Resumo: Trata a presente pesquisa de análise aos aspectos sigilosos dos dados bancários, bem como das teorias que ampararam sua proteção em nosso ordenamento jurídico, concluindo pela sua relativização quando da entrada em vigor da Lei complementar 105/2001.
Palavras-chave: sigilo bancário, lei complementar 105/2001, teorias
Sumário: 1. Sigilo Bancário: conceito e teorias. 2. Sistema jurídico: o descompasso entre a teoria e a prática. 3. A relativização do sigilo e a interpretação do texto constitucional. Conclusão. Referência bibliográfica.
1. Sigilo Bancário: conceito e teorias.
Conforme preceitua De Plácido e Silva[1], sigilo bancário consiste “no comportamento ético que se exige das instituições financeiras tocante à preservação, perante terceiros, dos dados que disponham acerca dos clientes”.
Para Covello[2], o sigilo bancário é a “obrigação que têm os bancos de não revelar, salvo justa causa, as informações que venham a obter em virtude de sua atividade profissional”.
Esse sigilo, na ótica do Direito Bancário, no entanto, passa do mero dever para fundamentar-se na própria relação de confiança entre as partes que, na visão de Aramy Dornelles[3], consiste na alma do negócio e condição intrínseca ao sucesso profissional do banqueiro.
Essa obrigatoriedade do sigilo dos dados e informações ganhou especial proteção na órbita do Direito Bancário, ainda que assegurado constitucionalmente, em razão do caráter protetor e regulador do Direito.
Isto porque o Direito objetiva estabelecer as regras de convivência dos indivíduos na sociedade e estas, algumas vezes, encontram dificuldades de se coadunarem com a prática comercial. Ou seja, embora o texto constitucional preveja que os dados são invioláveis, conforme se verá adiante, há que se sopesar os interesses envolvidos em cada caso concretamente.
O objeto de estudo, Lei Complementar n° 105/2001, conforme dicção legal, consiste na obrigação imposta às instituições financeiras e/ou equiparadas a conservar sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.
De se ressaltar que, para efeito do objeto do estudo, instituições financeiras são as constantes no rol do artigo 1° da Lei Complementar n° 105, de 10 de janeiro de 2001, dentre as quais se destacam os bancos de qualquer espécie. Vejamos:
“Art. 1o As instituições financeiras conservarão sigilo em suas operações ativas e passivas e serviços prestados.
§ 1o São consideradas instituições financeiras, para os efeitos desta Lei Complementar:
I – os bancos de qualquer espécie;
II – distribuidoras de valores mobiliários;
III – corretoras de câmbio e de valores mobiliários;
IV – sociedades de crédito, financiamento e investimentos;
V – sociedades de crédito imobiliário;
VI – administradoras de cartões de crédito;
VII – sociedades de arrendamento mercantil;
IX – cooperativas de crédito;
X – associações de poupança e empréstimo;
XI – bolsas de valores e de mercadorias e futuros;
XII – entidades de liquidação e compensação;
XIII – outras sociedades que, em razão da natureza de suas operações, assim venham a ser consideradas pelo Conselho Monetário Nacional.
§ 2o As empresas de fomento comercial ou factoring, para os efeitos desta Lei Complementar, obedecerão às normas aplicáveis às instituições financeiras previstas no § 1o.”
Parte da doutrina trata referido dever como “dever de conduta de conteúdo negativo”, haja vista o detentor das informações ter que se abster de revelá-las a qualquer outra pessoa.
Essa obrigação tratada na norma não se destina ao beneficiário da norma, mas sim ao banqueiro ou instituição financeira detentora dos dados, vez que sobre estes recai a obrigatoriedade de manter o sigilo em benefício e salvaguarda de seus clientes.
Em função da norma se destinar às instituições financeiras, há quem afirme que o sigilo em questão corresponde, na verdade, ao sigilo decorrente do exercício da profissão[4]. Esta espécie de sigilo, no dizer de De Plácido e Silva[5], consiste no “segredo ou fato cuja ciência se teve em razão de profissão, ou em pleno exercício de uma atividade profissional, em virtude do que se está no dever de não o revelar”.
