada trouxe benefícios ao INSS, como a redução dos custos, contudo é evidente o prejuízo causado aos trabalhadores segurados.

Assim, é o que já se decidiu a Jurisprudência do TRF 1ª Região que:

“É ofensiva ao princípio da razoabilidade a conduta do INSS em presumir que as causas que ensejaram a incapacidade para o trabalho estariam superadas a contar de uma data previamente estimada, sem que realizado qualquer exame ao término do período inicialmente estipulado para a percepção do aludido benefício ou mesmo transferir para o segurado a responsabilidade de conseguir agendar uma nova data para perícia quando deficiente a máquina administrativa a ponto de ensejar a criação da alta programada”. (TRF 1ª Região – Processo na Origem: 105041218964 – Rel. Rosymayre Gonçalves de Carvalho, DJ em 02.04.2012, p. 249).(JUSBRASIL, 2015)

Por outro lado, como determina o art. 62 da Lei de Benefícios, o trabalhador que é beneficiado pelo auxílio doença é obrigado a realizar exames periódicos e participar do programa de reabilitação profissional prescrito e custeado pela Previdência Social, sob pena de ter o beneficio suspenso.

Depreende-se, da referida lei, que cabe a Previdência Social oferecer aos segurados incapacitados para o trabalho, por acidente ou por doença, os meios necessários para a reeducação ou readaptação profissional para o seu efetivo retorno ao mercado de trabalho. Isso demandaria o acompanhamento médico periódico do trabalhador até a sua reabilitação parcial ou total.

Já o § 2° do art. 78 do Decreto 3.078/99 determina que cumpre ao segurado contestara sua alta programada, no caso de discordardo laudo emitido pela autarquia por ocasião da data da cessação do beneficio. Logicamente que o trabalhador, no ato do Pedido de Reconsideração deverá portar um laudo médico que confronte com o laudo emitido pela autarquia previdenciária.

Ao se aplicar a Alta Programada não se leva em conta as condições subjetivas do trabalhador/contribuinte, como já apontado. Não se podendo pressupor que, após o prazo determinado no sistema, a incapacidade do trabalhador esteja superada, sem que uma nova perícia seja realizada.

Nesse sentido, já foi decidido pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região que a Alta Programada contraria os arts. 60 e 62 da Lei n° 8.213 /91 e os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. De acordo com o entendimento firmado pelo Egrégio Tribunal, conforme ementa colacionada:

“MANDADO DE SEGURANÇA. PREVIDENCIÁRIO. SUSPENSÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO SEM REALIZAÇÃO DE PERICIA PELA AUTARQUIA. COBERTURA PREVIDENCIÁRIA ESTIMADA (COPES) – ALTA PROGRAMADA. IMPOSSIBILIDADE. 1. Mandado de segurança interposto contra ato que determinou a cessação de auxílio-doença de titularidade do impetrado em razão de alta programada. 2. A alta programada contraria os arts. 60 e 62 da Lei 8213/91 e os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório. 3. O INSS deve convocar o segurado para nova perícia antes de suspender o benefício. Não é possível a suspensão sem ficar comprovado, através de perícia médica, que o segurado não está mais incapaz. 4. Apelação e remessa oficial,não providas”. (TRF-1 – AMS: 13020 MT 2007.36.00.013020-1, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MONICA SIFUENTES,Data de Julgamento: 09/05/2012, SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: e-DJF1 p.32 de 06/07/2012). (JUSBRASIL, 2015)

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O “limbo jurídico” que se apresenta o trabalhador, nesta situação específica, é resultado de um ato normativo ilegal e inconstitucional que inseriu a Alta Programada no âmbito da Previdência Social. E, ainda transferiu para o trabalhador hipossuficiente o ônus de provar que se encontra ainda incapacitado para voltar as suas funções laborativas.

2.7 Limbo Jurídico: Posições Jurisprudenciais

No que tange a recusa do empregador a reintegração do empregado ao trabalho, assim se decidiu o Tribunal Regional do Trabalho (TRT/SP, 2010):

“TRT/SP – Alta médica do INSS. Recusa do trabalhador pela empresa. Impossibilidade Data da publicação da decisão – 27/10/2010. PREVIDÊNCIA SOCIAL Auxílio-doença Alta médica do INSS. Recusa do trabalhador pela empresa. Impossibilidade. A alta médica é um ato administrativo e este goza de presunção de boa-fé e correção. Não pode o particular (empregador) descumprir o ato administrativo e impedir o acesso da trabalhadora ao trabalho e respectivos salários. Se a empresa entende que não deve receber o empregado nas suas dependências porque ainda está doente, deve questionar a alta médica no Juízo competente. E, até obter decisão favorável, deve pagar os salários do período. O que não se admite é que, diante da alta do INSS, com a cessação do benefício previdenciário e a recusa do empregador e ausência de salários, o empregado fique à própria sorte, sem obter sua subsistência de qualquer dos lados. Recurso ordinário não provido.” (TRT/SP – 00585200831202007 (00585200831202007) – RO – Ac. 3ªT 20101083593 – Rel. ANTERO ARANTES MARTINS – DOE 27/10/2010) (JUSBRASIL, 2015)

