Resumo: Muito se há falado sobre a responsabilidade civil no âmbito de trabalho com relação ao empregador e também com relação aos acidentes “de” e “no” trabalho. Porém esse artigo tratará da responsabilidade civil delitual do empregado, público ou privado, quando a questão é a falta injustificada, imprópria e desinteressada no local de trabalho; falta esta que se pode acarretar danos a usuários, colegas e/ou instituições e empresas. Essa falta aqui será tratada como negligencia, e será abordada de acordo com a análise feita por estudos na área social e humana no ambiente de trabalho, porém abarcadas aos olhos do direito.
Palavras-Chave: responsabilidade delitual, negligencia, ausência, profissional, danos.
Abstract: Much is spoken about the liability civil under working with relationship the employer, and also with respect to accidents "from" and "on" work. But this article will address the liability civil tortious of the employee, public or private, when the issue is the lack unjustified, improper and disinterested in the workplace; lack this that one can cause damage to users, colleagues and / or institutions and companies. This lack here is treated as negligence, and will be addressed according to the analysis by studies in the area social and human in the workplace, but spanned to eyes of the law.
Keywords: tortious liability, negligence, absence, professional, damage.
Sumário: Introdução. 1. A profissionalização, o trabalho exclusivo e a dependência. 2. O Lex Aquilia. 2.1. Negligência. 3. A ausência imérita no trabalho. 3.1. Dos danos causados a instituição/empresa. 3.2. Dos danos causados ao serviço. 3.3. Dos danos causados ao usuário. 4. Da possível reparação. Conclusão. Referências.
Introdução
O âmbito de trabalho, não diferente dos demais ambientes humanos, é um local cheio de direitos e deveres, e as relações de trabalho propõe um leque de responsabilidades. Embora a responsabilidade contratual seja o alvo preferido dos direitos de justiça no Brasil, como os direitos do trabalho e previdenciário, a responsabilidade delitual vem se destacando no mundo contemporâneo, onde os direitos humanos e sociais estão em pleno vapor. Porém, a responsabilidade delitual ainda é foco de temas como “assédio moral e sexual” e “abuso de poder”.
Mas há no seio das relações de trabalho uma problemática chamada DEPÊNDENCIA do serviço prestado por um ou dois profissionais (empregado) em uma determinada lotação. Isto quer dizer que com o avanço da profissionalização, os trabalhos vêm se tornando exclusivos, e as vagas limitadas. Tornando a falta (ausência) de um determinado profissional ao local de trabalho, por muitas vezes, uma catástrofe em seu real sentido.
É ai que se enquadra o dano ao serviço, ao servidor ou ao usuário quando da falta injustificada de um determinado profissional. É nessa condução de negligencia no trabalho, que o presente texto propõe a obrigação do trabalhador de reparar o dano causado por sua falta imérita para dentro do Lex Aquilia.
1. A profissionalização, o trabalho exclusivo e a dependência.
A profissão é um termo pertencente ao mundo contemporâneo, ela possui regulamentos e representações, tornando-se cada vez mais uma palavra mais concreta do que abstrata.
De acordo com os estudos do educador Simon Schwartzman (2005), a profissionalização no Brasil floresceu no século XX, o que permite dizer que nos tempos de hoje não estamos mais engatinhando pela busca da capacitação/especialização nas áreas do trabalho. Porém isso não exclui o fato de que o país ainda é novo nessa realidade e é grande a abrangência de sua inexperiência com relação à formação profissional.
Sem maiores escólios, o importante é que no Brasil já existe o profissional capacitado e especializado em um determinado ramo, e as relações de trabalho exige que seja assim, pois se entende que é “dentro da esfera profissional que a sociedade exerce sua coesão” (Nobert Elias apud BARBOSA, 1998).
Antes, o trabalho era visto como todos fazendo parte de uma mesma sociedade corporativa, uma igualdade entre os proletariados com relação ao serviço. Na verdade o trabalhador era uma espécie de “faz-tudo”. O capitalismo, a globalização e o avanço tecnológico e de aprofundamento de estudos destrói o “proletário” e apresenta o “profissional”, dotado do trabalho exclusivo que requer:
“a existência de um corpo de conhecimento suficientemente abstrato e complexo para requerer um aprendizado formal prolongado; uma cultura profissional sustentada por associações profissionais; uma orientação para as necessidades da clientela e um código de ética.” ( DINIZ, 2001, p.20).
Este tipo de formação é o trabalho exclusivo, que está na capacidade de exercer um determinado ofício com alto grau de instrução de conhecimento a respeito do que se faz, como se faz e a quem se faz. A graduação hoje somente não basta, o profissional tende a buscar sempre uma manutenção de conhecimentos para superar seus limites e adversários, se tornando cada vez mais únicos, diferente de tempos atrás quando:
“Os profissionais não tinham prazo de validade determinado. Ninguém ousava perguntar a um médico ou a um engenheiro se ele tinha feito cursos de atualização profissional visando aprimorar seus conhecimentos. A velocidade da ciência e da pesquisa era baixa em comparação aos dias de hoje e não havia tanta pressa em se atualizar. As oportunidades eram diferentes e o conhecimento adquirido durava mais. Mas este panorama mudou muito desde então. A velocidade das mudanças, a famosa globalização e o desenvolvimento tecnológico transformam incessantemente o ambiente de trabalho, de forma que hoje não há dúvidas de que "estudo" e "formação" não são apenas uma etapa da vida, mas uma constante ao longo de toda a carreira.” (COLLETTO, 2005).
Observando, de acordo com o que foi mencionado até então, a dependência nas relações de trabalho e nas relações entre usuários e profissionais. Uma vez que este profissional é especializado em determinada área, ninguém mais, além dele, deve fazer seu trabalho. Uma vez que nenhum outro que não tenha sua formação profissional possa realizar seu ofício, a responsabilidade civil surge em seus atos, podendo ser obrigado a reparar certos danos causados por eventuais recusas ou faltas ao serviço perante o Lex Aquilia.
2. O Lex Aquilia.
Denominação vinda das leis romanas, o Lex Aquilia conhecido como responsabilidade aquiliana ou delitual na área da Responsabilidade Civil do direito, apresenta o termo responsabilização ou invés de obrigação de reparar danos. A diferença é que “na obrigação, verifica-se um dever jurídico originário, ao passo que, na responsabilidade, a conseqüência de violar a obrigação gera o dever jurídico da responsabilidade” (Cavalieri Filho, 2009, p. 2). O presente termo é bem definido nos textos de Maria Helena Diniz:
“A responsabilidade extracontratual, delitual ou aquiliana decorre de violação legal, ou seja, de lesão a um direito subjetivo ou da prática de um ato ilícito, sem que haja nenhum vínculo contratual entre lesante e lesado. Resulta, portanto, da inobservância da norma jurídica ou de infração ao dever jurídico geral de abstenção atinente aos direitos reais ou de personalidade, ou melhor, de violação à obrigação negativa de não prejudicar ninguém.” (DINIZ, 2007, p.505).
Quando a ausência de um determinado profissional se torna uma violação aos direitos de um usuário, na qual não há vinculo contratual, mas se há real dependência do serviço prestados por este profissional, existe aí agravos na responsabilidade civil. Sergio Cavalieri Filho explica melhor quando diz que
“se esse dever de violação surge em virtude de lesão a direito subjetivo, sem que entre o ofensor e a vítima preexista qualquer relação jurídica que o possibilite, temos a responsabilidade extracontratual, também chamada de ilícito aquiliano ou absoluto” (CAVALIERI FILHO, 2009, p.14).
Um exemplo simples é o caso dos serviços prestados por um assistente social de uma determinada universidade, que um de seus deveres é atender alunos carentes em prol de oferta de bolsa alimentação, com o intuito de contribuir pela permanência dos referidos estudantes na universidade. Porém, o profissional de serviço social falta fogosamente, sem prestar justificativas de forma meramente irresponsável, deixando os alunos por dias sem direito a refeições gratuitas no restaurante universitário da universidade. A ação deste assistente social é entendida como Mera Culta ou Negligência, ferindo diretamente a responsabilidade Civil.
2.1. Negligência.
No dicionário Aurélio, o termo negligência indica “sf 1. Desleixo, incúria. 2. Indolência.” (mini Aurélio, p. 483), e se encontra dentro do Código Civil brasileiro como ato ilícito:
“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
A negligência, representada aqui como a falta injustificada e desleixada ao serviço, e é tido juridicamente como CULPA, pelos atos cometidos. Essa culpa ou mera culpa exprime um juízo de responsabilidade pessoal e social sobre sua conduta, além de expressar ação leviana e imérita do profissional.
3. A ausência imérita no trabalho.
A ausência imérita é a falta ao trabalho sem mérito, sem justificativa, sem reconhecimento e sem valor, que trás possíveis danos e consequentemente culpa ao profissional negligente. A culpa está dividida em duas categorias, a “ex lascivia” e a “ex ignorantia”, conhecidas como culpa consciente e culpa inconsciente, respectivamente.
A culpa consciente é quando o ator prediz os fins de sua conduta, porém espera que entes fins não advenham, ou simplesmente não se importa. Já na culpa inconsciente o ator não prediz os fins de sua conduta, apesar dele ser bem previsível, bem provável. Um profissional que conhece bem suas atribuições e as dependências de seus clientes e/ou usuários aos seus serviços e falta ao trabalho, pode-se ser analisada pelas duas óticas de culpa apresentados.
A ausência imérita ao ambiente de trabalho pelo profissional, quando sem possibilidade de ser substituído e sendo ele o único em seu quadro de lotação, acarreta danos à usuários reparáveis e irreparáveis, vale analisar o grau da mera culpa ou negligência.
3.3 Dos danos causado ao usuário
Se há dano, tem que haver reparação. Pelo menos é dessa forma que se pensa a sociedade desde sua formação. Assim como indica Sílvio de Salvo Venosa (2008 p. 1-2):
“Os princípios da responsabilidade civil buscam restaurar um equilíbrio patrimonial e moral violado. Um prejuízo ou dano não reparado é um fator de inquietação social. Os ordenamentos contemporâneos buscam alargar cada vez mais o dever de indenizar, alcançando novos horizontes, a fim de que cada vez menos restem danos irressarcidos. É claro que é esse um desiderato ideal que a complexidade da vida contemporânea coloca sempre em xeque. Os danos que devem ser reparados são aqueles de índole jurídica, embora possam ter conteúdo também de cunho moral, religioso, social, ético, etc., somente merecendo a reparação do dano as transgressões dentro dos princípios obrigacionais.”
O dano como afirma Venosa, tem vários segmentos, como o cunho moral, religioso, social, ético… Pode-se acrescentar a este artigo os de cunho financeiro, saúde, psicológico e outros de suma relevância social. Danos pessoais que provém da ausência imérita, negligente de um profissional especializado e capacitado para exercer determinada atribuição somente permitida por ele.
Um exemplo de dano patrimonial por ausência negligente de um guarda municipal é quando deste profissional falta ao trabalho em noites escaladas para se trabalhar em determinada área que possui praça com parque municipal, e vândalos destroem o citado parque do município, ao estarem ciente da ausência imérita e/ou negligente do guarda municipal na região.
Todo profissional negligente, por força de ausência imérita ao trabalho, causar danos a outrem, em especial aos usuários de seus serviços e que não possuam contrato, porém dependência obvia dos serviços do profissional negligente, deve reparar o dano. Ou melhor, deverá ser responsabilizado a indenizar sua “vítima”.
4. Da possível reparação
Sabe-se que para existir responsabilidade de indenizar, é necessário que exista dano. Que o caso ilícito culposo encerre acarretando prejuízo a outrem. Danos pessoais, materiais, patrimoniais, emergentes, Dano real, Dano de cálculo e entre outros, são exemplos de possíveis danos trazidos a um usuário dos serviços prestados por um determinado profissional que faltou ao trabalho por mera culpa ou negligencia.
O nível de circunspecção do dano é avaliado por um padrão objetivo. A circunspecção do dano será avaliada em posto da tutela do direito, ou seja, o dano necessita ser grave para que se explique a concessão de reparação ao lesado.
A reparação corresponderá a juízos de igualdade, tendo em vista as circunstâncias reais de cada caso. Analisar-se-á a gravidade do fato, observando o mérito da tutela do direito, reparando mais que indenizando, concretizando a missão do Lex Aquilia.
Conclusão
No mundo contemporâneo, o profissional especializado e capacitado para o livre exercício de suas atribuições, além de direitos, possuem também deveres. Estes deveres trazem com sigo muitas responsabilidades, entre elas a responsabilidade delitual, quando em suas ações a mera culpa ou negligencia está presente. Um exemplo sério é a ausência imérita, injustificada e desnecessário ao ambiente de trabalho onde os usuários necessitam dos serviços prestados pelo profissional.
Em qualquer acontecimento, portanto, em qualquer das diretrizes da responsabilidade civil, haverá ininterruptamente de ter uma ligação causal entre o fato e o dano, para que o agente da causa seja responsabilizado a indenizar o prejuízo cometido.
ARMANDO DAL COLLETTO. Folha de São Paulo. A importância do aperfeiçoamento profissional. 04/04/2005. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/folha/educacao/ult305u17270.shtml> Acesso em: 03/11/2012.
BARBOSA, M. L. de O. Para onde vai a classe média: um novo profissionalismo no Brasil. Tempo Social, São Paulo, v.10, n.1, p.129-142, mai. 1998.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. São Paulo: Saraiva, v. 7, 1984.
______. Os donos do saber: profissões e monopólios profissionais. Rio de Janeiro: Revan, 2001.
FILHO, Sergio Cavalieri. Programa de Responsabilidade Civil. 8 ed. Revista e ampliada.São Paulo: Editora Atlas, 2009.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 8. ed. São Paulo: Editora Atlas, 2008.
Informações Sobre o Autor
Carmem Tassiany Alves de Lima
Assistente Social. Pesquisadora. Mestranda em Cognição, Tecnologias e Instituições pela Universidade Federal Rural do Semi-árido – UFERSA