Inclusão do nome dos consumidores nos cadastros de proteção ao crédito é imoral, arbitrária e ofende princípios constitucionais consagrados

Resumo: O presente artigo tem por objetivo, analisar a tese de que a inclusão do nome dos consumidores nos cadastros de proteção ao crédito, jamais poderia ocorrer, sem a derrogação dos dispositivos constitucionais consagrados, notadamente o que dispõe sobre o direito ao nome, pelo fato deste ser inalienável, indisponível, irrenunciável e intransmissível, assumindo o status de cláusula pétrea da nossa Carta Magna.


Palavras chave: Ofensa. Dignidade. Arbitrariedade. Auto-tutela. Direito ao Nome. Cadastros. Inadimplência. Omissão. Simetria.


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Exposição de motivos


Ao presidir as audiências de conciliação na esfera do Procon de Juiz de Fora MG, o autor pode perceber a angústia dos consumidores que de forma reiteradas, pediam socorro ao Órgão, com fito de se pôr fim a autotutela exercida pelos “legitimados” cadastros de proteção ao crédito. Inconformado com a arbitrariedade exarada dos mesmos, bem como assumindo o dever institucional de quebrar tal paradigma, foi o que levou o autor a debruçar nesta nobre causa em prol da massa consumidora.


Ao afirmar que o artigo 43 do CDC, viola princípios constitucionais consagrados e por via de consequência desequilibra as relações de consumo, tal assertiva encontra amparo nos direitos personalíssimos. A tônica adotada para o deslinde da questão a ser abordada, é inerente ao risco da atividade que os fornecedores se propõem a exercer por ocasião do seu empreendimento, ou seja, o inadimplemento, que jamais poderá ser repassado para os consumidores num contexto coletivo, sob pena de afronta a segurança jurídica que alicerça as relações de consumo.


Portanto, até mesmo uma regularização dos cadastros, não será uma tarefa fácil para nossos renomados legisladores, tendo em vista que temos uma Constituição rígida e que no rol das cláusulas pétreas, temos os direitos da personalidade, que fôra regulamentados pelo artigo 11 do Código Civil de 2002 e um dos mais importantes, é sem dúvida o direito ao nome, e por esta razão, inviabiliza qualquer tentativa de regularização dos cadastros, pelo fato dos mesmos afrontarem os direitos da personalidade.


1 – INTRODUÇÃO


O presente artigo foi elaborado com o objetivo de trazer algumas explicações sobre a necessidade de uma regulamentação, ou mesmo a extinção dos cadastros de proteção ao crédito,na forma em que os mesmos se encontram, uma vez que os mesmos ofendem frontalmente a dignidade da pessoa humana, violando dispositivos constitucionais elencados no artigo 11 do Código Civil de 2002, notadamente o direito ao nome.


O cerne da discussão nos remete à Lei nº 8.078/90, precisamente ao artigo 43, que reconhece a existência dos Bancos de Dados e Cadastros de Consumidores. No parágrafo 3º do citado artigo 43, o legislador descreveu outras condutas e definiu como prerrogativa dos consumidores a exigência da correção em caso de inexatidão na inclusão, que deverá ser imediata, ficando o arquivista responsável pela comunicação ao fornecedor que deu origem a inclusão, sendo certo que tal prazo é de 5 dias. Como inexato é um conceito amplo e ambíguo e por essa razão requer uma interpretação extensiva de modo a lançarmos o manto protetor à massa consumidora por ocasião da sua vulnerabilidade e hipossuficiência, concluímos que inexato, pode ser interpretado como algo contrário à lei, aos princípios basilares que revestem a Constituição Federal, bem como aquilo contrário aos direitos da personalidade, dado sua indisponibilidade.   


Neste diapasão fica nítido que toda inclusão está eivada de vício de nulidade, uma vez que é flagrantemente comprovada a ofensa ao Princípio da Supremacia Constitucional, bem como, o Princípio da Simetria, posto que, os direitos que ornamentam a personalidade vêm sendo colocados em xeque, quando da sua inclusão nos cadastros de proteção ao crédito, uma vez que, além de ofender a dignidade da pessoa humana, viola os princípios Constitucionais supracitados.