Este mesmo entendimento foi firmado pela decisão do Juiz Marcio Mendes Granconato em acórdão da 14ª Turma do TRT da 2ª Região:

“É responsabilidade da empresa, por ser seu o risco do empreendimento e também por conta de sua responsabilidade social, efetuar os pagamentos dos salários (art. 170, caput, da CF). Não lhe é dado suspender o contrato de trabalho unilateralmente e deixar o empregado sem salário por longos meses, sabendo que esta é sua única fonte de sustento. Se o empregado não tem condições de trabalhar e o INSS não lhe fornece o benefício previdenciário correspondente, é obrigação da empresa realizar o pagamento dos salários até que o trabalhador esteja saudável novamente ou obtenha aquele direito por parte da autarquia. O que não se pode admitir é que o empregado fique meses a fio sem pagamentos, porque isso fere sua dignidade enquanto ser humano. É da empresa os riscos do empreendimento (art. 2º, caput, da CLT) e, entre esses riscos, está o chamado (impropriamente) capital humano.” (Proc. 01999007620085020462 – Ac. 20111554190) (JUSBRASIL, 2015)

Em analise de casos, a 5ª Turma do TRT-MG, nos autos do Processo: 0000475-44.2011.5.03.0136 ED, entendeu que é da empresa essa responsabilidade, sustentando que o simples encaminhamento do empregado ao INSS não isenta o empregador de suas obrigações trabalhistas.

Por outro lado, se o empregado recebe alta do INSS e munido de atestado particular declara ao empregador que não tem condições de retornar as suas atividades laborativas, já se decidiuo TRT da 12ª Reg (Proc. 00436200926102000 – RO)que não há obrigação patronal de pagamento dos salários entre a alta previdenciária e o julgamento do pedido de reconsideração perante o INSS.

Este impasse, como já pontuado, não apresenta solução legislativa clara, restando para a jurisprudência e a doutrina a discussão de como devem as partes envolvidas lidar com o período de "limbo" onde o empregado tem alta do INSS, mas clinicamente não tem condições de trabalho.

Conclusão

Verifica-se que na Alta Programada, a capacidade ou incapacidade do trabalhador/contribuinte não é aferida, ou seja, não se leva em consideração as condições subjetivas do trabalhador, tratando-se de uma lei essencialmente voltada para os interesses da Autarquia, o que vai de encontro aos princípios constitucionais, em especial o princípio maior, o princípio da dignidade da pessoa humana dos quais derivam vários outros princípios.

Diante do exposto, resta claro que a Alta Programada é ilegal e inconstitucional, pois contraria a Lei de Benefícios e fere os direitos fundamentais dos trabalhadores/contribuintes. E mais, vem trazendo insegurança jurídica não só para os trabalhadores, mas também para os empregadores.

Por outro lado, se olharmos sob a ótica da legalidade do exame admissional, o empregador pode recusar-se a reintegrar um trabalhador às suas funções se for comprovado pelo Médico do Trabalho que o profissional ainda se encontra incapacitado. Essa medida, embora tenha sido vista como descaso por parte do empregador com relação a situação doempregado, não visa somente o prejuízo que pode advir da sua baixa produtividade, mas ele preserva também a saúde do trabalhador que pode se agravar ainda mais. O que, consequentemente, trará problemas maiores para o empregador.

Relevante apontar também que embora uma Lei Ordinária seja hierarquicamente superior a uma Portaria do Ministério do Trabalho (Norma Regulamentadora 7), o empregador se vê em uma situação também complexa.Em regra, atestada a capacidade do trabalhador pelo INSS, o empregador não poderia recusar-se a reintegrá-lo as suas funções, mas não se pode exigir do empregador que aceite um empregado comprovadamente incapacitado para exercer as funções para a qual foi contratado.

Entendemos que cumpre a Jurisprudência resolver definitivamente a questão do emparedamento previdenciário, visto ser uma questão que fere os direitos fundamentais dos trabalhadores, tendo em vista a nítida ilegalidade e inconstitucionalidade do ato normativo que deu origem a Alta Programada no âmbito da Previdência Social.

Referências
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VIEIRA GOUVEIA, Carlos Alberto. Benefício por Incapacidade e Perícia Médica. 2ª edição Revista e Atualizada, 2015.

Informações Sobre o Autor

Marcos Rogério de Oliveira

Advogado. Graduado pela Faculdade FBCJ/RJ. Pós graduando em Direito da Seguridade Social pela Faculdade Legale


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