Esse entendimento, inclusive, encontra guarida em uma das teorias que fundamentam a necessidade de guarda e sigilo das informações, comumente tratada no campo do Direito Bancário, as quais passamos a analisar neste momento[6].
As teorias que tratam do fundamento do sigilo bancário visam definir os interesses por ele tutelados e, com isso, delimitar seu sentido e abrangência no direito brasileiro. São elas: a teoria contratual; a extracontratual; a legal; a que o relaciona com o direito à intimidade; a do segredo profissional e a mercantil.
A primeira fundamenta o sigilo no pacto de depósito firmado entre o cliente e a banca, ao passo que a segunda o fundamenta segundo a responsabilidade do banco pelos danos causados injustamente ao cliente quando da revelação culposa dos dados de titularidade deste.
A terceira teoria, por sua vez, fundamenta o sigilo e a necessidade de proteção dos dados em razão de a proteção estar prevista na legislação vigente, ou seja, simplesmente por observância à norma positivada.
Diferentemente, pela quarta teoria, o sigilo bancário se justifica pelos preceitos fundamentais contidos na Constituição Federal, mormente o direito à intimidade, enquanto a quinta teoria o fundamenta no livre exercício da profissão e nos dispositivos penais relativos à inviolabilidade do segredo oriundo de ofício ou profissão[7].
Sobre a relevância do segredo profissional do banqueiro, Nelson Hungria[8] destaca que:
“Dizia Kant que, para aferir-se da moralidade ou imoralidade de um fato, o melhor critério era imaginá-lo, hipoteticamente, transformado em norma geral de conduta: se a vida social ainda fosse possível, o fato é moral; do contrário, é imoral. A antinomia de um fato humano com a moral positiva está na razão direta de sua nocividade social. É bem explicável, portanto, que entre as ações imorais que, por sua maior gravidade, constituem o injusto penal, figure a violação do segredo profissional. Se fosse lícita a indiscrição aos que, em razão do próprio ofício ou profissão, recebessem segredos alheios, estaria evidentemente criado um entrave, muitas vezes insuperável, e com grave detrimento do próprio interesse social, à debelação de males individuais ou à conservação e segurança da pessoa.”
Por fim, a sexta e última teoria sustenta que o sigilo bancário, na realidade, surgiu e se consolidou em razão da boa-fé e da confiança mútua que regiam os negócios e as relações comerciais travadas ao longo do tempo.
Segundo esta teoria, o sigilo bancário estaria intimamente ligado à lex mercatoria e ao direito consuetudinário.
Em que pesem as teorias supramencionadas, críticas ao posicionamento por elas adotado surgiram com a doutrina, a qual listou pontos desfavoráveis tal como os a seguir mencionados. Segundo a doutrina, a teoria contratual não se sustenta em virtude de a responsabilidade na guarda das informações também se aplicar às relações pré e pós contratuais, não se limitando ao contrato formalizado.
No que se refere à segunda teoria, a extracontratual, a objeção decorre do fato de esta teoria não analisar o fundamento em si, mas apenas as conseqüências pelo descumprimento do dever de sigilo. Do mesmo modo, a terceira teoria, que fundamenta o sigilo em razão de sua previsão legal, não enfrenta a questão em si, mostrando-se superficial.
A crítica relativa à quarta teoria decorre da interpretação dada ao texto constitucional, haja vista este ter tido seu campo de incidência ampliado sem que fossem observados, de fato, os limites que envolvem o sigilo e o direito à intimidade.
No entendimento de Barbeitas[9], os limites do sigilo bancário seriam muito mais amplos que os limites do direito à intimidade, pois, além de abrangerem os interesses privados, também se relacionam com os interesses de cunho publicista.
Com relação à teoria do segredo profissional, a crítica se pautou no fato de os dispositivos penais relacionados à inviolabilidade do segredo se destinarem aos profissionais em geral, sem a observância ao direito de reserva das instituições financeiras e tampouco da possibilidade de se destinarem à proteção de interesses privados ou mistos, não abrangidos na atividade comercial.
Em sentido oposto à teoria legal, a crítica relativa à teoria mercantil decorre do fato de que sua aplicabilidade e reconhecimento somente se daria nos países em que não houvesse dispositivo legal, haja vista pautar-se no direito consuetudinário e práticas comerciais que ao longo do tempo foram tidas como obrigatórias[10].
