Resumo: Este trabalho objetiva analisar os doze primeiros artigos do CPC-2015 à luz dos preceitos constitucionais fundamentais, buscando construir uma abordagem do conteúdo principiológico da Lei n. 13.105/15 e a nova sistemática principiológica inserida neste código. A produção se localiza na vertente teórico-metodológica jurídico-dogmático, sendo o tipo de investigação jurídico-diagnóstico. No tocante às técnicas e procedimentos metodológicos para o levantamento de dados, utilizou-se dados bibliográficos, normativos e técnicos. Quanto à análise dos dados levantados, o recurso metodológico adotado foi o hermenêutico-analítico. Já o controle dos dados se deu por meio da técnica de triangulação metodológica. Concluiu-se que, embora inexista ainda um consenso entre os doutrinadores brasileiros, dada a recente promulgação da Lei Processual civil, ser evidente o avanço que o CPC 2015 promove, no sistema processual brasileiro.
Palavras-chave: Principiologia, neoconstitucionalismo, compatibilidade com as normas constitucionais.
Abstract: This work aims to analyze the first twelve CPC-2015 articles from the perspective of fundamental constitutional principles, seeking to build an approach to principiológico content in Law. 13,105 / 15 and the new system principled inserted this code. The production is located in the legal-dogmatic theoretical and methodological aspects, being the kind of legal and diagnostic research. On the technical and methodological procedures for data collection, bibliographic, regulatory and technical data were used. As for the analysis of the data, the methodological approach adopted was the hermeneutic-analytical. Have control of the data was through methodological triangulation. It was concluded that, although there is still no consensus among Brazilian scholars, given the recent enactment of the Civil Procedure Law, be clear progress that the CPC 2015 promotes in Brazilian legal system.
Keywords: principles, neoconstitutionalism, compatibility with the constitutional rules.
Sumário: 1. Introdução; 2. Teorias norteadoras do processo civil constitucional; 3. As normas fundamentais estruturadas nos 12 primeiros artigos; 3.1. Análise do artigo 1º; 3.2. Análise do artigo 2º; 3.3. Análise do artigo 3º; 3.4. Análise do artigo 4º; 3.5. Análise do artigo 5º; 3.6. Análise do artigo 6º; 3.7. Análise do artigo 7º; 3.8. Análise do artigo 8º; 3.9. Análise do artigo 9º; 3.10. Análise do artigo 10; 3.11. Análise do artigo 11; 3.12. Análise do artigo 12; 4. Implicações práticas do CPC 2015; 5. Considerações finais.
1. INTRODUÇÃO
Cada vez mais o Direito Processual Civil deixa de ser visto de forma isolada e passa a dialogar com outros ramos do Direito, principalmente com as normas constitucionais, pois estas são a base de um Estado Democrático de Direito. A Constituição é a norma fundamental de onde as demais se originam.
Diante disso, o legislador buscou dar uma nova roupagem ao processo civil, e, portanto, contemplou no CPC-2015 inúmeros direitos e garantias fundamentais já previstos na Certa Magna de 1988. Nessa perspectiva, fica claro que a força normativa dos princípios não pode ser afastada quando da elaboração de qualquer norma presente no sistema jurídico brasileiro.
Assim, este trabalho analisará os doze primeiros artigos para identificar a compatibilidade das normas constitucionais com os artigos do CPC-2015 e suas implicações de ordem prática.
A produção se localiza na vertente teórico-metodológica jurídico-dogmática, isto é, ou seja, uma abordagem preliminar de um problema jurídico (GUSTIN; DIAS, 2015, p. 27), utilizando para seu enfrentamento, exclusivamente, recursos técnicos e dogmáticos internos à ciência jurídica, ressaltando características e percepções dos principais autores que abordam o tema. O tipo de investigação adotada para tanto será o jurídico descritivo, ou seja, terá a abordagem um caráter exploratório descritivo, objetivando ressaltar as características dos fragmentos normativos analisados. No tocante às técnicas e procedimentos metodológicos para o levantamento de dados, utilizar-se-á apenas dados bibliográficos: normativos e técnicos dogmáticos. Quanto a analise dos dados levantados, lançou-se mão do recurso metodológico da hermenêutico-analítico. O controle dos dados, em sede das considerações finais, serão auferidos por meio da triangulação metodológica que implica no cruzamento das teorias adotadas, o conteúdo dos doze primeiros artigos do CPC-2015 e a perspectiva dos doutrinadores consultados (GUSTIN; DIAS, 2015, p. 93).
O presente trabalho se inicia com uma exposição do aporte teórico, para que sejam lançadas as bases para a análise do conteúdo normativo presente nos artigos 1º ao 12 do Código de Processo Civil 2015. Busca-se assim situar tal conteúdo em um pensamento jurídico pautado nas teorias neoconstitucionalista e o neoprocessualista. Em seguida passa-se a explorar, propriamente, os doze primeiros artigos realizando considerações individuais e detalhadas de como cada artigo se insere no sistema processual à luz da Constituição de 1988. Finalmente, busca-se apresentar as implicações práticas das normas contidas no referido código e suas consequências.
2. TEORIAS NORTEADORAS DO PROCESSO CIVIL CONSTITUCIONAL
O presente artigo adotará como aporte teórico, para analisar o conteúdo normativo presente no Código de Processo Civil de 2015[1], a teoria processual exposta por Fredie Didier Jr (2015, p.42).
O referido doutrinador faz um recorte do atual pensamento jurídico que vive o sistema processual, ou seja, o Neoconstitucionalismo. Nessa perspectiva afirma o autor ser mais adequado chamar o termo de "positivismo jurídico reconstruído" ou “neopositivismo”. Tal posição merece maior destaque devido ao termo ser vago e gerar controvérsias entre diversos autores, surgindo assim críticas ao uso do termo neoconstitucionalismo, como aponta Didier:
“Os abusos e incompreensões revelam-se basicamente em uma postura de supervalorização dessas "novidades": a) supervalorizam-se as normas-princípio em detrimento das normas-regra, como se aquelas sempre devessem preponderar em relação a essas e como se o sistema devesse ter mais normas-princípio do que normas- regra, ignorando o importantíssimo papel que as regras exercem no sistema jurídico: reduzira complexidade do sistema e garantir segurança jurídica; b) supervaloriza-se o Poder judiciário em detrimento do Poder Legislativo, subsunção é método bem adequado à aplicação das normas-regra, de resto as espécies normativas mais abundantes no sistema. As críticas são indispensáveis. A história do pensamento jurídico costuma desenvolver-se em movimento pendular: essas transformações puxam para um lado; as críticas, para o outro; no final do "cabo de guerra", chega-se ao equilíbrio” (DIDIER, 2015, p. 43-44).
Didier Jr. (2015, p.44) afirma que, na evolução histórica do direito processual, o Código de Processo Civil estaria inserido em uma quarta fase[2]·. Reafirmando assim, as conquistas do processualismo e do instrumentalismo, defendendo ainda a ideia de que a ciência teve de avançar, e que realmente avançou, alterando seus contornos.
Nesse diapasão, o neoconstitucionalismo traz enquanto premissas metodológicas a necessária comunicação entre o processo que se pretende erigir e constitucionalismo, novo, que pretende irradiar seus preceitos, enquanto normas fundadoras, para todos os ramos do direito pátrio. Por isso, é possível verificar nesse contexto, uma nova perspectiva, em relação ao direito processual à luz da Constituição Federal de 1988, ao receber destaque a proteção aos direitos fundamentais na construção e aplicação do formalismo processual (DIDIER JR, 2015, p.44-45).
O direito contemporâneo aponta para a constitucionalização do direito processual. Seja na incorporação de textos processuais como direitos fundamentais seja como sendo as normas processuais concretizadoras de dispositivos constitucionais. Nesse sentido, afirma o referido autor:
“Não é, então, por acaso que o art. 1 ° do C PC, com forte caráter simbólico, está assim redigido: "O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código”. Do ponto de vista normativo, o enunciado reproduz uma obviedade: qualquer norma jurídica brasileira somente pode ser construída e interpretada de acordo coma Constituição Federal. A ausência de dispositivo semelhante no CPC não significaria, obviamente, que o CPC pudesse ser interpretado em desconformidade com a Constituição” (DIDIER JR, 2015, p.46).