Noutro prisma, devemos ter em mente que, resta comprovado através da elucidação dos fatos, que independente do inadimplemento, todos os consumidores que hoje figuram nesses “cadastros de proteção ao crédito” estão sendo injustiçados por tal medida arbitrária, até porque a quem interessar o adimplemento, terá à sua disposição à tutela Estatal via ação de cobrança, o contrário, seria querer fazer justiça com as próprias mãos, o que sabemos, é vedado em nosso ordenamento jurídico que não permite o exercício arbitrário das próprias razões, tanto assim que tipificou como crime previsto no artigo 345 do CP. Assim, não podemos suprimir ou reduzir as garantias Constitucionais consagradas, sob pena, de convalidarmos o erro e por via de consequência fazermos apologia à insegurança jurídica neste País.


Para conhecermos melhor tal prática, remetemo-nos ao ordenamento jurídico onde certificamo-nos não haver previsão para tais cadastros, e sim, uma perigosa permissibilidade, uma vez que foram estes impostos pela classe dominante, que quer mandar na “coisa” pública sem aparecer e acaba por cometer abusos deste tipo, embalada pela omissão de quem teria o dever institucional de proteger a dignidade da pessoa humana, os quais optaram por colocar uma venda nos olhos e concordar com a eternização das oligarquias. Tanto é fato, que nada fizeram quando da inserção do artigo 43 no Código de Defesa do Consumidor, instituto que afronta todos os Princípios Constitucionais consagrados e por via de consequência é eivado de vícios de Constitucionalidade. Há que se perguntar; porque tal dispositivo ainda não foi atacado por uma ação direta de inconstitucionalidade – ADIN.


A análise do tema ora proposto nos induz a avançar, para colher e produzir informações que ajudem o operador do direito a concluir, pela inadmissibilidade da inclusão do nome de consumidores nos cadastros de proteção ao crédito, pelo simples fato, dessa medida, não possuir previsão expressa no ordenamento jurídico, e ainda, suprimir direitos personalíssimos, cobertos pela “manta” Constitucional. Direitos estes, inerentes à pessoa humana, notadamente o direito ao nome, à intimidade, inseridos em um contexto de cláusulas pétreas. O fato é que, muito embora sabemos, que esta prática perniciosa, se eterniza com o decurso do tempo, isso não quer dizer que há a convalidação do erro.


Parafraseando nosso renomado Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva, é sinal que nunca na história desse País, alguém se propôs a debruçar numa causa tão nobre quanto esta, em prol da maioria dos cidadãos brasileiros que clamam por justiça e sem burocracia. Na medida em que o artigo 43 do CDC autoriza os cadastros e fornecedores, a negativar o nome dos consumidores, a estes não haverá outra saída senão inflar o Poder Judiciário, com ações cautelares de modo a cessar a lesão a direitos personalíssimos e consequentemente burocratizando e judicializando as relações de consumo por ocasião do iminente desequilíbrio contratual. E mais, para determinados trabalhadores – como é o caso dos bancários-, esta negativação pode até mesmo resultar em resilição do contrato de trabalho por justa causa, com base no artigo 508 da CLT. Um absurdo, mas ainda permanece esta anomalia na legislação protetiva do trabalho.


É angustiante para todo consumidor, ficar na expectativa, quando da espera de suas faturas mensais de serviços essenciais para uma vida digna e ter que se deparar com cobranças indevidas, que em regra, os fornecedores já fazem em pequenos valores, para desestimular uma demanda por parte do consumidor acabando estes, por preferirem o adimplemento de tais faturas, corroborando para o enriquecimento sem causa de fornecedores inescrupulosos, que repassam parte de suas supostas despesas com o empreendimento, para que a massa consumidora venha patrocinar. Isso é uma vergonha Nacional e não merece prosperar. O Estado jamais pode dar as costas à massa consumidora conferindo privilégios para classe dominante sob pretexto de evitar inadimplência, até porque, esta é inerente a qualquer empreendimento. Quem não quer arcar com a inadimplência, que passe a fidelizar melhor sua clientela, sendo fiel a esta e prestando serviço com um custo razoável, produtos de qualidade capazes de atender aos anseios do consumidor e não se limitar a esconder sob os “Cadastros de Proteção ao Crédito” que violam a dignidade da pessoa humana.


O fato é que, diante da omissão ou mesmo por ausência de sensibilidade por parte de quem teria a obrigação de reconhecer o sofrimento alheio! O que se vê, são cidadãos implorando por justiça ao não concordar com a arbitrariedade dos cadastros de proteção, por estarem inseridos neste contexto, acabando por ficarem excluídos da sociedade, na condição de destinatário de uma espécie de pena de banimento, imposta por esse “tribunal de exceção” popularmente conhecido por “SPC” e “SERASA”.


Ousamos afirmar, que em muitos casos, os legitimados na defesa da população, se acovardam diante das pressões sofridas da classe dominante, pouco se importando com o clamor pela igualdade social, por uma sociedade mais igualitária, pela preservação da dignidade da pessoa, além da extinção dos famigerados “cadastros de proteção ao crédito”.


Por outro lado, não podemos perder de vista que a última palavra em relação aos conflitos oriundos das relações de consumo cabe ao Poder Judiciário que têm o dever institucional de prezar pela tutela da massa consumidora, aplicando os dispositivos constitucionais e infraconstitucionais. Assim, não nos restam dúvidas de que o procedimento adotado em face de eventual inadimplemento dos consumidores, também deverá ser norteado pelos princípios constitucionais, garantidores de um processo digno (devido processo legal e ampla defesa). Por vezes, nos deparamos com uma interpretação tendenciosa por parte dos fornecedores e cadastros, ao interpretar de forma conveniente e equivocada, o disposto no artigo 43 do Consagrado Código de Defesa dos Consumidores, e não se diga que essa tendência se curvaria aos interesses dos consumidores!


Sem sombra de dúvidas, as análises realizadas pelo presente trabalho não esgotam o tema, outrossim, levantam questões importantes para que o Estado-juiz possa oferecer a referida tutela jurisdicional com a máxima efetividade e observância aos princípios que norteiam a matéria.


2 – CRIMES CONTRA A MASSA CONSUMIDORA. CLASSIFICAÇÃO E ELEMENTOS DO TIPO.


O crime que ora recebe a “nomenclatura” de crime contra a massa consumidora, na exposição do presente trabalho, pode está caracterizado no artigo 345 do Código Penal, por ocasião do exercício arbitrário das próprias razões. O bem jurídico tutelado pelo referido artigo, é o direito ao nome implícito no conceito de dignidade da pessoa humana constitucionalmente assegurado, que no seu bojo, prevê a inalienabilidade, indisponibilidade, irrenunciabilidade e intransmissibilidade.


Além disso, temos como impenhorável o nome da pessoa jurídica. Desta feita, para a consumação do crime de exercício arbitrário das próprias razões, consubstanciado no artigo 345 do CP, bastaria a configuração de uma das mencionadas condutas direcionadas aos fornecedores e cadastros, quais sejam: o envio do nome para o cadastro de proteção ao crédito, bem como os cadastros darem publicidade ao mesmo, uma vez que é ausente a preocupação com os efeitos devastadores da dignidade da pessoa humana, ao conferir aos inadimplentes, uma espécie de “atestado de óbito civil temporário”, já que em regra, o cidadão fica praticamente “engessado” em relação aos atos da vida civil, o que beira ao absurdo.


Todos esses aspectos, conquanto assaz relevantes, não cabem na perspectiva deste trabalho, sob pena de se estender demasiadamente o mesmo, portanto, nos ateremos a algumas peculiaridades do trabalho exposto, acerca do que vem ocorrendo desde os “primórdios”, ou seja, o que se verifica, é uma total concessão de créditos de forma completamente irresponsável, o que certamente contribui para o superindividamento e consequentemente o crescimento alarmante do índice de inadimplência, popularmente conhecido como “calote”, muito embora esta situação por si só, não justifica a suposta prerrogativa que os fornecedores e cadastros possuem, ao jogar no “lixo” o nome dos consumidores.


A celeuma sobre a tese defendida, desde fevereiro de 2009 por ocasião da percepção das angústias sofridas pelos consumidores ao terem seus nomes inseridos neste contexto, foi reacendida recentemente, uma vez que o Senado Federal, que já teria aprovado projeto de lei do Senador Paulo Paim[1] versando sobre crime, utilizar dos cadastros, para efeito de contratação e demissão (A consulta a cadastro de inadimplentes como parte de processos de contratação de trabalhador poderá ser proibida, conforme proposta aprovada pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ). A medida visa impedir prática discriminatória e limitativa de acesso a emprego. (grifo) O texto legal em vigor (Lei 9.029/95) já prevê que sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade não podem motivar discriminação. O projeto (PLS 465/09) acolhido na CCJ, do senador Paulo Paim (PT-RS), amplia esta lista, incluído como crime “utilizar informações constantes de banco de dados ou cadastro de inadimplentes para fins de admissão ou rescisão de contrato de trabalho”. Na justificativa do projeto, o senador afirma que “se um candidato, inserido no cadastro de proteção ao crédito e assim penalizado por deixar de honrar com suas obrigações financeiras em razão do desemprego, é desclassificado à vaga de emprego em razão do não-cumprimento destas obrigações, acabará sofrendo uma dupla penalidade”. Paim argumenta ainda que, será exatamente o novo emprego que possibilitará a essa pessoa se tornar adimplente.


Não bastasse o cadastro negativo, os que defendem a permanência dos mesmos, não satisfeitos, ainda acionaram seus representantes no Senado Federal, tentando impor “goela” abaixo dos consumidores, o cadastro positivo, através da inserção do parágrafo sexto no artigo 43 do CDC, o que também não merecia prosperar e de fato não prosperou. Quanto ao projeto irresponsável de Cadastro Positivo, insta salientar que também deverá ser atacado por uma ADIN, caso o mesmo venha se efetivar, até porque se essa lei vir à tona, também limitará créditos para pessoas honestas e que não estão inseridas nos cadastros positivos, nem mesmo nos negativos, por nunca terem se socorrido ao crédito, pelo simples hábito de comprar à vista, portanto, por seu caráter discriminatório, não deve prosperar.


Salienta-se por derradeiro que após o envio através de e-mail, do conteúdo deste artigo “publicado” em setembro de 2009, através dos Fóruns virtuais dos Procons, o mesmo fora enviado para todos os Senadores, como espécie de repúdio em relação ao cadastro positivo. E para nossa maior surpresa, os mesmos debruçaram nesta nobre causa e aprovaram um projeto de lei semelhante, impondo às operadoras concessionárias de serviços essenciais, a proibição de enviar o nome dos consumidores inadimplentes para os cadastros de proteção ao crédito (SPC/SERASA), além de não permitir a suspensão do serviço, senão após 30 dias da citação válida. Com o advento deste PLS, constata-se que a tese ganha notoriedade a nível Nacional.


Noutro giro, cumpre salientar que, se o procedimento adotado para tais inclusões obedecesse todo um sistema legal, para que somente ao final, se fosse o caso, impusesse tal “penalidade”, ainda assim penderia de efetividade tal prática, a não ser que alterasse substancialmente o leque de direitos inerentes a personalidade, contidos no ordenamento jurídico pátrio.


Se contemplássemos ainda que de forma analógica, a teoria do fruto da árvore envenenada, como norte para decisões futuras chegaríamos à conclusão de que todos os atos praticados por tais cadastros até então, estão eivados de vício de formalidade ou mesmo de legalidade, seja por ausência do devido processo legal para efeito dessa condenação, ou mesmo por ofensa aos direitos da dignidade da pessoa humana, notadamente o direito ao nome.