Dentre as teorias mencionadas, o Direito Brasileiro adotou a teoria que relaciona o sigilo ao direito à intimidade, tal como se verifica na decisão do Supremo Tribunal Federal:
“Mandado de Segurança. Tribunal de Contas da União. Banco Central do Brasil. Operações financeiras. Sigilo. 1. A Lei Complementar nº 105, de 10/1/01, não conferiu ao Tribunal de Contas da União poderes para determinar a quebra do sigilo bancário de dados constantes do Banco Central do Brasil. O legislador conferiu esses poderes ao Poder Judiciário (art. 3º), ao Poder Legislativo Federal (art. 4º), bem como às Comissões Parlamentares de Inquérito, após prévia aprovação do pedido pelo Plenário da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do plenário de suas respectivas comissões parlamentares de inquérito (§§ 1º e 2º do art. 4º). 2. Embora as atividades do TCU, por sua natureza, verificação de contas e até mesmo o julgamento das contas das pessoas enumeradas no artigo 71, II, da Constituição Federal, justifiquem a eventual quebra de sigilo, não houve essa determinação na lei específica que tratou do tema, não cabendo a interpretação extensiva, mormente porque há princípio constitucional que protege a intimidade e a vida privada, art. 5º, X, da Constituição Federal, no qual está inserida a garantia ao sigilo bancário. 3. Ordem concedida para afastar as determinações do acórdão nº 72/96 – TCU – 2ª Câmara (fl. 31), bem como as penalidades impostas ao impetrante no Acórdão nº 54/97 – TCU – Plenário.” (grifo meu) (MS n. 22801/DF – Distrito Federal, Supremo Tribunal Federal, Tribunal Pleno, Rel. Min. Menezes Direito, j. 17/12/2007, votação unânime).
O fundamento constitucional para o entendimento do Supremo Tribunal Federal advém da interpretação dos direitos fundamentais arrolados no artigo 5° da Constituição Federal, sobretudo o princípio da dignidade humana e o direito à intimidade.
Ademais, na medida em que o caráter do sigilo bancário desenvolve-se sob duas dimensões, uma vertical – relativa ao sigilo frente aos interesses do Estado, sendo de cunho publicista – e uma horizontal – relativa ao sigilo frente aos interesses dos indivíduos, de cunho civilístico – o segredo das informações passou a ser tratado no direito bancário sob dois aspectos: o que se relaciona à própria pessoa e o que se relaciona à estrutura do Ente público.
Com relação à necessidade de se ponderar os interesses para adequação da norma, preceitua Ricardo Lobo no prefácio da obra de André Barbeitas[11] que:
“(…) o fundamento dos direitos individuais é a preservação da dignidade humana e sob este prisma é que o sigilo bancário há de ser dimensionado – ainda que constituíssem informações bancárias expressão inconteste do direito à intimidade, como os indivíduos vivem em comunidade, é imprescindível superar a multiplicidade de interesses envolvidos (…)”
Esse entendimento, de que o sigilo bancário abrange interesses privados foi, inclusive, ratificado pelo Supremo Tribunal Federal quando este assentou que o sigilo bancário é uma espécie de direito à privacidade, inerente à personalidade das pessoas[12].
2. Sistema jurídico: o descompasso entre a teoria e a prática.
Embora se entenda que o Direito como ciência consiste em um sistema único e organizado, capaz de abranger a toda e qualquer situação fática, independentemente de estar previsto em lei ou não, é evidente a discrepância entre a teoria e a prática.
Isto porque, ainda que, conceitualmente a Constituição Federal seja o parâmetro para toda e qualquer outra norma, definindo a estrutura de nosso sistema e a validade das demais normas surgidas, atualmente se verifica uma insurgência do que Paulo Quezado e Rogério Lima[13] denominam “era das magnas normas infraconstitucionais”.
Tal fato se deve à constante inversão de ordem hierárquica de nosso sistema, pelo qual se aceitam as normas infraconstitucionais e leis complementares como constitucionais, apenas buscando sua validação por meio da adequação às normas constitucionais ao texto naquelas disposto, quando, na essência, deveríamos adequar as normas infraconstitucionais à Constituição Federal.
