Natureza jurídica da responsabilidade civil por danos morais

Resumo: Este trabalho, de natureza bibliográfica, analisa a natureza jurídica da responsabilidade civil por danos morais, sob a justificativa de que, diante da amplitude e complexidade que envolve a estipulação de um valor à reparação civil do dano moral, cabe ao julgador analisar as peculiaridades de cada caso concreto, fazendo incidir certos princípios informadores próprios da quantificação do dano moral ministrados pela doutrina e pela jurisprudência, seja em razão da natureza e da função da reparação ou igualmente, tendo em vista a conduta do agressor e as condições pessoais das partes, situação que faz emergir a preocupação com o que se chama de “prudente arbítrio do julgador.”


Palavras-chave: responsabilidade civil, princípios.


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Abstract: This work, bibliographical, examines the legal nature of liability for punitive damages, on the grounds that, given the breadth and complexity involving a stipulation of value to civil remedies for moral damages, it is for the judge to analyze the peculiarities of each case, focussing on certain principles of the informants themselves on damage moral taught by the doctrine and jurisprudence, both because of the nature and function of repair and also in view of the conduct of the offender and the individual circumstances of the parties, a situation that gives rise to concern over what it calls “discretion of the judge.”


Keywords: civil liability, Principles.


Sumário: 1. Introdução; 2. Uma visão histórico-conceitual da responsabilidade civil; 2.1. Definindo responsabilidade civil; 2.2. Pressupostos da responsabilidade civil; 3. Natureza jurídica da responsabilidade civil por danos morais; 3.1. Dano moral indenizável; 3.2. Natureza jurídica da reparação do dano moral; 4. Considerações finais referências


1. Introdução


A temática envolvendo reparação por danos morais ainda causa perplexidade, principalmente para aqueles que desconhecem a realidade de quem é atingido nos seus sentimentos mais nobres, ignorando o alcance do instituto. Nos últimos anos, verifica-se crescente demanda de ações com pedidos de indenização por danos morais nos tribunais brasileiros, o que denota uma mudança paradigmática do conceito de responsabilidade civil e uma nova postura sociocultural em relação aos danos morais, razões que justificam uma abordagem investigativa mais amiúde sobre o assunto.


Silva (1983, p. 630-1) já se manifestava, enfatizando que:


“É preponderante, na reparação dos danos morais, o papel do juiz. A ele, a seu prudente arbítrio, compete medir as circunstâncias, ponderar os elementos probatórios, inclinar-se sobre as almas e perscrutar as coincidências em busca da verdade, separando sempre o joio do trigo, o licito do ilícito, o moral do imoral, as aspirações justas das miragens de lucro, referidas por Dernburg.”


Para nortear a pesquisa, questiona-se: qual a natureza jurídica da indenização por dano moral: compensatória ou punitiva?


Para direcionar a investigação, em busca das respostas à problemática levantada, adota-se a técnica de pesquisa bibliográfica (produção acadêmica) e documental (legislação e jurisprudência), utilizando-se o método de interpretação jurídica aplicado ao ordenamento jurídico, à doutrina e à análise jurisprudencial. Os procedimentos operacionais, ligados diretamente ao tratamento dos aspectos factuais da construção do conhecimento, são trabalhados conforme o método histórico e processual: primeiro porque se faz necessária à abordagem histórica da responsabilidade civil para entender e justificar sua aplicabilidade em relação ao dano moral; segundo em razão de que a perspectiva de processo leva em consideração que o direito e a sociedade são formados por diferentes componentes, inter-relacionados e interdependentes, compreendendo-se o dano moral como parte de um todo multidisciplinar.


2. Uma visão histórico-conceitual da responsabilidade civil


2.1 Definindo Responsabilidade Civil


Sempre que se tenha a pretensão de estudar determinado tema, este deve ser precedido de uma mínima definição. Discorrer sobre o tema responsabilidade não é atribuição das mais fáceis, tendo em vista que se trata de uma matéria de natureza interdisciplinar. Contudo, é preciso pelo menos uma noção prévia para a devida compreensão de seu conceito contemporâneo.


Em termos gerais, é possível fixar uma noção de responsabilidade[1] no sentido de repercussão obrigacional da atividade humana. Como o campo do que se chama de atividade humana varia até o infinito, é lógico concluir que são também inúmeras as espécies de responsabilidade, conforme a área em que se apresenta o problema: violação de regra moral ou de norma jurídica. (DIAS, 2006, p. 4).


A responsabilidade moral repousa na seara da consciência individual, acontecendo quando da violação de uma regra moral, de modo que o ofensor se sentirá responsável perante sua própria consciência. Já a responsabilidade jurídica apresenta-se quando ocorrer uma


“infração de norma jurídica civil ou penal, causadora de danos que perturbem a paz social que essa norma visa manter […] se houver prejuízo a um indivíduo, à coletividade, ou a ambos, turbando a ordem social, a sociedade reagirá contra esses fatos, obrigando o lesante a recompor o status quo ante, a pagar uma indenização ou a cumprir pena, com o intuito de impedir que ele volte a acarretar o desequilíbrio social e de evitar que outras pessoas o imitem”. (DINIZ, 1995, p. 15).


Portanto, a responsabilidade jurídica pode ser penal ou civil. A primeira pressupõe uma lesão aos deveres de cidadãos para com a sociedade, acarretando um dano social determinado pela violação de uma norma penal, exigindo-se a aplicação de pena ao causador do dano. A responsabilidade civil requer prejuízo à terceiro, seja este um particular ou o próprio Estado, de modo que a vítima poderá pedir reparação do dano, traduzida na recomposição das coisas como elas se encontravam (status quo ante) ou, ainda, numa quantia em dinheiro. A responsabilidade civil é a repercussão do dano civil onde não se cogita se o ato que causou o dano ao particular ameaça, ou não, a ordem social.[2] (STOCO, 1995, p. 49).


Desta feita, perpassando o conceito de responsabilidade e sua classificação quanto à natureza da norma violada, chega-se ao cerne investigativo deste tópico, que é a responsabilidade civil, definida como a obrigação que forma um vínculo entre um indivíduo perante o outro em decorrência de prejuízo causado. (MEIRELLES, 1994, p. 225).


Diversos são os conceitos expostos pela doutrina clássica para definir responsabilidade civil, indo desde sua acepção baseada apenas na culpa, que deve ser comprovada para gerar a obrigação indenizatória (responsabilidade civil subjetiva)[3], até um conceito mais amplo que vislumbra na responsabilidade civil uma repartição de prejuízos causados, visando ao “equilíbrio de direitos e interesses.”[4]


Também no direito brasileiro clássico, a responsabilidade civil foi eminentemente baseada na culpa. Contudo, com a evolução dos tempos e a maturidade doutrinária, passou a ser entendida, também[5], como decorrente do risco, e, portanto, independente de culpa (responsabilidade civil objetiva). É que a Revolução Industrial[6] e a decorrente multiplicação dos danos no ambiente de trabalho acabaram por ocasionar o surgimento de novas teorias, tendentes a propiciar maior proteção às vítimas (Vitimologia).


Se até o século XIX prevaleceu à necessidade da existência de culpa na caracterização da responsabilidade civil, com a Revolução Industrial e a maquinofatura, ocorreu um aumento inevitável dos acidentes de trabalho, o que fez surgir à necessidade de se conferir maior proteção legal às vítimas. Disso resultou a chamada teoria do riscque veio suprir, em grande parte, a defasagem da clássica teoria da culpa. Na teoria do risco, a culpa seria objetiva, tendo como fundamento a periculosidade, de maneira que o trabalhador, vítima de acidente do trabalho, pudesse ser indenizado, com ou sem a culpa do empregador ou do próprio obreiro, com a ressalvada, obviamente, da autolesão.


Nesse sentido, o Código Civil de 2002, atendendo a doutrina e a jurisprudência brasileiras, tentando se adequar à Constituição Federal de 1988, inovou sobremaneira em relação ao Código Civil anterior. A responsabilidade civil era, até pouco tempo, subjetiva (artigo 159 do Código Civil de 1916) e, só excepcionalmente, objetiva, em algumas leis especiais. Hoje o sistema é dualista, coexistindo a responsabilidade subjetiva (artigo 186 do Código Civil de 2002) e a objetiva, esta sempre definida em lei.


Em termos genéricos, o conceito de responsabilidade civil não assume nenhum compromisso com as duas correntes que disputam as preferências: a teoria subjetiva da culpa e a teoria objetiva da responsabilidade sem culpa. A rigor, elas se completam e convivem pacificamente, visando ao mesmo objetivo: a reparação do dano seja ele moral ou patrimonial (PEREIRA, 1993, p. 8), pois não são duas espécies diferentes de responsabilidade civil, mas maneiras diversas de encarar a obrigação de reparar o dano. (RODRIGUES, 1989, p. 9-10).


Na constatação de Stoco (1995, p. 62), “[…] tenha-se por fim, que, hoje, a conciliação das duas correntes tem como defensores os mais ilustres doutrinadores.”


Apesar das variadas definições de responsabilidade civil, o certo é que não existem mais discussões quanto à sua aceitação. Não importa a filiação histórica ou a concepção ideológica: todos os entendimentos concebem o princípio da responsabilidade civil como fonte obrigacional, onde o causador do dano deve repará-lo.


Independentemente das teorias que procuraram explicar a responsabilidade civil, todos os tipos ou espécies podem ser enquadrados na seguinte classificação: responsabilidade civil com culpa, responsabilidade civil transubjetiva (responsabilidade por atos de terceiros ou coisas) e responsabilidade civil objetiva. Na primeira espécie, o estado de culpa é requisito essencial, sem a qual não há ilícito nem se poderá atribuir responsabilidade a alguém pelo dano causado. Na segunda tipologia, a culpa é irrelevante, pois no direito interessa atribuir responsabilidade a determinadas pessoas por ato ou fato de outrem ou por fato de coisas e animais. Na terceira classe, basta ter o dano para imputação da responsabilidade a quem deva suportar o ônus da indenização. (LÔBO, 1999, p.128).


Além disso, a evolução do direito aponta para a superação da distinção entre a responsabilidade civil negocial e a responsabilidade civil extranegocial, criando-se um sistema unitário de reparação com fundamento no equilíbrio material de posições jurídicas, ou princípio da equivalência. Porém, um dos traços mais importantes da evolução do conceito de responsabilidade civil é a ampliação das hipóteses de solidariedade entre todos que devam assumir o dever de separação. Destarte, “[…] a solidariedade favorece a vítima, pois pode exercer a pretensão contra qualquer um dos responsáveis, ou contra todos.” (LÔBO, 1999, p. 134).


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Em síntese, os fundamentos da responsabilidade civil, identificados ao longo da evolução do próprio conceito de responsabilidade civil são:


a) não lesar ou ofender a pessoa ou o patrimônio do outro;


b) o princípio da equivalência que impõe ao dano a prestação do equivalente;


c) e, atualmente, a função mais restitutiva e menos punitiva.


