Resumo: A Internet, rede mundial de computadores, faz parte do cotidiano da sociedade, possibilitando maior interação entre as pessoas, uma vez que rompeu com o padrão presencial, no qual era imprescindível a presença dos indivíduos, sendo, deste modo, utilizada para os mais variados fins, dentre eles para realização de pesquisas, vídeos conferências, comércio eletrônico e porque não como forma de difusão dos relacionamentos afetivos. Nesse panorama, surgiram os relacionamentos virtuais, e, por conseguinte, um novo conceito para infidelidade, pela qual uma pessoa comprometida, seja pelo casamento ou pela união estável, passa a experimentar diferentes experiências virtuais afetivas e/ou sexuais com pessoa estranha a relação conjugal. No atual contexto do ordenamento jurídico, a infidelidade virtual representa uma das causas ensejadoras da separação judicial com causa culposa, haja vista infringência ao dever conjugal de fidelidade, com a possibilidade de pedido de indenização por danos morais; pois para a decretação da separação falência, da separação remédio, do divórcio e quando da dissolução da união estável, a culpa pela ruptura do relacionamento não é levada em consideração. Contudo, diante da evolução da sociedade e do novo conceito de família, fundado na afetividade, a culpa não mais tem relevância quando da dissolução da união, devendo ser substituída pela teoria do desamor. Deste modo, a infidelidade virtual, como conduta moralmente reprovável, vez que afronta diretamente os deveres de fidelidade, lealdade e respeito entre os cônjuges e companheiros, e por conseqüência, a dignidade da pessoa humana; em que pese não poder ser considerada como causa de dissolução dos relacionamentos, face a aplicação da teoria do desamor, enseja a possibilidade de indenizar o cônjuge ou companheiro “traído” pelos danos morais suportados.
Palavras-chave: Internet; infidelidade virtual; culpa; desamor; indenização por danos morais.
Sumário: Introdução; 1.Origens da Internet; 2. Conceitos e características dos relacionamentos virtuais; 2.1 Diferença entre relacionamentos virtuais e relacionamentos reais; 3. Infidelidade virtual; 4.Repercussão jurídica da infidelidade virtual: dissolução de união estável, separação, divórcio e danos morais; Conclusão.
INTRODUÇÃO
O estudo desenvolvido pretende trazer à baila a questão da infidelidade virtual e sua repercussão jurídica, notadamente quanto a possibilidade de requerer-se indenização por danos morais, diante das novas tendências doutrinárias e jurisprudenciais.
Não seria possível esta análise sem abordarmos as origens da Internet, rede mundial de computadores, no mundo e no Brasil.
A Internet é considerada instrumento extremamente importante na sociedade moderna, na medida que permite aos usuários usufruírem de serviços de informação e comunicação de alcance mundial, permitindo a interação das pessoas para a realização de negócios, pesquisas, bem como, meio de difusão de relacionamentos.
Nesse contexto, o estudo focaliza a propagação dos relacionamentos virtuais, suas características e diferenças quando comparados aos relacionamentos reais.
O surgimento dos relacionamentos virtuais, ocasionou também o surgimento da chamada infidelidade virtual, instituto moderno, que traz ao ordenamento jurídico, muitas indagações e polêmicas quanto a sua aplicação, haja vista ser o Direito de Família evolutivo, ou seja, sujeito a mudanças de costumes e de entendimentos sobre determinadas situações.
Assim, conceituamos a infidelidade virtual como sendo um relacionamento virtual praticado por pessoa comprometida, seja pela união estável ou pelo casamento, a qual passa a experimentar diferentes experiências afetivas e/ou sexuais com pessoa estranha a relação estável ou conjugal.
Com a finalidade de demonstrar a repercussão jurídica da infidelidade virtual, relacionamo-la com os institutos do casamento e da união estável, apresentando suas características, deveres dos cônjuges e companheiros diante da união, bem como, as formas de dissolução destas entidades familiares.
Por fim, uma vez que a infidelidade virtual representa afronta aos deveres de fidelidade, lealdade, respeito mútuo e insulta a dignidade da pessoa humana, há a possibilidade do cônjuge ou companheiro traído ingressar em juízo pleiteando indenização por danos morais.
1. ORIGENS DA INTERNET
A Internet, rede mundial de computadores, teve origem no final dos anos cinqüenta, início dos anos sessenta, nos Estados Unidos, logo após a Segunda Guerra Mundial, diante do cenário da Guerra Fria, a qual pode ser definida como o estado de forte tensão político-militar entre o bloco ocidental liderado pelos Estados Unidos e o bloco do leste liderado pela antiga União Soviética (URSS), conflito este que se estendeu durante quase toda a segunda metade do século XX. Embora nunca se tenha chegado ao confronto armado entre os dois blocos, uma vez que fora uma disputa ideológica; as agressões mútuas, de que se destacam a corrida aos armamentos, a crise dos mísseis em Cuba, a questão de Berlim e a intervenção em diversos conflitos regionais, de que são exemplos a Guerra da Coréia, a Guerra do Vietnam, a Guerra de Angola, entre outras; faziam parecer que uma Terceira Guerra Mundial estava iminente.
Nesse panorama, salienta-se que a Internet fora criada com objetivos militares, desenvolvida pela empresa ARPA (Advanced Research and Projects Agency) em 1969, denominada ARPANET, objetivando que as forças armadas norte-americanas mantivessem comunicação em caso de ataques inimigos que destruíssem os meios convencionais de telecomunicações.
Seus princípios de funcionamento eram, e ainda são, a procura de diversos caminhos para alcançar determinado ponto, sendo que na hipótese de um tronco – caminho pelo qual percorre o sinal eletrônico – estar interrompido, automaticamente, ocorre a procura de outro caminho que o substitua.
Referido projeto preocupava-se em montar, nos dizeres de Olavo José Gomes Anchieschi:
“uma arquitetura, cujo objetivo era funcionar como um sistema de comunicação independente, mesmo que Washington fosse riscada do mapa por um ataque nuclear. A Internet nasceu sem um centro de comando. Não tem dono nem governo, cresce espontaneamente como um capim e qualquer corporação venderia a alma para tê-la a seu serviço.”[1]
Nos anos 70, quatro universidades que faziam trabalhos relativos à defesa militar tiveram permissão para se conectar à ARPANET. Quatro anos após, o número das instituições participantes subiu para quarenta, sendo o e-mail (eletronic mail) o primeiro uso da Internet entre os pesquisadores, porquanto possibilitava que a comunicação entre eles fosse facilmente acessível.
Em 1975, existiam aproximadamente 100 sites[2] e os pesquisadores que mantinham a ARPANET começaram a estudar como seu crescimento (da ARPANET) estava alterando o modo como às pessoas usavam a rede.
Inicialmente, os pesquisadores presumiam que manter a alta velocidade da ARPANET seria o maior problema, mas na realidade a maior dificuldade se tornou a manutenção da comunicação entre os computadores.
No final dos anos 70, a ARPANET cresceu tanto que o seu protocolo de comutação de pacotes original, chamado de Network Control Protocol (NCP), tornou-se inadequado.
Depois de algumas pesquisas, a ARPANET mudou do NCP para um novo protocolo chamado TCP/IP (Transfer Control Protocol/Internet Protocol) .A maior vantagem do TCP/IP era que ele permitia o crescimento praticamente ilimitado da rede, além de ser fácil de implementar uma variedade de plataformas diferentes de “hardware” de computador (“hardware” é a parte física do computador, ou seja, é o conjunto de componentes eletrônicos, circuitos integrados e placas, que se comunicam através de barramentos).
Em 1980, referida rede experimental foi dividida em outras duas: a ARPANET, para pesquisa civil com fins militares, e a MILNET, com fins exclusivamente militares. A interligação dessas redes foi chamada de “Defense Advanced Research Projects Agency Internetwork”, nome que foi abreviado posteriormente para Internet.
Somente no ano de 1990 com o desenvolvimento da “World Wide Web” (WWW), pelo engenheiro inglês Tim Bernes-Lee, a qual fora lançada em 1992, que a Internet começou a alcançar a população em geral, uma vez que possibilitava a utilização de uma interface gráfica e a criação de sites mais dinâmicos e visualmente interessantes.
A “World Wide Web, ou “WWW” deixou a Internet mais acessível e atraente, sendo responsável por sua popularização, uma vez que conciliada ao desenvolvimento dos navegadores – também conhecidos por “browser”, oferecia aos usuários a utilização de imagem, som e movimento.
Insta esclarecer, portanto, que a Internet não é a “World Wide Web”, pois justamente devido sua extensão e amplitude, é o meio pelo qual correios eletrônicos, servidores e outros serviços trafegam.
Assim, a partir do desenvolvimento da “World Wide Web”, a Internet expandiu-se absurdamente, conforme observa o jurista Maurício Matte:
“À medida que as interligações das instituições e universidades foram aumentando por todo o globo, seus usuários vêm lutando para facilitar sua utilização. A World Wide Web (Teia Global), um sistema projetado para unir, ou entrelaçar, os vastos recursos da Internet, vem a ser uma tentativa a solucionar esse problema. “Criada na European Particle phypics Laboratory – CERN, em Genebra, a Teia Global (World Wide Web, abreviada como “WWW”) foi concebida originalmente como um sistema de intercâmbio para hipertexto baseado na Net, que permitiria aos físicos europeus compartilharem um “universo de documentos’”[3]
A década de 1990 tornou-se a era de expansão da Internet e para facilitar sua navegação, surgiram vários navegadores (“browsers”) como, por exemplo, o Internet Explorer da Microsoft e o Netscape Navigator.
O surgimento acelerado de provedores de acesso e portais de serviços “on line”, contribuíram para este crescimento, passando a utilização da Internet por vários segmentos sociais.
Os estudantes passaram a buscar informações para pesquisas escolares, enquanto jovens utilizavam a Internet para divertirem-se em sites de games.
As salas de “chats” tornaram-se pontos de encontro para um bate-papo virtual a qualquer momento.
Desempregados iniciaram a busca de empregos por meio de sites de agências de empregos ou enviando currículos por e-mail.
As empresas descobriram na Internet um excelente caminho para melhorar seus lucros, e as vendas “on line” dispararam, transformando a Internet em verdadeiros shopping centers virtuais.
Nos dias atuais, é impossível pensar no mundo sem a Internet, uma vez que ela tomou parte dos lares de pessoas, passando a ser uma necessidade de extraordinária importância estar conectado a rede mundial.
Para Esther Dyson, a Internet constitui:
“(…) um ambiente vivo, um lugar onde as sociedades, as comunidades e as instituições possam crescer, (…) a estrutura emerge das ações individuais em vez de originar-se de alguma autoridade ou governo central”[4]
No mesmo sentido, o jurista Gustavo Testa Corrêa entende que:
“A Internet é um sistema global de rede de computadores que possibilita a comunicação e a transferência de arquivos de uma máquina a qualquer outra máquina conectada a rede, possibilitando, assim, um intercâmbio de informações sem precedentes na história, de maneira rápida, eficiente e sem a limitação de fronteiras, culminando na criação de novos mecanismos de relacionamento.”[5]
A utilização Internet cresce em um ritmo acelerado, representando um verdadeiro fenômeno mundial, frise-se que em até 2005 este mercado representou cerca de 50 bilhões de dólares[6], tal fato é oriundo do grande número de pessoas proprietárias de computadores pessoais e que acessam a rede por meio de provedores das mais variadas empresas, as quais são responsáveis pela distribuição do sinal da Internet.
Estima-se que em 2010 mais de 700 milhões de pessoas passem a integrar a Grande Rede.[7]
A jurista Liliana Minardi Paesani, em sua obra “Direito e Internet: liberdade de informação, privacidade e responsabilidade civil”, aponta aspectos relevantes da Internet:
“Existem aspectos relevantes na Internet: a constatação de que se depara com uma gigantesca fonte de informações destinadas ao navegador da Internet, que é uma pessoa. Portanto, a rede telemática é uma oportunidade de encontro, de confronto, de troca de opiniões, de crescimento de relações interpessoais (global village), com todas as vantagens e os riscos das relações sociais. Em contrapartida, existe o reverso da medalha, que Umberto Eco sintetizou na afirmação: “o verdadeiro problema da comunidade eletrônica é a solidão”. E numerosas e fundamentadas pesquisas médicas sustentam que a utilização solitária e prolongada da Internet provoca uma espécie de dependência semelhante ao uso de drogas.
Segundo estudo do cientista político Norman Nie, da Universidade de Stanford (São Francisco), a Internet está criando uma nova e grande onda de isolamento social, introduzindo o espectro de um mundo fragmentado, sem contato humano nem emoções.”[8]
A história da Internet no Brasil começou bem mais tarde, em 1988 a Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo – FAPESP, resolveu estabelecer contato com instituições de outros países para compartilhar dados por meio de uma rede de computadores, sendo criada, então, a “Because is Time to Network” (BITNET), frise-se que esta operação acadêmica fora subordinada ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
Em 1991, o acesso ao sistema, já era chamado Internet, sendo permitido à instituições educacionais e de pesquisa e à órgãos do governo, em outras palavras, o acesso era reservado a um grupo específicos de pessoas, as quais participavam de debates, tinham acesso a dados nacionais e internacionais, podendo transferir arquivos e softwares.
O Ministério da Ciência e Tecnologia, em 1992 inaugurou a Rede Nacional de Pesquisa (RNP) e organizou o acesso à rede por meio de um “backbone”, ou seja, por meio de um tronco principal da rede, além disso, o Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas firmou um convênio com a Associação para o Progresso das Comunicações autorizando a utilização da Internet por organizações não governamentais.
Insta esclarecer que até hoje, a Rede Nacional de Pesquisa é o “backbone” principal e envolve instituições e centros de pesquisa, tais como Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo – FAPESP, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Rio de Janeiro – FAPEPJ, Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Ferais – FAPEMIG, universidades, laboratórios, entre outros.
O ano de 1995 foi o marco, uma vez que por iniciativa do Ministério das Telecomunicações e Ministério da Ciência e Tecnologia, fora permitido a utilização da Internet para exploração comercial, haja vista a criação dos provedores de acesso privado à Internet.
O número de pessoas interligadas na rede mundial de computadores cresce em um ritmo surpreendente, vez que a tecnologia avança a cada dia, permitindo a interação das pessoas em tempo real.
“Na verdade, um dos aspectos mais extraordinários da nova tecnologia das comunicações é justamente a eliminação das distâncias. Tanto faz que a pessoa com quem você estiver entrando em contato se encontra na sala ao lado ou num outro continente, porque essa rede altamente intermediada não estará limitada por milhas ou quilômetros.”[9]
Portanto, em síntese, sob o ponto de vista técnico, a Internet é uma rede mundial, não regulamentada, de sistemas de computadores interligados, por meio de fio de alta velocidade, que tem em comum um conjunto de protocolos e serviços, de uma forma que os usuários conectados possam usufruir de serviços de informação e comunicação de alcance mundial, sendo certo que a Internet passou a fazer parte do cotidiano das pessoas, rompendo com o padrão presencial, no qual se fazia necessário o comparecimento do indivíduo; possibilitando cada dia mais o comércio eletrônico, a realização de pesquisas, vídeos conferências, e porque não a difusão dos relacionamentos afetivos.
2. CONCEITOS E CARACTERÍSTICAS DOS RELACIONAMENTOS VIRTUAIS
A comunicação virtual começou na década de 70, ganhando maior intensidade nos anos 90, estando atualmente difundida no mundo todo.
Inicialmente o e-mail era o único meio de comunicação utilizado, mas com o desenvolvimento da rede e com o surgimento de novos programas, a Internet viabilizou a interação em tempo real de regiões geograficamente distantes, sem a necessidade de deslocamento.
Nesse passo, cumpre mencionar que há duas formas de comunicação “on line”. A primeira é denominada síncrona, pela qual os usuários estão conectados ao mesmo tempo e conversam em tempo real, aqui destacam-se as salas de bate-papo dos “sites” de relacionamentos e programas como o MSN (Messenger); e a segunda é conhecida como assíncrona, a qual não é realizada em tempo real, sendo mediada pelo uso de e-mails e dos “sites” de comunidades “on line” ou virtuais, como o Orkut.
Toda forma de relacionamento virtual acontece em um meio denominado ciberespaço, ou simplesmente mundo virtual.
Referido termo vem do inglês “cyberspace” e fora criado pelo escritor Willian Gibson em sua obra “Neuroromancer” que em uma analogia ao espaço sideral, designa o mundo virtual, pelo qual trafegam todas as informações veiculadas pela Internet, representando a junção das palavras cibernético com espaço.[10]
Desta forma, pode-se concluir que o ciberespaço permite a comunicação universal, pois refere-se a uma grande rede interconectada.
Parafraseando o professor Aaron Ben-Ze’ev, o ciberespaço traz uma novidade, a sua própria natureza interativa e esta mesma interatividade transforma o ciberespaço em uma realidade psicológica e social, sendo um local que permite que pessoas reais tenham interações reais com outras pessoas, enquanto podem moldar ou mesmo criar, suas personalidades.
Pelo esposado, é possível concluir que os relacionamentos virtuais são aqueles que acontecem no ciberespaço, mediados pela rede mundial de computadores, Internet.
Referidos relacionamentos recebem a denominação de “cyberaffairs”, os quais incluem os relacionamentos afetivos/amorosos e/ou os relacionamentos sexuais, os quais são mantidos predominantemente através de conversas eletrônicas que podem ocorrer por meio de e-mails, comunidades virtuais como o Orkut, salas de bate-papo e programas como o Messenger.
Com a Internet permite-se a interatividade absoluta com a utilização de vídeo, câmera digital, tela interativa, celulares, entre outros, possibilitando que as pessoas rompam limites entre o real e o imaginário.
Para a jurista Marilene Silveira Guimarães:
“No descortinar do novo século, vive-se um momento de profunda mutação antropológica e sociológica decorrente dos constantes avanços da tecnologia, em especial da revolução operada na comunicação. Assim como no passado aconteceram descobertas marítimas, ao navegar pelo espaço cibernético, o homem está descortinando um mundo novo, sem fronteiras. A mundialização do planeta aproximou povos distantes, miscigenou raças e culturas, os interesses econômicos superaram nações e sistemas jurídicos, provocando uma verdadeira revolução de paradigmas.
Analisando a história da humanidade, observa-se que no início da civilização, na era paleolítica, todos viviam em uma única sociedade. A primeira ruptura deste modelo aconteceu quando a humanidade separou-se e passou a habitar todos os continentes.
A segunda ruptura aconteceu com a revolução neolítica (na Mesopotâmia, Egito, China e nas civilizações inca e maia), período de grandes mutações técnicas, sociais, culturais e políticas que, em decorrência da fixação do homem no espaço, resultou na criação das cidades e na invenção do Estado, no desenvolvimento da agricultura e na invenção da escrita.
A terceira ruptura da história da humanidade aconteceu no século XV, no final da Idade Média, quando as descobertas marítimas levaram o
homem a navegar por mares impensados, aportando em novos mundos.
Neste final de milênio presencia-se outra fase de ruptura com o modelo social vigente, provocada pela comunicação que criou outra vez uma sociedade sem fronteiras. A era tecnológica apequenou o mundo e o homem está outra vez navegando, não mais pelo mar, mas sim pelo espaço cibernético ou espaço virtual, que está disponível para todos. Neste espaço não se estabelecem hierarquias, a estratificação social a partir de agora acontecerá entre os que estão na rede e os que optarem por estar fora dela, num redimensionamento também do uso do poder.
Presencia-se o esgotamento do modelo social vigente, o que provoca também uma ruptura com o modelo jurídico.
(…) uma forma de comunicação ágil, barata e relativamente segura, como é a comunicação virtual, torna-se um convite a uma nova forma de socialização. Basta um computador e uma linha telefônica para estabelecer a comunicação, não importa a nacionalidade, a idade, o sexo, a raça, a condição social do interlocutor. Para os que estão na rede abre-se um mundo relacional completamente inusitado.” [11] (grifos e negritos nossos)
Os relacionamentos virtuais romperam o padrão social dos relacionamentos presenciais, sendo motivados por muitas causas, frise-se que algumas pessoas utilizam a Internet para atender a necessidade natural de conhecer pessoas, para fazer descobertas, como um relacionamento que se inicia por uma amizade sem compromisso; outras navegam na Internet para afastar a solidão, o tédio do dia a dia, preenchendo, desta forma, carências afetivas.
Há, ainda, os que se envolvam virtualmente para fugirem das relações pouco gratificantes que vivem no mundo real; e os que fazem da sedução da Internet, um aprimoramento para seus relacionamentos reais.
2.1 Diferenças entre relacionamentos virtuais e relacionamentos reais
Há diferenças entre relacionamentos virtuais e relacionamentos reais, em que pese serem os relacionamentos virtuais uma variação dos reais.
Tais diferenças são apontadas porque os relacionamentos virtuais alteram os estágios de envolvimento para que uma pessoa possa se sentir atraído e íntimo de outra, como foi abordado no anteriormente.
Nos relacionamentos reais, existem algumas fases e sinais que são identificados antes que o envolvimento se inicie, tais como expressões faciais e gestos, risos, uso de acessórios e roupas que enfeitam a aparência, os quais demonstram que a pessoa está atraída por outra. Ressalta-se que há mais proximidade corporal entre as duas pessoas que estão se relacionando.
É cristalino que no mundo real a presença corporal é indispensável para que o relacionamento de inicie, em contrapartida, na Internet os sinais corporais inexistem.
Na Internet a pessoa que se sente atraída por outra pode utilizar-se de ferramentas para a sedução, tais como “emoticons”, símbolos que representam expressões faciais, beijos, abraços, atos que substituem a linguagem corporal.
Diante das interfaces textuais e gráficas utilizadas na Internet, a atração física que existe nos relacionamentos reais diminui visivelmente.
Ademais, a Internet possibilita a comunicação com pessoas de todo o mundo, reduzindo a necessidade da proximidade espacial que existe nos relacionamentos reais.
Os usuários da rede mundial de computadores, podem, ainda, manterem-se no anonimato, revelando suas identidades somente se acharem interessante, parafrasiando Ben-Ze’ev a auto-revelação aumenta a familiaridade e a intimidade nos relacionamentos virtuais, uma vez que é mais rápido e profundo do que nos encontros reais, pois com o anonimato a vulnerabilidade do usuário fica reduzida, sendo que nos relacionamentos virtuais é dada pouco importância para as características físicas do parceiro, além disso na Rede é possível achar muitas pessoas com traços de personalidade parecidos.
Conclui-se que quando a pessoa se mantém no anonimato se protege de uma exposição não almejada, podendo ao mesmo tempo mostrar-se diferente, inclusive no que tange a traços de personalidades, e até mesmo, podendo expressar desejos proibidos e fantasias, atitudes estas que dificilmente são praticadas no início dos relacionamentos reais.
Além disso, a máscara do anonimato pode ter uma repercussão psicológica, protegendo de o indivíduo de sofrer por qualquer que seja o desapontamento ou desaprovação do parceiro, fato este que não pode ser evitado nos relacionamentos reais, haja vista os parceiros terem conhecimento um da identidade do outro.
Nos relacionamentos reais é preciso tempo para que as pessoas se conheçam profundamente ainda que os encontros sejam freqüentes, diferentemente do que acontece no ciberespaço, onde as pessoas se conhecem mais rapidamente, contudo, demoram meses ou até mesmo anos para marcar um encontro, frise-se que há aqueles que jamais se encontraram de fato com o parceiro.
Nos relacionamentos virtuais os contatos entre os parceiros acontecem com maior freqüência, permitindo, desta forma que o envolvimento sobrevenha em um ritmo acelerado, haja vista que a quantidade de encontros “on line” altera a percepção de intimidade, chegando a muitos casos apresentarem características de um encontro sexual, sendo denominados de “cybersex”.
Referido termo pode ser utilizado, também, quando os parceiros utilizam sons, imagens e textos eróticos ou pornográficos, obtidos pela Internet ou por programas específicos, salienta-se que hoje em dia é possível estabelecer conversas de voz em tempo real, assim como em uma ligação telefônica, por meio de programas como o Messenger e o Skype; com a finalidade de estimulação sexual.
Para Ben-Ze’ev[12] nos relacionamentos virtuais, em que pese à infinidade de recursos que a Internet possibilita, o recurso da escrita ainda é o preferido entre os que se envolvem virtualmente, sendo uma versão aprimorada da antiga forma de comunicação que era estabelecida por cartas.
Por fim, insta esclarecer que atualmente há outro comportamento cada vez mais freqüente no ciberespaço, a infidelidade virtual, a qual passaremos analisar detalhadamente.
3. INFIDELIDADE VIRTUAL
Influenciada pelos preceitos judaico-cristãos, a comunidade ocidental adotou a monogamia como padrão social, com a finalidade de resguardar e proteger a célula familiar.
Entendemos por monogamia o costume em que é imposto ao homem ou à mulher de relacionar-se com apenas um parceiro, enquanto se mantiver vigente o seu casamento, ou qualquer tipo de relacionamento que envolva o desejo sexual.
Nesse passo, a fidelidade que emana da monogamia passa a ser um valor e um dever dentro da sociedade, tanto em questões voltados para o afeto, como em questões que envolvam a sexualidade.
Uma vez que a monogamia representa um valor social, sua infringência representará a afronta a própria organização social.
A infringência ao dever de fidelidade, em outras palavras, a infidelidade, é uma escolha do parceiro.
O presente trabalho tem como objeto o estudo da ciberinfidelidade, ou seja, da infidelidade praticada por meio de comunicação eletrônica.
A rede mundial de computadores possui um duplo efeito, aproximar as pessoas que estão longe, e em outros casos romper laços de pessoas que estavam próximas, pelo menos fisicamente, tendo provocado dolorosas separações.
A infidelidade virtual é um instituto moderno, que traz ao ordenamento jurídico, muitas indagações e polêmicas quanto a sua aplicação, haja vista estar o Direito de Família em constante mudanças de costumes e de entendimentos sobre certos acontecimentos.
A infidelidade virtual caracteriza-se por ser um relacionamento virtual praticado por pessoa comprometida, seja pelo casamento ou pela união estável, o qual passa a experimentar diferentes experiências afetivas e/ou sexuais com pessoa estranha a relação conjugal ou relação estável.
Salienta-se que no ciberespaço, ainda que não haja contato físico, há um relacionamento de fato entre os indivíduos conectados “on line”.
Em muitos casos pode ser que não ocorra a conjunção carnal convencional, entretanto, o sexo virtual é uma realidade, frise-se que os orgasmos são verdadeiros, frutos de uma masturbação assistida (podendo ser conjunta ou compartilhada, nestes casos há uma interação entre os participantes. Interação esta que poderá se apresentar de diversas formas seja pela mera escrita com descrição fática, ou pela utilização de som, imagem, ou “genital drive”), podendo ser neste caso considerada mais que uma infidelidade virtual, mas sim uma infidelidade emocional, haja vista que a Internet facilita a auto-revelação e a intimidade é atingida mais rapidamente, pois as pessoas têm liberdade para se abrirem umas às outras, mostrando como de fato são, ou criando novas personalidades.
A cada dia aumenta o número de pessoas casadas ou que vivem em união estável que já tiveram ou mantêm um relacionamento na Internet, ressalta-se que a rede mundial de computadores facilita este tipo de conduta, pois cria um clima de permissividade que encoraja as pessoas a se envolverem virtualmente.
Consoante já fora abordado no capítulo anterior, na Internet é possível que a pessoa mantenha sua identidade no anonimato, e isso faz com que se sinta mais segura em manter conversas eróticas, perdendo o medo de ser descoberta.
Há, ainda, programas interativos, como o Messenger e salas de bate-papo, os quais permitem conhecer novas pessoas, e com elas manter conversas em tempo real.
Além disso, os relacionamentos virtuais podem representar uma “válvula de escape” do estresse e dificuldades da vida real.
A infidelidade virtual é caracterizada por qualquer tipo de atividade sexual mediada pelo computador, podendo neste contexto, ser considerada a visita a “sites” de conteúdos pornográficos, salas de bate-papo, utilização de programas como o Messenger, todos engajados por uma pessoa que tenha um compromisso já estabelecido.
As causas destas pessoas já comprometidas buscarem um relacionamento na Internet são das mais variadas, destacando-se entre elas, a monotonia que enfrentam em seus relacionamentos reais, falta de interesse sexual do parceiro ou por desejo de variedade e diversão, incompreensão do parceiro, fuga da vida real quando falta coragem para promover a separação formal, fuga da relação pouco gratificante que as pessoas vivem.
Para a psicóloga Ana Cristina Silveira Guimarães:
“A realidade das relações virtuais abrange um amplo espectro de possibilidades de relações que vai desde a normalidade à patologia, dependendo do uso que cada indivíduo faça desta relação, seja um uso narcísico (que pode ser apenas um prolongamento de seu mundo interno), seja um uso perverso ou uma forma de se evadir da realidade externa ou interna, conforme a subjetividade inerente a cada ser humano”.[13]
Cumpre mencionar que nos relacionamentos virtuais a liberação das fantasias e dos desejos é mais rápida do que na vida concreta, fato este que faz com estes tipos de relacionamentos sejam baseados muito mais em pensamentos e ficções do que na proximidade física que existe nos relacionamentos reais.
Conforme observa Marilene Silveira Guimarães:
“Até bem pouco tempo, a fuga inconsciente para o mundo imaginário ficava apenas no terreno da fantasia, no mundo do sonho, único espaço onde se pode ser verdadeiramente livre, onde se pode ser infiel sem que ninguém descubra, onde a infidelidade fantasiosa jamais é confessada a alguém. Agora existe a Internet e o espaço virtual permite “estar junto” com outra pessoa, permite revelar sonhos e desejos, realizar fantasias, sem riscos aparentes.
Na Internet, a figura idealizada do outro não enfrenta o desgaste do convivência. O que se idealiza sempre é melhor do que se tem. No espaço virtual todos são pessoas especiais que construímos em nossas mentes, a partir dos nossos desejos. O espaço mágico virtual permite que o indivíduo construa um mundo também mágico, como se estivesse escrevendo o roteiro de um romance.
O internauta pode fraudar dados pessoas como estado civil, raça, profissão, idade, tipo físico. Quanto à personalidade, pode demonstrar no espaço virtual características diferentes do seu comportamento social real. No entanto, a simulação da personalidade nada mais é do que o exercício de um papel que o internauta desejaria desempenhar na vida real, mas não consegue. Esta nova realidade tem levado os especialistas a reverem os conceitos sobre personalidade múltipla.
Na comunicação virtual acontece a construção de “uma realidade de segunda ordem”, uma realidade de simulação, que nos reporta a um “mundo imaginal”, que é um mundo simbólico, imaterial, uma forma inusitada de estabelecer um vínculo social. Neste mundo, a pessoa pode “fugir” do cotidiano, comunicando-se com um “outro” sem rosto, sem identidade, que não exige compromisso, bastando clicar um botão para interromper a comunicação. Este relacionamento pode manter-se no plano imaginal, ou derivar para uma aproximação física.”[14]
No primeiro momento, as pessoas que mantêm um relacionamento erótico-afetivo fantasiam em conjunto, partilham desejos, experiências, sonhos relacionados com temáticas sexuais, protegidas por um pseudo-anonimato que a Internet oferece.
As partes encontrando um conjunto de afinidades que as aproximam ou atraem, num segundo momento, passam a compartilhar fotos ou utilizar “software” de voz e “webcam” enquanto perduram os diálogos, tais recursos fazem com que o outro deixe de ser uma figura abstrata, adquirindo tons de realidade.
Neste sentido é o posicionamento da psicóloga Rosana Ferrari:
“A Internet apresenta novas possibilidades de relacionamento, permitindo o encontro e a descoberta no anonimato. Quando as pessoas estão anônimas, comportam-se em geral de forma mais livre e mais despojada de preconceitos e máscaras, podendo fantasiar que são melhores do que são, e podem despir-se de inibições. Encontrar pessoas pela Internet e relacionar-se “intimamente” com elas traz para dentro de casa uma possibilidade nunca antes vivida. Para casais que vivem frustrações no casamento a tela e o teclado tornam-se amigos concretos, o computador passa a ser o aliado. Substituindo-se assim a ameaça do relacionamento real, e ele pode ser vivido sem riscos.
(…) Fidelidade e infidelidade dependem do conceito de cada casal. Para alguns a infidelidade não está em encontrar outra pessoa mas em apaixonar-s por ela.
(…) A Internet realiza os desejos incompatíveis com a vida cotidiana. Não há compromisso com a verdade. Ela dá vida aos desejos reprimidos. Cria um mundo Ilusório de facilidades. Mudou o flerte, a palavra se torna poderosa no jogo da sedução.
O romance virtual é uma imitação quase perfeita do romance da vida real. O amante virtual como não tem rosto nem identidade, é virtualmente perfeito, pois depende da imaginação de cada um. Mas se o relacionamento pela Internet traz menos riscos, a vida real é mais difícil de ser encarada. Quando surge o desinteresse pelo parceiro, na vida real, é difícil romper. Na Internet, quando surge o desinteresse, é só deletar o parceiro.”[15]
Para o professor e presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Rodrigo da Cunha Pereira, “enquanto houver desejo sobre a face da terra haverá quem burle a lei jurídica para ir ao encontro da Lei do Desejo, nem sempre coincidente com a lei jurídica” [16]
Uma vez que o contato físico muitas vezes inexiste nos relacionamentos virtuais, as pessoas que estão sendo infiéis tendem a imaginar que os relacionamentos mantidos com terceiros não ensejam infidelidade.
Todavia, apesar da tentativa de quem pratica em minimizar seu ato, aquele que descobre a infidelidade do parceiro, ainda que, “on line”, sofre demasiadamente, porquanto há a intenção do parceiro em manter um relacionamento erótico secreto.
Para alguns parceiros traídos há uma quebra da promessa de exclusividade, já para outros a manutenção de relacionamentos virtuais auxilia atividade sexual entre o casal na vida real.
Insta esclarecer que se ambas as partes estão sabendo do relacionamento virtual mantido por um deles, não vêem implicância nisso, tal fato não configura infidelidade virtual e provavelmente não destruirá a relação.
Diante do até aqui esposado, fica cristalino o fato de que o parceiro comprometido que mantém um relacionamento erótico-afetivo com pessoa terceira a relação, afronta a moral, aviltando a entidade familiar, contudo, juridicamente há a necessidade de análise profunda quanto sua repercussão.
4. REPERCUSSÃO JURÍDICA DA INFIDELIDADE VIRTUAL: DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL, SEPARAÇÃO, DIVÓRCIO E DANOS MORAIS
A família foi a primeira e principal forma de agrupamento humano, preexistindo à organização jurídica da vida em sociedade, razão pela qual é a considerada a “celula mater” de uma nação.
Diante deste conceito a Constituição da República proclama a família como base da sociedade, merecendo proteção especial do Estado, consoante se observa pelos princípios elencados nos artigos 226 e 230.
Conforme observa Euclides de Oliveira:
“Tal a sua relevância histórica na formação da própria humanidade que a família se considera uma autêntica instituição social, perpetua-se no envolver dos séculos, torna-se imortal” [17].
Salienta-se que a família é uma entidade histórica, interligada com os rumos que a sociedade traça, por isso é mutável de acordo com as mudanças das estruturas que se propagam no tempo.
Nesse passo, o artigo 226 parágrafos 1ª a 3ª da Constituição Federal, reconhece como entidades familiares o casamento e a união estável, consoante se observa abaixo:
226: “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
1º : O casamento é civil e gratuita a celebração.
2º : O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei.
3º : o do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.[18]
Frise-se que antes de 1.988 vigorava a regra de que a família era constituída apenas pelo casamento, sem qualquer referência as inegáveis uniões de fato.
O casamento civil ou religioso com efeitos civil entre um homem e uma mulher é a forma tradicional e clássica de constituição de família.
O casamento civil é ato solene em que o Estado intervém desde a habilitação, a fim de averiguar a existência de eventuais impedimentos matrimoniais, até a celebração por autoridade competente.
Por sua vez, a união estável caracteriza-se por ser uma união entre homem e mulher, com relacionamento público, contínuo e duradouro e que tenha o objetivo de constituir família.
Tanto o casamento como a união estável foram devidamente regulados pelo Código Civil de 2002, em seus artigos 1.511 a 1.590 e 1.723 a 1.729.
Casamento e união estável estabelecem plena comunhão de vida, com base na igualdade de direitos e deveres entre os parceiros, nesse sentido, surgem entre eles relações recíprocas, algumas de cunho estritamente econômica, e outras de fundo exclusivamente pessoal.
Conquanto numa entidade familiar haja questões econômicas de relevo, como a mútua assistência, a partilha de bens, os direitos sucessórios entre outros, o cerne de um relacionamento com vistas à constituição de uma família reside muito mais em questões pessoais do que em tratos materiais, deste modo, o respeito mútuo, o carinho, o amor, enfim, a afetividade e seus desdobramentos, são a essência de uma relação.
Salienta-se que os efeitos jurídicos do casamento são conseqüências que se projetam no ambiente social, nas relações pessoais e econômicas dos cônjuges, nas relações pessoais e matrimoniais entre pais e filhos, dando origem a direito e deveres próprios e recíprocos, razão pela qual podemos distingui-los entre deveres patrimoniais e deveres pessoais.
Importante consignar que no presente trabalho somente será abordado os deveres pessoais dos cônjuges.
Nesse sentido, dispõe o artigo 1.566 do Código Civil:
Art. 1.556: “São deveres de ambos os cônjuges:
I: fidelidade recíproca;
II: vida em comum, no domicílio conjugal;
III: mútua assistência;
IV: sustento, guarda e educação dos filhos;
V: respeito e consideração mútuos.”[19]
Deste modo, no que se refere aos efeitos pessoais, com o ato do casamento, automaticamente, nascem para os consortes, situações jurídicas que impõem direitos e deveres recíprocos, reclamados pela ordem pública e interesse social, e que não se medem em valores pecuniários como a mútua assistência, fidelidade recíproca e vida em comum no domicílio conjugal.
Consoante se observa pela análise do artigo 1.565 do Código Civil, abaixo transcrito, homem e mulher assumem condições de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.
Art. 1565: “Pelo casamento, homem e mulher assumem mutuamente a condição de consortes, companheiros e responsáveis pelos encargos da família.”[20]
Preceitua o Código Civil a igualdade de direitos e deveres entre marido e mulher, competindo a ambos a direção da sociedade conjugal, em mútua colaboração, sempre no interesse da família, inclusive no tocante sustento, guarda e educação dos filhos, consoante estabelecido no artigo 1.567 de referido diploma legal.
O dever da vida em comum é também chamado de dever de coabitação, pelo qual ficam os cônjuges obrigados a manterem vida afetiva, mas não necessariamente sob o mesmo teto, situação este que normalmente ocorre devido a questões profissionais.
Há violação de aludido dever quando evidenciado o abandono, ou seja, quando um dos cônjuges afasta-se voluntária e injustamente do domicílio comum.
Insta esclarecer que o abandono não exige o afastamento físico do cônjuge do lar conjugal, haja vista que o abandono afetivo pode ocorrer mesmo na permanência sob o mesmo teto, ocasião em que se apresentará sob a forma de ausência moral.
Parafraseando a jurista Maria Helena Diniz, ficará evidenciada a violação ao dever de coabitação quando houver o “debitum conjugale”.
O dever da mútua assistência se funda nos cuidados pessoais em caso de moléstias, ao apoio da adversidade e ao auxílio constante em todas as vicissitudes da vida, seja materialmente ou moralmente.
Referido dever se justifica em razão da comunhão de vida entre o casal, de fato que o distanciamento por falta de diálogo, a frieza no trato pessoal e outras falhas de comunicação podem afetar a convivência entre os consortes.
O dever da mútua assistência implica, então, a solidariedade, a entrega de um para com o outro e a prestação mútua de colaboração, tanto no aspecto material como no moral.
Os cônjuges são responsáveis pelo sustento dos filhos, ou seja, os genitores, ambos, devem prestar aos filhos o indispensável à existência, ou seja, devem oferecer aos filhos alimentação, roupas e assistência médica necessária.
No que tange a guarda dos filhos, os pais devem oferecer um local físico para que os filhos habitem, com apoio e fiscalização dos destes (pais), por fim, o dever de educar os filhos, consiste em oferecer instrução escolar e orientação da vida.
O dever moral e jurídico da fidelidade mútua decorre do caráter monogâmico do casamento e dos interesses superiores da sociedade, pois constitui um dos alicerces da vida conjugal e da família.
Ressalta-se que a fidelidade, enquanto dever de um e direito do outro, perdura durante o casamento, mas só serve de fundamento para justificar a busca do seu término, de acordo com a teoria da culpa, ainda vigente no ordenamento jurídico.
A teor do que disciplina a teoria da culpa, a imputação da culpa pelo descumprimento do dever de mútua fidelidade não permite buscar seu adimplemento durante a constância do casamento, concedendo tão somente o direito à separação.
Quanto aos efeitos pessoais da união estável, estabelece o artigo 1.724 do Código Civil que:
Artigo 1.724: “As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos.”[21]
Em confronto com os direitos e deveres dos que casados, necessário se faz destacar que para os companheiros se aplica o dever da lealdade, similar ao dever da fidelidade; além disso, não consta para os companheiros o dever da vida em comum no mesmo domicílio, o que é exigido para os casados.
Os deveres de respeito e assistência, guarda, sustento e educação dos filhos são idênticos aos deveres impostos aos casados.
Frise-se que a Constituição Federal em seu artigo 226, parágrafo 3º, bem como toda a doutrina dominante, equipara a união estável e o casamento em vários aspectos, entre eles ao dever de fidelidade ali expresso, no vocábulo “lealdade”.
Ao termo fidelidade podemos atribuir os sinônimos, lealdade, honradez, honestidade, integridade, retidão, honestidade, constância, assiduidade, firmeza, perseverança.
Deste modo, é possível conceituar o dever de fidelidade como a lealdade entre os parceiros, especialmente no que tange às relações cujo principal objetivo seja o prazer físico e a satisfação sexual.
O desrespeito a tal dever configura-se, a princípio pela prática de relação sexual com pessoa estranha ao casamento ou à união estável, além de outros atos que, embora não cheguem à conjunção carnal, demonstram o propósito de satisfação do instinto sexual fora da sociedade conjugal.
Há fatores que podem importar extinção da sociedade conjugal, sejam eles oriundos ou não de atos dos cônjuges.
Nesse passo, preceitua o artigo 1.571 do Código Civil Brasileiro que a sociedade conjugal tem seu término morte, invalidade do casamento, separação judicial ou divórcio.
Art. 1571: “A sociedade conjugal termina:
I: pela morte de um dos cônjuges;
II: pela nulidade ou anulação do casamento;
III: pela separação judicial;
IV: pelo divórcio.”[22]
Pela análise de mencionado artigo fica evidente que o casamento pode ser extinto em caso de mortes de um dos cônjuges, seja morte real ou presumida; nos casos de invalidade e ineficácia do matrimonio, causas estas que na verdade são anteriores ao casamento; bem como, pela vontade das partes, seja por meio da separação judicial ou pelo divórcio.
Acrescenta o parágrafo primeiro de aludido artigo que o casamento válido somente se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se esta presunção nos casos de ausência.
Deste modo, a sociedade conjugal termina com a separação judicial e o vínculo matrimonial com a morte de um dos cônjuges, presunção de óbito do consorte declarado ausente, invalidade do casamento e divórcio.
Neste contexto, será aprofundado neste trabalho o término da sociedade conjugal pela separação judicial e pelo divórcio.
A separação judicial dissolve a sociedade conjugal, mas conserva íntegro o vínculo matrimonial, impedindo os cônjuges de convolar novas núpcias, haja vista que o vínculo matrimonial, se válido, somente se extingue pela morte real ou presumida de um deles ou com o divórcio.
O divórcio, é oriundo de fatos supervenientes ao casamento válido, dissolvendo tanto a sociedade conjugal como o vínculo matrimonial, autorizando, deste modo, os consortes a casarem-se novamente.
Salienta-se que pode ocorrer a dissolução da sociedade conjugal sem a do vínculo matrimonial, entretanto, o rompimento do vínculo matrimonial, acarreta, necessariamente, o da sociedade conjugal.
Por fim, insta consignar que vigora tanto no casamento como na união estável o princípio da “ratio” das relações afetivas, pelo qual a dissolução de uma dessas entidades familiares, se e quando ocorrer, originou-se de uma relação afetiva, fundada na solidariedade e na comunhão de vida
Tem-se que a separação judicial põe ponto final à vida em comum, dissolve a sociedade conjugal e separa os cônjuges, conservando intacto o vínculo matrimonial, de modo que lícito não será a qualquer deles contrair novo matrimonio.
Nesse sentido, preleciona a jurista Maria Helena Diniz:
“A separação judicial é a causa de dissolução de sociedade conjugal (CC, art. 1.571, III), não rompendo o vínculo matrimonial, de maneira que nenhum dos consortes poderá convolar novas núpcias.”[23]
A separação judicial é o gênero do qual derivam, como espécies, a separação consensual e a separação litigiosa, a primeira prevista no artigo 1.574 e a segunda, artigos 1.572 e 1.573, todos do Código Civil.
A separação consensual ou por mútuo consentimento, pressupõe, a existência de casamento entre os separandos pó no mínimo um ano. Nela os consortes deverão estar de acordo acerca do conteúdo disposto nos artigos 1.120 a 1.124 do Pátrio Código de Ritos que regula a ação de separação consensual.
Salienta-se que deve haver consenso acerca do nome que cada qual passará a usar após a separação, ou seja, se continuarão a utilizar o sobrenome adotado por ocasião o casamento ou se voltarão a usar o nome de origem, além disso, deve haver consenso no que se refere a guarda de filhos e visita.
No que tange ao patrimônio do casal, a legislação admite a separação sem que haja a partilha destes, permanecendo os bens em comunhão.
Os consortes, devem, ainda, firmar o pedido de dissolução, o qual também será subscrito pelo advogados ou advogado comum aos dois postulantes.
A fiscalização dos termos propostos na separação consensual, caberá ao juiz e ao membro do Ministério Público, os quais se ater a ausência de prejuízo a qualquer das partes e especialmente aos filhos incapazes, se houverem.
Ao juiz restará a homologação e conseqüente decreto de dissolução da sociedade conjugal, ou a não homologação.
Referido procedimento é simples, não exigindo a discussão acerca dos motivos que ensejam a separação, ou seja, não será abordado neste tipo de separação o requisito da culpa.
Por sua vez, o artigo 1.572 do Código Civil permite a separação judicial a pedido de um dos consortes, por meio de um processo contencioso, qualquer que seja o tempo do casamento, desde que estejam presentes hipóteses legais que tornam insuportável a vida em comum.
Dentre as hipóteses de separação litigiosa, temos a separação falência, a separação remédio e a separação sanção ou com causa culposa.
A separação falência tem previsão legal no parágrafo 1º, do artigo 1.572, do Código Civil, e tem como pressupostos a separação de fato entre os consortes, ou seja, que haja ruptura da vida em comum do casal há mais de um ano, e, que seja impossível a retomada da vida em comum.
Necessário se faz esclarecer que do mesmo modo que ocorre na separação consensual, na separação falência não há qualquer discussão de culpa.
A separação remédio ocorre quando um dos cônjuges, após o matrimônio, manifesta doença mental grave que perdure por no mínimo dois anos e se mostre pouco provável a cura, fato este que torna impossível a continuidade da vida em comum, consoante preconiza o artigo 1.572, parágrafo 2º, do Código Civil.
Em referida separação, deve o autor da demanda demonstrar a insanidade mental do outro e a cura improvável, por meio de um laudo psiquiátrico elaborado por um médico competente, assim como, se faz necessário a comprovação de que não é possível a retomada da vida em comum, afastando, ainda, a possibilidade de que a separação agrave a situação cônjuge adoentado.
Importante consignar que neste tipo de separação não há discussão de culpa.
Por fim, a separação com causa culposa ou separação sanção é a espécie de separação judicial que mais suscita discussão, haja vista sua complexidade jurídica, pois exige a presença e comprovação de culpa, além de exigir a comprovação da insuportabilidade da vida em comum, conforme estipulam o “caput” do artigo 1.572, e artigo 1.573, ambos do Código Civil, abaixo transcritos:
Artigo 1.572: “Qualquer dos cônjuges poderá propor a ação de separação judicial, imputando ao outro qualquer ato que importe grave violação dos deveres do casamento e tornem insuportável a vida em comum.”[24]
Artigo 1.573: “Podem possibilitar a impossibilidade da comunhão de fida a ocorrência de algum dos seguintes motivos:
I – adultério;
II – tentativa de morte;
III – sevícia ou injúria grave;
IV – abandono voluntário do lar conjugal, durante 1 (um) ano contínuo;
V – condenação por crime infamante;
VI – conduta desonrosa.
Parágrafo único: O juiz poderá considerar outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum.”[25]
Deste modo, a separação com causa culposa ocorre quando um dos cônjuges imputa ao outro qualquer ato que importe em grave violação dos deveres matrimoniais ou que torne insuportável a vida em comum.
Consoante já mencionado, neste tipo de separação há possibilidade de discussão de culpa, que podem se apresentar pelas formas elencadas no “caput” do artigo 1.572 e no artigo 1.573, ambos do Código Civil; precedida sempre pelas obrigações que são impostas aos cônjuges quando da celebração do casamento, quais sejam, fidelidade recíproca, vida em comum no domicílio conjugal, mútua assistência, sustento, guarda e educação dos filhos e respeito e consideração mútuos.
Por fim, cumpre mencionar que o parágrafo único do artigo 1.573 do Código Civil permite que no juiz considere, além dos fatos elencados nos incisos I a VI do mesmo artigo, questões diversas que ensejem a insuportabilidade da vida em comum, haja vista que nenhum princípio moral ou legal, pode impor que se mantenha uma união, na qual não existe mais o respeito, a compreensão, a amizade, o companheirismo, ou seja, que se mantenha uma união onde desapareceu a afetividade.
Ressalta-se que ao juiz incumbe, em cada caso, verificar o fato alegado, como causa real no descumprimento dos deveres inerentes ao matrimônio, os seus efeitos e conseqüências na vida do casal, para assim avaliar a insuportabilidade da vida em comum, de acordo com a condição socioeconômica e cultural dos cônjuges.
A culpa, além de figurar como a própria causa da separação, também acarreta reflexos na definição de algumas questões, quais sejam: a guarda dos filhos, os alimentos e o nome de casado.
No que se refere à guarda dos filhos, já há algum tempo, em que pese no Direito Brasileiro o artigo 10 da Lei do Divórcio ter vigorado até o advento do Código Civil de 2002, tanto a doutrina, como a jurisprudência já haviam sedimentado o entendimento de que para a atribuição da guarda não é o comportamento dos cônjuges enquanto marido e esposa que é importante, mas sim o comportamento como pai e mãe.
A guarda dos filhos não pode ser considerada um prêmio ou um castigo pelo fato de o cônjuge ter sido considerado inocente ou culpado na ação de separação.
O interesse que deve prevalecer sempre é o dos filhos, devendo a guarda, portanto, ser deferida àquele genitor que oferecer melhores condições para acompanhar mais de perto a criação e a educação daqueles, considerando sempre os dispositivos elencados no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Nesse sentido, o Código Civil desvinculou a fixação da guarda dos filhos com a discussão da culpa. Assim, o artigo 1584, caput, estabelece expressamente que decretada a separação judicial ou o divórcio, sem que haja entre as partes acordo quanto à guarda dos filhos, será ela atribuída a quem revelar melhores condições para exercê-la.
Sendo certo que o parágrafo único desta norma ainda afirma que se o juiz verificar que nenhum dos genitores deva ficar com a guarda, poderá deferi-la a terceira pessoa que revele compatibilidade com a natureza da medida, devendo sopesar o grau de parentesco e a relação de afinidade e afetividade desta com o menor.
Com relação ao nome, cada vez mais solidificado na doutrina o entendimento de que se trata de um direito decorrente da personalidade, o que foi acolhido inclusive pelo Código Civil de 2002, conforme se constata pela leitura de seus artigos 16 a 19.
Não se trata de uma concessão feita pelo marido ou pela mulher quando do casamento, razão pela qual não há o que se falar em nome do marido, nome da mulher, ou nome de casada. No momento em que um dos cônjuges, quando do casamento, acresce ao seu o nome do outro, este passa a ser o seu nome, passando a incorporar a sua identidade.
A perda do direito ao nome na separação judicial só é possível quando esta houver sido fundada na culpa.
Entretanto, o fato de o cônjuge ter sido declarado culpado pela separação não implica mais na automática perda do nome, o que somente ocorrerá se, além de ser reconhecido culpado, o outro cônjuge houver requerido expressamente, além de ter sido necessariamente considerado inocente, e a alteração do nome não implicar evidente prejuízo para a sua identificação; se houver manifesta distinção entre o seu nome de família e o dos filhos havidos da união dissolvida; e se existir dano grave reconhecido na decisão judicial, nos termos do artigo 1.578, “caput”, do Código Civil.
O Código Civil relacionando direito aos alimentos à discussão da culpa; contudo, em hipótese específica, autoriza que o próprio culpado faça jus aos alimentos.
Deste modo, se o cônjuge for considerado inocente, presente o binômio capacidade e necessidade, fará jus aos alimentos, sendo que estes deverão ser fixados em montante que assegure a manutenção do padrão de vida existente à época da sociedade conjugal.
A substancial inovação refere-se à possibilidade de o próprio cônjuge considerado culpado fazer jus aos alimentos. Com efeito, conforme se infere do artigo 1694, parágrafo 2º, e artigo 1704, parágrafo único, ambos do Código Civil, caso também o cônjuge considerado culpado não tenha condições de se manter, não tenha aptidão para o trabalho e não tenha nenhum parente em condição de prestar os alimentos, terá direito aos alimentos, todavia, estes deverão ser fixados em montante que apenas assegure a subsistência.
O divórcio somente fora permitido no Brasil, por meio da Emenda Constitucional 9, de 28/06/1977, que deu nova redação ao parágrafo 1º do artigo 175 da Constituição de 1969, não só suprimindo o princípio da indissolubilidade do vínculo matrimonial como também estabelecendo os parâmetros da dissolução, que seria regulamentada por lei ordinária.
O divórcio somente passou a ser aplicado no Brasil com a regulamentação da emenda constitucional pela Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, a modalidade principal era o divórcio-conversão, pelo qual era necessário que o casal se separasse judicialmente, e depois do lapso temporal de três anos fosse requerida a conversão da separação em divórcio.
Nesse contexto, o divórcio direto era uma forma excepcional, prevista nas disposições transitórias, em seu artigo 40, sendo possível apenas quando os casais encontravam-se separados de fato há mais de cinco anos em 28 de junho de 1977.
A Constituição Federal de 1.988 modificou esse panorama, reduzindo o prazo da separação judicial para um ano, no divórcio-conversão, e criando uma modalidade permanente e ordinária de divórcio direto, desde que comprovada a separação de fato por mais de dois anos.
Ressalta-se que a Lei nº 7.841/89, restringiu-se a adaptar a Lei do Divórcio à nova Constituição Federal, dando, ainda, nova redação ao artigo 40 de referido diploma legal, excluindo, desta forma, qualquer possibilidade de discussão a respeito da causa eventualmente culposa da separação, passando a ser o único requisito do divórcio direto a comprovação da separação de fato por mais de dois anos, sem prever qualquer sanção ao cônjuge que intentar referida demanda.
Com o Novo Código Civil, o prazo para o divórcio direto passa a ser de dois anos após a separação de fato, e do divórcio indireto, um ano depois da separação judicial.
É possível definir o divórcio como sendo a completa ruptura da sociedade conjugal e do vínculo matrimonial, que permite ao divorciado livre para a celebração de novo casamento civil.
Frise-se que não se pode mais falar em restabelecimento da sociedade conjugal, haja vista que se operou a ruptura definitiva do vínculo matrimonial, razão pela qual os cônjuges somente poderiam retornar ao estado jurídico de casados, com a celebração de novo casamento civil.
A teor do que disciplina o artigo 1.580 do Código Civil, o divórcio pode ser direito, ante a inexistência de pedido anterior de separação judicial; ou indireto, que pressupõe a decretação anterior da separação judicial e o decurso de prazo de, no mínimo, um ano do trânsito em julgado da sentença ou ainda, da decisão que concedeu a medida cautelar de separação de corpos, ; frise-se que ambos podem ocorrer na foram consensual ou litigiosa.
O artigo 226, parágrafo 6º, da Carta Magna, permite o divórcio direto, comprovada a separação de fato por mais de dois anos consecutivos, não se exigindo mais a demonstração da causa da separação, ou seja, não é mais abordado a questão da culpa.
O divórcio direito difere do indireto, haja vista que resulta de estado de fato, autorizando a conversão direta da separação de fato por mais de dois anos, desde que comprovada, em divórcio, sem que haja a prévia separação judicial ou ainda a partilha de bens, consoante preconiza o artigo 1.581 do Código Civil.
O divórcio direto pode ser consensual ou litigioso. No divórcio direto consensual, o procedimento adotado será o previsto nos artigos 1.120 a 1.124 do Código de Processo Civil, observado o artigo 40, parágrafo 2º da lei Nº 6.515/77, que pressupõe que a petição contenha a indicação dos meios probatórios da separação de fato, e seja instruída com a prova documental já existente; a petição fixe o valor da pensão do cônjuge que dela necessitar para sua manutenção, e indique as garantias para o cumprimento da obrigação assumida; se houver prova testemunhal, esta será produzida na audiência de ratificação do pedido de divórcio, a qual será obrigatoriamente realizada; a partilha dos bens deverá ser homologada pela sentença do divórcio”.
Ressalta-se que a Lei não especifica o que consiste a prova documental previamente constituída, mas podem ser lembradas, dentre outras, ação de alimentos ou cautelar de separação de corpos anteriormente ajuizadas, entre outras.
No que tange a partilha de bens, com exceção dos bens havidos por um deles, após a separação de fato, para evitar enriquecimento sem causa, apesar do estabelecido no artigo 1.581 do Código Civil e decisões jurisprudenciais entendendo ser desnecessária a prévia partilha de bens, parece razoável que este entendimento somente se aplique aos casos de divórcio direto litigioso, haja vista que no consensual a petição inicial deve incluir a partilha de bens para homologação, assim como disposições sobre a guarda dos filhos e direito de visitas.
Uma vez que as todas as provas forem produzidas, o juiz prolatará sentença, homologando a vontade das partes; entretanto, se não houver tais provas, o juiz recusará a homologação, cabendo, desta decisão, apelação, a qual poderá ser interposta por um dos cônjuges, por ambos ou pelo representante do Ministério Público.
O divórcio direto litigioso seguirá o procedimento ordinário. Sendo necessário a comprovação do decurso do prazo de dois anos consecutivos da separação de fato. A partilha prévia de bens do casal é dispensável, não constitui óbice à decretação do divórcio
Atualmente, diante do disposto nos artigos 1.580, parágrafo 2ªº, 1.571, parágrafo 2º, 1.584, parágrafo único, 1.586, 1.589, 1.590, 1.694, 1.708 e 1.709, todos do Código Civil, o magistrado tem parâmetros para decidir questões relativas a guarda, alimentos, partilha de bens, entre outros, sem necessidade de averiguar a culpabilidade das partes, requerendo apenas que um dos cônjuges, comprove a separação de fato por mais de dois anos consecutivos.
O divórcio indireto é aquele que pressupõe a decretação anterior da separação judicial e o decurso de prazo de, no mínimo, um ano do trânsito em julgado da sentença, de acordo com o parágrafo 6º, do artigo 226, da Carta Magna, ou ainda, da decisão que concedeu a medida cautelar de separação de corpos, consoante preconiza o caput do artigo 1.580 do Código Civil.
Cumpre ressaltar que do mesmo modo que o divórcio direto, o divórcio indireto pode se apresentar sob duas formas, a consensual ou a litigiosa.
O divórcio indireto consensual se faz mediante o requerimento conjunto das partes, resulta, portanto, do livre consentimento do casal, que se encontra separado judicialmente, pretendendo divorciar-se.
Nesta hipótese a conversão da separação em divórcio é admitida indiretamente, haja vista que entre a separação judicial e o divórcio há a certeza de uma separação reconhecida em juízo.
Em contra partida, o divórcio litigioso indireto somente é obtido mediante uma sentença judicial proferida em processo de jurisdição contenciosa, pelo qual um dos cônjuges, separado de fato judicialmente a mais de um ano, havendo recusa do outro em consentir o divórcio, ingressa em juízo, requerendo a conversão da separação em divórcio.
Parafraseando Maria Helena Diniz[26], a única diferença existente entre o divórcio indireto consensual e o litigioso, diz respeito ao consenso ou dissenso dos consortes.
Em todos os casos de divórcio, seja ele direito ou indireto, consensual ou litigioso, a sentença proferida pelo magistrado somente produzirá efeitos, depois de ser devidamente averbada no registro público competente, em outras palavras, quando for averbada ao assento de casamento.
Da mesma forma como inicia, geralmente informal, a união estável necessita de reconhecimento judicial de sua existência ou de sua dissolução para que produza efeitos jurídicos entre os companheiros.
Assim, a dissolução da união estável se opera pela morte de um dos conviventes, pela vontade das partes e, pelo rompimento da convivência, seja por abandono ou por quebra dos deveres inerentes à união estável (deslealdade, tentativa de homicídio, sevícia, conduta desonrosa, etc.).
Do mesmo modo que ocorre no casamento, a dissolução da união estável gera conseqüências e, dentre estas, o dever de alimentos, bem como a guarda dos filhos, além da partilha dos bens, seja nas condições que a lei estabelece, seja nas condições previamente estipuladas em contrato de união estável.
Como ocorre no casamento, a morte de um dos conviventes dissolve a união estável, salienta-se que este fato não pode ser imputado a qualquer deles, a menos que suceda o homicídio ou a instigação ou auxílio ao suicídio.
Cumpre ressaltar que nos casos em que a união estável se baseie em contrato, a resilição, dada por iniciativa unilateral ou o distrato, pleiteado pelos conviventes, deverá ser processada e homologada judicialmente, frise-se que mesmo quando ocorra resilição unilateral, pode ser proposta ação declaratória para que o magistrado declare a existência da união, além de sua dissolução.
Quanto da dissolução da união estável, a guarda dos filhos poderá caber a qualquer um dos conviventes, em igualdade de condições, no tocante aos deveres de guarda, visita, conservação do acervo patrimonial.
No que tange a partilha de bens, O Código Civil não inovou muito com relação ao que dispunha a Lei 9.278/96, que já regulava a matéria, entretanto, ressalvou que, em não havendo contrato escrito, aplicar-se-á a união estável o regime de comunhão parcial de bens.
Por fim, insta esclarecer que para dissolução da união estável não se faz necessário como requisito a discussão de culpa, da mesma forma como ocorre no divórcio.
Diante do até aqui declinado fica claro que a culpa pelo descumprimento dos deveres conjugais, somente é discutida quando do ajuizamento de separação com causa culposa também denominada de separação sanção.
Deste modo, nos demais tipos de separação, no divórcio e na dissolução da união estável a culpa não é considerada fator relevante para o fim do relacionamento, uma vez que tais institutos baseiam-se na teoria da ruptura.
O tema objeto da presente monografia, infidelidade virtual, diante da perspectiva da legislação em vigor, ensejaria separação judicial com causa culposa, uma vez que representa descumprimento do dever conjugal de fidelidade.
Nos demais casos de separação, no divórcio e na dissolução de união estável, a infidelidade virtual, embora represente violação a dever dos cônjuges e dos companheiros, quais sejam, deveres de fidelidade e lealdade, pouco importa para a dissolução do relacionamento, haja vista que nestes casos, consoante já esposado, não há a possibilidade de discussão de culpa.
Nesse passo, para que seja possível analisarmos a culpa ensejadora da dissolução da sociedade conjugal, se faz necessário entender sua origem, as mudanças e transformações da família e da sociedade, passando a compreender a figura da pessoa humana como um ser “desejante” interligado ao contexto de família.
Com o surgimento da psicanálise, no século XX, Sigmund Freud apresentou ao mundo a existência do inconsciente do subjetivo.
A partir deste momento o pensamento da sociedade se modificou, sendo possível considerar que na objetividade dos fatos existe uma subjetividade que também determina as relações jurídicas.
Neste diapasão, a ciência jurídica recebeu, e ainda recebe, grande influência psicanalítica, influência esta que atinge especificamente o Direito de Família.
Salienta-se que o psicanalista Jacques Lacan, seguidor de Freud, trouxe ao Direito de Família inovador conceito de família, enxergando-a como estrutura psíquica, como núcleo basilar e essencial de qualquer sociedade, sem a qual não é possível nenhum tipo de organização social ou jurídica, haja vista que é na família que tudo se inicia, e é a família que estrutura as pessoas como sujeitos, e que estes encontram algum amparo para o desamparo da sociedade.
Ademais, os movimentos políticos e sociais do século XX e o fenômeno da globalização provocaram mudanças profundas na estrutura da família e nos ordenamentos jurídicos não só do Brasil, mas de todo o mundo.
É evidente que referidas mudanças originaram-se diante do cenário da Revolução Industrial, com a redivisão sexual do trabalho, e à Revolução Francesa, com os ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, os quais promoveram um novo pensamento, inclusive no tocante as relações conjugais e extraconjugais.
Grande alteração pode ser percebida quanto à figura da mulher, que passou a integrar o mercado de trabalho, até então monopolizado pelos homens, cobrando destes a necessidade de assumir e cumprir responsabilidades no lar.
Deste modo, o casamento, até então visto como meio de lucratividade e reprodução, passou a ser observado do ponto de vista afetivo, uma vez que origina plena comunhão de vida entre o casal.
Diante do novo conceito de família, baseada na afetividade, o casamento se tornou mais vulnerável, haja vista que questões subjetivas como o amor e o afeto, acarretam maiores possibilidades de conflitos entre os casais.
Nesse sentido, é o posicionamento do jurista Rodrigo da Cunha Pereira:
“O pensamento contemporâneo tomou um outro rumo a partir do discurso psicanalítico.As noções de inconsciente, desejo, e libido instalaram um outro discurso sobre a sexualidade, que não está necessariamente ligada à genitalidade, mas muito mais ao AFETO. Essa sexualidade está também vinculada a uma moral sexual dita civilizatória, segundo Freud. Por isso podemos dizer que todas as questões com as quais lidamos no Direito de Família, direta ou indiretamente, passam pelo crivo de um viés da moral sexual vigente. Por exemplo: quando se está investigando uma paternidade, mesmo com a possibilidade de prova via exames de DNA, discute-se a conduta da moral sexual da mãe; quando se está litigando em um processo de separação, na maioria das vezes o cerne é saber quem traiu, quem foi infiel; as discussões sobre anulação de casamento estão associadas à homossexualidade, frigidez, impotência etc; as destituições de pátrio poder, na maioria das vezes, dão-se em razão de um abuso sexual.
Em nome dessa moral sexual, dita civilizatória, é que muitos já foram excluídos do “laço social” e da legitimação e do reconhecimento do Estado, como os filhos havidos fora do casamento, famílias ilegítimas por não terem recebido o selo da oficialidade do casamento etc, etc. Até quando os ordenamentos jurídicos continuarão excluindo as formas de relações diferentes daquelas tradicionalmente instituídas? Em nome de qual moral os ordenamentos jurídicos se autorizam ainda a excluir, por exemplo, as relações homoafetivas? Não estaria na hora de reconhecer, em nome da dignidade da pessoa humana, base de sustentação dos Direitos Humanos, a liberdade de as pessoas estabelecerem suas relações e estarem, seja qual for sua forma de expressão do amor, incluídas no laço social?
Em síntese, e para terminar, as bases principiológicas dos Direitos Humanos pressupõem-se como sustentáculo da liberdade do sujeito. Entretanto, não é possível pensar em liberdade se as pessoas não puderem ser sujeitos da própria vida e do próprio destino e desejo. A verdadeira liberdade é aquela em que os Sujeitos-de-Direito não estejam assujeitados aos ordenamentos jurídicos excludentes das diferentes e diversas formas de constituição de famílias, ou nos ordenamentos jurídicos que sobrepõem a forma à essência e ainda não consideram o afeto como norteador e condutor da organização jurídica sobre a família. A verdadeira liberdade e ideal de Justiça estão naqueles ordenamentos jurídicos que asseguram um Direito de Família que compreenda a essência da vida: dar e receber amor.”[27]
Com o passar do tempo, em muitos casos, os casais se deparam com uma realidade diversa da idealizada no início da união, instaurando-se o conflito conjugal na tentativa de atribuir a culpa a um dos cônjuges.
Uma vez que os conflitos conjugais baseiam-se em questões extremamente subjetivas, geralmente os consortes não atingem um consenso, sendo necessário levar para a apreciação do Judiciário tais questões, ou seja, ao Juiz, que frise-se é um terceiro na relação, cabe proferir uma solução para a avença, com o objetivo de minimizar os efeitos da insuportabilidade da vida em comum.
Em referidas demandas, cada parte tem que provar suas alegações, atribuindo ao outro cônjuge a culpa pela infringência de um dos deveres conjugais e pleiteando sua punição, tornando, desta forma, pública os acontecimentos da vida do casal.
A identificação de um culpado tem como escopo manter a função institucional do matrimônio, a fim de ser conservada a família que é a base da sociedade.
