Orientações para contratação de serviços de hotéis pelos órgãos do poder público

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Resumo: A contratação pelos órgãos do Poder Público exige procedimento licitatório, como regra. Em algumas hipóteses previstas em lei a licitação poderá deixar de ser realizada. A contratação de hotéis para serviços de hospedagem, alimentação ou locação de espaços para eventos podem ser contratados pelo Poder Público, respeitando os Princípios da Moralidade e da Legalidade.

Palavras-chave: Contratação. Hotel. Hospedagem. Servidor Público. Licitação.

Abstract: Hiring by government entities requires bidding procedure , as a rule. In some cases provided by law bidding can no longer be held . Hiring hotels for hosting services , supply or rental spaces for events can be hired by the Government, respecting the Principles of Morality and Legality.

Keywords: Hiring . Hotel. Accommodation. Public server. Bidding.

Sumário: a) Hipóteses de contratação pelo Poder Público de serviços de hotéis; b) Obrigatoriedade, dispensa e inexigibilidade de licitação; c) Aglutinação de serviços; d) Fracionamento da modalidade; e) Despesas; f) Modo de pagamento g) Prestação de Contas.

A – HIPÓTESES DE CONTRATAÇÃO PELO PODER PÚBLICO DE SERVIÇOS DE HOTÉIS (hospedagem, alimentação e locação de espaços)

1. O Poder Público – nele compreendido os órgãos dos Poderes Executivo e Legislativo da União, dos Estados e dos Municípios, além do Poder Judiciário – poderá contratar os serviços de um hotel em três hipóteses:
a) para a locação de um espaço, uma sala, um auditório para a realização de um evento de interesse público, previsto em lei ou incluído como uma de suas ações governamentais. A realização de conferência federal, estadual ou municipal de saúde a cada quatro anos, por exemplo, é um dos instrumentos obrigatórios de implementação do Sistema Único de Saúde, caso o ente estatal não possua um auditório, pode locar o auditório de um hotel para realizar a conferência. Outro exemplo é o Campeonato de Judô ou Xadrez, previsto no Calendário Oficial de Eventos e que precise de um espaço para nele serem realizadas as competições;

b) para a hospedagem e alimentação de servidores públicos que eventualmente irão participar de algum evento que será realizado no próprio hotel, nas imediações ou algum compromisso oficial junto aos demais órgãos do Poder Público que exija pernoitar ou passar algum tempo hospedado no hotel. É o caso de um Procurador que precisa acompanhar o julgamento de uma ação no Tribunal de Justiça, que está pautada e pode ser que seja julgada no dia marcado ou fique para dia posterior. Pode ser o caso de um médico servidor público participando de um congresso ou treinamento em local próximo ao hotel;

c) para a hospedagem e alimentação de artistas ou atletas contratados ou patrocinados pelo Poder Público para a participação em evento a ser realizado no próprio hotel ou na cidade, em local externo. A realização de uma maratona na cidade pode incluir a hospedagem de atletas “de ponta”, que além de promoverem o evento, também o tornam mais profissional.

B – OBRIGATORIEDADE, DISPENSA E INEXIGIBILIDADE DE LICITAÇÃO

2. A regra geral que prevalece na Administração Pública é a obrigatoriedade de licitação, segundo o artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal. Na hipótese mencionada no item 1, “a”, a melhor recomendação é que haja o procedimento licitatório, para que outros hotéis interessados ou espaços com auditórios adequados aos interesses da Administração Pública possam oferecer suas propostas de valor. Porém, mesmo neste caso, poderá o Poder Público deixar de promover a licitação:

a) se o valor para locação do espaço no hotel não superar R$ 8.000,00, poderá haver a dispensa de licitação, com fundamento no artigo 24, inciso II, da Lei de Licitações;
b) se no Município o único espaço disponível for o auditório de um hotel será inexigível a licitação, por ser inviável a competição por simplesmente não existirem outros espaços na cidade para servir ao interesse da Administração Pública, conforme inteligência do artigo 25, caput, da Lei de Licitações.

3. Nas hipóteses mencionadas nos itens 1 “b” e 1 “c” não há necessidade de licitação, e o Poder Público poderá justificar de duas formas:

a) dispensando a licitação, pelo artigo 24, inciso II, da Lei de Licitações, por ser despesa de pequeno valor, orçada em até R$ 8.000,00;

b) inexigindo a licitação, pelo artigo 25, caput, da Lei de Licitações, por ser inviável a competição, já que é no hotel que se pretende hospedar onde será realizado o evento, é o mais próximo do evento, ou é o único da cidade, poupando despesas adicionais de deslocamento ou translado.