Nesse diapasão, os valores e direitos fundamentais, firmados na Carta de 1988, podem ser entendidos como um conjunto de normas, princípios, prerrogativas, deveres e institutos, inerentes à soberania popular, que garantem a convivência pacífica, digna, livre e igualitária, independentemente de credo, raça, origem, cor, condição econômica ou status social (BULOS, 2014, p. 525). Assim, o CPC 2015 busca uma maior integração com o texto constitucional valorizando suas normas fundamentais.
O referido artigo parece ser uma norma básica que deriva da Constituição e, consequentemente deve estar alinhada com a mesma. Assim, poderá sofrer controle caso seja necessário e não poderão ser interpretadas em desconformidade com o texto constitucional (DIDIER, 2015, p. 47).
Diante de um conflito, o magistrado não deve decidir somente de acordo com a lei, pois os princípios exercem uma função bloqueadora, ou seja, servem para justificar a não-aplicação de textos expressamente previstos que sejam incompatíveis com o estado de coisas que se busca promover. Por outro lado, o juiz que decide conforme o Direito terá à sua disposição regras e princípios e, por isso, o Código de Processo Civil de 2015, guiado pela diretriz normativa constitucional, autoriza a “ponderação de normas” em seu art. 489, §2º, sendo este um dos exemplos da sistemática adotada pelo processo civil constitucional (DIDIER, 2015, p.50).
3. AS NORMAS FUNDAMENTAIS ESTRUTURADAS NOS 12 PRIMEIROS ARTIGOS
O Código de 2015 tem uma parte geral, inexistente no Código de 1973, e começa pelo Livro I: “Das Normas Fundamentais e da Aplicação das Normas Processuais”. A Primeira parte deste Livro I traz vetores normativos, a lista, de modo não exauriente, princípios constitucionais à luz dos quais o Código foi elaborado.
Os princípios de que trata este começo do Código de 2015 está por vezes expressamente formulado. Não raramente, são concretizados em algum instituto novo. E, em todos os casos, devem imprimir direção ao movimento interpretativo de todas as regras do Código, para que se chegue a resultados condizentes com esta estrutura principiológica fundamental.
Assim, o começo para o constitucionalismo processual brasileiro se deu a partir da percepção de que o fenômeno processual não mais poderia ser compreendido como um fim em si mesmo. Diante disso vislumbrou-se em matéria processual, esta não deveria mais ter caráter meramente instrumental (CALDAS, 2015, p. 22)
3.1. Análise do artigo 1º
O primeiro dispositivo anuncia a linha mestra fundamental da construção do novo sistema processual civil brasileiro.
“Art. 1o O processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código.” (BRASIL, 2015, não paginado)
Esta contextualização tem uma função quase didática. Não é a partir deste artigo, obviamente, que o CPC deverá passar a submeter-se à Constituição Federal. Trata-se de um dispositivo que deve ser lido antes de todo e qualquer outro dispositivo que integra o Código, que deve ser compreendido a partir dos princípios constitucionais fundamentais. O artigo dá ênfase à imposição que já existe, ou seja, a de que o CPC deve ser interpretado à luz da Constituição Federal.
A eclosão da tese da eficácia imediata dos direitos fundamentais, aliada a percepção do compromisso, firmado pelos ordenamentos jurídicos contemporâneos, com a promoção da dignidade despertaram a melhor doutrina para a imprescindibilidade de uma releitura dos ordenamentos processuais (CALDAS, 2015, p. 22)
Nessa perspectiva, o artigo 1º do CPC-2015 procura contemplar os valores e direitos fundamentais presentes nas normas e princípios, que visam garantir a convivência pacífica, digna, livre e igualitária de toda a sociedade.
Todavia, a de ser feita uma ressalva, pois a inclusão da palavra valores foi colocada como sendo um elemento autônomo. Observa-se que no momento que em que o texto diz “normas fundamentais da constituição federal”, termo que é normalmente empregado como gênero, de que são espécies de regras propriamente ditas e princípios, já é dizer valores, pois os valores têm de ter sidos encampados pelos princípios. Assim, contempla uma visão neoconstitucionalista do Estado Democrático de Direito
“Da Constituição emergem os requisitos do processo justo, o qual supera, em profundidade, o feitio preponderantemente procedimental da antiga visão do devido processo legal. Deixa esse moderno processo tipificado pelo novo constitucionalismo, construído pelo Estado Democrático de Direito, de ser tratado como simples instrumento técnico de aplicação da lei para tornar-se um sistema constitucional de tutela dos direitos, sempre que lesados ou ameaçados” (CF, art. 5º, XXXV) (THEODORO JR, 2015, p. 139).
Claramente inspirado em valores éticos que permeiam os direitos e garantias fundamentais, esse processo, que é mais justo, está enraizado numa ordem constitucional, indo além do princípio da legalidade (THEODORO JR, 2015, p.139). Diante disso, a Constituição Federal de 1988 aborda o ordenamento jurídico brasileiro de uma forma diferente, estabelecendo normas voltadas ao Estado Democrático de Direito, ou seja, mostra que o Direito Privado poderá ser aplicado à luz de seus preceitos.
Flávio Tartuce em sua obra “O novo CPC e o Direito Civil”, comenta os ensinamentos de Maria Helena Diniz para elucidar a importância dos princípios.
“Maria Helena Diniz afirma que os princípios são “cânones que não foram ditados, explicitamente, pelo elaborador da norma, mas que estão contidos de forma imanente no ordenamento jurídico”. Observa Jeanneau que os princípios não têm existência própria, estão ínsitos no sistema, mas é o juiz que, ao descobri-los, lhes dá força e vida” (TARTUCE, 2015, p. 18).
As normas fundamentais elencadas pelo legislador nesse artigo são consideradas eixos normativos a partir dos quais o processo civil deve ser interpretado, aplicado e estruturado (MARINONI, 2015, p. 90). Nos dizeres desse autor: o Código de Processo Civil constitui constitucional aplicado.
3.2. Análise do artigo 2º
O Código de Processo Civil estabelece em seu art. 2º que:
“Art. 2º – O processo começa por iniciativa da parte e se desenvolve por impulso oficial, salvo as exceções previstas em lei” (BRASIL, 2015)
O referido artigo traz o principio do dispositivo (ou da inércia da jurisdição) e o principio do impulso oficial, que se concretiza e tem como resultado o desenvolvimento do processo. O CPC 2015 enquadra esses princípios como normas fundamentais do processo civil brasileiro (DIDIER JR, 2015, p.121).
Resguardando o interesse individual das partes, ou seja, a autonomia individual na construção do procedimento (MARINONI, 2015, p.93), a regra dispõe no sentido de que a estas cabe a iniciativa de provocar a jurisdição, movendo a ação. Por outro lado, em nome do interesse publico, o processo caminha rumo ao seu desfecho, por impulso oficial. Afinal é de interesse público que o processo não fique parado, que seja ágil e que chegue logo ao fim, que, deve ser preferencialmente uma sentença de mérito. Nesse sentido, é possível perceber que o princípio do dispositivo é preponderante em um modelo adversarial[3], ou seja, um modelo que assume a forma de competição ou disputa, desenvolvendo-se com o um conflito entre dois adversários diante de um órgão jurisdicional relativamente passivo, cuja principal função é decidir o caso (DIDIER JR, 2015, p.121). Assim, não é interessante que o próprio judiciário atue de ofício e assuma uma postura ativa diante de um conflito.
No CPC de 1973, em seu artigo 989, o magistrado podia, por exemplo, dar início a um processo de inventario, sem que as partes o provocassem. Tal dispositivo não existe mais no Código de 2015, ou seja, não é mais permitido esse tipo de exceção ao princípio do dispositivo. No entanto, o juiz pode instaurar a execução de sentença que impõe prestação de fazer, não-fazer ou dar coisa distinta de dinheiro (arts. 536 e 538, CPC) (DIDIER JR, 2015, p.145).