A Ilustre Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, Maria Berenice Dias, se posiciona no mesmo sentido:
“A averiguação e identificação de um culpado tem significado quando o agir de uma pessoa coloca em risco a vida ou a integridade física, moral, psíquica ou patrimonial de outrem ou de algum bem jurídico tutelado pelo Direito. Assim, a segregação de quem comete um ato que pode ameaçar a segurança da sociedade é a maneira eleita pelo Estado para assegurar a organização social.
No entanto, migrar o instituto da culpa para obter-se o desenlace do matrimônio não tem qualquer justificativa. Revela nítido caráter punitivo vedar ao “culpado” a iniciativa do processo de separação, assegurando legitimidade somente ao “inocente” para buscar a desconstituição do casamento (art. 1.572). Ou seja, quem não tem motivo, quem nada tem a imputar contra o par simplesmente precisa aguardar o prazo de um ano para buscar a separação (art. 1.572, § 1º) ou o decurso de dois anos para obter o divórcio (art. 1.580, § 2º). De outro lado, se o autor não logra provar a responsabilidade do réu pelo fim do casamento, o pedido de separação é desacolhido. O autor perde a ação e arca com os encargos sucumbenciais. E, as partes continuam casadas, mesmo depois de todo o desgaste de um processo judicial.(…)
No entanto, a lei não contempla a única causa que pode tornar insuportável a vida em comum. Nenhuma das diversas hipóteses ressuscitadas pelo novo Código Civil permite a identificação de um culpado. O que elenca a lei são meras conseqüências de uma única causa. Somente comete adultério, tenta matar, ou age da forma preconizada no art. 1573, quem não ama mais. O exaurimento do vínculo de afetividade é a única causa que leva alguém a agredir, abandonar, manter conduta desonrosa. Tais atitudes são meros reflexos do fim do amor.
A perquirição da culpa, além de ser de todo impertinente, tem seqüelas perversas. Evidencia que o interesse do legislador é simplesmente a mantença dos sagrados laços do matrimônio, punindo quem dele quer se afastar. O culpado perde a própria identidade, pois o uso do nome depende da benemerência do inocente (art. 1.578). Ainda que não mais seja condenado a morrer de fome[1][1], o responsável pela separação irá receber alimentos tão-só para assegurar a sobrevivência (art. 1.704, parágrafo único). Afora tal, a inocência do cônjuge sobrevivente garante-lhe direitos sucessórios ainda que separado de fato há dois anos (art. 1.830).
Não bastasse tudo isso, não deixa de causar estranheza que toda essa averiguação só cabe no processo de separação, sendo absolutamente despicienda quando se trata de união estável. Nada mais é preciso além da identificação do termo inicial e final do período de convívio para a declaração do desfazimento da entidade familiar extramatrimonial.
Ainda que seja dolorido ver o sonho do amor eterno desfeito, ninguém manda no coração e ninguém pode ser condenado por deixar de amar. Portanto, de todo descabida a mantença do instituto da culpa para se chancelar a desconstituição do casamento, devendo ser respeitada a vontade de cada um dos cônjuges. Injustificável causar prejuízos, impor perdas ou proclamar culpados, se o amor acabou!”[28]
A Constituição Federal de 1.988, não identifica a família apenas com o casamento, vez que em seu artigo 226, são previstas outras entidades familiares como a união estável e a família monoparental. O código Civil de 2002 reafirma o novo conceito de família, deste modo, a culpa perde efetividade quanto as suas conseqüências, diante do texto constitucional e infraconstitucional.
Os efeitos impostos pela separação com causa culposa ao cônjuge considerado culpado diz respeito a guarda dos filhos, a utilização do sobrenome do cônjuge e com relação aos alimentos.
Conforme o abordado no item 4.3.1, fica claro que tais efeitos no atual contexto não são aplicáveis, vez que questões relativas a guarda dos filhos, devem ser interpretadas tendo como base o interesse do menor; o nome constitui direito de personalidade do cônjuge que o adota; e por fim, os alimentos são permitidos ao cônjuge declarado culpado, contudo, somente no que diz respeito a sua sobrevivência.
As sanções impostas estão permeadas de valores morais e religiosos, os quais não acompanharam a evolução da sociedade, constituindo uma negação ao direito do ser humano de não mais amar seu parceiro, remetendo a idéia de que o casamento deve ser eterno.
Insta informar que doutrinadores modernos como Maria Berenice Dias, Rodrigo da Cunha Pereira e outros membros do IBDFAM – Instituto Brasileiro do Direito de Família, se contrapõem a teoria da culpa, aplicando nos casos de separação judicial o princípio da ruptura, pelo qual o Poder Judiciário não deve se basear em questões de ordem subjetiva, haja vista que não é possível aferir a contribuição dos cônjuges para a falência do relacionamento afetivo, além disso, é possível afirmar que a infringência a um dos deveres conjugais representa apenas a conduta fim de um relacionamento já desgastado e acabado.
Entretanto, ainda há autores que são favoráveis a aplicação da teoria da culpa, mantendo-se a possibilidade de um dos cônjuges requerer a decretação da culpa do consorte em razão da violação dos deveres conjugais, dentre eles Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos.
A legislação brasileira caminha pela substituição do princípio da culpa pelo princípio da ruptura, o Tribunal do Rio Grande do Sul talvez seja o principal exemplo da aplicação do princípio da ruptura em seus julgados.
Portanto, o princípio da culpa não se enquadra na idéia e ideal de Justiça, vez que são muitos os casos em que os cônjuges não conseguem identificar a causa que determinou o fim da união, consoante já abordado, haja vista que muitas vezes a violação de um dos deveres conjugais é apenas uma conseqüência do que de fato ensejou a separação.
Nesse passo, a doutrina e a jurisprudência têm adotado como fundamentação a teoria do desamor, a qual surgiu com base no princípio da afetividade, a qual hoje é considerada princípio basilar na formação da família.
O princípio da afetividade é fundado no sentimento das paixões naturais, no sentimento de ternura e proteção, contudo, não possui uma previsão legal na legislação brasileira, sendo feita sua extração pela junção de outros princípios como da dignidade da pessoa, da solidariedade e da proteção integral.
Embora não seja expresso no ordenamento jurídico, tal fato não o torna inexistente ou subsidiário, haja vista que sua aplicação é de extrema importância, sobretudo no Direito de Família, que regula questões subjetivas oriundas de relacionamentos afetivos.
Nesse passo, pela teoria do desamor, as relações afetivas, casamento e união estável, chegam ao fim por não haver mais interesses recíprocos entre os cônjuges ou companheiros, sendo possível a verificação de incompreensões entre as partes e dissenso no relacionamento, fato este que não justifica a manutenção e continuidade do relacionamento.
Uma vez que não há mais amor e afeto entre o casal, a atitude mais sensata seria deixar a pessoa que um dia fora amada, livre para reconstruir sua vida ou encontrar-se, pois tanto no casamento como na união estável, o que imposta é vontade de permanecer junto, inexistindo esta, não há motivo para “aprisionar” o cônjuge ou companheiro que deixou de amar e desejar o outro.
À luz da teoria do desamor, não há motivos para aferição de culpa, cabendo, tão-somente ao Poder Judiciário, diante de uma ação de separação, buscar obter resolução de questões de cunho patrimonial e quanto aos filhos, se estes existirem, devendo ser expurgada a vinculação moral da culpa pelo desenlace do casamento.
Diante deste contexto, Alexandre Rosa entende que:
“No paradigma do desamor as culpas são partilhadas a gosto dos cônjuges, sem que se preocupe em apontar o culpado pelo fim do relacionamento. Será que alguém se acredita totalmente inocente ao final de um relacionamento? Nunca fez qualquer ato ou omissão capaz de gerar no companheiro/companheira uma desilusão, um dissabor, uma frustração, uma mágoa sequer?” [29]
Independentemente se houve culpa ou não, quando duas pessoas resolver colocar fim a um relacionamento, ocorre o fim da comunhão de vida que existia entre o casal, pois não há mais desejo, afeto e amor.
Em síntese, diante das mudanças e transformações da sociedade deve-se abstrair do ordenamento jurídico a teoria da culpa, tendo em vista sua inaplicabilidade diante do novo conceito de família que é baseado na afetividade, substituindo-a pela teoria do desamor, cujo objetivo principal é busca da felicidade dos cônjuges.
Como o avanço tecnológico-científico alcançado pela humanidade a partir da segunda metade do século XX, houve uma mudança profunda dos conhecimentos humanos, sendo que nenhuma área da sociedade pôde se eximir de seus efeitos, fato este que exigiu do Direito – ciência cujo principal objetivo é a prevenção de conflitos e solução dos já instaurados – uma adaptação a esta nova realidade.
Consoante esposado ao longo desta monografia, a atualidade é considerada a Era da Informática, com predominância da Internet como forma de interação entre as pessoas.
Nesse passo, no âmbito do mundo virtual, o Direito de Família depara-se com uma questão proporcionada pela cibernética e que faz parte da realidade da sociedade moderna, a infidelidade virtual, a qual exige do ordenamento jurídico soluções para os conflitos impostos.
A sociedade com a finalidade de proteger a família, adotou a monogamia como padrão social, desde modo, qualquer ato ofensivo ao dever de fidelidade, lealdade e mútuo respeito, serão considerados infidelidade.
Cumpre consignar que a fidelidade e o respeito mútuo constituem juízo de valor emanado da sociedade, pela qual é imposto um limite ao direito de liberdade do indivíduo.
Frise-se, ainda, que a fidelidade envolve o dever de lealdade entre os parceiros, tanto sob o aspecto físico como sob o aspecto moral, com a finalidade de não permitir o envolvimento afetivo e sexual com terceiro alheio ao relacionamento.
A infidelidade virtual caracteriza-se por ser um relacionamento virtual praticado por pessoa comprometida, seja pelo casamento ou pela união estável, o qual passa a experimentar diferentes experiências afetivas e/ou sexuais com pessoa estranha a união, ainda, que não haja contato físico, pois há um relacionamento de fato entre os indivíduos que estão conectados “on line”.
Muitas são as causas que podem motivar a infidelidade virtual, desde a curiosidade em manter um relacionamento proibido, até mesmo para preencher carências afetivas diante de um relacionamento preexistente e real já ameaçado pela ausência de amor, afeto e desejo.
A infidelidade virtual, como qualquer tipo de infidelidade, pode ser considerada apenas a conseqüência, o efeito, de uma causa já existente.
Desde modo, quando descoberta a infidelidade virtual, esta acarreta, geralmente, o fim dos relacionamentos preexistentes e reais, contudo, é preciso ressaltar que tais relacionamentos já estavam acabados pela falta de amor e desejo, pois é evidente que aquele que ama, não trai.
Pois bem, propaga a legislação brasileira a hipótese de o cônjuge traído requerer a separação judicial, abordando causa culposa, qual seja, a infidelidade, podendo ser elencada nesta hipótese a infidelidade presencial e virtual, haja vista o descumprimento de dever imposto aos cônjuges e aos companheiros.
Nesta hipótese de separação é imposta ao cônjuge culpado sanções relativas a guarda dos filhos, utilização do nome e alimentos.
Consoante já abordado no capítulo anterior, tais sanções já foram superadas, não causando nenhum efeito prático, ou seja, não importa a declaração de culpado, a guarda dos filhos sempre atenderá os interesses do menor; o sobrenome diz respeito ao direito de personalidade do cônjuge que o adota, e por fim, os alimentos, caso sejam necessários, serão deferidos ao cônjuge culpado, em valor suficiente apenas para sua sobrevivência.
Insta consignar que paradoxalmente nos demais tipos de separação judicial, no divórcio e quando da dissolução da união estável, a culpa não é discutida.
No entanto, ainda prevalece no ordenamento pátrio a possibilidade da separação judicial com causa culposa; e dentre os doutrinadores que amparam a permanência do princípio da culpa com a aplicação das respectivas sanções previstas no Código Civil, estão Yussef Said Cahali, Caio Mário da Silva Pereira e Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos.
Para essa corrente, a sentença de separação determinará o cônjuge culpado, sendo aplicada a penalidade devida oriunda de seu comportamento infiel.
Referidos doutrinadores defendem a possibilidade do cônjuge inocente, pleitear indenização por danos morais, alegando, em suma, que não há dúvidas quanto ao ato ilícito, qual seja, a violação ao dever conjugal da fidelidade.
Deste modo, a ação de separação judicial com causa culposa pode ser cumulada com o pedido de indenização por danos morais, ou ainda, pode o cônjuge inocente aproveitar a sentença que declarou o cônjuge infiel como culpado e ajuizar separadamente a ação de indenização por danos morais.
Vale transcrever o posicionamento da ilustre jurista Regina Beatriz Tavares da Silva Papa dos Santos:
“A prática de ato ilícito pelo cônjuge que descumpre dever conjugal e acarreta dano ao consorte, ensejando a dissolução culposa da sociedade conjugal, gera a responsabilidade civil e impõe a reparação dos prejuízos, com o caráter ressarcitório ou compensatório, consoante o dano seja de ordem material ou moral”[30]
Em que pese o notório conhecimento jurídico dos juristas que defendem a manutenção do princípio da culpa com a aplicação das sanções previstas na lei ordinária, a investigação da culpa somente remonta à idéia, já ultrapassada, de que o casamento não poderia ser desfeito.
Nesse sentido, parte da doutrina mais moderna, defende a substituição do princípio da culpa pelo princípio do desamor, dentre eles, Rodrigo da Cunha Pereira, Maria Berenice Dias, Rolf Madaleno, Antônio Cesar Peluso.
Para os partidários da substituição do princípio da culpa, o novo conceito de família abarcado pela Constituição Federal de 1.988, não se identifica apenas pelo casamento, ademais pela análise dos dispositivos constitucionais e infraconstitucionais, não há como associar a aplicação das penalidades previstas no Código Civil à ruptura da vida em comum do casal.
Referida corrente também aponta o fato da contradição existente no nosso ordenamento jurídico quando estabelece que no caso de separação remédio, separação falência, divórcio e dissolução da união estável, não há abordagem sobre a culpa, não sendo esta necessária para a dissolução da união.
Importante ressaltar que para caracterizar o fim da união basta a extinção do amor e do afeto, os quais são a base de qualquer entidade familiar, sendo certo que na ausência destes, não há motivos para continuidade do relacionamento.
Conforme já asseverado, a doutrina e a jurisprudência têm-se inclinado para a substituição da teoria da culpa pela teoria do desamor, a fim de acompanhar a evolução da sociedade moderna.
Considerando a aplicação da teoria do desamor, ou seja, retirando do ordenamento jurídico a possibilidade da separação judicial com causa culposa, ainda assim, permanecerá a possibilidade de indenização por danos morais face o descumprimento de um dos deveres dos cônjuges ou companheiros.
Salienta-se que diante um caso de infidelidade, tanto presencial como virtual, a separação será inevitável, vez que se houve o descumprimento do dever de fidelidade e lealdade, tal fato significa que a parte que se envolveu em um relacionamento com um terceiro alheio ao casamento ou a união estável, não sente mais o amor e o afeto que inicialmente existiam quando da constituição da união.
Deste modo, a separação com fundamento na teoria do desamor, não significa “perdão” ao cônjuge ou companheiro infiel, simplesmente exterioriza o rompimento da união, face a ausência da afetividade, princípio fundamente da família; e, portanto, permite ao cônjuge ou companheiro atraiçoado, a possibilidade de pleitear a reparação pelos danos morais suportados.
Frise-se que se faz necessário observar se o descumprimento do dever de fidelidade ou lealdade, causou de fato acometimento moral ao cônjuge ou companheiro traído.
Nesse passo, incontáveis são as noções e definições de dano moral que permeiam a doutrina jurídica, sendo certo que há algum tempo, contentavam-se os autores com uma definição genérica, pela simples negação do patrimônio físico, econômico ou patrimonial da pessoa.
Entretanto, a conceituação que realmente satisfaz, até mesmo pela quantidade de vezes em que é citada em artigos e doutrina, é a dada por Carlos Alberto Bittar, que entende que o dano moral é a lesão sofrida pela física ou jurídica, em certos aspectos de sua personalidade, em razão de investidas injustas de outrem que atinjam a moralidade e a afetividade da pessoa, causando-lhe constrangimentos, vexames, dores, enfim, sentimentos e sensações negativas.
Cumpre ressaltar que não será considerado dano moral qualquer acometimento comezinho do dia a dia, sendo necessário que cause mácula ao direito de personalidade daquele que pleiteia a indenização.
Não paira dúvidas de que a infidelidade é uma conduta moralmente reprovável, haja vista ter o Brasil adotado a monogamia como forma de relacionamento.
Diante do conceito de monogamia, fora estabelecido como dever conjugal a fidelidade e como dever dos companheiros a lealdade, a qual abrange também a fidelidade no aspecto físico e moral.
A violação do dever de fidelidade ou lealdade, enseja descumprimento dos deveres entre os cônjuges e companheiros, e, por conseguinte, a possibilidade de indenização por danos morais.
Vale ressaltar que tal indenização não pretende punir o cônjuge ou companheiro pela falta de amor e afeto, haja vista que nem sempre a infidelidade pode ser considerada a causa de dissolução do relacionamento, sendo em alguns casos somente a conseqüência, diante de uma união já desgastada.
Por oportuno, cumpre transcrever o posicionamento da ilustre jurista Marta Vinagre Bembom:
“É possível, efetivamente, achar um culpado pelo fracasso do casamento ou da união estável? Quem é mais responsável pela ruína de uma união: o parceiro, que, há tempos, e continuamente, vem praticando as mais diversas “faltas” ou o outro, que cometeu o último deslize? Quem é, afinal, o cônjuge infrator: o que se relacionou, “amorosamente”, pela Internet ou o seu consorte que o despreza, que mantém apenas uma aparência de casamento para dar uma satisfação à sociedade? Culpado, normalmente, é o que não tem força nem estrutura para atirar a primeira e mais pesada pedra, é o mais desamparado, o que não tem condições de contratar bens advogados para defendê-lo dos ataques vis e desprezíveis que exsurgem de uma relação afetiva desfeita, quando o amor transforma-se em ódio, que vem se somar aos mistérios da natureza humana, restando, no dizer também do Professor RODRIGO, apenas os “restos” ou os cacos, que ainda ferem”.[31]
Entretanto, a falta de amor, afeto e desejo do parceiro que se envolve com terceiro alheio a relação estável ou conjugal, não pode causar no cônjuge traído acometimento moral.
Nesse contexto, entendemos que não pode o cônjuge ou companheiro traído passar por situações constrangedoras e vexatórias, causadas pela infidelidade de seu parceiro; servindo a indenização como forma de reparação e compensação pela mácula que a atitude do cônjuge ou companheiro infiel causou.
Não há como o Direito negar a uma pessoa que aceita manter com outra, laços de ternura e dedicação, a reparação do sofrimento imensurável na hipótese de imprevisto unilateral, que cause constrangimentos, humilhações e o rompimento da exclusividade recíproca de sentimentos que permeiam uma entidade familiar.
A infringência ao dever de lealdade e fidelidade, atinge a dignidade da pessoa humana, os quais fazem parte dos direitos de personalidade dos companheiros ou cônjuges, motivo pelo qual, quando violados, ensejam em muitos casos, o dano moral.
È certo que o cônjuge ou companheiro traído, em muitos casos, é exposto a situações constrangedoras, até mesmo diante da família e da sociedade, tais fatos ensejam a reparação civil.
No tocante a infidelidade virtual, é cristalino que há violação do dever de fidelidade ou lealdade, vez que tais relacionamentos levam a um envolvimento afetivo com a terceira pessoa, de modo que emoções, confidências, segredos, são compartilhados entre os envolvidos.
Salienta-se que a infidelidade virtual para ser caracterizada independe de contato físico entre os parceiros, bastando para tanto, atos que levam a prazeres afetivos e sexuais.
Imperioso consignar que a indenização por danos morais não pode representar o enriquecimento ilícito daquele que a pleiteia, devendo servir apenas como fonte de reparação e compensação pelos prejuízos suportados, haja vista que a fissura que causa
à alma daquele que é acometido pelo dano moral, é um dos males que jamais se apagará.
No que concerne a demonstração do dano moral, ressalta-se que o dano moral não existe no plano material, fato este que dificulta a demonstração de sua ocorrência, nesse passo não basta a afirmação do cônjuge ou companheiro traído de ter sido violado moralmente, atingido em sua dignidade, ante o descumprimento do dever de fidelidade e lealdade.
Deve ser possível da análise do fato efetivamente ocorrido, ou comprovado, que se presuma a ocorrência de gravame a um bem moral.
Nesse contexto, assevera-se que o espaço virtual é um meio que garante pouca privacidade ao internauta, sendo certo que ainda que o internauta se identifique por meio de codinomes, os denominados “Nicks”, os e-mail e conversas mantidas “on line” ficam arquivados no computar e no provedor de acesso à rede.
Referidos arquivos em um processo de indenização, poderão ser requisitadas pelo Magistrado, a fim de corroborar os fatos aduzidos na exordial.
Frise-se que tais informações podem ser facilmente verificadas por técnicos de informática e os chamados “hackers”, ainda que o usuário do computar utilize senha para acesso ao correio eletrônico, haja vista ser a segurança proporcionada no espaço virtual relativa.
Quando o cônjuge ou companheiro infiel utiliza computador familiar para manter relacionamento afetivo/sexual com terceiro alheio ao relacionamento, sem o uso de senha, não há o que se falar em invasão de privacidade ou infração ao direito de sigilo, quando da utilização de cópia das conversas mantidas e e-mail trocados entre os amantes virtuais.
Entretanto, quando o cônjuge ou companheiro utiliza senha de acesso, as provas obtidas sem seu consentimento, ou seja, por meio de profissional técnico em informática ou por um “hacker”, será considerada prova ilícita.
Deste modo, a fim de infringir o direito de privacidade e de sigilo das comunicações pessoais, o cônjuge ou companheiro traído que pleitear indenização por danos morais, decorrente da conduta infiel de seu parceiro, deve socorrer-se do Poder Judiciário para obtenção da prova desejada.
Pelo esposado, não resta dúvidas de que a infidelidade desvendada, seja presencial ou virtual, representa a violação do dever de fidelidade e lealdade entre os cônjuges e companheiros, e por conseqüência lógica, infringência a dignidade da pessoa humana, fundamento maior de nosso ordenamento jurídico, gerando o acometimento do cônjuge ou companheiro traído.
Sendo a dignidade humana requisito imprescindível a justificar a razoabilidade do convívio entre os homens, não são necessárias muitas elucubrações mentais para concluir-se que a infringência a este princípio basilar do Estado Democrático de Direito, gera a desestabilização da sociedade.
Não há outra forma do Estado minimizar os efeitos infringência ao seu fundamento maior, qual seja, a dignidade da pessoa humana, senão a condenação do cônjuge ou companheiro infiel ao pagamento de indenização por danos morais ao cônjuge ou companheiro traído, quando da ocorrência de situações que lhe causaram constrangimentos e vexames, ou seja, quando caracterizado o acometimento moral; vez que o sancionamento desta conduta ética é tomada em prol de um mundo melhor consoante já asseverava Rousseau, além de indispensável a manutenção da sociedade.
Informações Sobre o Autor
Cybelle Guedes Campos
Advogada. Pós-graduada em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Universidade São Judas Tadeu, especialista em Direito Contratual pela Fundação Getúlio Vargas – FGV.