4. Em qualquer hipótese, de dispensa ou inexigibilidade da licitação, a Administração Pública deve observar o artigo 26, da Lei de Licitações. A falta de instrução do processo administrativo com os requisitos exigidos pelo artigo 26 é uma das mais recorrentes falhas apontadas pelos Tribunais de Contas.

5. Pelo artigo 26, parágrafo único, da Lei de Licitações, o processo de dispensa ou de inexigibilidade será instruído, no que couber, com os seguintes elementos: razão da escolha do executante do serviço e a justificativa do preço. Por isso, o processo administrativo, além de demonstrar as razões de interesse público que demandam a hospedagem, também precisa demonstrar o motivo de escolha do hotel – a opção por este ou aquele hotel em detrimento de outros – e deverá ser instruído com cotações de preços de outros hotéis – para que se demonstre que os preços praticados pelo hotel que se pretende contratar são compatíveis com os preços de mercado.

C – AGLUTINAÇÃO DE SERVIÇOS

6. Ao realizar uma licitação, o Poder Público não pode aglutinar os serviços de hotelaria, alimentação e locação de auditório com palco, sonorização e iluminação. Pretendendo contratar todos esses serviços, a Administração deve separar o objeto da contratação, em diversos certames ou lotes individuais: a) locação do espaço; b) hospedagem; c) montagem de palco; d) som; e) iluminação. Existem diversas empresas no mercado que apenas montam o palco, ou apenas trabalham com sonorização, ou somente com iluminação, e há outras que fazem esse conjunto. Separar as contratações permite que a Administração obtenha uma participação maior de licitantes, que em tese podem oferecer preços mais convidativos.

D – FRACIONAMENTO DA MODALIDADE

7. Caso o Poder Público, diversas vezes ao ano, por motivos iguais ou diferentes, custeie as despesas de servidores públicos, artistas, atletas com hospedagem e alimentação em hotel, deverá ser observado o limite legal do artigo 24, inciso II, da Lei de Licitações, para aqueles que optarem por dispensar a licitação, em cada uma das hospedagens, ao longo do ano, sempre contratando diretamente o mesmo ou hotéis diferentes.

8. Pelo artigo 23, §3º e 5º, da Lei de Licitações, as contratações podem ser parceladas, divididas ao longo do ano, do exercício financeiro, em função do Princípio da Anualidade do Orçamento, mas deverão respeitar o limite de R$ 8.000,00. Se as despesas da mesma natureza somadas superarem esse valor, indicam a necessidade de licitação na modalidade convite ou pregão.

E – DESPESAS IMPRÓPRIAS

9. As despesas com hospedagem devem atender aos fins para o qual foi contratada, sendo ilegal que qualquer pessoa estranha ao serviço público ou diferente daqueles para o qual o quarto foi locado beneficiem-se do negócio, sob pena de ofensa ao Princípio da Moralidade. Dessa forma, se um servidor público se hospeda em hotel para participar de curso ou de compromisso oficial no dia seguinte, não pode estar acompanhado de sua esposa ou namorada para que também se utilize do espaço, que é contratado e pago com recursos públicos. Da mesma forma, se os quartos são ocupados por atletas ou artistas, estes também não podem ocupar os quartos com parentes, amigos e pessoas estranhas a ação governamental de interesse público objeto da contratação.

10. As despesas com alimentação também precisam estar alinhadas com o interesse público. Somente podem se alimentar no hotel aquelas pessoas indicadas pelo Poder Público como autorizadas para a hospedagem e alimentação. Da mesma forma que no exemplo anterior, seria ilegal custear as despesas com o almoço da namorada do servidor público. Se o servidor público estiver acompanhado de outra pessoa estranha, sua namorada, cabe a eles pagar com seus recursos pessoais a despesa. Também estão proibidas despesas com bebida alcóolica no hotel, mesmo no frigobar, pois não há interesse público que justifique o consumo de bebida alcóolica por servidores públicos, artistas ou atletas, todos ali a trabalho ou para participar de competição, que exigem lucidez e comprometimento com as atividades para o qual foram contratados a desempenhar, com recursos públicos. Despesas dessa espécie, devem ser custeadas com recursos particulares. O cardápio do hotel também costuma ser bem variado e não há nada que impeça o hóspede de se alimentar com aquilo que deseja, mesmo optando pelo filé de peixe, ao invés do frango, que é geralmente mais barato. O que não pode é optar por um prato exótico, extremamente mais caro que a média dos demais pratos, tal como camarões, lagostas, sobremesas com ouro comestível. Serviços como lavagem, secagem e passagem de roupas, massagens e outras amenidades não encontram justificativa razoável para que sejam custeadas pelo Poder Público. Assunto recorrente na jurisprudência dos Tribunais é a despesa imprópria com a injustificável hospedagem de servidor público em hotel na própria cidade sede do órgão público para o qual presta serviços, ou a hospedagem em hotel muito distante do local do evento ou do compromisso oficial, sem um motivo razoável para demonstrar o interesse na contratação do hotel.