2.2 Pressupostos da Responsabilidade Civil


Da fundamentação legal da responsabilidade civil (artigos 186, 187 e 927, do Código Civil de 2002) e seus pressupostos, extraem-se os seguintes elementos:


a) O fato lesivo que é o ato violador de um direito subjetivo, voluntário ou pelo menos imputável ao agente por dolo (culpa lato sensu)[7] ou culpa (stricto sensu).[8] A culpa lato sensu abrange o dolo e ocorre quando existe à vontade de cometer uma violação de direito. A culpa stricto sensu ocorre quando se verifica a falta de diligência por parte do agente causador do dano. A contrariedade ao direito deriva da qualificação como ilícito de determinados fatos, atos-fatos ou atos. Assim sendo, o dever de indenizar nasce com a antijuridicidade. (LÔBO, 1999, p. 135).


b) A ocorrência de um dano, patrimonial ou moral a um bem jurídico.


c) O nexo de causalidade, a ligação entre o dano e o comportamento do agente. A demonstração desta relação causal é indispensável nos termos do Código Civil de 2002. Quebra-se essa relação causal: quando a culpa é da vítima – será proporcional se há culpa concorrente da vítima; e havendo caso fortuito ou força maior, ou seja, a inevitabilidade.


Dessa forma, o ato ilícito é o praticado em desacordo com a ordem jurídica, violando direito subjetivo individual, causando dano a outrem, criando o dever de reparar tal prejuízo através de uma indenização. Tal responsabilidade é de ordem pública, sendo que os bens do responsável ficam sujeitos à reparação, e se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão de forma solidária, conforme previsão do artigo 942 do Código Civil de 2002.


3. Natureza jurídica da responsabilidade civil por danos morais


3.1 Dano Moral Indenizável


A palavra dano[9] designa prejuízo ou detrimento, que geralmente tem sentido econômico ou patrimonial, mas pode atingir elementos não patrimoniais, como os da personalidade. Quer seja patrimonial ou moral, o certo é que o dano é o principal elemento necessário à configuração da responsabilidade civil. Mas não é suficiente dizer que o fato é capaz de produzir um dano porque possui natureza prejudicial; é preciso demonstrar o prejuízo concreto. Contudo, não cabe ao prejudicado considerar o quantum indenizatório, pois que é matéria da liquidação. De acordo com José de Aguiar Dias (2006, p. 969):


“O dano é, dos elementos necessários à configuração da responsabilidade civil, o que suscita menos controvérsia. Com efeito, a unanimidade dos autores convém em que não pode haver responsabilidade sem a existência de um dano, e é verdadeiro truísmo sustentar esse princípio, porque, resultando a responsabilidade civil em obrigação de ressarcir, logicamente não pode concretizar-se onde nada há o que reparar.”


Assim, o dano que interessa, ao estudo da responsabilidade civil, é o que constitui requisito da obrigação de indenizar; um dano considerado pelo direito como prejuízo concreto. Dessa forma, não se pode deixar de atentar para a divisão: danos patrimoniais ou materiais e danos extrapatrimoniais, imateriais ou não patrimoniais (este último recebeu, recentemente, o nome de dano moral ou dano à personalidade). (DIAS, 2006, p. 973).


Os danos materiais representam um prejuízo econômico mensurável. Nestes casos, geralmente, a indenização arbitrada pelo julgador é suficiente para recompor integralmente o comprovado prejuízo material sofrido. Por sua vez, o dano moral é aquele que não pode ser economicamente medido, já que provoca lesão aos direitos personalíssimos, que são imateriais. Significa dizer que os danos morais não podem ser mensuráveis cientificamente e dependem exclusivamente do arbitramento do juiz, quando da liquidação. Em suma:


“Quando ao dano não correspondem às características do dano patrimonial, dizemos que estamos em presença do dano moral. A distinção, ao contrário do que parece, não decorre da natureza do direito, bem ou interesse lesado, mas do efeito da lesão, do caráter da sua repercussão sobre o lesado. De forma que tanto é possível ocorrer dano patrimonial em conseqüência de lesão a um bem não-patrimonial como dano moral em resultado de ofensa à bem material”. (DIAS, 2006, p. 992).


Assim, o dano moral indenizável pode ser definido como “qualquer sofrimento humano que não é causado por uma perda pecuniária.” (STOCO, 1995, p. 458). Desta feita, nada mais é do que aquele relativo à personalidade humana nas mais variadas formas.


De acordo com Cahali (2005, p. 21-2), parte da doutrina entende que a expressão “dano moral” é reservada, exclusivamente, para designar o agravo que não produz qualquer efeito patrimonial, ou seja, se há consequências de ordem patrimonial, ainda que mediante repercussão, o dano deixaria de ser extrapatrimonial. Porém, se for abstraído o caráter estritamente econômico do patrimônio para alargar o seu conteúdo de modo a compreender valores imateriais, inclusive de natureza ética, o critério distintivo à base da exclusão não é satisfatório. Diante desses argumentos, defende que:


“Parece mais razoável caracterizar o dano moral pelos seus próprios elementos; portanto, como a privação ou diminuição daqueles bens que têm um valor precípuo na vida do ser humano e que são a paz, a tranquilidade de espírito, a liberdade individual, a integridade individual, a integridade física, a honra e os demais sagrados afetos; classificando-se, desse modo, em dano que afeta a parte social do patrimônio moral (honra, reputação etc.) e dano que molesta a parte afetiva do patrimônio moral (dor, tristeza, saudade etc.); dano moral que provoca direta ou indiretamente dano patrimonial (cicatriz deformante etc.) e dano moral puro (dor, tristeza, etc.)”. (CAHALI, 2005, p. 22).


Neste pensar não há como enumerar de forma exaustiva as hipóteses que caracterizam o dano moral, que pode ser:


 a) Físico, provocando uma lesão visível ou interna, e prejudicial ao corpo do cidadão, na maioria das vezes gerada por um acidente ou por erro ou negligência médica;


 b) Não físico: como o comprometimento do sentimento, do respeito, da dignidade, da probidade, da retidão, do brio e da consideração da pessoa perante a sociedade.


O que se deve então provar, para o ensejo da reparação, é justamente o dano sofrido. Para tanto, exige-se uma análise subjetiva do magistrado, eis que não é só a teoria subjetiva que sustenta a reparação por danos à personalidade, mas também a teoria objetiva.


Assim, a responsabilidade civil, por danos aos direitos da personalidade, pode dar-se dentro de um contexto em que o ordenamento jurídico preveja a reparação com base na teoria objetiva ou subjetiva, razão pela qual o julgador deve analisar o caso concreto sob ambos os prismas. “Destarte, não é só a teoria subjetiva que sustenta a reparação por danos à personalidade, mas também a teoria objetiva, que melhor completa a responsabilidade civil desta natureza.” (IGLESIAS, 2003, p. 34).


Portanto, conclui-se que o dano moral, no bojo de princípios éticos e morais que norteiam a sociedade, atinge violações a direitos não-patrimoniais. Ao que parece, o fundamento do dever de reparação do dano não reside no propósito de sancionar ou punir, mas no princípio de que o dano sofrido tem de ser reparado, sempre que possível, pelo responsável. Aqui surge uma dúvida: qual a natureza jurídica da indenização por dano moral: compensatória ou punitiva?


3.2 Natureza Jurídica da Reparação do Dano Moral


O direito brasileiro sempre aceitou indenizar os efeitos patrimoniais do dano, mas até pouco tempo não admitia a indenização do dano exclusivamente moral. Em regra, a doutrina e a jurisprudência defendiam a reparação de danos morais somente quando tivesse reflexos patrimoniais. Conforme Stoco (1995, p. 456), “a teoria do dano moral será, talvez, a que maior resistência sofreu desde sua concepção, na Índia lendária e à fabulosa Babilônia (Código de Manu e Código de Hammurabi), passando pelo direito romano e frutificando e desenvolvendo na França (Código de Napoleão)”.


A resistência à adesão a reparabilidade civil por danos morais é compreensível, pois não é simples considerar um bem moral como suscetível de avaliação em dinheiro. No entanto, não se pretende traduzir, em somas pecuniárias, os valores morais da sociedade. O que se busca é dar ao menos alguma compensação para que a aflição, a humilhação e a dor não fiquem ignoradas em nome da impossibilidade de avaliação econômica do sofrimento moral. A doutrina moderna já consente na indenização do dano moral em todos os atos ilícitos capazes de produzir gravame moral de maior alcance. Também, no âmbito jurídico brasileiro, resultou plenamente consagrada com o advento da Constituição Federal de 1988 e reafirmada, em definitivo, pelo Código Civil de 2002.


Para além de sua admissibilidade, o dano moral pode ser sofrido por pessoa física ou jurídica, neste caso com o comprometimento da imagem idônea e respeitabilidade adquiridas no mercado comercial. No entanto, é preciso avaliar cada caso especificamente para que seja constatada a presença do dano moral que dará ensejo à propositura da competente ação de indenização por danos morais. A dificuldade está no arbítrio do quantum indenizatório, que deve ser suficiente para ressarcir a vítima e prevenir reincidências, sem violar, destarte, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Como não existem limites legais ao valor da indenização por danos morais, a estipulação depende unicamente do prudente arbítrio do juiz.


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Primeiramente é preciso ressaltar que a doutrina, via de regra, identifica uma natureza dúplice na reparabilidade do dano moral: de compensar e confortar, em termos financeiros, o sofrimento da vítima (aspecto compensatório) e de punir o agressor para que não volte a prejudicar outras pessoas (penalidade exemplar ou punição pedagógica ao ofensor). A reparação pecuniária do dano moral figura, portanto, como um misto de pena e de satisfação compensatória, ou seja:


a) Tem função penal: sanção imposta ao ofensor, visando à diminuição de seu patrimônio, pela indenização paga ao ofendido, visto que o bem jurídico da pessoa – integridade física, moral e intelectual –, não poderá ser violado impunemente, subtraindo-se o seu ofensor às consequências de seu ato por não serem reparáveis. Trata-se de uma espécie de punição ao causador do dano, de forma a inibir uma conduta similar futura.


b) Tem função satisfatória ou compensatória: como dano moral, afeta interesses jurídicos extrapatrimoniais, provocando sentimentos que não têm preço, a reparação pecuniária visa proporcionar ao prejudicado uma satisfação que atenue a ofensa causada. Traduz-se na satisfação à vítima, representando uma compensação entre a impossibilidade de se estabelecer perfeita equivalência entre o dano e o ressarcimento. É nesse sentido a tese defendida por Diniz (1995, p. 74-5), para quem a reparação do dano moral cumpre:


“uma função de justiça corretiva ou sinalagmática, por conjugar, de uma só vez, a natureza satisfatória da indenização do dano moral para o lesado, tendo em vista o bem jurídico danificado, sua posição social, a repercussão do agravo em sua vida privada e social e a natureza penal da reparação para o causador do dano, atendendo a sua situação econômica, a sua intenção de lesar (dolo ou culpa), a sua imputabilidade, etc.”


Trata-se do que se chama de tese da função punitiva da reparação do dano moral, que não foi adotada pelo legislador ordinário brasileiro, mas vem encontrando adeptos na doutrina e na jurisprudência atual.


De acordo com a previsão do Código Civil de 2002, “a indenização mede-se pela extensão do dano”, sendo que “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização” (artigo 944 e parágrafo único). Não faz referências à função punitiva da reparação do dano moral. Veja-se uma decisão do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido:


“Ementa: civil e processual civil. Responsabilidade civil. Erro médico. Recém-nascido com vida. Dano moral e pensão. Valor não excessivo. 1. Não se considera excessivo o valor arbitrado a título de indenização, acrescido de pensão mensal vitalícia, na medida em que se apresenta compatível com a gravidade do dano sofrido. 2. Recurso especial improvido” (REsp. nº 820497/RJ).


Nos argumentos justificadores de seu voto, o Ministro João Otávio de Noronha entendeu que:


“o arbitramento dos valores operou-se com moderação, afastada a geração de enriquecimento indevido por parte da vítima, mantendo proporcionalidade com o grau de culpa e ao porte econômico das partes envolvidas. Ademais, servirá para desestimular condutas de descaso com a saúde pública que permeiam o país, em níveis federal, estadual e municipal” (REsp. nº 820497/RJ).


Em outra ocasião e de modo similar, o Superior Tribunal de Justiça, agora na voz da Ministra Nancy Andrighi decidiu nos seguintes termos:


“Ementa: Responsabilidade civil. Acidente do trabalho. Morte. Indenização por dano moral. Filho nascituro. Fixação do quantum indenizatório. […]. 2. Embora sejam muitos os fatores a considerar para a fixação da satisfação compensatória por danos morais, é principalmente com base na gravidade da lesão que o juiz fixa o valor da reparação. […]. Recurso especial da ré não conhecido” (REsp. nº 931556/RS).


Ainda ressaltando que a indenização por danos morais é mensurada pela extensão do dano, assim se posicionou a Ministra Denise Arruda, também do Superior Tribunal de Justiça:


“Ementa: Agravo Regimental no Agravo de Instrumento. Responsabilidade civil. Indenização. Acidente em rodovia. Falta de sinalização. Suposta violação do artigo 948, inciso II, do Código Civil de 2002. Pensão mensal e majoração do valor da indenização por danos morais. Impossibilidade. Reexame da matéria fática. Inviabilidade. […] considerando as circunstâncias do caso concreto, as condições econômicas das partes e a finalidade da reparação, a indenização por danos morais de R$ 52.500,00 (cinqüenta e dois mil e quinhentos reais) nem é irrisória nem desproporcional ao dano sofrido pelos ora agravantes. Ao contrário, o valor foi arbitrado com bom senso, dentro dos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. […] Agravo Regimental desprovido” (AgReg no AgI nº 977062/SP).


Contudo, o mesmo Superior Tribunal de Justiça tem solidificado entendimento condizente com a teoria da função punitiva da reparação do dano moral, nos seguintes termos:


“Ementa: Processo civil. Recurso especial. Ação de indenização. Danos morais. […]. Fixação de valor indenizatório. […]. 4. A indenização por dano moral deve se revestir de caráter indenizatório e sancionatório de modo a compensar o constrangimento suportado pelo consumidor, sem que caracterize enriquecimento ilícito e adstrito ao princípio da razoabilidade. […]. Recurso conhecido em parte e provido” (REsp. nº 565924/RS).


Do mesmo modo:


“Ementa: Recurso especial. Responsabilidade civil por acidente causado em rodovia federal. Omissão do Estado. Responsabilidade subjetiva. Má conservação da rodovia federal. Culpa da autarquia. Indenização por danos materiais e morais. Adequação aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade. […]. 4. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça firmou-se no sentido de que a revisão do arbitramento da indenização somente é admissível nas hipóteses de determinação de montante exorbitante ou irrisório, uma vez que tais excessos configuram flagrante violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade […]. 6. Na presente hipótese o valor da condenação por danos morais encontra-se dentro dos parâmetros legais, atendendo ao dúplice caráter daquela condenação, tanto punitivo do ente causador quanto compensatório em relação à vítima. 7. Recurso Especial conhecido em parte e, nessa, não provido.” (REsp. nº 763531/RJ).


Em outros termos, mas que demonstram que o Superior Tribunal de Justiça brasileiro aderiu à tese do caráter punitivo da indenização por danos morais:


“Ementa: Direito civil. Imputação de furto a funcionária. Ação de indenização por danos morais. Arbitramento moderado. Inalterabilidade. 1. Considerando que o quantum indenizatório arbitrado a título de danos morais guarda proporcionalidade com a gravidade da ofensa, o grau de culpa e o porte sócio-econômico dos causadores dos danos, não deve o valor ser alterado ao argumento de que é excessivo. 2. Recurso especial desprovido.” (REsp. nº 687709/MG).


Outro exemplo que confirma a linha interpretativa do Superior Tribunal de Justiça brasileiro:


“Ementa: Direito civil. Acidente de trânsito. Ação de indenização. Dano Moral. Arbitramento adequado. Deficiência física permanente. Redução da capacidade laboral. Inexistência. Seguro de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores Terrestres – DPVAT. Descontos. […]. 2. Considerando que a quantia indenizatória arbitrada a título de danos morais guarda proporcionalidade com a gravidade da ofensa, o grau de culpa e o porte sócio-econômico do causador do dano, não deve o valor ser alterado ao argumento de que não é suficiente à cobertura da dor sofrida pela vítima. […]. Recurso especial não-conhecido.” (REsp. nº 799989/PR).


Como se vê, o Superior Tribunal de Justiça brasileiro aderiu à tese do caráter punitivo, tendo como fundamento para a fixação do valor da indenização por danos morais, o grau de culpa e o porte econômico das partes (critérios de punição), bem como a necessidade de desestimular o ofensor a repetir o ato (critério preventivo).


Porém, julgados também existem no sentido de que não se trata de punir os excessos, mas de apenas compensar os danos morais causados a terceiro:


“Ementa: Direito civil e processual civil. Indenização por danos morais. Correição parcial. Ofensa a juiz. Imunidade profissional do advogado. Caráter não absoluto. Valor dos danos morais. […]. – O valor dos danos morais não deve ser fixado em valor ínfimo, mas em patamar que compense de forma adequada o lesado, proporcionando-lhe bem da vida que aquiete as dores na alma que lhe foram infligidas. Recurso especial provido. Ônus sucumbenciais invertidos”. (REsp. nº 1022103/RN).


Apesar da variação de critérios utilizados pelos julgadores na fundamentação do quantum indenizatório, em se tratando de danos morais, o fato é que a tese da função punitiva da reparação do dano moral, embora não positivada pelo direito pátrio, vem sendo bem recebida pela doutrina e pela jurisprudência brasileiras. Por isso a importância de se analisar seus critérios constitutivos.


A teoria da pena privada foi idealizada no início do século XX e recebeu forças em meados do mesmo século, para fundamentar e fortalecer a ideia da reparação do dano moral, neutralizando o argumento moral que a afastava


É assim que, não havendo como submeter a qualquer tipo de aferição em concreto a extensão do dano, o pagamento de quantia em dinheiro pelo ofensor, poderia ter, pura e simplesmente, o caráter de sanção.[10]


O principal argumento levantado em defesa dessa teoria foi o de que a ideia de compensação (substituição da dor pelo prazer que o dinheiro poderia proporcionar) serve de fundamento à reparação do dano moral apenas para vítimas pobres, que se alegrariam com um aparelho de televisão novo, por exemplo, já a vítima rica não, o que significaria, ao final, que esta jamais seria indenizada. Daí resulta o entendimento de que a reparação do dano moral tem também um caráter de pena, funcionando como uma justa punição que deve reverter em favor da vítima. (MORAES, 2003, p. 220-1).


A par dessa tese, surgiu a teoria do desestímulo, baseada no caráter de exemplaridade das regras de punição. Segundo essa corrente, deve estar inserida, no âmbito da indenização, uma quantia significativa, de modo a conscientizar o ofensor de que não deve persistir no comportamento lesivo, todavia, é preciso cuidar para não enriquecer em demasia o lesado. Além disso, argumenta-se que há necessidade de se impor pena ao ofensor no dano moral, para não passar impune a infração e, assim, estimular novas agressões, de modo que a indenização funcionará, também, como uma espécie de pena privada em benefício da vítima. (MORAES, 2003, p. 222).


Essas teorias serviram para motivar a responsabilização civil por danos morais, eis que na época o pagamento pela dor sofrida era considerado imoral. Desse modo, não se compensava o sofrimento, mas se punia o agressor com pena privada em benefício da vítima. Com o passar do tempo, essas ideias se fundiram na tese da função punitiva de reparar o dano moral que hoje se fundamenta em dois critérios basilares: satisfação e punição. Porém, o assunto não é pacífico na doutrina. Ao tratar do tema, Pontes de Miranda (apud MORAES, 2003, p. 261-2) critica severamente o juízo punitivo na reparação civil, expondo que:


“A teoria da responsabilidade pela reparação dos danos não há que se basear no propósito de sancionar, de punir, as culpas, a despeito de se não atribuir direito à indenização por parte da vítima culpada. O fundamento, no direito contemporâneo, está no princípio de que o dano sofrido tem que ser reparado, se possível. A restituição é que se tem por fito, afastando qualquer antigo elemento de vingança. […]. A reparação é sem propósito exemplificativo, disciplinar: o que se tem por fito é emenda, correção objetiva. Daí a inconfundibilidade com a pena. O juiz que condena à reparação não pune; pode punir e condenar à reparação. Mas, mesmo então, as sanções são diferentes em conteúdo.”


Dias (2006, p. 997), por sua vez, entende que o pagamento de uma soma em dinheiro, a título de satisfação, ocupa um lugar intermediário entre a indenização e a pena. Segundo seu pensar, “na doutrina contemporânea, registra-se universal hostilidade à ideia da pena privada”. Esclarece que “isso se justificava no passado, quando dominava, no instituto da responsabilidade civil, o princípio da culpa”. Porém, “hoje o problema se apresenta de modo diverso. Cada vez mais as questões de reparação e garantia independem das noções de prevenção ou repressão.” Nas suas palavras:


“Para o sistema de responsabilidade civil que esposamos, a prevenção e repressão do ato ilícito resulta da indenização em si, sendo-lhe indiferente à graduação do montante da indenização. Mesmo os ricos sofrem um corretivo moral enérgico, que conduz à prevenção e repressão do ato ilícito praticado, quando lhes é imposta a obrigação de reparar o dano sofrido por outrem” (DIAS, 2006, p. 999).