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Desta feita, concluímos pela invalidação, desde a origem, dos cadastros de proteção ao crédito, por ausência de fato tipificado em lei e também por estarem totalmente na contramão de todos os comandos normativos ornamentadores da dignidade da pessoa humana, até porque, ninguém está obrigado a conceder crédito, se o faz, deverá assumir o risco da inadimplência, que é inerente à sua atividade e consequentemente, embutidos nos autos lucros auferidos pela maioria dos fornecedores, até porque, se tal situação não fosse possível, vários fornecedores que optam por não fazerem convênio com tais cadastros, estariam fadados ao fracasso, o que não é verdade, ou seja, os mesmos sobrevivem com o decurso do tempo concedendo crédito de forma responsável, zelando pela manutenção de sua clientela que em regra são tratados com respeito, acabando por criar uma reciprocidade sustentável que mantém esta relação de consumo, sem a conivência da ilegalidade dos famigerados cadastros, que não raro vem lucrando para manchar o nome dos consumidores. A questão envolvendo todo tipo de cadastro neste país, ganha relevância, na medida em que grandes fornecedores, promovem sorteios de brindes, com intuito de ter acesso aos nomes dos participantes, ou até mesmo, fazer do mesmo, uma fonte inesgotável de lucros fáceis, já que outras empresas, compram tais cadastros e utilizam das mais arquitetadas formas de enganar consumidores, ao enviar boletos de cobranças indevidas, principalmente para funcionários de Bancos por exemplo, que temem pela inclusão negativa de seus nomes nos cadastros e serem vítimas do artigo 508 da CLT, que prevê de forma arbitrária, sua demissão por justa causa, o que também merece ser atacado em sede de ADPF.


3 – DA EFICÁCIA HORIZONTAL DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS E INFRACONSTITUCIONAIS


Neste contexto, é conveniente tecermos algumas considerações acerca do pilar que apóia o Código de Defesa do Consumidor. Como norma de ordem pública e de grande relevância social, o CDC foi inserido no ordenamento jurídico, com o fito de equilibrar as relações entre as partes, já que as mesmas possuem “paridade” nessa relação jurídica de consumo, portanto, como o equilíbrio necessário para harmonização da relação de consumo é presumido nessa relação, não vejo necessidade de inserir o famigerado artigo 43 que veio de forma implícita, admitir tais cadastros, o que beira ao absurdo, uma vez que, ao colocar os consumidores em desvantagem excessiva desequilibra as relações de consumo. O que comprova a ineficácia da existência dos cadastros é justamente o desequilíbrio das relações de consumo que prescindem da regulação pelo Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078 de 1990), uma das normas mais avançadas no mundo que regula a matéria, mesmo com a infeliz e inoportuna inserção do artigo 43, que fulminou o sentido de ordem pública e interesse social que reveste a tão importante norma. Desta forma, somos levados a concluir pela violação do Princípio da Isonomia, uma vez que, como eficácia horizontal das normas infraconstitucionais, pressupõe-se “paridade” nessa relação. Logo, é fácil concluir que merece ter um tratamento isonômico, o que não condiz com a realidade fática, uma vez que o artigo 43 privilegia uma parte em detrimento a outra, logo não cumpre a função social dos contratos de relação de consumo e contraria um dos pilares constitucionais da República Federativa do Brasil que vem a ser o “respeito à dignidade da pessoa humana”. A carta de 1988 reinsere a democracia no Estado brasileiro e consagra como princípio fundamental, a dignidade humana, elencando uma série de direitos, como vida privada e intimidade, criando o que os americanos chamam de “privacy” e os italianos de “riservatezza”, e também garantias não previstas anteriormente, como: “habeas data”, mandado de injunção, etc. A constituição Federal de 1988, reiterando direitos e garantias já consagrados e prevendo novos direitos e garantias da personalidade, estabeleceu uma cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, através de direitos preenchidos da mais absoluta eficácia. Absoluta, como um plus à plena eficácia, porque intangíveis as regras constitucionais que as reveste. Porquanto, contra elas, nem mesmo há o poder de emendas. Daí conterem força paralisante total de qualquer legislação que, explícita ou implicitamente, vier a contrariá-las. Distinguem-se, portanto, das normas constitucionais de eficácia plena, que, apesar de incidirem imediatamente sem necessidade de legislação complementar posterior, são emendáveis.


O artigo 5º da Constituição dispõe: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurando o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.


O Princípio da Supremacia Constitucional requer a conformidade de todas as situações jurídicas, aos preceitos da constituição, de tal forma que todos os atos expedidos pelos Órgãos Públicos ou aqueles que assumem função pública, devem necessariamente obedecer aos princípios e preceitos constitucionais, sob pena de nulidade, por ausência de requisitos elementares e indispensáveis a segurança jurídica, dado a flagrante violação do artigo 11 do Código Civil de 2002, no que tange aos Direitos da Personalidade e que seu exercício, jamais poderá sofrer limitações, por serem inalienáveis, indisponíveis, irrenunciáveis e intransmissíveis. O mais grave é permitir a existência dos cadastros e a sua utilização para concessão de análise de crédito, uma vez que tais informações não abrangem apenas lesão a bens ou a interesses patrimoniais, mas também à violação de bens personalíssimos – como o bom nome, reputação, saúde, imagem e honra. Configura também dano material a redução de seu patrimônio futuro – dano emergente e lucros cessantes.


Como já consignado alhures, o direito ao nome é inseparável da pessoa por ser essencial para uma vida digna, a ela vinculado de forma vitalícia, sendo inconcebível na sociedade democrática contemporânea que o cidadão não tenha direito absoluto sobre seu próprio nome. O que torna evidente no mundo moderno a preocupação da pessoa, contra as omissões do Poder Público, na medida em que permite a existência de tais cadastros concorrendo assim para a prática do crime de exercício arbitrário das próprias razões. Não obstante a fraca produção legislativa sobre o tema entendemos ser conveniente a proteção dos direitos personalíssimos, não só em relação ao Estado, mas também no campo do direito privado, para se evitar desleixo com o moral alheio. Fato um tanto quanto notório é a previsão na Constituição Federal de 1988, ao elevar o direito à cidadania plena como valor máximo do ordenamento jurídico brasileiro, não deixando dúvidas acerca de sua preferência em preservar o cidadão contra qualquer agressão como no caso das inclusões de nomes dos consumidores em cadastros, com o fito de bani-los do mercado de consumo. Esses direitos elencados e consagrados na Carta da República devem ser preservados e respeitados por todos indistintamente.


Os direitos da personalidade são absolutos e vitalícios, porque se impõem erga omnes. Fábio Ulhoa afirma: “Inviolabilidade da vida privada, assim, é o direito da personalidade, que assegura a pessoa, a faculdade de selecionar quais dados (não públicos) que sobre ela podem ou não serem divulgados, e por que meios. Por serem direitos absolutos, todos indistintamente, têm o dever de se abster de qualquer ato, público ou privado que importe na divulgação não desejada da informação.” (grifo).[2]


Um dos poucos consensos teóricos do mundo contemporâneo diz respeito ao valor essencial do ser humano. Ainda que tal conceito se restrinja muitas vezes ao discurso ou que essa expressão por demais genérica, seja capaz de agasalhar concepções as mais diversas eventualmente contraditórias-, o fato é que, a dignidade da pessoa humana, o valor do homem como um fim em si mesmo, é hoje um axioma da civilização ocidental, e talvez a única ideologia remanescente. Neste sentido, portanto, pode-se dizer que deve ser reparado por meio de indenização o ato que viola a dignidade da pessoa humana? Ora, se a dignidade é inerente ao próprio conceito de pessoa humana e assegurada na Constituição Federal, evidente que sim, já que é um bem a ser protegido e, mais que isso, deve ser protegido de forma especial.


Portanto, como o direito ao nome está inserido neste contexto na condição de direito inalienável, intransmissível, irrenunciável e indisponível, permitir sua alienação aos “órgãos de Proteção ao Crédito”, por ocasião da publicidade, é seguir na contramão de todos os comandos normativos inseridos no Ordenamento Jurídico Pátrio. No dizer de Gilberto Haddad Jabur (2000:28)[3], em excelente monografia sobre os direitos da personalidade, o mesmo afirma com veemência que “… os direitos da personalidade são, diante de sua especial natureza, carentes de taxação exauriente e indefectível…”, o que significa dizer, que são todos indispensáveis no desenrolar saudável e pleno das virtudes psicofísicas que ornamentam a pessoa, motivo pelo qual, é impossível permitir que tais cadastros, atestem o “óbito” civil temporário dos consumidores que estiverem inseridos neste contexto, na condição de inadimplentes, de tal forma que o consumidor jamais poderá ser posto em posição vexatória para que os fornecedores atinjam suas pretensões, que é o adimplemento do crédito concedido, o que também viola dispositivo legal, consubstanciado no CDC.


Já o artigo 12 do Código Civil de 2002, dispõe sobre a prerrogativa daquele que se sentir ameaçado ou lesado em seus direitos da personalidade, exigir que cesse a ameaça ou lesão, sob pena das sanções cabíveis na seara do dano moral eventualmente sofrido. O CPC fornece instrumentos eficazes para que a vítima obtenha celeremente o provimento jurisdicional que faça cessar a ameaça ou lesão a direito personalíssimo. Afora os princípios gerais que disciplinaram a ação cautelar, que podem ser usados conforme a utilidade e conveniência, consoante o artigo 461 do CPC, Caput, “na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o Juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático almejado”, com tal medida, é possível estancar a lesão aos direitos da personalidade, já que o direito ao nome é consagrado pelo novo código civil expressamente,“ o nome da pessoa não pode ser empregado por outrem em publicações ou representações que a exponham ao desprezo público, ainda quando não haja intenção difamatória. ”(artigo 17 do CC-2002).


Jamais poderemos admitir no território nacional uma espécie de “Tribunal de Exceção” como querem os fornecedores, que utilizam desse meio ardil, para tirar proveito da situação, sabendo que a maioria dos consumidores são honestos e temem que seu nome seja incluso nos cadastros, acabando por pagar por cobranças indevidas, ou mesmo não questionando determinados lançamentos desconhecidos numa fatura como acontece com algumas operadoras de telefonia que dissolvem na massa consumidora as multas que pagam por ocasião de sua má prestação de serviço ou mesmo por cobranças indevidas em que tentam obter êxito em detrimento aos consumidores.


É sabido que em caso de cobrança indevida, caso o consumidor venha a adimpli-la, abre-se precedente para que o mesmo pleiteie na esfera judicial a repetição do indébito, o que significa dizer, que terá direito ao dobro do valor pago, por estar implícita a cobrança indevida e consequentemente seu pagamento.


O que não é forçoso interpretar, ainda que não tenha havido o pagamento, teria o consumidor direito ao valor cobrado, até mesmo como uma espécie de multa pedagógica, para se evitar desleixo com o moral alheio e consequentemente a extinção da tese do “se colar, colou” muito comum entre fornecedores desonestos que sequer têm produto ou serviço a oferecerem, apenas constituem-se em “empresas de fachada” contratam meia dúzia de empregados, e passam a enviar boletos de cobranças de serviços que nunca foram prestados, em regra, de pequeno valor, mas que num universo de 100.000.000 de consumidores justificaria a manutenção dessa empresa especializada em lesar incautos consumidores fazendo com que tais empresas sobrevivam com o decurso do tempo, já que a minoria dos consumidores reclama e é até ressarcida, ou ainda que não o sejam, as reclamações seguem para o setor de práticas infrativas na esfera dos PROCONS, que certamente irão instaurar processo administrativo com fito de apurar as causas e consequentemente equilibrar as relações de consumo por ocasião da penalidade a ser aplicada ao fornecedor contumaz. A impressão que fica é a de que numa relação custo – benefício, o crime compensa uma vez que o adimplemento das multas aplicadas é o suficiente para cobrir o custo com tais penalidades. É a massa consumidora, alimentando um ciclo vicioso “hemorrágico” e que precisa ser estancado o mais breve possível, sob pena de estarmos concordando, que através do recebimento das multas, algumas empresas ao invés de se adequarem ao serviço que se propuseram a prestar, adquirem uma espécie de “credencial” para permanecer na ilegalidade, ameaçando assim a segurança jurídica.