Theodoro Júnior (2015, p.140) alerta que, numa visão moderna, os princípios do dispositivo e do inquisitivo não merecem mais a consagração dos Códigos, pois as legislações processuais são mistas e apresentam preceitos tanto de ordem inquisitiva como dispositiva. Ainda sobre esse assunto vai além:
“Se o interesse em conflito é das partes, podem elas renunciar à sua tutela, como podem renunciar a qualquer direito patrimonial privado. Daí a liberdade de procurar ou não a prestação jurisdicional, bem como de exercitar ou não as defesas e faculdades que a relação processual lhes enseja. Contudo, uma vez deduzida a pretensão em juízo, já existe outro interesse que passa a ser de natureza pública e que consiste na preocupação da justa composição do litígio, segundo o direito material vigente, dentro do menor tempo possível. Não pode o Estado permitir a eternização dos processos, porque “justiça tardia é justiça desmoralizada” (THEODORO JR, 2015, p.141)
A segunda parte do art. 2° contemplou algo que já era conhecido no processo civil brasileiro, isto é, uma vez instaurado, o processo desenvolve-se por impulso oficial, independentemente de novas provocações da parte. No entanto, tal regra não impede que o autor simplesmente desista da demanda e, com isso, o processo seja extinto sem exame do mérito (DIDIER JR, 2015, p.146).
Portanto, cabe ao Juiz dar andamento ao processo. Este princípio é da tradição dos processos de civil Law. Todavia, o CPC contém um conjunto de regras que alteram as feições do principio do impulso oficial, são as que tratam das convenções processuais prevista no artigo 190 do seu texto legal. In verbis:
“Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo.
Parágrafo único. De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade” (BRASIL, 2015, não paginado)
O referido artigo deixa claro que as partes podem, em certas situações, convencionar sobre certas situações processuais. No entanto, isso não se dá de forma totalmente livre, pois o magistrado exercerá o controle de tal convenção nos termos da lei.
3.3. Análise do artigo 3º
O terceiro Artigo do código de 2015 prevê:
“Art. 3o Não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito.
§ 1o É permitida a arbitragem, na forma da lei.
§ 2o O Estado promoverá, sempre que possível, a solução consensual dos conflitos.
§ 3o A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial” (BRASIL, 2015)
Logo se percebe que no caput do dispositivo há uma repetição da regra que já consta na Constituição Federal (art. XXXV), regra então materialmente constitucional, sendo, portanto, expressa menção à tutela preventiva (ameaça a lesão). Assim, busca-se um direito à tutela adequada e efetiva, ou seja, nos dizeres de Marinoni (2015, p.94): “a proibição da autotutela só pode acarretar o dever do Estado Constitucional de prestar tutela jurisdicional idônea aos direitos”. Assim, o processo deve ser capaz de garantir a aplicação do direito material, além de ter um resultado processual.
A diferença nas redações é que a Constituição diz “apreciação do Poder Judiciário”, já o novo código traz “apreciação jurisdicional”, no sentido de indicar que as ameaças ou lesões a direito deverão ser dadas soluções de direito, mas não necessariamente pelo Poder Judiciário. Tanto é assim que os parágrafos se referem justamente aos meios alternativos de solução de conflitos, e, especificamente a arbitragem. Assim:
“É de se ter em conta que, no moderno Estado Democrático de Direito, o acesso à justiça não se resume ao direito de ser ouvido em juízo e de obter uma resposta qualquer do órgão jurisdicional. Por acesso à Justiça hoje se compreende o direito a uma tutela efetiva e justa para todos os interesses dos particulares agasalhados pelo ordenamento jurídico” (THEODORO JR, 2015, p.144).
O §1º traz o instituto da arbitragem. No Brasil, a arbitragem é regulada pela Lei nº 9307/96 e é encarada como sendo um negócio jurídico denominado convenção de arbitragem, que compreende tanto a cláusula compromissória[4] quanto o compromisso arbitral[5] (DIDIER JR, 2015, p.170).
O Ordenamento jurídico brasileiro tende a estimular a autocomposição. Nesse sentido, os § 2º e § 3º do referido artigo trazem uma solução negocial para os conflitos, fazendo com que doutrinadores, como Fred Didier elevem o instituto à categoria de princípio.
“Pode-se, inclusive, defender a atualmente a existência d e u m princípio do estímulo da solução por autocomposição – obviamente para os casos e m que ela é recomendável. Trata-se de princípio que orienta toda a atividade estatal na solução dos conflitos jurídicos” (DIDIER JR, 2015, p.274).
Portanto, a novidade trazida por este artigo consiste justamente em se abrirem portas para que o próprio magistrado (assim como advogados, defensores e membros do Ministério Público) incentive as partes, tendo em vista as peculiaridades do caso, a tentar a resolução do conflito pela mediação ou pela conciliação. Fazendo a própria lei referência expressa a este dever do juiz, fica definitivamente afastada a opinião no sentido de que incentivar as partes a optar por outro caminho que não o da Jurisdição Estatal seria denegar a justiça.
3.4. Análise do artigo 4º
O CPC-2015 traz a redação do referido artigo da seguinte forma:
“Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa” (BRASIL, 2015).
Na análise do texto legal pode-se verificar que neste se concretiza o principio da razoável duração do processo. Isto por levar em conta não só o tempo até a sentença, mas a duração integral do caminho a ser percorrido pelo autor até que este obtenha integralmente a satisfação de seu direito. Nas lições de Theodoro Júnior:
“O novo CPC, por seu turno, prevê que essa garantia de duração razoável do processo aplica-se ao tempo de obtenção da solução integral do mérito, que compreende não apenas o prazo para pronunciamento da sentença, mas também para a ultimação da atividade satisfativa. É que condenação sem execução não dispensa à parte a tutela jurisdicional a que tem direito. A função jurisdicional compreende, pois, tanto a certificação do direito da parte, como sua efetiva realização. Tudo isso deve ocorrer dentro de um prazo que seja razoável, segundo as necessidades do caso concreto” (THEODORO JR, 2015, p.148).
Como a proposta do novo texto legal processual é de aproximação com a Constituição de 1988, é conveniente lembrar que a Emenda Constitucional nº 45/2004, incluiu o inciso LXXVIII no seu art. 5º. inverbis:
“Art. 5º(…)
LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 2016).
Fred Didier cita a Justiça Eleitoral para verificar a aplicação desse princípio. Então, vejamos:
“Há uma regra no direito brasileiro que pode servir de parâmetro. De acordo com o art. 97-A da Lei 9.504/ 1997, acrescentado pela Lei nº 12.034/2009, reputa-se razoável o prazo de um ano, incluindo a tramitação em todas as instâncias, para a duração do processo que possa resultar em perda de mandato eletivo. Esse prazo começa a conta da apresentação da demanda perante a justiça Eleitoral. Se houver desrespeito a esse prazo, caberá representação disciplinar contra o juiz ou o Tribunal (art. 97, Lei n. 9.504/1 997), sem prejuízo da representação perante o Conselho Nacional de justiça (art. 97 -A, § 2°, da Lei 9.504 /1 997)” (DIDIER JR, 2015, p.95-96).
Por muito tempo se entendeu que o principio da inafastabilidade do controle jurisdicional dizia respeito ao direito que tinha o autor à obtenção de sentença de mérito. Hoje se concebe o principio da inafastabilidade como sendo o direito não só à sentença de mérito, mas a providencia prática que corresponde à efetiva satisfação do autor, como, por exemplo, o pagamento, a reconstrução muro derrubado, a abstenção quanto à realização de veiculação da propaganda enganosa etc. (LEITE, 2010, não paginado).
Para que os efeitos do Código Processual vigente sejam visíveis, no que diz respeito a minimizar a duração dos processos, além de alterações da lei, é imprescindível a boa vontade e o espírito cooperativo de todos os personagens que lidam no foro: juízes, advogados, promotores e as próprias partes. De outro lado, há quem diga que não existe um princípio da celeridade. Diante disso, o processo não tem de s e r rápido/célere: o processo deve demorar o tempo necessário e adequado à solução do caso submetido ao órgão jurisdicional (DIDIER, 2015, p. 96).
No entanto, o referido doutrinador traz também uma série de instrumentos capazes de concretizar o artigo 4º do CPC-2015.
“Há alguns instrumentos que podem servir para concretizar esse direito fundamental: a) representação por excesso de prazo, com a possível perda da competência do juízo em razão da demora (art. 235, CPC); b) mandado de segurança contra a omissão judicial, caracterizada pela não prolação da decisão por tempo não razoável, cujo pedido será a cominação de ordem para que se profira a decisão59; c) se a demora injusta causar prejuízo, ação de responsabilidade civil contra o Estado, com possibilidade de ação regressiva contra o juiz; d) a EC n. 45/2004 também acrescentou a alínea ‘e’ ao inciso 11 do art. 93 da CF/88, estabelecendo que "não será promovido o juiz que, injustificadamente, retive r autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão” (DIDIER, 2015, p.96).
Em que pese tudo isso, o Pacto de São José da Costa Rica, em seu art. 8º, ratifica a ideia de que toda pessoa tem o direito de ser ouvida, por um juiz ou Tribunal, dentro de um prazo razoável (DIDIER, 2015, p.93).
Nos dizeres de Marinoni (2015, p.97), o direito à duração razoável do processo não implica direito a um processo rápido ou célere. O que se quer dizer com isso é que não haja desproporcionalidade entre a duração do processo e a complexidade do debate processual.
3.5. Análise do artigo 5º
Ainda que de modo indireto, sobre uma atitude cooperativa é que versa o art. 5º. Este dispositivo diz respeito ao comportamento das partes e de todos aqueles que participam do processo.
“Art. 5o Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé” (BRASIL, 2015).
Não se trata de investigar intenções ocultas das partes e dos demais participantes do processo. Trata-se de verificar se sua conduta está de acordo com o direito. A conduta é considerada a exteriorização da boa ou da má fé e é analise da conduta que importa, não das intenções.
No dever de agir com a boa fé[6] se inclui o de dizer a verdade, o de não criar embaraços ao cumprimento de decisão judicial, o de exibir documento em seu poder cujo exame, pelo juiz. Seja necessário para decidir o mérito (e isso diz respeito até o terceiro); quanto ao juiz, deve, por exemplo, declarar-se suspeito quando o for, respeitando a isonomia entre as partes. O novo código, como o ainda vigente, prevê punições de natureza pecuniária para os que agem de má fé. Diante disso, assevera a doutrina:
“Consiste o princípio da boa-fé objetiva em exigir do agente que pratique o ato jurídico sempre pautado em valores acatados pelos costumes, identificados com a ideia de lealdade e lisura. Com isso, confere-se segurança às relações jurídicas, permitindo-se aos respectivos sujeitos confiar nos seus efeitos programados e esperados” (THEODORO JR, 2015, p.150).
O princípio da boa-fé pode ser entendido em dois sentidos: princípio-norma e princípio-elemento subjetivo. Nesse sentido:
“Não se pode confundir o princípio (norma) da boa-fé com a exigência de boa-fé (elemento subjetivo) para a configuração de alguns atos ilícitos processuais, como o manifesto propósito protelatório, apto a permitir a tutela provisória prevista no inciso I do art. 311 do CPC. A boa-fé subjetiva é ele mento do suporte fático de alguns fatos jurídicos; é fato, portanto. A boa-fé objetiva é uma norma de conduta: impõe e proíbe condutas, além d e criar situações jurídicas ativas e passivas. Não existe princípio da boa-fé subjetiva. O art. 5º do CPC não está relacionado à boa-fé subjetiva, à intenção do sujeito processual: trata-se de norma que impõe condutas em conformidade com a boa-fé objetivamente considerada, independentemente da existência de boas ou más intenções” (DIDIER JR, 2015, p.104).
Do referido princípio extrai-se uma cláusula geral processual[7] capaz de impor um comportamento que contemple a boa-fé objetiva nas relações processuais, exigindo das partes um comportamento leal e honesto.
O princípio da boa-fé tem fundamento constitucional e pode ser encarado como um direito fundamental. Para Didier:
“Há quem veja no inciso I d o art. 3° da CF/1 988 o fundamento constitucional da proteção da boa-fé objetiva. É objetivo da República Federativa Brasil e ira a construção de um a sociedade livre, justa e solidária. Haveria um dever fundamental de solidariedade, do qual decorre ria o dever de não quebrar a confiança e de não agir com deslealdade. Nesta mesma linha de raciocínio, há quem veja a cláusula geral d e boa-fé como concretização da proteção constitucional à dignidade da pessoa humana” (art. 10, 111, CF/1 988) (DIDIER, 2015, p.107).
O Supremo Tribunal Federal[8]corrobora esse entendimento e entende que a cláusula do devido processo legal exige um processo leal e pautado na boa-fé.
3.6. Análise do artigo 6º
O artigo 6º dispõe que:
“Todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva” (BRASIL, 2015).
O principio da cooperação é relativamente jovem no direito processual. Cooperar é agir de boa fé. Embora nem todas as condutas de boa fé sejam essencialmente cooperativas. O dever de cooperar existe no interesse de todos, pois todos pretendem que o processo seja solucionado em tempo razoável (DIDIER JR, 2015, p.112).
No direito comparado, como destaca Theodoro Jr., é possível verificar norma semelhante.
“Dispositivo similar consta do Código de Processo Civil de Portugal, de 2013: “Art. 7º- 1- Na condução e intervenção no processo, devem os magistrados, os 152/1774 mandatários judiciais e as próprias partes cooperar entre si, concorrendo para se obter, com brevidade e eficácia, a justa composição do litígio” (THEODORO JR, 2015, p.152-153).
A ideia de cooperação, por vezes, atinge não só as partes, mas a própria sociedade que se faz presente, por meio dos amicus curie ou mesmo grupos que participam das audiências públicas, que são marcadas quando a questão a ser decidida pelo Judiciário tem grande repercussão social.
O princípio da cooperação tem como base os princípios do devido processo legal, da boa-fé processual e do contraditório (DIDIER, 2015, p.124-125). Assim, tal princípio tem o condão de mostrar como o processo civil deve ser estruturado no ordenamento jurídico brasileiro. Nesse sentido:
“O modelo cooperativo parece ser o mais adequado para um a democracia. Dierle José Coelho Nunes, que fala em modelo com participativo de processo como técnica de construção de um processo civil democrático em conformidade com a Constituição, afirma que “a comunidade de trabalho deve ser revista em perspectiva policêntrica e com participativa, afastando qualquer protagonismo e se estruturando a partir do modelo constitucional de processo “(DIDIER, 2015, p.107).
O modelo cooperativo transcende os outros modelos já analisados nesse artigo (adversarial e inquisitivo). Nesse sentido, é bom lembrar que o processo é um feixe de relações jurídicas, que se estabelecem entre os diversos sujeitos processuais, em todas as direções. É por isso que o art. 6º do CPC determina que todos os sujeitos processuais devem cooperar entre si (DIDIER, 2015, p.127).
Assim, a colaboração é um modelo que organiza o papel das partes e do juiz na conformação do processo, estruturando-o como uma verdadeira comunidade de trabalho (MARINONI, 2015, p.100). Diante disso, esse modelo de cooperação enquadra-se como obra do princípio da colaboração.
3.7. Análise do artigo 7º
O sétimo dispositivo, o Código elenca que:
“Art. 7o É assegurada às partes paridade de tratamento em relação ao exercício de direitos e faculdades processuais, aos meios de defesa, aos ônus, aos deveres e à aplicação de sanções processuais, competindo ao juiz zelar pelo efetivo contraditório” (BRASIL, 2015).
A paridade de tratamento é decorrência do principio constitucional da isonomia. Evidentemente, este princípio convive harmonicamente com as diferenças de tratamento decorrentes de peculiaridades que as justificam. É o caso do idoso, daqueles que fazem jus à justiça gratuita, à Fazenda Pública etc. Neste contexto se insere a possibilidade de o juiz, à luz de razões ligadas ao interesse público, flexibilizar as regras tradicionais da distribuição do ônus da prova.
A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, caput, é uma fonte normativa do princípio da igualdade processual. Nessa perspectiva, a igualdade processual deve observar quatro aspectos:
“a) imparcialidade do juiz (equidistância em relação às partes);
b) igualdade no acesso à justiça, sem discriminação (gênero, orientação sexual, raça, nacionalidade etc.); c) redução das desigualdades que dificultem o acesso à justiça, com a financeira (ex.: co cessão do benefício da gratuidade da justiça, arts. 98- 1 02, CPC), a geográfica (ex. possibilidade de sustentação oral por vídeo conferência, art. 9 3 7, §4o, C PC), a de comunicação (ex.: garantir a comunicação por meio da Língua Brasileira de Sinais, nos casos de partes e testemunhas com deficiência auditiva, art. 162, 111, CPC) etc.62; d) igualdade no acesso às informações necessárias ao exercício do contradito rio” (DIDIER, 2015, p.97).
O referido artigo também garante que o magistrado deverá zelar pelo efetivo contraditório. O princípio do contraditório tem relação direta com o devido processo legal, nos âmbitos jurisdicional, administrativo e negocial. A Constituição Federal prevê o contraditório no inciso LV do art. 5, in verbis:
“Art. 5º Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” (BRASIL, 1998).
Assim, o princípio do contraditório pode ser considerado um reflexo do princípio democrático, ou seja, a participação no processo opera-se pela efetivação da garantia do contraditório (DIDIER, 2015, p.78).
Portanto, mais uma vez o CPC-2015 mostra-se alinhado com os preceitos constitucionais vigente no país. Diante disso, pode ser visto sobre uma ótica garantista[9]·. Ademais, Marinoni (2015, p. 103) ensina que o essa igualdade pode ser vista perante a legislação, ou seja, direito a uma aplicação uniforme da lei processual; e igualdade na legislação, isto é, a inexistência de distinções arbitrárias de conteúdo.
3.8. Análise do artigo 8º
O Artigo oitavo, por sua vez, enumera os fins e exigências a serem seguidas:
“Art. 8o – Ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência” (BRASIL, 2015).
No Estado de Direito, ninguém é obrigado fazer ou deixar de fazer alguma coisa, senão em virtude da lei (CF, art. 5º, II). E esse regime não se limita à esfera da atividade privada, pois a Administração Pública também se acha constitucionalmente sujeita a só agir nos limites da legalidade (CF, art. 37, caput) (THEODORO JR, 2015, p.160).
Este dispositivo estabelece alguns parâmetros à luz dos quais o juiz deve aplicar o ordenamento jurídico processual, para presidir o procedimento; e material para decidir a lide. O artigo traz parâmetros ligados a princípios constitucionais, outros a finalidades do próprio direito e alusão a um conceito de natureza filosófica, que, se de um lado, não pode ser compreendido a partir do senso comum, de outro, não pode exigir do interprete profundo conhecimento de filosofia.
Fins sociais e exigências do bem comum são finalidades do próprio direito. A dignidade da pessoa humana é principio consagrado expressamente pela Constituição Federal. Para Fred Didier o dispositivo é aparentemente desnecessário, pois a dignidade da pessoa humana já é um dos fundamentos da República Federativa do Brasil (art. 1°, III, CF/1 988) (DIDIER, 2015, p.75). Assevera ainda:
“A dignidade da pessoa humana pode ser considerada como sobre princípio constitucional, do qual todos os princípios e regras relativas aos direitos fundamentais seriam derivação, ainda que com intensidade variável. A dignidade da pessoa humana pode ser considerada um direito fundamental d e conteúdo complexo, formado pelo conjunto de todos os direitos fundamentais, p revistos ou não no texto constitucional” (DIDIER JR, 2015, p.75).
Já a proporcionalidade e a razoabilidade são expressões a respeito das quais não estão de acordo os mais prestigiados filósofos do direito. Talvez o que o legislador tenha querido dizer aqui seja que se uma situação se aplicam dois princípios, a luz dos quais a lei pode ter duas interpretações diferentes, a proporcionalidade deve orientar o juiz nesta opção. Diante disso, é através desses princípios que se pode analisar se um processo é adequado ou justo. Nesse sentido:
“Como são os próprios deveres de proporcionalidade e de razoabilidade que irão definir, ao lado de outros critérios, o que é um processo adequado ou justo, é equivocado afirmar que há um 'devido processo legal procedimental', entendido como direito a um processo adequado ou justo, se parado do 'devido processo legal substancial', compreendido com a exigência de proporcionalidade e de razoabilidade” (DIDIER JR, 2015, p.71).
A legalidade há de ser compreendida a luz dos padrões dos nossos dias. Há muitas décadas, vem considerando-se o entendimento no sentido de que o juiz não está vinculado à lei, em sua literalidade. O juiz está vinculado ao sistema jurídico, que é composto de normas, interpretadas pela jurisprudência, a luz da doutrina. Estes elementos, jurisprudência e doutrina, funcionam como filtros em relação ao texto da lei, e é ao resultado deste filtro que o juiz deve estar vinculado. Assevera Didier que:
“De acordo com o par. ún. do art. 723 do CPC, pode o órgão jurisdicional, na jurisdição voluntária, não observar a legalidade estrita, decidindo de acordo com critérios de conveniência e oportunidade. O enunciado é velho (consta do texto originário d o CPC- 1 9 7 3) e foi criado para conferir ao órgão jurisdicional uma maior margem de discricionariedade, tanto na condução do processo quanto na prolação da decisão e m jurisdição voluntária” (DIDIER JR, 2015, p.187).
A publicidade é principio constitucional que se aplica a todos os atos dos Poderes Publico. A eficiência, por seu turno, é valor ligado ao principio da razoável duração do processo.
Mais uma vez o CPC-2015 aproxima seus artigos do texto constitucional. Assim, o processo deve ser público, pois o direito à publicidade é um direito fundamental. In verbis:
“Art. 5º LX – a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem” (BRASIL, 1988).
Ainda na lição de Didier, pode-se concluir que a regra é que os atos processuais sejam públicos.
“Os atos processuais hão de ser públicos. O princípio da publicidade gera o direito fundamental à publicidade. Trata-se de direito fundamental que tem, basicamente, duas funções: a) proteger as partes contra juízos arbitrários e secretos (e, nesse sentido, é conteúdo do devido processo legal, como instrumento a favor da imparcialidade e independência do órgão jurisdicional); b) permitir o controle da opinião pública sobre os serviços da justiça, principalmente sobre o exercício da atividade jurisdicional” (DIDIER, 2015, p.86).
Portanto, O CPC-2015 quis contemplar um direito fundamental ligado à transparência e o controle por parte de quem busca o sistema jurisdicional. Diante disso, o código buscou proteger as partes de eventuais abusos dos magistrados.
3.9. Análise do artigo 9º
O principio do contraditório é trazido neste dispositivo:
“Art. 9o Não se proferirá decisão contra uma das partes sem que ela seja previamente ouvida.
Parágrafo único. O disposto no caput não se aplica:
I – à tutela provisória de urgência;
II – às hipóteses de tutela da evidência previstas no art. 311, incisos II e III;
III – à decisão prevista no art. 701” (BRASIL, 2015).
O principio do contraditório vem assumindo contornos diferentes e mais abrangentes ao longo do tempo. O artigo supracitado trata de sua essência cientificar e proporcionar a possibilidade de manifestação à parte, antes que seja proferida decisão em seu desfavor. Segundo Theodoro Júnior:
“O que prevalece, portanto, é que o contraditório do processo justo vai além da bilateralidade e da igualdade de oportunidades proporcionadas aos litigantes, para instaurar um diálogo entre o juiz e as partes, garantindo ao processo “uma atividade verdadeiramente dialética”, em proporções que possam redundar não só em um procedimento justo, mas também em uma decisão justa, quanto possível” (THEODORO JR, 2015, p.157).
O princípio do contraditório pode ser decomposto em duas garantias: participação (audiência, comunicação, ciência) e possibilidade de influência na decisão. Segundo Didier:
“A garantia da participação é a dimensão formal do princípio do contraditório. Trata-se da garantia de ser ouvido, de participar do processo, de ser comunicado, poder falar no processo. Esse é o conteúdo mínimo do princípio do contraditório e concretiza a visão tradicional a respeito do tema. De acordo com esse pensamento, o órgão jurisdicional efetiva a garantia do contraditório simplesmente ao dar ensejo à ouvida da parte. (…) Há, porém, ainda, a dimensão substancial do princípio do contraditório. Trata-se do "poder de influência". Não adianta permitir que a parte simplesmente participe do processo. Apenas isso não é o suficiente para que se efetive o princípio do contraditório. É necessário que se permita que ela seja ouvida, é claro, mas em condições de poder influenciar a decisão do órgão jurisdicional” (DIDIER, 2015, p.78-79).
Assim, não seria legítimo aplicar uma punição a uma das partes sem que a outra tenha se manifestado, ou seja, pensar dessa forma seria admitir uma punição sem contraditório.
O contraditório, em sua versão contemporânea, abrange a necessidade de que as partes sejam ouvidas mesmo quando o juiz pretende resolver matéria sobre a qual pode se manifestar de oficio e também a necessidade de que a atividade das partes em contraditório seja levada em conta pelo juiz, ao decidir. Esta exigência, que revela uma outra faceta do principio do contraditório, se manifesta de modo concreto no minucioso dispositivo, que traz o CPC2015, acerca da motivação da sentença. Neste artigo, a nova lei deixa claro o dever do juiz, no sentido de apreciar os elementos trazidos pelas partes, tanto para acolhê-los, quanto para rejeitá-los. Diante disso, uma decisão-surpresa é decisão nula, por violação ao princípio do contraditório (DIDIER, 2015, p.82).
O contraditório pode ser postergado, se tratar da concessão de tutela provisória de urgência; de tutela provisória de evidencia concedida porque, além da evidencia, as alegações de fato feitas pelo autor possam ser demonstradas apenas por documentos e haja tese firmada em julgamento de recursos repetitivos (incidente de resolução de demandas repetitivas e recursos extraordinários e especiais repetitivos); ou em sumula vinculante; ou se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada ao contrato de deposito, caso em que a lei especifica o conteúdo da liminar ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa. Assim, nos ensinamos de Theodoro Júnior:
“Não se trata, porém, de afastar, em definitivo, o contraditório, mas apenas de protraí-lo. Pelas necessidades e conveniências do caso, decide-se a questão proposta de imediato, sem prévia audiência do interessado. Uma vez, contudo, ultimada a medida excepcional, abrir-se-á a oportunidade de discussão da matéria e da defesa da parte afetada, podendo o juiz, então, se for o caso, confirmar, modificar ou revogar o provimento emergencial” (THEODORO JR, 2015, p.159).
Para este doutrinador, o contraditório é da essência do processo democrático e justo. No entanto, a exigência de prévia audiência das partes não pode ser levada a um extremismo que comprometa a agilidade indispensável da prestação jurisdicional, também objeto de garantia constitucional (THEODORO JR, 2015, p.159).
3.10. Análise do artigo 10
Dispõe o décimo artigo:
“Art. 10 – O juiz não pode decidir em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício” (BRASIL, 2015).
O dispositivo diz respeito a um dos aspectos do contraditório, já mencionado nos comentários do artigo anterior, que consiste na vedação que o juiz decida com base em fundamento (fático jurídico) sobre o qual não tenha havido contraditório, assim como lhe é vedado decidir sobre matéria que pode conhecer de oficio, sem que proporcione às partes a oportunidade de se manifestar (DIDIER JR, 2015, p.81).
Então, o contraditório no Novo Código de Processo Civil, é principio acolhido em sua versão mais especifica, haja vista que, não se decide contra alguém (salvo exceções expressamente previstas) sem que se lhe de oportunidade de se manifestar; e ainda, embora o direito brasileiro permitir que o juiz decida com base em fundamento não suscitado pelas partes, (iuranovitcuria), deve, antes, proporcionar oportunidade às partes, de que se manifestem sobre ele. Assim, Didier ensina que:
“Não pode o órgão jurisdicional decidir com base em um argumento, uma questão jurídica ou uma questão de fato não postos pelas partes no processo. Perceba: o órgão jurisdicional, por exemplo, verifica que alei é inconstitucional. Ninguém alegou que a lei é inconstitucional. O autor pediu com base em uma determinada lei, a outra parte alega que essa lei não se aplicava ao caso. O juiz entende de outra maneira, ainda não aventada pelas partes: "Essa lei apontada pelo autor com o fundamento do seu pedido é inconstitucional. Portanto, julgo improcedente a demanda". O órgão jurisdicional pode fazer isso, mas deve antes submeter essa nova abordagem à discussão das partes” (DIDIER, 2015, p.81).
Assim, o correto seria o órgão jurisdicional sempre intimar as partes para que estas se manifestem, corroborando assim com os princípios cooperativo e democrático.
3.11. Análise do artigo 11
No artigo 11 os princípios tratados são, o principio da publicidade e o dever de motivar as decisões judiciais.
“Art. 11. Todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos e fundamentados todas as decisões, sob pena de nulidade.
Parágrafo único. Nos casos de segredo de justiça, pode ser autorizada a presença somente das partes, de seus advogados, de defensores públicos.” (BRASIL, 2015).
Princípios essenciais no direito processual constitucionalizado. A lei diz, repetindo a Constituição Federal em seu artigo 93, IX, que julgamentos serão públicos e fundamentadas as decisões, sob pena de nulidade. In verbis:
“Art. 93. Lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados os seguintes princípios:(…)
IX todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação” (BRASIL, 2015).
No parágrafo único do artigo em análise, excepcionam-se casos de segredo de justiça, quanto à publicidade plena, mas não quanto à fundamentação. O dever de fundamentação garante que a decisão não foi fruto de arbitrariedade e torna possível, tecnicamente, que a decisão seja impugnada pela via recursal, pois, de fato o que se ataca não é a decisão, mas seu fundamento.
A publicidade que se confunde com o dever de transparência, contribui para evitar abusos no exercício do poder. O CPC2015, além de reforçar de maneira veemente o dever de fundamentar e a transparência, contém normas que facilitam o acesso às informações das decisões judiciais, porque estas podem afetar indiretamente terceiros; dizer respeito a causas que versem sobre direitos de massa, e em face da tendência manifesta de valorização da jurisprudência, passam a ser relevantes, inclusive para aqueles que ainda nem ingressaram em juízo. Didier vai além e alerta que os atos processuais devem ser públicos e elege tal princípio à categoria dos direitos fundamentais. Nesse sentido:
“Os atos processuais hão de ser públicos. O princípio da publicidade gera o direito fundamental à publicidade. Trata-se de direito fundamental que tem, basicamente, duas funções: a) proteger as partes contra juízos arbitrários e secretos (e, nesse sentido, é conteúdo do devido processo legal, com o instrumento a favor da imparcialidade e independência do órgão jurisdicional); b) permitir o controle da opinião pública sobre os serviços da justiça, principalmente sobre o exercício da atividade jurisdicional” (DIDIER, 2015, p.86).
Um exemplo é a obrigatoriedade que tem os Tribunais, de acordo com a Lei processual no que tange à manutenção de bancos eletrônicos de dados, com informações sobre questões jurídicas submetidas ao incidente de resolução de demandas repetitivas, ao regime de julgamentos de recurso especial e recurso extraordinário repetitivo, e o CNJ que deverá também ter o seu cadastro, conforme preconiza o artigo 979 do Código de Processo Civil 2015.
Preserva-se, entre outros, o direito de intimidade criando-se exceção à publicidade do processo, exceção que se aplica, normalmente, as ações de família. A dificuldade de se eleger qual o valor merecedor de proteção do direito é comum nos casos em que estão em jogo, de um lado, direito a informação, e de outro, direito à privacidade das partes. Não nos casos que se discute sobre direito de família, mas em tantos outros, cabe ao juiz, sopesar valores e decidir em favor ou em desfavor de se abrir, em algum caso concreto, exceção à regra geral da publicidade. Assim, há casos em que a lei já determina que o processo corra em segredo de justiça ou que seja decretado pelo magistrado (DIDIER, 2015, p.87).
De todo modo, é de se frisar que em relação às partes, advogados, defensores e Ministério Público jamais haverá qualquer tipo de restrição às informações constantes do processo.
Em que pese tudo isso, explica-se tal exigência constitucional pela circunstância de que na prestação jurisdicional há um interesse público maior do que o privado defendido pelas partes. Para Humberto Theodoro Júnior (2015, p. 167) trata-se da garantia da paz e harmonia social, procurada por meio da manutenção da ordem jurídica.
“Daí que todos, e não apenas os litigantes, têm direito de conhecer e acompanhar tudo o que se passa durante o processo. Aliás, a publicidade é exigência do Estado Democrático que não se limita aos atos do Judiciário, pois a Constituição a impõe como princípio fundamental da Administração Pública praticada na esfera de qualquer dos Poderes institucionais (CF, art. 37)” (THEODORO JR, 2015, p. 167).
Ademais, segundo Marinoni (2015, p. 110), o CPC2015 preza pela administração democrática da justiça civil, ou seja, a alocação do dever de publicidade visa concretizar o processo civil brasileiro a partir de uma ideologia democrática.
3.12. Análise do artigo 12
O ultimo dispositivo deste artigo preconiza:
“Art. 12. Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão.
§ 1o A lista de processos aptos a julgamento deverá estar permanentemente à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores.
§ 2o Estão excluídos da regra do caput:
I – as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido;
II – o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos;
II – o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas;
IV – as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932;
V – o julgamento de embargos de declaração;
VI – o julgamento de agravo interno;
VII – as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça;
VIII – os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal;
IX – a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada.
§ 3o Após elaboração de lista própria, respeitar-se-á a ordem cronológica das conclusões entre as preferências legais.
§ 4o Após a inclusão do processo na lista de que trata o § 1o, o requerimento formulado pela parte não altera a ordem cronológica para a decisão, exceto quando implicar a reabertura da instrução ou a conversão do julgamento em diligência.
§ 5o Decidido o requerimento previsto no § 4o, o processo retornará à mesma posição em que anteriormente se encontrava na lista.
§ 6o Ocupará o primeiro lugar na lista prevista no § 1o ou, conforme o caso, no § 3o, o processo que:
I – tiver sua sentença ou acórdão anulado, salvo quando houver necessidade de realização de diligência ou de complementação da instrução;
II – se enquadrar na hipótese do art. 1.040, inciso II” (BRASIL, 2015).
Depreende-se da inteligência desse extenso artigo que a transparência é fundamental ao Poder judiciário. Ademais, a parte tem direito a um processo célere sem obstáculos criados por tal poder. Nos ensinamentos de Humberto Theodoro Júnior:
“Para que a observância da regra em foco seja controlada, o § 1º do art. 12 do NCPC obriga a manutenção permanente da lista dos processos aptos a julgamento à disposição para consulta pública em cartório e na rede mundial de computadores” (THEODORO JR, 2015, p. 169).
A redação do art. 12 do CPC 2015 é inovadora e estabelece que todos os órgãos jurisdicionais, de primeira e segunda instância, deverão obedecer à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Trata-se de inovação para salvaguardar a garantia fundamental da igualdade, impedindo que os julgamentos sigam ordens distintas da conclusão, considerando aspectos ou fatores que não deveriam ser levados em consideração, nem interferir na justiça, como, por exemplo, pedidos de preferência estimulados pelo relacionamento entre juiz e advogados; condição social das partes; preferências pessoais do juiz por determinadas matérias etc. (CALDAS, 2015, p.50)
Em uma análise mais apurada é possível observar uma certa relação desse artigo com o princípio da duração razoável do processo, pois disciplina o tempo da decisão pleiteada, evitando que processos conclusos há muito tempo tenham seu deslinde prolongado indefinidamente (DIDIER, 2015, p.146).
O §2º trata das exceções, os casos em que a ordem cronológica não precisa ser obedecida. Sentenças proferidas em audiência, sentenças que homologam acordos. Também não estão submetidos à ordem cronológica, não pela sua simplicidade, mas pela sua complexidade e relevância social implícita, justamente os processos que gerarão as decisões que serão usadas como paradigma. E ainda, saem da fila as sentenças processuais e as decisões tomadas pelo relator, para preparar o recurso para ser apreciado por órgão colegiado.
Fred Didier Jr.(2015, p. 147-149) analisa comenta cada um dos incisos do §2º do CPC-2015. Diante disso é importante trazer a baila os argumentos do jurista para um maior entendimento da aplicação dessa norma.
No inciso I do artigo ora analisado, diz que as sentenças proferidas em audiência, sejam homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido, podem ser decididas ao final da audiência sem maior dificuldade e, em nome do princípio da razoabilidade, não ferem a norma que garante a ordem cronológica de julgamento.
No inciso II, traz a decisão em bloco, que também não precisará obedecer a ordem cronológica, pois garantirá uma maior celeridade e um tratamento isonômico do caso. Desse modo, é possível reunirem-se processos conclusos em datas bem diferentes, desde que todos versem sobre a mesma tese jurídica a ser aplicada. Assim, esse agrupamento somente se justifica se for para julgar os casos: quebra-se o respeito à ordem cronológica para fim de julgamento de todos os processos repetitivos (DIDIER, 2015, p.147-148).
No inciso III, o CPC vigente criou duas novas hipóteses de processo prioritário, ambas de competência de tribunais. O julgamento de recursos repetitivos compete ao STF ou ao STJ, conforme o caso e o julgamento do incidente de resolução de demandas repetitivas que compete ao Tribunal de justiça ou ao Tribunal Regional Federal.
O inciso IV assevera que, estando o processo em tribunal, somente os acórdãos finais se submetem à regra de observância da ordem cronológica de conclusão. Decisões do relator, proferidas com base no art. 932 do CPC, estão fora do âmbito de incidência da regra. Também estão fora da incidência às decisões que extinguem o processo sem resolução do mérito (art. 485 do C PC), sejam sentenças (proferidas por juiz), sejam acórdãos (DIDIER, 2015, p148).
O inciso V diz que os embargos de declaração estão fora desta ordem cronológica, porque como tem em vista provocar o magistrado para proferir a decisão que, de rigor, já deveria ter sido proferida desde o inicio, o lapso temporal entre a decisão e o julgamento do agravo dela interposto não pode ser de longo. Isto, sob pena de o magistrado no caso de se apontar obscuridade na decisão, nem mais se lembrar do que queria dizer.
O inciso VI fala que o julgamento de agravo interno fica fora do âmbito de incidência dessa regra fundamental. Assim, se ocaso já foi julgado, o agravo interno leva a questão para a revisão do colegiado a que pertence o relator.
O inciso VII e VIII afirmam que devem ser passados na frente preferências legais e metas do CNJ, processos criminais e causas em que o juiz ou relator reconheça urgência, em decisão fundamentada. Nestes casos, evidentemente, o critério é do juiz, do desembargador ou do ministro e desta decisão não cabe recurso. A lei prevê que o fato de a parte formular qualquer tipo de requerimento não gera alteração da lista: decidido o processo/recurso, este volta ao lugar em que estava (DIDIER, 2015, p148).
Finalmente, certamente preocupado com situações excepcionais não reguladas na extensa lista deste §2º do art. 12. Didier afirma que:
“O legislador resolveu estabelecer um a regra geral excetuadora: sempre que houver urgência, reconhecida por decisão fundamentada, pode o órgão jurisdicional julgar determinado processo, ignorando a ordem cronológica de conclusão. O interessado pode requerer isso ao juiz, demonstrando a urgência. Requererá, então, uma tutela de urgência, que no caso virá conjuntamente com a sentença (o que é possível, nos termos do art. 1.012, § 1°, V, CPC). A decisão que negar esse pedido estará, portanto, negando um a tutela de urgência; por isso, será impugnável por agravo de instrumento (art. 1.015, I, CPC)” (DIDIER, 2015, p148).
No §6º há duas situações em que os processos deverão ter prioridade de julgamento, ocupando o primeiro lugar na lista a que se refere o artigo 12. A primeira se refere nos casos de anulação da sentença ou do acórdão, salvo se a anulação se der por cerceamento de defesa, pois haverá necessidade da realização de atos de instrução, e por isso não haverá prioridade de julgamento. A segunda hipótese diz que será incluído em primeiro lugar na lista de julgamento, o processo em que tenha sido interposto recurso especial ou recurso extraordinário que se encontrem sobrestados no tribunal local, em razão de julgamento de recurso pelo rito repetitivo nos tribunais superiores.
4. IMPLICAÇÕES PRÁTICAS DO CPC 2015
A análise dos artigos que abrem o CPC2015, à luz da interpretação doutrinária, deixa claro as bases utilizadas para construção do texto, fundamentado nos preceitos do neoprocessualismo, que celebra a Constituição como linha norte da lei e das decisões. Como já mencionado em linhas anteriores, a nova sistemática principiológica trazida pelo Diploma de 2015, revelou uma nova parametrização da processualística nacional, haja vista que, busca na Constituição seu fundamento de validade.
É relevante mencionar que o Código de 1973 também trazia, de forma esparsa, princípios constitucionais para embasar a lei ordinária, porém, a nova sistemática, trazendo expressamente os princípios constitucionais, permite uma melhor aplicação e valorização da norma, interpretando-se de modo que se aproxime mais do Texto Constitucional. E ainda, não se pode deixar de mencionar, que, tal forma é um meio didático de demonstrar que a sociedade baseia-se e preza por valores mais éticos e isonômicos.
O CPC-2015 trás implicações nas diversas áreas do direito, pois, ao encarar o processo civil numa visão constitucional aumenta consideravelmente seu campo de atuação e a forma como esse é aplicado. Ademais, uma das consequências da teoria da interpretação é a existência de um sistema onde os juízes interpretam as leis e sua constitucionalidade (MARINONI, 2014, p. 102).
Assim, é importante destacar algumas alterações trazidas pelo novo código. O Código de Processo Civil que entrou em vigor ano de 2015 privilegia a Conciliação entre os litigantes, propondo uma solução pacífica para a lide. Diante disso, prevê que nas ações em que as partes possam dispor de seus direitos, seja realizada uma audiência de conciliação antes da contestação por parte do réu. Alguns doutrinadores aportam nesse sentido:
“A alteração é oportuna, pois a diretriz é para que se busque o resultado autocomposição, independentemente da técnica a ser utilizada para tal finalidade. Destaca-se, ainda, a importância do papel dos conciliadores e mediadores (arts. 165-175), que são fundamentais para facilitar o diálogo entre as partes e auxiliar a construção do consenso”. (CALDAS, 2015, p.50)
Nesse diapasão, o novo código, acabou os incidentes processuais de incompetência de forma apartada e oportunizou as alegações da defesa nem sede de contestação, tornando a defesa do réu mais ampla mais simples. Também extinguiu a contagem de prazos de forma corrida e passou a adotar uma contagem em sistema de dias úteis, o que fez com que os prazos fossem ampliados consideravelmente. Nessa perspectiva, o inciso LV, artigo 5º, senão vejamos:
“Art. 5º, LV – Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com meios e recursos a ela inerentes” (BRASIL, 1988, não paginado).
Outra implicação importante foi a criação de uma ordem para que os processos sejam julgados. O código anterior era omisso em relação a isso e deixava ao bel prazer do magistrado o cronograma elaborado para decidir. O Novo Código de Processo Civil avança e afasta essa faculdade do juiz, deixando claro que o julgamento dos processos devem obedecer à antiguidade, independentemente da complexidade da causa. Tal entendimento também tem aporte constitucional no art. 5º LXXVIII, in verbis:
“A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 1998, não paginado)
Em relação ao sistema recursal, o CPC2015 estabeleceu prazo unificado de quinze dias úteis para quase todos os recursos existentes no código e extinguiu alguns recursos do antigo código, como, por exemplo, os embargos infringentes e o agravo retido, sempre visando uma maior celeridade.
Tema muito comemorado pelos advogados foi o sistema de honorários. O CPC 2015 trouxe diversas regras sobre o assunto. O pagamento de honorários na fase recursal é uma das regras mais importantes, pois determina que a parte que apresentar recurso e for sucumbente terá que pagar os honorários sucumbenciais destinados ao advogado da parte vencedora.
O CPC2015 também traz novos procedimentos para desconsiderar a personalidade jurídica de uma determinada sociedade para que os sócios sejam responsabilizados diretamente por fraudes e atos contrários à lei.
Portanto, pode-se observar através dos exemplos ora citados, que este novo conjunto de normas processuais lastreou-se na Constituição Federal de 1988e trouxe para o processo civil uma visão mais garantista. No entanto, dos dados obtidos, pode-se verificar que vários autores ainda não chegaram a um consenso. Didier, por exemplo, detalha os dispositivos do CPC a luz de princípios constitucionais.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A abordagem iniciou-se com a breve explanação sobre as teorias neoconstitucionalista e neoprocessualista que passam a nortear a disciplina processual civil no Brasil, a partir da entrada em vigor da Lei n. 13.105 de 16 de março de 2015.
Seguiu-se a análise com a apreciação do texto normativo, confirme disposto no Código de Processo Civil de 2015, em justaposição com os posicionamentos doutrinários. Utilizou-se com o pilar hermenêutico central a percepção doutrinária de Didier Jr, valendo-se também do aporte fornecidos por outros doutrinadores, mencionados ao longo da análise.
Desta forma, foram analisados os doze primeiros artigos do Código de Processo Civil do ano de 2015, um a um, sendo tratadas as várias mudanças que representam a visão mais contemporânea do sistema processual, adotada no texto da Lei de março de 2015. Além da análise propriamente do texto processual, buscou-se revelar a aproximação que a norma processual passa a ter com a Carta Magna de 1988, por meio do cruzamento entre os posicionamentos doutrinários selecionados para construção da análise.
Conforme exposto, alguns dos princípios representam inovações do legislador. No entanto, outros, já eram contemplados no Código de 1973, mas que ganharam um novo contexto. Assim, essas normas tornaram-se um instrumento com mais eficácia para a solução dos conflitos. Além do mais, o CPC-2015não ficou atrelado somente à função da jurisdição. A visão dessa norma foi ampliada e procuro reduzir as desigualdades entre as partes, exercer uma função educadora e políticas, sempre procurando forma de tornar o processo mais Justo.
Só tempo e a prática forense dirão se os valores e fundamentos aqui abordados em cada artigo irão realmente tornar o processo mais equânime e justo. Embora inexista ainda um consenso entre os doutrinadores brasileiros, dada a recente promulgação da Lei Processual civil. Resta evidente o avanço que o CPC 2015 promove, no sistema processual brasileiro, ao contemplar as vertentes principiológicas constitucionais em seu texto, propagando assim, o legislador brasileiro, uma fase completamente diferente dos códigos processuais anteriores.
Informações Sobre os Autores
Phablo Freire
Advogado, Professor universitário, Bacharel em Direito. Especializando em Gestão de Cidades pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina (FACAPE), Especialista em Direito Constitucional Aplicado pela Damásio Educacional, Mestrando em Psicologia Social pelo Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF).
Valdeí de Amorim Coelho Jr.
Acadêmico de Direito pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina FACAPE Engenheiro Eletricista pela Escola Politécnica de Pernambuco pós-graduado em Automação Industrial pela UFPE e MBA em Gestão Empresarial pela FGV