Assim, mister se faz a análise do texto constitucional para verificar a real extensão da expressão “sigilo” e, com a definição do gênero, alcançar suas espécies, dentre as quais o sigilo bancário faz parte.
3. A relativização do sigilo e a interpretação do texto constitucional.
Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, o legislador estabeleceu hipóteses permissivas para a quebra do sigilo bancário desde que as informações fossem requeridas pelo Poder Judiciário. Tal fato acabou por relativizar o caráter absoluto do sigilo bancário.
Essa relativização, oriunda da interpretação dada ao texto constitucional, estaria intimamente ligada à inviolabilidade dos dados que, conforme acentua Barbeitas[14], teria realocado o tema para a ordem constitucional.
Contudo, ainda que possível, a quebra, além de ser justificada, deveria se enquadrar nas hipóteses previstas no texto constitucional sob pena de ferir os direitos à intimidade e à privacidade dos indivíduos e, com isso, sujeitar os autores do dano à indenização em favor do prejudicado.
Isto porque o sigilo bancário representa uma garantia do cidadão de que este poderá ter, usar e gozar do que é seu reservadamente, sem sofrer devassas e perseguições de curiosos, invejosos e tiranos[15].
Com relação aos limites aplicáveis ao sigilo bancário, haja vista sua vinculação aos princípios constitucionais, assevera Arnold Wald[16] que estes estariam em conformidade com os direitos da personalidade. Vejamos:
“(…)o sigilo bancário encontra proteção constitucional no Direito Brasileiro, dentro dos limites em que se caracteriza como um verdadeiro direito da personalidade, que resguarda os aspectos econômicos do chamado direito à intimidade e à vida privada.”
Dessa forma, em consonância com os demais princípios que regem nosso direito, em especial os direitos fundamentais, a divulgação de informações de caráter sigiloso que violem o direito à intimidade ou à vida privada enseja a responsabilidade daquele que divulgou em razão do dano causado.
Há que se ressaltar, no entanto, que este dano não pode ser oposto ao detentor das informações se estas somente foram reveladas mediante cumprimento de determinação judicial. Isto porque o inciso XII, do artigo 5° da Constituição Federal, é expresso quanto à chamada reserva de jurisdição, segundo a qual informações não são oponíveis ao Poder Judiciário quando por ele são requeridas.
Esta reserva está ligada ao próprio conceito de Jurisdição que, segundo De Plácido e Silva[17], consiste nas atribuições conferidas aos magistrados, observada a extensão desta e os limites do poder de julgar.
Assim, nos casos em que a competência permite ao magistrado a determinação de quebra de sigilo, as instituições financeiras não poderiam se opor ao cumprimento de tal ordem. No entanto, antes de tais considerações, mister se faz analisar, sob dois aspectos, a extensão dada ao preceito fundamental em referência.
O primeiro aspecto consiste na inexistência de expressa menção ao sigilo bancário no texto constitucional, vez que o artigo 5° trata apenas de inviolabilidade dos dados transferidos em comunicação.
Nesse sentido, para alcançar a extensão dada por nossos Tribunais, melhor se faz a releitura do texto constitucional para a inclusão do sigilo de dados na expressão “comunicação de dados”. Com relação a esta releitura, destaca-se o pensamento de Alexandre de Moraes[18], pelo qual “o preceito que garante o sigilo de dados engloba o uso de informações decorrentes da informática” e que esta nova forma de armazenamento e transmissão de dados deve observar os direitos fundamentais constantes na Carta Magna.
Com relação ao segundo aspecto, há que se observar que inexiste na Magna Carta previsão legal para a reserva da jurisdição no caso de requisição de informações bancárias. Ou seja, não há autorização expressa para a quebra do sigilo dos dados em razão de determinação judicial, mas apenas a quebra das comunicações telefônicas. Vejamos:
“Art. 5°. (…)
XII – é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.” (grifo meu)
Considerando-se a falta de previsão para a quebra do sigilo, oportuno destacar o entendimento de Cláudio Lembo[19], pelo qual, ainda que o inciso XII do artigo 5° da Constituição Federal objetivasse conferir garantia constitucional aos meios de comunicação individuais, ou seja, de pessoa para pessoa, empregando a mesma confidencialidade das correspondências em papel às transmitidas por fax, internet, vídeos, áudios, telefones ou qualquer outra forma de comunicação, a autorização judicial somente alcançaria as comunicações telefônicas.
Tal fato se deve por se colocar como mais uma garantia à privacidade da vida íntima o segredo da correspondência ou das comunicações particulares[20].
Esta garantia, a seu turno, estaria ligada à elementos integrantes e substanciais da individualidade de cada pessoa, inclusive pessoa jurídicas, podendo ser concebida em três esferas: a esfera íntima, a esfera privada e a esfera individual.
A esfera íntima corresponderia ao grau mais pessoal de cada um, aquele em que as informações não são compartilhadas nem com os familiares, mas podendo, eventualmente ser compartilhada com companheiro ou companheira. A esfera privada, por sua vez, englobaria a vida da pessoa com seus graus de parentesco mais próximos, bem como a vida social desta, ao passo que a esfera individual corresponderia às particularidades individuais como o nome, imagem, entre outros.[21]
Contudo, ainda que tenham surgido críticas e debates ao alcance da norma, pacificou-se na jurisprudência o entendimento de que os dados informáticos, sob os quais se inserem os dados relativos às transações bancárias, são passíveis de quebra mediante cumprimento à ordem judicial haja vista o dispositivo constitucional tratar apenas de duas hipóteses para a concessão de sigilo.
Dessas hipóteses, apenas a primeira, relativa à correspondência e comunicações telegráficas manteria seu caráter absoluto, podendo a segunda hipótese, relativa ao sigilo dos dados e das comunicações telefônicas, sofrer relativização.
Esse posicionamento foi, posteriormente ratificado com a entrada em vigor da Lei Complementar n° 105/2001, que trata especificamente da guarda do sigilo bancário pelas instituições financeiras.
Essa lei surgiu para regular a atividade das instituições financeiras face à necessidade de guarda das informações cadastrais e operacionais dos clientes, abordando as hipóteses permissivas para quebra do sigilo das operações nos artigos 3º e 4º.
Os casos previstos no § 3°[22] e 4º do artigo 1° do referido diploma legal, excepcionam o sigilo nos casos em que o fornecimento de dados se dá em razão de comunicação aos órgãos reguladores, com expresso consentimento dos interessados e apuração de ilícitos, os quais, sobretudo, mas não exclusivamente, se referem aos casos de terrorismo; tráfico ilícito de substâncias entorpecentes ou drogas afins; de contrabando ou tráfico de armas, munições ou material destinado a sua produção; de extorsão mediante seqüestro; contra o sistema financeiro nacional; contra a Administração Pública; contra a ordem tributária e a previdência social; lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, direitos e valores, bem como praticado por organização criminosa.
Contudo, ainda que a lei em questão tenha surgido para regular as hipóteses em que o fornecimento de dados não configura quebra do sigilo pelas instituições financeiras, importante verificar que, segundo Nelson Abrão[23], a relativização do modelo destinado ao sigilo bancário decorre da necessidade de o Estado conhecer dados específicos e rastrear informações a fim de manter sua segurança e combater a macrocriminalidade organizada e objetiva “normatizar regras de conduta que situem a lavagem de dinheiro e coibir o grande acesso de valores incomprovados que circulam livre e impunemente”.
CONCLUSÃO
Por fim, observa-se que, dentre as teorias que justificam a necessidade de proteção às informações, a que mais se coaduna com o nosso ordenamento jurídico é a que estendeu a interpretação dos dispositivos constitucionais, atrelando ao direito à intimidade e à privacidade o não fornecimento de dados solicitados sem intermédio do Poder Judiciário.
Contudo, em virtude do próprio descompasso entre a teoria e a prática, tendo o texto constitucional a interpretação atualizada para alcançar as necessidades da vida moderna, mecanismos de regulação – como a Lei Complementar nº 105/2001 – foram criados para relativizar a proteção antes conferida.
No entanto, embora as informações bancárias sejam interpretadas como expressão e extensão do direito à intimidade, estas devem ser sopesadas para se adequarem à realidade e aos interesses envolvidos no caso particular.
Informações Sobre o Autor
Sandra Rose de Mendes Freire e Franco
Advogada em São Paulo. Pós graduanda na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUCSP