Precarização do Trabalho Docente no Ensino Privado no Brasil: A Falta de Dignidade no Trato do Profissional

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Autora: SANTOS, Rossane Cristina Ferraz dos. Mestre em Ciências Sociais Aplicadas/UEPG; Bacharel em Direito/Unifio; Licenciada em Letras/UEPG e História/Uninter; Professora no curso de Direito da Fajar. E-mail: [email protected]

Resumo: O trabalho é elemento indispensável na sociedade e na formação de qualquer estado, assim como a educação, sendo que o trabalho do docente transmite educação capaz de formar cidadãos mais críticos e politicamente ativos, ponto no qual repousa a importância da pesquisa. A problemática da pesquisa repousa na mercantilização do ensino no país nos dias de hoje, muito embora a exploração do ensino se trate de um direito assegurado na Constituição. Justifica-se o estudo pela necessidade de abordar a temática pouco discutida, bem como pela necessidade de romper com a ideia de subordinação da atuação do profissional da educação a preceitos empresariais, esquecendo-se que o trabalho deve ser elemento capaz de dignificar o sujeito e a educação oferecida com viés crítico forma o indivíduo para o exercício da cidadania. O objetivo da pesquisa é demonstrar a falta de dignidade no trabalho do docente do ensino privado no país, diante da precarização do mesmo, embora a garantia constitucional de oferta de educação de qualidade com autonomia do profissional. Diante da problemática, justificativa e objetivos propostos, discute-se inicialmente a amplitude da definição de dignidade e a repercussão desta na ideia de trabalho, em especial no exercido pelo docente, de forma que um trabalho de qualidade, não precarizado é um trabalho digno, e significa o oferecimento de educação de qualidade. Colaciona-se lição a respeito do que é educação e como Paulo Freire entende a chamada educação popular, mencionando a politização do aluno por meio do diálogo e autonomia na atividade docente. Na sequência a pesquisa traz a precarização do trabalho do docente em meio aos conceitos de dignidade, de evolução das relações de trabalho e da ideia de trabalho digno, conciliadas a educação de qualidade, participativa, inclusiva, fomentada por meio da análise crítica, sem olvidar na adequada remuneração do profissional. A pesquisa revela-se como quantitativa e qualitativa, de cunho exploratório e descritivo, desenvolvida com base em material bibliográfico e documental, submetidos ao método da análise de conteúdo, com a formação de categorias básicas, exteriorizadas através dos tópicos que constam no desenvolvimento do presente artigo.

Palavras-chave: Trabalho. Dignidade. Educação. Precarização.

 

Abstract: Work is an indispensable element in society and in the formation of any state, as well as education, and the work of the teacher transmits education capable of forming more critical and politically active citizens, a point on which the importance of research rests. The problem of research rests on the commercialization of education in the country today, even though the exploitation of education is a right guaranteed in the Constitution. The study is justified by the need to address the little discussed topic, as well as by the need to break with the idea of ​​subordination of the education professional’s performance to business precepts, forgetting that work must be an element capable of dignifying the subject and the offered education of critical bias forms the individual for the exercise of citizenship. The objective of the research is to demonstrate the lack of dignity in the work of the private education teacher in the country, faced with the precariousness of the same, although the constitutional guarantee of offering quality education with professional autonomy. In view of the problems, justification and proposed objectives, the scope of the definition of dignity and its repercussion in the idea of ​​work, especially in the work of the teacher, is discussed initially, so that a quality work, not precarious, is decent work, and it means offering quality education. There is a lesson about what education is and how Paulo Freire understands so-called popular education, mentioning the politicization of the student through dialogue and autonomy in teaching activity. Following the research brings the precariousness of the work of the teacher in the midst of the concepts of dignity, the evolution of work relations and the idea of ​​decent work, reconciled quality education, participatory, inclusive, fostered through critical analysis, without forgetting in the proper remuneration of the professional. The development took place through exploratory research, bibliographical material, submitted to the method of content analysis, with the formation of basic categories, externalized through the topics included in the development of this article.

Keywords: Work. Dignity. Education. Precariousness.

 

Sumário: Introdução; 1. A Dignidade da Pessoa Humana e o Trabalho; 2. Educação para Todos; 3. A Precarização do Trabalho Docente No Ensino Privado no Brasil; 4. Material e Métodos; Considerações Finais; Referências.

 

Introdução

A educação hoje no Brasil, infelizmente, aparece como um negócio, o qual necessita gerar lucros ao administrador do estabelecimento de ensino, ficando a margem a essência do papel da educação que é formar sujeitos críticos.

Noutra via, tem-se a dignidade atingida por meio de um trabalho digno, sendo a atividade laboral elemento indispensável na sociedade e na formação de qualquer estado, assim como a educação.

É em meio a ideia de trabalho digno e educação de qualidade que se traz a discussão o trabalho do docente, o qual consiste em transmitir educação capaz de formar cidadãos mais críticos e politicamente ativos, ponto no qual repousa a importância da pesquisa, com cuja problemática central paira na mercantilização do ensino no país nos dias de hoje, muito embora a exploração do ensino se trate de um direito assegurado na Constituição, que permite a criação de instituições privadas além de assegurar o livre exercício da atividade comercial, por meio da livre iniciativa.

A justificativa do estudo está na necessidade de abordar a temática pouco discutida, bem como pela necessidade de romper com a ideia de subordinação da atuação do profissional da educação a preceitos empresariais, nos quais são deixados de lado os escopos da atividade docente, como elemento capaz de dignificar o sujeito, com educação oferecida de forma crítica contribuindo para o que indivíduo possa exercer a cidadania no futuro.

A falta de dignidade no trabalho do docente do ensino privado no país, com a demonstração da precarização do mesmo, é o objetivo da pesquisa, em meio a garantia constitucional de oferta de educação de qualidade com autonomia do profissional.

No desenvolvimento, inicialmente discute-se a amplitude da definição de dignidade e a repercussão desta na ideia de trabalho, de forma que um trabalho de qualidade, não precarizado é um trabalho digno, e significa o oferecimento de educação de qualidade.

Adiante conceitua-se educação conforme disposição constitucional e também de acordo o entendimento do educador Paulo Freire, trazendo à tona o que o estudioso endente por educação popular, mencionando a politização do aluno por meio do diálogo e autonomia na atividade docente.

No último tópico do desenvolvimento, o leitor vai se deparar com a análise específica da precarização do trabalho do docente em meio aos conceitos de dignidade, evolução das relações de trabalho e a ideia de trabalho digno, conciliadas com educação de qualidade, participativa, inclusiva, fomentada por meio da análise crítica, sem olvidar a adequada remuneração do profissional, como forma de precarização da atividade.

O estudo apresenta-se como quantitativo e qualitativo, sendo que para o desenvolvimento do artigo foi realizada pesquisa de cunho exploratório e descritivo, com base em material bibliográfico e documental, submetido ao método da análise de conteúdo, com a formação de categorias básicas, exteriorizadas através dos tópicos que constam no desenvolvimento do presente texto científico.

Almeja-se que o artigo seja capaz de aguçar o leitor a buscar maiores informações a respeito do tema.

 

1 A Dignidade da Pessoa Humana e o Trabalho

A atividade laboral remunerada sofreu constantes evoluções, deixou o trabalho de ser sinônimo de pobreza para refletir elementos indispensáveis para concretização daquilo que se entende por dignidade.

Hoje qualquer indivíduo precisa do trabalho para sentir-se útil, para sentir-se inserido socialmente e por óbvio, também profissionalmente, logo, este labor é capaz de lhe permitir alcançar a dignidade, na medida que em esta repousa, entre outros aspectos, em uma vida salutar.

A respeito da dignidade é oportuno colacionar a lição de Sarlet:

 

No pensamento estóico, a dignidade era tida como a qualidade que, por ser inerente ao ser humano, o distinguia das demais criaturas, no sentido de que todos os seres humanos, são dotados da mesma dignidade, noção esta que se encontrava intimamente ligada à noção de liberdade pessoal de cada indivíduo (o Homem como ser livre e responsável por seus atos e seu destino), bem como à ideia de que todos os seres humanos, no que diz com a sua natureza, são iguais em dignidade. (2001, p. 30/31).

 

A liberdade de cada ser, portanto, está atrelada a ideia de dignidade, sendo que sua definição não é criação do pensamento moderno, inclusive na Bíblia é possível encontrar já no antigo testamento menção a dignidade, muito embora o cristianismo tenha admitido por longos anos a escravidão, em contradição aos preceitos que pregavam como norteadores da vida.

É evidente que a liberdade e a dignidade naquele momento não estavam no plano concreto. Neste sentido:

 

Essa igualdade universal dos filhos de Deus só valia, efetivamente, no plano sobrenatural, pois o cristianismo continuou admitindo, durante muitos séculos a legitimidade da escravidão, a inferioridade natural da mulher em relação ao homem, bem como a dos povos americanos africanos e asiáticos colonizados, em relação aos colonizadores europeus. (COMPARATO, 2001, p. 17).

 

Denota-se a tamanha importância da dignidade, tanto que se encontra insculpida em preceitos bíblicos, os quais os homens entenderam por bem não cumprir por milhares de anos.

Trazendo a questão para um cerne mais atual, tem-se que a Organização das Nações Unidas, por meio de Assembleia Geral no dia 10 de dezembro de 1948, proclamou a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, contemplando a dignidade já no seu preâmbulo.

Assim consta do texto extraído do preâmbulo da Declaração em comento:

 

Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo, (….) Considerando que os povos das Nações Unidas reafirmaram, na Carta da ONU, sua fé nos direitos humanos fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano e na igualdade de direitos entre homens e mulheres, e que decidiram promover o progresso social e melhores condições de vida em uma liberdade mais ampla, (…) A ASSEMBLÉIA GERAL proclama a presente DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIRETOS HUMANOS como o ideal comum a ser atingido por todos os povos e todas as nações, com o objetivo de que cada indivíduo e cada órgão da sociedade, tendo sempre em mente esta Declaração, se esforce, através do ensino e da educação, por promover o respeito a esses direitos e liberdades, e, pela adoção de medidas progressivas de caráter nacional e internacional, por assegurar o seu reconhecimento e a sua observância universal e efetiva, tanto entre os povos dos próprios Estados-Membros, quanto entre os povos dos territórios sob sua jurisdição. (ONU, 1948, p. 01/02). Grifo meu

 

O fato da dignidade estar prevista no preâmbulo da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão revela a magnitude da mesma, pois a sua localização no texto, significa que ela é um mecanismo para ser utilizado como norte interpretativo, balizador de todo o sistema, regendo a vida de todos, portanto, a conduta de cada cidadão, de cada agente estatal, que deve em suas ações zelar para que a dignidade seja atingida e alcançada.

A Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, não se limita a trazer a dignidade apenas no seu preâmbulo. O princípio, encontra-se previsto de forma expressa ao longo do texto em outros artigos.

O artigo 1.º traz a seguinte previsão: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”. (ONU, 1948, p. 02). Deixa claro que todos, sem quaisquer distinções, são iguais, de forma que é vedada qualquer distinção, não sendo permitidas políticas de cunho discriminatório.

Na sequência tem-se o artigo 22 o qual estabelece que: “Todo ser humano, como membro da sociedade, tem direito à segurança social e à realização, pelo esforço nacional, pela cooperação internacional e de acordo com a organização e recursos de cada Estado, dos direitos econômicos, sociais e culturais indispensáveis à sua dignidade e ao livre desenvolvimento da sua personalidade”. (ONU, 1948, p. 05).

Pela leitura do artigo 22, constata-se que a dignidade guarda relação com a ideia de bem social, dentro do qual tem-se a educação, a cultura, o esporte, o lazer, segurança e o trabalho, de maneira que estes são indispensáveis para o desenvolvimento salutar da personalidade do agente e de sua dignidade.

A Constituição Federal de 1988, seguiu a lição, e trouxe em seu texto de modo expresso a dignidade, estando prevista na parte inicial, como fundamento da República:

 

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político.(BRASIL, 1988).

 

A dignidade na forma como disposta pelo constituinte no artigo 1.º, revela que o estado deve erguer-se sob os seus valores, sendo indispensável para o Estado Democrático de Direito, ou seja, para o Estado que se pauta pela liberdade de expressão e manifestação, pela possibilidade de escolha e manifestação entre seu povo.

Dificuldade emerge na conceituação da dignidade, pois esta é inerente a qualquer pessoa, mas não guarda conceito fechado, ou seja, possui conceito aberto, cuja interpretação é ampla, sendo que a dignidade pode ser atrelada ao que de mais íntimo existe dentro de cada indivíduo, pois não possui valor algum que seja capaz de indenizar a ofensa ao que existe no interior de cada um.

Neste sentido é a lição de Kant, ao afirmar:

 

No reino dos fins tudo tem um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode-se pôr em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e portanto não permite equivalente, então tem ela dignidade (…) O que se relaciona com as inclinações e necessidades reais do homem tem um preço venal; aquilo que, mesmo sem pressupor uma necessidade, é conforme a um certo gosto, isto é, a uma satisfação no jogo livre e sem finalidade das nossas faculdades anímicas, tem um preço de afeição ou de sentimento (Affektionspreis); aquilo porém que constitui a condição só graças à qual qualquer coisa pode ser um fim em si mesma, não tem somente um valor relativo, isto é, um preço, mas um valor íntimo, isto é, dignidade. (2003, p. 77/78).

 

A abertura na definição permite que as mais diversas situações sejam abrangidas pelo princípio, de maneira que protege o indivíduo de situações vexatórias, humilhantes ou degradantes.

Neste sentido é a lição de Maihoferm[1] citado por Tavares (2008, p. 542):

 

A dignidade humana consiste não apenas na garantia negativa de que a pessoa não será alvo de ofensas ou humilhações, mas também agrega a afirmação positiva do pleno desenvolvimento da personalidade de cada indivíduo. O pleno desenvolvimento da personalidade pressupõe, por sua vez, de um lado, o reconhecimento da total autodisponibilidade, sem interferências ou impedimentos externos, das possíveis atuações próprias de cada homem; de outro, a autodeterminação (Selbstbestimmung des Menschen) que surge da livre projeção histórica da razão humana, antes que de uma predeterminação dada pela natureza.

 

Quando se pensa na dignidade como a garantia de não ser alvo de humilhações e situações vexatórias, traz-se a questão para a temática das relações de trabalho, as quais inclusive tem previsão no mesmo artigo 1.º da Constituição Federal, ou seja, o trabalho, mais especificamente, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, são fundamentos da República Federativa do Brasil, assim como a dignidade. (BRASIL, 1988).

O trabalho também tem proteção assegurada na Declaração Universal dos Direitos do Homem e o Cidadão, da mesma forma que a dignidade. Inclusive há dispositivo que trata da dignidade e do trabalho em conjunto.

Observe-se:

 

Artigo 23

  1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego. 2. Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por igual trabalho. 3. Todo ser humano que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social. 4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses. (ONU, 1948, p. 05). Grifo meu

 

A Carta da ONU traz que todo ser humano tem direito ao trabalho livre, justo, com remuneração adequada sem qualquer distinção, em condições iguais para homens e mulheres, permitindo uma vida digna a si e a sua família.

A temática trabalhista nem sempre foi vista dessa forma, a previsão da proteção ao trabalho no mundo se deu em virtude da força do capitalismo e da necessidade de aumentar a força produtiva para fomentar o mercado, todavia, não havia como manter-se as relações de trabalho sem qualquer regramento mínimo, surgindo normas, ainda que singelas para proteção do trabalhador.

Vários movimentos fomentaram mudanças na realidade vivenciada pelos trabalhadores que deixaram de viver em condições desumanas para gozar de um mínimo de proteção na atividade laboral.

A Revolução Francesa foi de grande importância no âmbito do trabalho, sendo que os movimentos da época foram capazes de revolucionar a realidade, assim como é possível observar da Revolução Industrial.

A Revolução Francesa, significou a base ideológica para o direito do trabalho, com seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, movida pelo liberalismo, trouxe a visão de autonomia ao sujeito, tanto empregador, como empregado. Dentro da qual, se tem a liberdade de contratar o trabalho que uma pessoa pode exercer em favor de outra, através do pagamento de uma contraprestação, mediante subordinação, mas com um contrato, vinculando-as. (PAULO; ALEXANDRINO, 2010).

A Revolução Industrial, por sua vez, com desemprego crescente, jornadas de trabalho desumanas, sem qualquer regulamentação digna, com diferenças salarias para homens, mulheres e crianças, fomentou as sindicalizações e greves sendo a base econômica para a estruturação das relações de trabalho na forma como visto nos anos que sucederam. (NEVES, 2015).

Estas Revoluções foram de extrema importância, pois fomentaram a nova visão do trabalho, atrelando-a a ideia de dignidade, pois o trabalho deve enaltecer o sujeito, valorizar a sua imagem, com condições para o exercício da sua atividade de forma satisfatória, com autonomia, com condições para que possa efetivamente desempenhar as funções para as quais é contratado, galgando melhores resultados,  os quais por sua vez, repercutem naquilo que se entende por dignidade diante do conceito aberto já exposto.

Ainda, vale destacar que a criação da Organização Internacional do Trabalho, a OIT, em 1919, foi de extrema importância para que o trabalho ganhasse essa nova visão de dignidade, pois inspirou a proteção mundial as relações de trabalho que advieram no futuro, sendo certo que menção ao trabalho na Declaração Universal dos Direitos Humanos, em 1948, contou com apoio da Organização do Trabalho.

A respeito da Organização Internacional do Trabalho tem-se que:

 

A OIT funda-se no princípio da paz universal e permanente como instrumento de concretização e universalização dos ideais da justiça social e proteção do trabalhador no mundo internacional do trabalho. Como a Organização das Nações Unidas apenas surgiu no ano de 1945, à luz dos efeitos da Segunda Guerra Mundial (1945), para que não houvesse dois organismos internacionais com as mesmas funções e atribuições, declarou-se a OIT integrante da ONU. Por isso, a OIT é considerada como um organismo internacional associado às Nações Unidas, ou melhor, a uma das agências especializadas da Organização das Nações Unidas. (ALVARENGA, 2017, p. 01).

 

Hodiernamente, um ser humano para considerar-se efetivamente inserido na sociedade perante seus pares precisa desempenhar uma atividade laboral, mas não basta que seja qualquer atividade, deve ser aquela que lhe traga prazer e felicidade, propiciando meios para sua subsistência, mas também permitindo que utilize todo o seu conhecimento e sua força, quer seja física, quer seja intelectual, a depender do ramo escolhido pelo indivíduo. Quando se obtém êxito, o trabalho é mecanismo para alcançar a dignidade para aquela pessoa, muito embora, qualquer trabalho, dignifique o sujeito, na medida em que lhe permite a obtenção de renda de forma honesta para manutenção da sua subsistência e de sua família.

 

2 Educação para Todos

Não se constrói um país sem educação para todos, mas esta deve ser de qualidade. O simples assegurar formalmente o acesso à educação em nada repercute na vida da população, pois este deve se dar de forma efetiva.

Morin (2009) trata da função atribuída a educação esclarecendo que consiste em fortalecer as condições de possibilidade da emergência de uma sociedade-mundo integrada por indivíduos protagonistas, conscientes e comprometidos de forma crítica com a formação de uma civilização mundial.

A importância da educação como base para a formação de um país é evidente pois o próprio Constituinte trouxe-a como um direito social:

 

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (BRASIL, 1988).

 

Além da Constituição deixar claro que se trata de um direito, tem-se toda uma disciplina a respeito de como o ensino deve se dar no país, dispondo sobre a obrigatoriedade do governo fornecer ensino fundamental gratuito e de qualidade, inclusive para os que não tiveram acesso à educação na época certa, pois a educação tem como objetivo preparar o indivíduo para o exercício pleno da cidadania, além de qualificá-lo para o trabalho, o que também pode ser extraído do artigo 205 da Constituição Federal[2].

A respeito da educação enquanto direito, é interessante colacionar a lição de Ramos:

 

Perante a Constituição brasileira fica certo que o direito à educação é juridicamente falando, um direito classificado como social (art. 6.º), e, nesse, sentido, é direito de todos, e dever do Estado e da família (art. 205). A educação, pois, obedece ao princípio da gratuidade, quando oferecida em estabelecimentos oficiais (inc. IV, do art. 206 da C.F.). A educação gratuita, contudo, só é considerada dever do Estado em relação ao ensino fundamental e obrigatório, inclusive para aqueles que não tiveram acesso a ela na época própria (inc. I do art. 208). Quanto ao ensino médio gratuito, a Constituição apenas exige sua “progressiva universalização” (inc. II do art. 208), e, para o que denomina “níveis mais elevados do ensino, de pesquisa e da criação”, a Constituição declara que o acesso dar-se-á consoante a capacidade, os méritos próprios de cada um (inc. V do art. 208 da C.F.). O direito à educação visa ao “pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (art. 205 da C.F.). (2008, p. 808).

 

Da forma como visto a educação deve a todos ser assegurada, mas a questão que emerge é o que de fato vem a ser educação. Seria o simples acesso ao conhecimento? O transmitir conhecimento? O alfabetizar-se? A profissionalização? A obtenção de uma profissão? O bom trato e zelo com o próximo?

A educação é na realidade uma junção de todos estes fatores, pois não é possível falar em educação como o simples ato de alfabetizar, pois a educação são as normas civis, morais de convivência social, a cargo da família e da sociedade como um todo, mas que são invariavelmente transferidas para os chamados profissionais da educação (professores, pedagogos, psicopedagogos, entre outros profissionais que atuam na área), bem como a possibilidade de se obter qualificação profissional e com isso exercer um trabalho capaz de prover o seu sustento e da sua família.

Sobre o exposto é interessante a lição versando a respeito de educação popular:

 

Neste sentido, que há três concepções mais comuns de educação popular. A 1ª concepção está ligada à educação direcionada à alfabetização de jovens e adultos no espaço escolar; a 2ª concepção reserva à educação popular o caráter transformador, acontecendo fora do espaço escolar; e a 3ª concepção e mais recente, compreende-a como uma educação política da classe trabalhadora, numa perspectiva tanto de emancipação como de conformação do status quo, sendo a escola e a sociedade espaços legítimos de educação popular. (MACIEL, 2011, p. 05).

 

A ideia de educação popular com três vertentes: alfabetização no espaço escolar; caráter transformador fora do espaço escolar e, educação política em perspectiva de emancipação e de conformação; revela a importância do professor, pois este fomentará a mudança em meio aos alunos, quer seja os pequeninos que estão sendo alfabetizados, ou mesmo os adultos, também em fase de alfabetização, ou àqueles que já está em processo de profissionalização, sendo importante que o profissional tenha autonomia no ensino e o exerça de forma crítica, formando cidadãos críticos politicamente.

Interessante é a análise do pensamento de Freire, feita por Maciel:

 

Segundo o educador, sair da condição de oprimido não é simplesmente deslocar-se para a função de opressor, mas propor uma nova relação social em que haja igualdade entre homens e mulheres projetando um bem comum. Partindo dessa premissa, Paulo Freire almeja por uma Pedagogia Libertadora, produtora do diálogo permanente, fruto do processo que é por natureza dialética. Propõe uma Pedagogia dialógica na qual parte da problematização da realidade dos educandos para a finalidade de intervenção no mundo. A Educação Popular, dessa forma, é pautada na dialogicidade. A partir das contradições da realidade capitalista vivida por homens e mulheres, o conhecimento é construído e reconstruído à medida do desvelamento do vir a ser na construção do saber realizado no processo de conscientização e na condição de seres históricos e inacabados. A Educação Popular, na ótica de Freire, se faz popular pelo potencial de organização da classe trabalhadora, possui em sua essência a contestação do sistema político e da ordem econômica vigente. Sua teoria é incorporada por grupos de educadores, militantes e trabalhadores dos movimentos populares para embasar suas práticas educativas. Faz-se também transformadora pelo teor político no trabalho educativo. (2011, p. 3).

 

Pelo proposto por Paulo Freire a educação deve pautar-se no diálogo, onde ambas as partes se respeitam e há autonomia para o profissional externar suas opiniões e o seu método de ensino, da mesma forma em que o aluno tem liberdade para expressar-se criticamente frente ao professor, motivando suas opiniões e atos, nunca agindo de forma a simplesmente menosprezar a função do docente.

O profissional livre para atuar, com autonomia para gerir a sua classe consegue ensinar e transmitir conhecimento de forma mais satisfatória e eficaz, sendo que os alunos por sua vez, obtém melhores resultados.

Todavia, não se pode afastar a ideia de que a educação hodiernamente tornou-se um negócio, com crescente número de instituições de ensino privadas espalhadas por todo o país, tanto de educação básica, como profissionalizante e superior.

Muitas vezes a educação não é aquela que o constituinte estabeleceu no texto da Constituição Federal e muito menos aquela que o patrono da educação brasileira Paulo Freire idealizou, pois há um negócio que precisa ser movimentado e gerar lucro aos seus proprietários, deixando a educação o seu caráter de formar o cidadão para o exercício da cidadania, para simplesmente tornar-se uma empresa, precarizando a atividade do profissional.

 

3 A Precarização do Trabalho Docente No Ensino Privado no Brasil

O docente é o profissional de maior destaque dentro da educação é ele quem tem a função de transmitir o conhecimento, de ensinar o aluno a tornar-se um cidadão, de auxiliá-lo na obtenção de qualificação profissional, ou seja, influenciar na formação do sujeito para a vida.

Sobre o profissional da educação destaca-se a lição:

 

O professor é o profissional do magistério encarregado de transmitir, pessoalmente, conhecimentos e educar o aluno. Estas são tarefas complexas e cada dia mais cobradas dos professores. Para ensinar, não basta o conhecimento técnico-científico da matéria; é preciso, muito, saber mais: repassar conhecimento, ter domínio de sala, tratar o aluno com respeito e, ao mesmo tempo, com autoridade, saber elaborar as avaliações e avaliar os alunos, prepará-los para a vida, ajudá-los a amadurecer de acordo com as etapas de sua existência. (MARQUES, 2009, p. 24/25).

 

É neste mesmo contexto que se afirma ter o professor uma função ideológica, própria dos intelectuais, pois fomenta além da discussão e da busca pelo conhecimento, enquanto ciência, a criação de valores e a internalização de princípios.

Neste sentido é a lição de Lowy, citado por Menezes:

 

Os intelectuais não são uma classe, mas uma categoria social; não se definem por seu lugar no processo de produção, mas por sua relação com as instâncias extraeconômicas da estrutura social; do mesmo modo que os burocratas e os militares se definem por sua relação com o político, os intelectuais situam-se por sua relação com a superestrutura ideológica. (2001, p. 29).

 

A educação tanto pública como privada tem suas deficiências no país, o que é natural dada as limitações que existem em questões orçamentárias, em ambas as situações.

Quando se fala em educação pública há uma maior autonomia do profissional, pois esta é garantida pela Constituição Federal[3], muito embora o texto não seja taxativo em dizer que a autonomia direciona-se apenas as instituições públicas, como os estabelecimentos privados são verdadeiras empresas, a autuação do docente é limitada a vontade e aos interesses do proprietário do empreendimento.

Neste contexto a precarização emerge, pois a educação tornou-se um negócio, quando se analisa o setor privado.

Enquanto que no âmbito púbico a atuação do docente é precarizada diante do sucateamento do aparato estatal, da falta de estrutura dos estabelecimentos de ensino, da limitação de recursos para desenvolvimento de projetos pedagógicos juntos aos alunos, em quaisquer dos níveis de educação, sem contar na indisciplina de muitos alunos, que trazem problemas como falta de estrutura familiar e transtornos psicológicos ou mesmos psiquiátricos que invariavelmente afetam física e emocionalmente o profissional que está em sala de aula, na educação particular, a mercantilização do ensino fez surgir outra forma de precarização do trabalho docente.

O ensino privado tem autorização constitucional para funcionar como já colacionado, significando, um ensino de maior qualidade aos olhos da comunidade, por contar com estrutura mais adequada e adaptada a realidade do aluno. Neste ponto, não há que se discordar.

Todavia, o medo por perder alunos faz com a atuação dos docentes seja limitada, deixando o trabalho de lhes gerar prazer, para trazer-lhes tristeza e ressentimento, pelo não exercício das atividades com autonomia e liberdade de expressão, sujeitando-se os profissionais a estas realidades, sem dignidade no trabalho, pela necessidade de prover o sustento próprio e de sua família.

A educação como visto deve contribuir para a formação da cidadania, para a formação política e crítica do cidadão, enquanto o trabalho deve ser elemento dignificante do trabalhador, ou seja, deve ser aquele com condições justas, adequadas, com liberdade de manifestação e salário digno.

De acordo com Tiradentes, pesquisadora da FIOCRUZ, citada por Carvalho Júnior e Alves:

 

A perda do papel da Educação Superior na produção e difusão da ciência em suas mais elevadas manifestações, produz a perda do sentido do trabalho e da existência do trabalhador da educação, compromete a qualidade da formação humana e danos aos trabalhadores envolvidos, como agravos à saúde física, psíquica e emocional, instabilidade, ruptura dos laços sócioafetivos, perda das condições de subsistência e/ou de tempo livre. (2017, p. 05).

 

Tem-se que a afirmação da pesquisadora não se limita apenas as instituições de ensino privadas, mas a toda a educação. Assim, como a atuação de um docente, notadamente, no ensino privado, pode ser digna se está limitada aos interesses mercantilistas da instituição? Isso sem questionar-se os baixos salários pagos, mesmo a professores com mestrado ou doutorado.

A média da hora aula de um professor do ensino médio privado é de R$ 24,00 (vinte e quatro reais) em cidades do interior do Paraná, sendo aproximadamente R$ 18,00 (dezoito reais) para ensino fundamental[4], enquanto que no ensino superior o valor da hora aula para um professor especialista é de R$ 32,00 (trinta e dois reais), incluindo hora atividade, descanso semanal remunerado e adicional noturno, tendo em vista que as faculdades funcionam apenas no período noturno no interior[5].

Logo, um professor universitário que lecione todas as noites, em regime de dedicação exclusiva, vai auferir R$ 2.560,00 (dois mil, quinhentos e sessenta reais), e se possuir mestrado R$ 2.800,00, e com doutorado R$ 3.200,00[6], enquanto que com as mesmas qualificações em instituições de ensino superior públicas o profissional galgaria auferir renda superior em três vezes[7], mas infelizmente não há vagas no setor público de ensino superior para todos, tanto para aqueles que desejam estudar como para aqueles que lá desejam laborar.

A precarização do trabalho do professor é muitas vezes associada exclusivamente a limitações financeiras das instituições, com o que se concorda que há repercussão na precarização, mas esta não se resume a tal, inobstante o professor comumente leve trabalho extra para casa sem receber qualquer remuneração para tal, sem contar que aquela remuneração percebida dos estabelecimentos privados, como demonstrado, dificilmente é suficiente para manter o profissional, sua família e eventuais cursos de aperfeiçoamento que almeja e deve fazer.

Marques (2009) trata do trabalho extra realizado pelo professor sem remuneração. O autor afirma que o profissional é um trabalhador intelectual, de maneira que sua atividade, pela natureza, exige que realize tarefas fora da sala de aula, em casa, no descanso do seu lar, como elaboração de aulas, preparação de atividades, provas, ou seja, sua atividade não se exaure no ambiente físico da Instituição de Ensino. A pequena aula, que em poucos minutos se acaba, não demonstra o tempo despendido pelo profissional com preparação, estudo, pesquisa, meditação, leitura, sem o que nada recebe, pois as chamadas horas-atividade, são insuficientes sequer para justificar o tempo de elaboração e correção de provas.

Inobstante o expresso, hoje a precarização vai além de questões econômicas, que afetam a dignidade do trabalho, pois impõe ao docente o exercício de jornadas duplas ou triplas de trabalho para manter a sua subsistência e de sua família, trabalhando por 12 (doze) ou 16 (dezesseis) horas diárias[8], com intervalo de uma hora para almoço, em condições desumanas, impactando no sentimento de alegria, felicidade, satisfação e prazer no trabalho, com risco de desenvolver transtornos de ansiedade, depressão, somatização ou mesmo síndrome de bournout[9].

O que se agrava diante da limitação imposta ao exercício livre da docência, pois o profissional não pode passar conteúdo de forma livre conforme as diretrizes e bases curriculares, deve seguir as normas do mercado capitalista que regem as empresas, como não cobrar conteúdos muitos extensos em provas, permitir avaliações mais simples, não considerar ausências em sala para fins de frequência e reprovação, não passar conteúdo até o final do horário, isto significa permitir que os alunos saiam alguns minutos antes do término das aulas, quando se trata de ensino superior.

Sobre a discussão proposta:

 

Os ritmos, os tempos, as condições de trabalho e as exigências paralelas, impostas aos trabalhadores, em meio às suas atividades principais, agravam a intensidade do trabalho. São processos que produzem desgaste físico e/ou mental e impacto das mais diferentes ordens sobre a saúde dos trabalhadores docentes. (MEDEIROS, apud Carvalho Júnior e Alves, 2017, p. 07/08).

 

Qualquer bom profissional se vê atingido naquilo que tem de mais valor dentro de si, ao ser forçado a agir desta forma, tendo a sua dignidade no trabalho violada e a educação de qualidade comprometida aos alunos que muitas vezes sequer compreendem tudo o que está se passando, sendo que em diversas situações a questão não ultrapassa o âmbito acadêmico.

Em meio ao grupo discente superior a situação se agrava muitas vezes, pois diversos deles frequentam o estabelecimento de ensino privado não com a intenção de obter de fato conhecimento e qualificação profissional de qualidade, mas sim em obter aquilo que lhes permita o exercício de determinada profissão, ainda que não habilitados de fato para tal, apenas formalmente, quer seja pela ação da instituição de ensino, dos mantenedores, ou mesmo do próprio corpo discente e docente.

Em instituições privadas de ensino, o professor é visto como um funcionário, não apenas da instituição, mas dos alunos como um todo, sendo vítima de toda sorte de humilhações e vexações, mormente em estabelecimentos altamente elitizados, nos quais o profissional ingressante sofre verdadeiro bulling do grupo discente, face a suposta relação de hierarquia e subordinação, que imaginam existir. Neste ponto, assevera-se que essa postura não é realidade dos cursos superiores, pois mesmo na educação básica após os 10/12 (dez/doze) anos é comum observar atitudes como a presente, sem que o professor nada possa fazer, pois qualquer atitude significa perda potencial de lucros pela empreendedora.

A violação a autonomia do professor que não pode lecionar conforme suas convicções, inobstante a liberdade de expressão para ensinar prevista na Constituição Federal, aliada ao bulling, são formas perversas de afastar a dignidade do trabalho e culminar em situações extremas no desenvolvimento de doenças emocionais graves.

Este mal deve ser afastado da educação, o trabalho do professor deve ser novamente valorizado, permitindo-se ao mesmo autonomia para ensinar, acabando com o mercado das instituições de ensino privadas, o que não significa em estatizar toda a educação, mas talvez em fixar um valor base geral de mensalidade, cessando a concorrência ao menos sob o aspecto econômico, a criação por meio de lei da garantia de estabilidade ao docente de instituições privadas, também seria capaz de assegurar a autonomia na forma de ensinar, melhorando os resultados do país.

São ações simples, mas que se acredita seriam capazes de diminuir a precarização do trabalho do docente no ensino privado no país e com isso assegurar um trabalho de fato digno e uma educação de qualidade aos brasileiros.

 

4 Material e Métodos

O artigo apresenta pesquisa exploratória e descritiva, desenvolvida de modo quantitativo e qualitativo, pois além de utilizar-se de dados concretos, também se vale de informações obtidas junto ao sujeito, ou seja, dos professores de instituições privadas de ensino nas cidades de Wenceslau Braz, Ibaiti, Arapoti e Jaguariaíva, todas no interior do Estado do Paraná.

A pesquisa qualitativa, conforme lecionam Minayo, Deslandes, Cruz Neto e Gomes (2002), se revela por um universo de significados, motivos, aspirações, valores e atitudes, entendidos como um fenômeno social. O ser humano, o sujeito, é o centro da pesquisa. Logo, como foram buscados dados junto aos sujeitos, é certo que a pesquisa apresenta características de qualitativa.

Destarte, também é quantitativa, pois se vale de dados concretos, obtidos por meio de pesquisa bibliográfica e documental. Neste aspecto, tem-se que a pesquisa quantitativa é objetiva, valendo-se de instrumentos padronizados, considerando que o mundo se opera com base em leis causais, consistindo a realidade em estruturas e instituições identificáveis na forma de dados brutos por um lado e crenças e valores por outro. (MINAYO, DESLANDES, CRUZ NETO e GOMES, 2002).

Nada impede que uma pesquisa contemple conjuntamente o método qualitativo e quantitativo de acordo com Minayo, Deslandes, Cruz Neto e Gomes (2002), pois haverá uma completação entre ambas contribuindo para o desenvolvimento do estudo científico, com observação dos sujeitos conciliadas aos dados concretos.

Considerando que os dados obtidos por meio da pesquisa bibliográfica e documental possuem importância vital, assim como as informações coletadas junto aos sujeitos, é possível dizer que a presente pesquisa de cunho exploratório e descritivo, é qualitativa e quantitativa.

Como universo da pesquisa tem-se as cidades de Wenceslau Braz, Ibaiti, Arapoti e Jaguariaíva, todas no interior do Estado do Paraná, onde há instituições de ensino superior privadas, assim como escolas de nível fundamental e médio privadas e públicas, permitindo a coleta de dados relacionados a remuneração dos profissionais da educação.

Assim, na investigação realizada, foi enfatizada a pesquisa bibliográfica e documental, sem prejuízo da análise do sujeito, por meio das informações prestadas pelos mesmos.

Para o pleno desenvolvimento deste estudo, considerando a realização de pesquisa documental e bibliográfica foram realizadas consultas em livros, jornais, revistas, bem como dissertações e teses, Edgar Morin (2009), István Mészáros (2005), Ana Maria Dorta de Menezes (2001), Maria Anita Martins (1987), Paulo Vicente a Marcelo Alexandrino (2010), Ingo Wolfgang Sarlet (2001) e André Tavares Ramos (2008), os quais possuem estudos de relevância científica sobre o tema, objeto da pesquisa, que foram utilizados no texto.

A verificação do material coletado foi realizada por meio da análise de conteúdo, a qual tem como foco principal a mensagem transmitida, de modo que esta pode ser chamada de ponto de partida para todo o processo que envolve o estudo do conteúdo propriamente.

Logo, é preciso aferir os elementos que envolvem o próprio processo de transmissão de informações ou como prefere Franco (2008), o processo de comunicação, para que seja possível a produção de uma pesquisa científica de qualidade.

Quando se estuda a obra de Bardin (1977), constata-se que a análise de conteúdo deve ser compreendida como um conjunto de técnicas que permitem a análise de comunicações, com a intenção de inferir através de indicadores quantitativos, ou não, conhecimentos ligados às condições de produção e recepção de mensagens.

Registre-se que a análise de conteúdo não se limita a diagnosticar o significado isolado e as características das palavras, mas a questionar o real alcance da mensagem.

Portanto, busca verificar as causas e efeitos do texto dentro da mensagem que é transmitida, com o que possibilita maior aprofundamento da pesquisa realizada pelo intérprete, ou seja, a análise de conteúdo é adequada ao estudo proposto.

Diante dessa metodologia e buscando atingir os objetivos propostos, o presente artigo está composto por três seções. Na primeira seção tem-se a análise da dignidade da pessoa humana enquanto viga mestre do ordenamento jurídico brasileiro e a relação de trabalho, com análise de documentos legais internacionais a respeito do tema. Na segunda seção a pesquisadora tratou da educação enquanto um direito assegurado a todos, com liberdade de atuação do profissional. A última seção tratou da precarização da atividade docente no ensino privado do Brasil, com informações a respeito da remuneração dos profissionais nas instituições privadas das cidades de Wenceslau Braz, Ibaiti, Arapoti e Jaguariaíva.

Ao final, após a análise dos dados, apresentando os resultados da pesquisa, tem-se as considerações finais da pesquisadora a respeito do objeto de estudo.

 

Considerações Finais

A educação e o trabalho são indissociáveis dentro da sociedade, demonstrando-se a importância do texto, pois o trabalho do docente transmite educação capaz de formar cidadãos mais críticos e politicamente ativos. Assim, a pesquisa discute inicialmente a amplitude da definição de dignidade e a repercussão desta na ideia de trabalho, de forma que um trabalho de qualidade, não precarizado é um trabalho digno, e significa o oferecimento de educação de qualidade.

Para compreender o que é educação foi necessário trazer lição de Paulo Freire, para apenas na sequência abordar a precarização do trabalho do docente em meio aos conceitos de dignidade, a evolução das relações de trabalho e a ideia de trabalho digno, conciliadas a educação de qualidade, participativa, inclusiva, fomentada por meio da análise crítica, sem olvidar na adequada remuneração do profissional.

Pelas leituras realizadas tem-se que a dignidade possui um conceito aberto, relacionando-se àquilo que o sujeito possui de mais íntimo e não há valor capaz de indenizá-la, pois relaciona-se a questões pessoais do sujeito, como aquilo que sente e espera, razão pela qual as condições do trabalho afetam o que se entendem por dignidade, tanto podem proporcionar dignidade ao sujeito, como podem afastar a ideia de dignidade da vida do sujeito.

Quando o professor trabalha em um ambiente adequado, salutar, com possibilidade para desenvolver-se de forma livre, expressar sua opinião livremente, sem preocupar-se com eventual cobrança ou retaliação do estabelecimento de ensino, ele trabalha de forma mais satisfatória, e por conta disso sua atividade é mais exitosa, aproximando-se de um trabalho digno, que dignifica o cidadão.

Ocorre que hoje, no Brasil, assiste-se a mercantilização da educação, não apenas superior, mas em todos os níveis, esquecendo-se os empresários do ramo, dos preceitos basilares que regem o Estado Democrático de Direito, como a ideia de que a educação é instrumento para formar cidadãos para o exercício da cidadania, bem como se esquecem que o docente é um intelectual, e precisa de liberdade para criar e desenvolver-se criticamente no meio acadêmico, de maneira que limitações laborais geram invariavelmente doenças psíquicas que afetam não apenas o emocional do profissional, mas também o físico, revelando verdadeira precarização da atividade, unicamente pela necessidade de buscar maior lucro.

A vida do profissional é colocada em risco para que a instituição de ensino obtenha maiores lucros, sendo que sequer estes rendimentos são repassados para os profissionais, pois conforme exposto no texto, a remuneração dos docentes no setor privado é inferior ao setor público que não tem como acolher todos os profissionais, da mesma forma que não tem como acolher todos os discentes que procuram o sistema público de ensino.

Para o êxito do estudo a pesquisadora efetuou pesquisa de quantitativa e qualitativa, de cunho exploratório e descritivo, utilizando-se de materiais bibliográficos e documentais, submetidos ao método da análise de conteúdo, com a formação de categorias básicas, exteriorizadas através dos tópicos que constam no desenvolvimento do presente artigo, o qual espera seja capaz de aguçar o leitor a buscar maiores informações a respeito do tema.

 

Referências

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TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 6.ª ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.

 

[1]  Derechos Humanos, Estado de Derecho y Constitución, p. 318.

[2]Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988).

[3]                             Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. (…)

  • 2º O disposto neste artigo aplica-se às instituições de pesquisa científica e tecnológica. (BRASIL, 1988).

[4] Informações obtidas pela autora em junho de 2019, junto a colegas que lecionam em escolas privadas em Wenceslau Braz, Arapoti, Jaguariaíva e Ibaiti.

[5] Fonte pessoal da autora que leciona em duas instituições de ensino superior privado no interior do Estado do Paraná, especificamente nas cidades de Jaguariaíva e Ibaiti

[6] Dados obtidos pela autora em instituições de ensino superior privado no interior do Estado do Paraná, notadamente em Jaguariaíva e Ibaiti.

[7] Conforme extrai-se dos Editais de concurso ou teste seletivo para contratação de professores nas Universidades Estaduais do Paraná no ano de 2019.

[8] Como o caso da autora que inicia a jornada laboral às 07h00 min. e termina o dia às 00h30min, diariamente se segunda a sexta.

[9] De acordo com Freudenberger, citado por Ulrich Kraft, a sindrome de bournout “é um estado de esgotamento físico e mental cuja causa está intimamente ligada à vida profissional” (2017, p. 01)