O fato é que se ninguém pode ser condenado sem o devido processo legal, como autorizar que fornecedores venham utilizar dessa prerrogativa de aplicar a pena máxima, que é a inclusão do nome do consumidor nos cadastros de proteção ao crédito, sem que o mesmo tenha exercido sua ampla defesa e o contraditório?


Ademais, projeto dessa envergadura, obedece ao clamor popular, haja vista que o mundo inteiro é consumidor, inclusive os fornecedores, mas nem todo consumidor é fornecedor, neste sentido estamos diante de uma norma de ordem pública e de grande interesse e aprovação social.


A celebração do Pacto Republicano proposto pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, visa não só desinflar o judiciário por ocasião das ações consumeristas, como também a diminuição dos conflitos oriundos de controvérsias nas relações de consumo, o que significa dizer que, com o advento dessa nova regra, os fornecedores necessariamente terão que cumprir o comando normativo previsto no CDC, que dispõe sobre os devidos esclarecimentos por ocasião da contratação e consequentemente a concessão de um crédito mais responsável, o que certamente irá minimizar as questões de super endividamento muito comum nos dias de hoje, pois não podemos aceitar que consumidores estejam assumindo posição de desvantagem excessiva frente ao fornecedor.


Vale ressaltar que muito embora o STJ tenha retrocedido em relação à obrigatoriedade do AR, nas questões pertinentes a inclusão do nome dos consumidores nos cadastros de proteção ao crédito, isso não nos faz entender de outra forma até porque não concordamos com o posicionamento desse Egrégio Tribunal, pois convivemos diariamente com as angústias dos consumidores penalizados pelos Órgãos de proteção ao crédito.


Acreditamos que essa empreitada ganhará força na medida em que se tornar pública, visto que, ainda no embrião, a mesma já vem arrancando pareceres favoráveis inclusive de renomados doutrinadores.


Independente do posicionamento do STJ, em relação ao caso das “correspondências com aviso de recebimento – AR”. Onde ficou nítido o retrocesso, acreditamos piamente que este não será o entendimento do STF, que certamente se sensibilizará com o clamor popular e dará parecer favorável à massa consumidora para que possamos de uma vez por todas “coroar” o Código de Defesa do Consumidor, bem como os Órgãos de Defesa, na medida em que o equilíbrio das partes será uma certeza com o advento dessa nova regra e desta forma, banirmos de vez a auto tutela utilizada pelos fornecedores e veementemente combatida pelo ordenamento pátrio. Isso é justo, viável e politicamente correto, haja vista que a Constituição Federal diz respeito ao dever de promover a Defesa dos Consumidores, por parte do Estado.


4 – CONCLUSÃO


Por todo o exposto, podemos concluir que a inclusão do nome dos consumidores em cadastros de negativação, verdadeira “lista negra, ou como se fazia antigamente; lista dos maus pagadores” é ilegal, imoral e arbitrária. Neste sentido, ainda que haja resistência por parte da classe dominante, tal conduta, não pode prosperar, uma vez que tais inclusões como restaram comprovado, ofende preceitos constitucionais, devendo ser extintas liminarmente.


Enveredando por outro caminho, se houver uma regulamentação dentro do ordenamento jurídico, sobrepesando os prós e os contra, estabelecendo um equilíbrio, talvez fosse prudente que toda inclusão necessariamente fosse precedida de uma ação de cobrança, bem como uma sentença judicial, ainda que de primeiro grau, já que assim, fica resguardado o devido processo legal para efeito de inclusão do nome dos consumidores inadimplentes nos cadastros de proteção ao crédito, tudo isso sobre os auspícios do bem jurídico a ser tutelado, notadamente o DIREITO ao NOME.


 


Notas:

[1]   – Senador Paulo Paim (PLS 465/09) acolhido na CCJ.

[2]   COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil, vol. 1. – São Paulo: Saraiva. 2003, p.193.

[3] Gilberto Haddad Jabour (2000:28) Monografia sobre os direitos da personalidade.


Informações Sobre o Autor

Sebastião César Grazzia da Silva

Bacharel em Direito. Procon Juiz de Fora.


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