Prossegue expondo que, na presença de danos extrapatrimoniais cuja reparação se tem de fazer em dinheiro, “avultam os pontos de contato entre a indenização e a pena,” pois “oferece satisfação à consciência de justiça e à personalidade do lesado, e a indenização pode desempenhar um papel múltiplo, de pena, de satisfação e de equivalência indenizante.” (DIAS, 2006, p. 1001).


Segundo Moraes (2003, p. 225-6):


“Há, de fato, quem distinga a função punitiva da função preventiva, conectando esta última a um objetivo utilitarista, no sentido de avaliação de sua utilidade para prevenir danos futuros, e não para retribuir danos passados – característica própria de juízo punitivo. Ocorre que, mediante tal perspectiva, será possível deduzir que uma conduta gravemente dolosa possa não constituir pré-requisito necessário e suficiente à imposição de penalidade, justamente por ser de difícil repetição; de outro lado, uma conduta menos grave, mas que possa ser facilmente imitada, mereceria, na finalidade preventiva, uma condenação maior. Este parece ser o problema principal da justiça/injustiça das sentenças exemplares e dos chamados bodes expiatórios.”


De qualquer modo, o fato é que, no cenário brasileiro atual, vem-se confirmando a duplicidade da reparação do dano moral sob a justificativa de que, na fixação do quantum indenizatório, além da satisfação compensatória da vítima, deve ser levado em conta um sancionamento do ofensor, como meio de se punir a prática do ato ilícito, tanto no sentido de retribuir danos passados quanto para inibir danos futuros.


4. Considerações finais


Do exposto neste estudo, verifica-se que a natureza jurídica da indenização por dano moral é mista: compensatória, no sentido de indenizar pecuniariamente o ofendido, alcançando-lhe a oportunidade de obter meios de amenizar a dor experimentada em função da agressão moral, em um misto de compensação e satisfação; e punitiva para inibir novos episódios lesivos, nefastos ao convívio social.


Destarte, o pagamento de uma soma, a título de satisfação, ocupa um lugar intermédio entre a indenização e a pena. Com a indenização, compartilha o fim essencial de representar uma prestação imposta a favor e em consideração do lesado; com a pena tem-se em comum o implicar em mal para o indenizante.


O caráter punitivo da indenização por dano moral, por sua vez, tem duas funções: de retribuir os danos passados e de prevenir danos futuros. Contudo, a problemática está no fato de que muitas vezes uma conduta considerada gravemente dolosa pode ser de difícil repetição; enquanto que outra conduta menos grave pode ser facilmente imitada. Do ponto de vista da função preventiva, essa última situação deveria receber uma condenação maior, o que contraria o mandamento legal de que “a indenização mede-se pela extensão do dano” (artigo 944, caput, do Código Civil de 2002).


A solução até então apresentada pelo legislador à referida problemática consta no Projeto de Lei nº 6.960, de 2002, que pretende inserir no artigo 944, do Código Civil de 2002, um segundo parágrafo – para além do parágrafo único existente –, com uma espécie de autorização genérica ao julgador para acrescentar uma parcela punitiva ao valor da indenização, com o intuito de desestimular o agressor: “a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante.”[11]


Essa proposta, de autoria de Ricardo Fiuza e que está em tramitação na Câmara dos Deputados desde 2002, vem sendo criticada por ser uma autorização genérica e por não indicar claramente os critérios a serem levados em conta pelo julgador e, desse modo, figuraria como uma espécie de cheque em branco, liberando o julgador a punir como bem entender.


É preciso ter em linha de conta que o caráter aflitivo, defendido pela teoria da função punitiva, se aplicado indiscriminadamente a toda e qualquer reparação de danos morais, colocaria em risco princípios fundamentais do sistema jurídico brasileiro que têm na lei a sua fonte normativa, na medida em que se passa a aceitar a ideia de que a reparação já não se constitui como o fim último da responsabilidade civil, mas a ela se atribuem também, como intrínsecas, as funções de punição e dissuasão, de castigo e prevenção.


Definitivamente não é tarefa das mais fáceis arbitrar o valor do dano moral, pois que o julgador precisa adentrar na ordem subjetiva. Porém, utilizando-se de alguns critérios, como a condição do ofendido, a intensidade da ofensa e o grau de culpa do ofensor; o nexo entre o dano punitivo e o prejuízo sofrido; a eventual prática anterior de condutas equivalentes; a lucratividade da conduta ofensiva (caso em que o valor dos danos punitivos deverá ser superior ao lucro obtido); a situação financeira das partes; o valor das custas judiciais; a consideração das sanções penais eventualmente já aplicadas, de forma que a indenização seja correspondentemente reduzida, dentre outros instrumentos pautados nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, pode-se chegar à quantia ideal a ser ressarcida.


 


Referências bibliográficas:

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Notas:

[1]A palavra responsabilidade decorre do latim responsabilitas, de respondere, “designando o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo” e se traduz no verbo responder, que significa a obrigação que alguém tem de assumir as consequências jurídicas de sua atividade, embasada na concepção de que as ações sempre são apoiadas em motivos ou razões, contendo, ainda, a raiz latina de spondeo, fórmula através da qual se vinculava, no direito romano, o devedor nos contratos verbais. No direito romano, para se fixar a stipulatio, fazia-se mister o pronunciamento dos termos dare mihi spondes? Spondeo era o que devia responder aquele que se responsabilizava pela obrigação. (DINIZ, 1995, p. 28-29). Sobre a matéria, sugere-se a leitura da obra de José Carlos Moreira Alves (2002).

[2]No Brasil o sistema jurídico adotou o princípio da independência da responsabilidade civil em relação à penal: “artigo 935: a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.” (Código Civil de 2002).

“Ementa: Civil. Condenação em indenização por danos materiais e morais. Sentença absolutória no juízo criminal. Independência. À exceção da inocência proclamada em virtude da inexistência do fato ou da não comprovação da autoria, a coisa julgada penal não interfere na área cível. Agravo não provido.” (AgR no AgR no AgI nº 973065/RS).

[3] Por exemplo: Ripert (1937, p.330-3): “a democracia não pode admitir uma organização econômica que separa na exploração os benefícios e os riscos”; Savatier (1951, p.1) “a responsabilidade civil é a obrigação que pode incumbir a uma pessoa de reparar o dano causado a outrem por um fato seu, ou pelo fato de pessoas ou das coisas dependentes dela”; Philippe Malaurie (apud PEREIRA, 1993, p. 8) “a responsabilidade civil é uma obrigação de reparar o dano que uma pessoa causa a outra.”

[4]A exemplo de Louis Josserand (1868 – 1941) que visualizava um conceito mais amplo de responsabilidade civil, no sentido de repartição de prejuízos causados. Nas suas palavras “a responsabilidade civil moderna comporta dois pólos: o objetivo, onde reina o risco criado, e o subjetivo, onde triunfa a culpa, e é em torno desses dois pólos que gira a vasta teoria da responsabilidade.” (JOSSERAND, 1936, p. 29).

[5] Não foi destacado do contexto da responsabilidade civil a análise da culpa. Não se trata de uma substituição da responsabilidade subjetiva pela objetiva, mas de uma inversão de papéis de forma complementativa, ou seja, se antes existia apenas a responsabilidade subjetiva, hoje admite-se a responsabilidade objetiva, que recebeu status de regra geral, ao lado da responsabilidade subjetiva, de incidência e aplicação mais restrita.

[6]A Revolução Industrial significou o início do processo de acumulação rápida de bens de capital, com consequente aumento da mecanização. Isso se deve ao fato de o capitalismo (economia de mercado) estar como sistema econômico vigente. Foi a Inglaterra que saiu na frente no processo de Revolução Industrial do século XVIII. Desde então só evoluiu impulsionada pela revolução tecnológica e a informatização.

[7]Ação ou omissão voluntária.

[8]Negligência: quando o agente previu as consequências de sua ação, não tinha intenção de praticar o mal, mas não teve a precaução de evitá-lo; imperícia: falta de habilitações, aptidões, no exercício da profissão; ou imprudência: quando o agente não previu nem quis o fato, resultante de sua falta de cautela, ou o efeito danoso de sua ação ou omissão, que podia, contudo, prever. (GUIMARÃES, 1999, p. 231).

[9] “Dano: ofensa ou prejuízo ao patrimônio jurídico, econômico ou moral de alguém.” (GUIMARÃES, 1999, p. 235).

[10]A origem e desenvolvimento dos danos punitivos se deram no common law norte-americano. O estudo da experiência daquele país serve de subsídios à solução do impasse brasileiro no que diz respeito ao estabelecimento dos critérios e de sua utilização e compensação, para a determinação do quantum indenizatório a ser atribuído a título de punição do ofensor. Porém, deve-se atentar para a imprevisibilidade, principal crítica que sofre a punitive damages americana. Não raro o júri condena em quantias muito superiores ao quanto as próprias vítimas esperavam receber. As questões relacionadas às indenizações por danos punitivos naquele país, em lugar de serem reguladas no âmbito de critérios e de parâmetros estritamente jurídicos, têm sido absorvidas pela lógica do mercado. Não existe limite constitucionalmente fixado para as indenizações por punitive damages. Há, no entanto, garantia fundamental contra indenizações arbitrárias ou irracionais. Considera-se violado o princípio do due process sempre que se verificar parcialidade na fixação dos punitive damages, independentemente da quantia fixada. O problema do valor dos punitive damages adquiriu tal gravidade que já é considerado o grande causador da crise da responsabilidade civil nos Estados Unidos, a partir dos anos noventa. Como reação ao que muitos consideravam abusivo, diversos Estados estabeleceram tetos legais para as indenizações a esse título. (MORAES, 2003, p.217).

[11]Texto atual: “artigo 944: a indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo único: se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”. Proposta do Projeto: “artigo 944: a indenização mede-se pela extensão do dano. Parágrafo 1º: se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização. Parágrafo 2º: a reparação do dano moral deve constituir-se em compensação ao lesado e adequado desestímulo ao lesante.”


Informações Sobre os Autores

Luzia Gomes da Silva

Doutoranda do Instituto Catarinense de Estudos Avançados Ltda – ICEA, desde janeiro de 2008, regularmente matriculada na Turma V/I – UMSA/ICEA; Doutoranda da Universidad del Museo Social Argentino, matrícula nº 660007, em Ciências Jurídicas e Sociais; Pós-Graduada na área de Educação, com Especialização em Metodologia do Ensino da História no Processo Educativo, pela Faculdade de Educação São Luís; Bacharel em Direito pela Faculdade de Alagoas/Sociedade de Ensino Superior de Alagoas S/C LTDA, desde dezembro de 2007; Licenciada em História pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Carangola-MG, concluído em julho de 1986.

Júlio Cezar da Silva Castro

Professor das Disciplinas de Direito Processual Civil III e Direito Ambiental da Faculdade Integrada Tiradentes – FITS/Maceió; professor da Disciplina de Direito Penal III da Faculdade Maurício de Nassau – Unidade Maceió; Especialista em Direito Civil e Direito Processual Civil; advogado e consultor jurídico.


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