11. As despesas com alimentação ainda poderão ser consideradas impróprias se o servidor público já for remunerado ou indenizado pela Administração Pública através de vale-alimentação, cartão-alimentação ou salário-alimentação. É assim porque se o servidor público recebe mensalmente determinado valor da Administração para cobrir suas despesas com refeições durante o expediente normal de trabalho, não poderia a Administração pagar pela alimentação no hotel se ela já paga a alimentação do servidor público através de outro benefício.

12. O hotel faz parte da relação contratual firmada com o Poder Público, pois ele é o executor dos serviços contratados e, como tal, deve também zelar pela ética e moralidade no serviço público, vetando e impedindo as práticas e despesas impróprias indicadas nos itens 9 e 10.

F – MODO DE PAGAMENTO

13. Qualquer despesa realizada com verbas públicas a de ser lançada e registrada em procedimento apropriado, formalizado com antecedência para tal fim, seja o processo ordinário, regido pela Lei Federal nº 8.666/93, seja o processo de adiantamento, determinado pela Lei nº 4.320/64.

14. Nas hipóteses tratadas no item 1 “a” e 1 “c” a despesa deve ser previamente empenhada e a liquidação, com o pagamento, somente deve ser realizada após a prestação dos serviços pelo hotel, conforme o artigo 60 e seguintes da Lei nº 4.320/64 . É uma forma de pagamento faturado ou a crédito, onde o Poder Público primeiro precisa da demonstração de que o serviço foi efetivado prestado para depois proceder ao seu pagamento.

15. Na hipótese do item 1 “b” a despesa pode ser paga previamente pelo Poder Público ao hotel, através do “regime de adiantamento de numerário”, que consiste em entregar ao servidor público, antecipadamente, quantia em dinheiro, cheque ou saldo no cartão corporativo, suficientes para o pagamento da despesa, desde que a regulamentação do “regime de adiantamento de numerário” este esteja previsto em lei, conforme o artigo 68, da Lei nº 4.320/64.

G – PRESTAÇÃO DE CONTAS

16. Em qualquer uma das hipóteses de contratação, a prestação de contas do Poder Público será realizada observando as informações constantes da nota fiscal e das comandas de consumo emitidas pelo hotel, que deverão trazer de forma detalhada as pessoas que ocuparam os quartos e a relação pormenorizada dos produtos e serviços consumidos no hotel. Historicamente, esta é uma das maiores falhas nas contratações dessa espécie, pois a pedido de hóspedes mal intencionados, o hotel emite criminosamente uma nota fiscal com valor maior do que foi efetivamente consumido ou omitindo o consumo de bebidas alcóolicas ou despesas impróprias tal como acima indicado.

 

Referências:
MUKAI. Toshio Mukai. Licitações e Contratos Públicos, Editora Saraiva, 8ª edição, 2009.
FURTADO, Lucas Rocha. Curso de Licitações e Contratos Administrativos, Editora Forum, 3ª edição, 2012.
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo, Malheiros Editores, 27ª edição.
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, Editora Saraiva, 17ª edição, 2012.
MEIRELLES, Hely Lopes. Licitação e Contrato Administrativo, Malheiros Editores, 14ª edição, 2010.
SABINO, Jamilson Lisboa, Lei de Licitações comentada segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, Saraiva Digital, 2ª edição, 2016,
COELHO MOTTA, Carlos Pinto. Eficácia nas Licitações e Contratos, Editora Del Rey, 10ª edição, 2012.

Informações Sobre o Autor

Jamilson Lisboa Sabino

Professor de Direito Administrativo. Pós-Graduado em Licitações e Contratos Públicos pela Fundação Getúlio Vargas. Foi Procurador Municipal. Autor, dentre outros, dos livros “Lei de Licitações comentada segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais” e “Lei de Licitações comentada segundo a jurisprudência do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo”