Resumo: A indenização por lucros cessantes em decorrência da redução da capacidade laborativa, proveniente do ato ilícito de outrem, é objeto de estudo deste artigo. O tema proposto demonstra de forma clara e objetiva a possibilidade de indenização com pagamento mensal de pensão em razão de redução da capacidade laborativa.
Palavras-chave: ação de indenização; acidente; redução de capacidade laborativa; responsabilidade civil.
Sumário: Introdução. 1. O ato ilícito. 2. A ação de reparação de danos. 3. Lucros cessantes. 3.1 Entendimentos jurisprudenciais. 3.2 Ausência de comprovação de atividade remunerada. 3.3 Pagamento de pensão pelo INSS. 3.4 Pagamento de pensão ao menor de idade. 3.5 Pagamento mensal ou parcela única. 3.6 Constituição de Capital. 4. Pedidos formulados na inicial. 5. Quesitos para perícia e indicação de assistente técnico. Conclusão. Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
A possibilidade de lucros cessantes decorrentes da redução da capacidade laborativa por ato ilícito de outrem, será o tema abordado neste artigo. Serão expostos os fundamentos legais e o posicionamento jurisprudencial de alguns tribunais e, principalmente, do STJ.
De forma objetiva, serão demonstrados as aspectos da responsabilidade civil proveniente do ato ilícito na ação de indenização; na sequência, abordar-se-á o estudo do instituto do lucro cessante no direito civil com as formas de recebimento da pensão devida.
Durante a leitura é de fácil constatação a grande omissão legal em vários tópicos, sendo sempre ancorada a fundamentação do artigo em precedentes do STJ em casos similares.
Segue, portanto, o ato ilícito no direito civil e breve estudo da ação de reparação para, em seguida, entrar no tema lucros cessantes, o qual, por ser o objeto do estudo, será desenvolvido com maior afinco e profundidade nas controvérsias legais.
1.O ATO ILÍCITO
O artigo 186 do vigente Código Civil determina de forma clara e precisa como conceito de ato ilícito aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Por ser instituto do direito com grande campo de abrangência (direito penal, tributário, administrativo, eleitoral, dentre outros), neste trabalho é importante ter em foco as implicações legais no campo do direito civil, pois seus efeitos variam de acordo com a disciplina estudada.
A principal consequência a ser examinada em decorrência do ato ilícito neste estudo, é o nascimento do dever de indenizar os danos sofridos pela conduta ilícita e a necessidade de reparação integral dos prejuízos sofridos pela vítima. (LEMOS, 2009, p. 45)
Com diversas correntes doutrinárias para o conceito de ato ilícito, deve-se saber que este se traduz em um comportamento voluntário que transgride um dever e, assim, evitar outros posicionamentos doutrinários que implicariam no desvio do foco do estudo o qual é o lucro cessante na ação de indenização por redução da capacidade laborativa. (VENOSA, 2005, p. 32)
Em decorrência do ato ilícito, surge para o ofendido o direito de ingressar com ação de reparação de danos. A partir disso, segue breve escopo sobre a ação de reparação de danos.
2. A AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS
A possibilidade de buscar reparação por danos causados por outrem, encontra respaldo nos artigos 186 a 188 e artigos 927 a 954 do Código Civil, e na Constituição Federal, art. 5º, inciso V e X, dentre outros dispositivos legais.
A vítima do acidente pode pleitear, por exemplo: danos morais, danos estéticos, danos materiais emergentes, lucros cessantes, dentro deste último pode estar pensão mensal vitalícia ou provisória e outros, conforme a situação requisitar em especial. A reparação do dano, que deve dar-se de forma ampla, procura restituir na integralidade e, na medida do possível, o estado anterior (restitutio in integrum, status quo ante).
O dano a ser tratado neste artigo é o indenizável que resultou em prejuízo. Reparar este dano significa tornar indene a perda (VENOSA, 2005, p. 270), ou seja, um dano compensado, indenizado ou remunerado (HOUAISS, 2009).
A problemática proposta neste artigo vem demonstrar a possibilidade de pleitear danos por lucros cessantes, em razão de redução da capacidade laborativa decorrente de ato ilícito.
3. LUCROS CESSANTES
Nasce para o ofensor que praticou ato ilícito, o dever de reparar e para ofendido o dever de ser ressarcido do dano sofrido, o qual pode ser na sua modalidade de dano moral ou patrimoninal. Neste segundo está o lucro cessante, que é um dano presente, entretanto com reflexos no futuro. (VENOSA, 2005, p. 271)
O artigo 402 do Código Civil estabelece que “as perdas e danos devidas ao credor abrangem, além do que ele efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar”. E, em clara linguagem dos artigos 949 do Código Civil, apura-se que é dever do ofensor indenizar o ofendido nos lucros cessantes até o fim da convalescença.
O artigo 950 do mesmo dispositivo legal completa que o ofensor indenizará ao ofendido lucros cessantes até o fim da convalescença, com pensão correspondente à importância do trabalho para o qual se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu, a saber:
“Art. 949. No caso de lesão ou outra ofensa à saúde, o ofensor indenizará o ofendido das despesas do tratamento e dos lucros cessantes até ao fim da convalescença, além de algum outro prejuízo que o ofendido prove haver sofrido.
Art. 950. Se da ofensa resultar defeito pelo qual o ofendido não possa exercer o seu ofício ou profissão, ou se lhe diminua a capacidade de trabalho, a indenização, além das despesas do tratamento e lucros cessantes até ao fim da convalescença, incluirá pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu.”
O termo cessante, segundo o dicionário, significa o que cessa, que se deixou de receber; interrompido. (HOUAISS, 2009) É, portanto, o que o ofendido deixou de receber em razão do acidente, como, por exemplo, um provento ou salário.
O exemplo mais comum encontrado nos livros doutrinários sobre o assunto, na parte de responsabilidade civil, é do taxista que tem seu veículo abalroado. Além do dano puro material para o conserto do automóvel, deverá o ofendido ser ressarcido pelo tempo que ficar impossibilitado de exercer sua função laborativa. Pode o veículo ficar na oficina, por exemplo, durante um mês, neste caso, deverá o causador do acidente pagar ao ofendido o que este deixar de lucrar.
Em consequência do ato ilícito, seja por acidente de trânsito, uma briga ou um acidente de trabalho, poderá o ofendido suportar sequela física de grandes proporções. A vítima passará por tratamento médico e poderá, em algumas situações, não ter recupação plena de sua forma física.
Conforme o trabalho exercido pela vítima, as sequelas terão grandes implicações e, consequentemente, a redução da capacidade laborativa que, por sua vez, implicará na redução da renda mensal do ofendido. O dano, portanto, é presente e com reflexos também no futuro.
Ter sua capacidade laborativa afetada poderá implicar na redução dos proventos mensais. Um exemplo é uma costureira que tem sequelas na mão após um acidente, ou um funcionário comissinado que perde a competividade e não consegue trabalhar em plena forma física e dentre tantos outros exemplos que poderiam ser citados.
O dano moral e o dano patrimonial pelo tempo exato que a vítima ficou sem trabalhar, com pagamento de salário, são de fácil visualização, mas não pode deixar de ser indenizado também o lucro cessante pela redução da capacidade laborativa, se este existir.
A citação adiante esclarece que os lucros cessantes aglomeram aquilo que se deixou de ganhar pelo evento, o qual é o reflexo futuro do ato ilícito sobre o patrimônio da vítima, com perda de um ganho esperável e diminuição do patrimônio.
“Os prejuízos sofridos de ordem material abrangem os danos emergentes, também chamados por Sérgio Cavalieri Filho de dano positivo, e para garantir ampla reparação inclui os lucros cessantes. Aqueles se referem a efetiva e imediata diminuição no patrimônio da vítima, e os lucros cessantes englobam aquilo que se deixou de ganhar pelo evento danoso, que no dizer de Cavalieri é o reflexo futuro do ato ilícito sobre o patrimônio da vítima, a perda de um ganho esperável, uma frustração e consequentemente também diminuição do patrimônio, mas em potencial. No entanto, se exige para os lucros cessantes uma probabilidade objetiva, pois não basta lucro imaginário, hipotético ou remoto”. (LEMOS, Paula M. F. de, 2009, p. 41, grifo nosso)
A vítima deixa, portanto, no exemplo citado, de auferir a renda mensal que antes recebia. Diante do novo quadro fático, o dano é iminente, mensal e na maioria das vezes de grande proporção. A vítima que padecer de sequelas permanentes que impliquem redução da capacidade laborativa na ordem de 50%, por exemplo, deverá receber do ofendido, mensalmente, 50% da remuneração proporcional antes do acidente, além de férias, 13º e terço constitucional.
A título ilustrativo, imagina-se um cidadão que trabalhava como vendedor e recebia mensalmente R$1.000,00 e, após e acidente de trânsito, ficou cinco meses em tratamento médico, totalmente impossibilitado de exercer suas funções. Terminado o tratamento médico volta a trabalhar, porém com claras limitações decorrentes de sequelas permanentes. Sua capacidade laborativa é afetada e deixa de receber o mesmo que antes recebia.
Neste caso, deverá o responsável pelo evento pagar cinco meses de R$1.000,00, 13º, férias e terço constitucional proporcional ao período, além de pagamento mensal a contar do término do tratamento proporcional à redução da capacidade laborativa, com os acréscimos legais. Importante mencionar também que haverá outros danos não discutidos neste artigo, como dano moral, dano estético ou perda da chance.
Neste sentido de conceder indenização com pagamento de pensão mensal proporcional à redução da capacidade laborativa, observa-se a decisão do STJ:
Ainda sobre decisão do STJ similar ao já citado, agora a respeito de ação por acidente ferroviário, que em decorrência da redução da capacidade laborativa determinou pagamento de pensão mensal vitalícia:
Importante citar também na sequencia duas decisões do STJ. A primeira, determinou pagamento de pensão mensal, pela redução da capacidade laborativa, na ordem de 30% do salário que percebia a vítima; a segunda decisão determinou pagamento de pensão por redução da capacidade que implica em maior sacrifício para o trabalho. Neste sentido:
Conforme já mencionado, a reparação do dano deve dar-se de forma ampla para tornar indene o prejuízo e, neste sentido, coerente às decisões do STJ com o texto legal (CCB, art. 402/949/950). O dano da redução da capacidade laborativa é indenizável por meio de pagamento de pensão mensal, logo, o causador deve reparar o que causou.
3.1 Entendimentos jurisprudenciais
No sentido de conceder pensão mensal vitalícia ao ofendido que tem sua capacidade laborativa reduzida, além das decisões já citadas, importante citar outros exemplos para os interessados:
“Outrossim, razoável a pensão fixada em favor de uma das vítimas, a que mais sofreu com o atropelamento provocado pelo veículo da transportadora, concedendo-se-lhe a pensão vitalícia, fixada em um salário mínimo, independente de não exercer ainda atividade remunerada à data do acidente, pois as lesões sofridas causaram-lhe incapacidade laboral irreversível. Na hipótese, é favorável à recorrente apenas o provimento quanto à incidência dos juros de mora a partir do evento danoso. Precedentes citados: REsp 595.789-MG, DJ 6/3/2006; REsp 126.798-MG, DJ 4/2/2002; REsp 899.869-MG, DJ 26/3/2007; REsp 737.708-CE, DJ 13/8/2007; AgRg no REsp 977.656-RS, DJ 6/11/2007; EREsp 109.675-RJ, DJ 29/4/2002; REsp 687.567-RS, DJ 13/3/2006, e REsp 416.846-SP, DJ 7/4/2003. REsp 519.258-RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 6/5/2008.” (STJ, Recurso Especial 519258/RJ, grifo nosso)
“DIMINUIÇÃO DA CAPACIDADE LABORATIVA. PENSIONAMENTO. CABIMENTO.
1. Consoante entendimento firmado nesta Corte, “nos lares desprovidos de maiores recursos, os filhos menores constituem fator econômico, cuja perda autoriza reparação”. Precedentes.
2. Como comprovado pelas instâncias ordinárias, resta inequívoco nos autos que a autora sofreu lesões graves, de natureza permanente, acarretando redução de sua capacidade laborativa .
3. Patente, portanto, a existência do dano material, correta a fixação da pensão indenizatória pelo Tribunal de origem, com fundamento no art. 1539 do Código Civil.” (STJ, Recurso Especial 769047/ES, grifo nosso)
Neste mesmo sentido, há precedentes do Tribunal de Justiça do Paraná:
“Tendo restado demonstrado que o apelado teve reduzida, de forma parcial e permanente, a sua capacidade laborativa, correta é a fixação de pensão mensal vitalícia.” (TJPR, Apelação Cível nº. 313484-7, grifo nosso)
“A pensão mensal é devida desde a época dos fatos até a sua morte, não devendo ser suspensa por eventual recebimento de aposentadoria, pois esta decorre da contribuição de empregado e empregador. Já o pensionamento tem natureza reparatória, em razão da redução da capacidade laborativa da vítima. 4. O retorno às atividades não obsta o pagamento da pensão. 5. Os juros de mora são devidos na razão de 6% ao ano, passando a 12% ao ano a partir da vigência do Novo Código Civil e art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. 6. O sofrimento e os dissabores suportados pela vítima, em razão do acidente de trabalho deve ser indenizado a título de danos morais. 7. “Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado”. (Súmula 313, do STJ)”. (TJPR, Apelaçaõ Cível nº. 295716-4, grifo nosso)
“DA PENSÃO VITALÍCIA
5. Tampouco merece prosperar a alegação da apelante de não ser possível o pensionamento vitalício, em virtude de que o apelado irá se aposentar, o que seria motivo para cessar o pagamento de pensão.
5.1 Insta salientar que, o referido pensionamento foi fixado proporcionalmente à perda da capacidade laborativa quantizada pelo perito do juízo, ou seja, 15% (quinze por cento) do salário percebido na época do evento, o que significa dizer, que a pensão a ser paga é, tão-somente a diferença entre aquilo que perceberia antes do acidente e o que deixou de perceber face à perda de capacidade laboral, que não foi total, mas de quinze por cento.
5.2 Ademais, não se há de olvidar que os institutos pensionamento vitalício e aposentadoria não se confundem, vez que possuem origens distintas. Note-se que o critério para a obtenção da aposentadoria é o tempo de contribuição ou idade, o que se chama de fator previdenciário, conquanto que a perda da capacidade laborativa possui relação direta com o ato ilícito praticado pela apelante que agiu com culpa na categoria negligência.” (TJPR, Apelação Cível nº. 304645-1, grifo nosso)
“Demonstrada a incapacidade laborativa decorrente do sinistro, há que se reconhecer o direito do requerente ao recebimento de pensão mensal vitalícia.” (TJPR, Apelação Cível nº. 498174-2, grifo nosso)
“Da pretensão de majoração do quantum relativo à pensão alimentícia PERÍCIA JUDICIAL QUE AFERIU A DIMINUIÇÃO DE 50% DA CAPACIDADE LABORATIVA DA VÍTIMA AUTORA. PENSÃO ALIMENTÍCIA QUE DEVE GUARDAR ESTRITA PROPORÇÃO COM A REDUÇÃO AFERIDA. MAJORAÇÃO DA PENSÃO de 1/4 PARA 1/2 SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO DA AUTORA PROVIDO NESSE PONTO.” (TJPR, Apelação Cível nº. 485536-7, grifo nosso)
Verifica-se nos precedentes citados a preocupação do julgador em tornar indene o prejuízo suportado pela vítima, pois se esta padece de sequelas que implicam redução da capacidade laborativa de forma permanente, o dano, logicamente, deve ser reparado por meio de pensão mensal proporcional ao dano sofrido.
3.2 Ausência de comprovação de atividade remunerada
Na hipótese da vítima suportar acidente e ter sua capacidade laborativa afetada, as decisões do STJ são pacíficas em determinar pagamento de pensão, mesmo sem comprovação da renda mensal do ofendido. Neste sentido:
“É cabível a fixação de pensão mensal equivalente a um salário mínimo até o fim da vida da vítima, ainda que não haja provas do exercício de atividade remunerada, tampouco de eventual remuneração recebida antes do ato ilícito, mas desde que configurada a redução
de sua capacidade laboral, segundo a jurisprudência do STJ.” (STJ, EREsp 812761 / RJ, grifo nosso)
“Outrossim, razoável a pensão fixada em favor de uma das vítimas, a que mais sofreu com o atropelamento provocado pelo veículo da transportadora, concedendo-se-lhe a pensão vitalícia, fixada em um salário mínimo, independente de não exercer ainda atividade remunerada à data do acidente, pois as lesões sofridas causaram-lhe incapacidade laboral irreversível. Na hipótese, é favorável à recorrente apenas o provimento quanto à incidência dos juros de mora a partir do evento danoso. Precedentes citados: REsp 595.789-MG, DJ 6/3/2006; REsp 126.798-MG, DJ 4/2/2002; REsp 899.869-MG, DJ 26/3/2007; REsp 737.708-CE, DJ 13/8/2007; AgRg no REsp 977.656-RS, DJ 6/11/2007; EREsp 109.675-RJ, DJ 29/4/2002; REsp 687.567-RS, DJ 13/3/2006, e REsp 416.846-SP, DJ 7/4/2003. REsp 519.258-RJ, Rel. Min. Fernando Gonçalves, julgado em 6/5/2008.” (STJ, Recurso Especial 519258/RJ, grifo nosso)
É presumível que a vítima trabalhe e tenha renda mensal para sua sobrevivência, sendo a pensão da indenização calculada, na ausência de comprovação de rendimento, pelo salário mínimo da data do evento danoso.
A redução da capacidade laborativa enseja não só as limitações óbvias, mas também a impossibilidade de buscar melhores condições no mercado de trabalho, motivos pelos quais é devida a pensão mesmo sem a comprovação cabal dos rendimentos auferidos na data do acidente.
3.3 Pagamento de pensão pelo INSS.
São institutos distintos o recebimento de qualquer provento do INSS e o pagamento de pensão mensal devida por responsabilidade civil do causador do acidente. O fato da vítima receber pensão mensal do INSS não ilide a responsabilidade do ofensor em pagar pensão mensal proporcional ao dano causado.
Decisões judiciais neste sentido, que determinam pagamento de indenização independente do recebimento da pensão pelo INSS, são facilmente encontradas nos órgãos superiores e, para título ilustrativo, segue:
“A pensão mensal é devida desde a época dos fatos até a sua morte, não devendo ser suspensa por eventual recebimento de aposentadoria, pois esta decorre da contribuição de empregado e empregador. Já o pensionamento tem natureza reparatória, em razão da redução da capacidade laborativa da vítima. 4. O retorno às atividades não obsta o pagamento da pensão. 5. Os juros de mora são devidos na razão de 6% ao ano, passando a 12% ao ano a partir da vigência do Novo Código Civil e art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. 6. O sofrimento e os dissabores suportados pela vítima, em razão do acidente de trabalho deve ser indenizado a título de danos morais. 7. “Em ação de indenização, procedente o pedido, é necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado”. (Súmula 313, do STJ).” (TJPR, Apelaçaõ Cível nº. 295716-4, grifo nosso)
“DA PENSÃO VITALÍCIA
5. Tampouco merece prosperar a alegação da apelante de não ser possível o pensionamento vitalício, em virtude de que o apelado irá se aposentar, o que seria motivo para cessar o pagamento de pensão.
5.1 Insta salientar que, o referido pensionamento foi fixado proporcionalmente à perda da capacidade laborativa quantizada pelo perito do juízo, ou seja, 15% (quinze por cento) do salário percebido na época do evento, o que significa dizer, que a pensão a ser paga é, tão-somente a diferença entre aquilo que perceberia antes do acidente e o que deixou de perceber face à perda de capacidade laboral, que não foi total, mas de quinze por cento.
5.2 Ademais, não se há de olvidar que os institutos pensionamento vitalício e aposentadoria não se confundem, vez que possuem origens distintas. Note-se que o critério para a obtenção da aposentadoria é o tempo de contribuição ou idade, o que se chama de fator previdenciário, conquanto que a perda da capacidade laborativa possui relação direta com o ato ilícito praticado pela apelante que agiu com culpa na categoria negligência.” (TJPR, Apelação Cível nº. 304645-1, grifo nosso)
Verifica-se, portanto, que a pensão mensal do INSS não tem ligação com o dever de pagamento de indenização devido pelo ofensor ao ofendido. Portanto, não pode o responsável pelo ato ilícito ter proveito em decorrência do direito da vítima, que originou do pagamento do INSS. Os amparos do INSS, quando devidos, são direitos pessoais do segurado e não beneficiam o ofensor.
Recebendo ou não o benefício do INSS, a vítima terá direito à indenização sem qualquer desconto ou compensação, sendo devida na sua integralidade, de acordo com o dano causado pelo ofensor.
3.4 Pagamento de pensão ao menor de idade
Na hipótese da vítima ser menor, também terá direito à pensão mensal. Em precedente no STJ, a pensão foi fixada a contar da data que a vítima completará 14 anos.
“RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATROPELAMENTO DE MENOR IMPÚBERE QUE SOFREU AMPUTAÇÃO DE MEMBRO INFERIOR E OUTRAS SEQÜELAS. REDUÇÃO DA CAPACIDADE PARA O TRABALHO. PENSÃO DEVIDA.
É devido o pensionamento vitalício pela diminuição da capacidade laborativa decorrente das seqüelas irreversíveis, conquanto a vítima, menor impúbere, não exercesse atividade remunerada à época do acidente. Recurso especial conhecido e provido.” (STJ, Recurso Especial 126.798/MG, 2002, grifo nosso)
“RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATROPELAMENTO DE MENOR IMPÚBERE. REDUÇÃO DA CAPACIDADE PARA O TRABALHO. PENSÃO.PAGAMENTO. TERMO INICIAL. 14 ANOS. HONORÁRIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ.
1. A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça fixou como termo inicial para o pagamento da pensão a data em que a vítima, menor de idade ao tempo do acidente, vier a completar 14 (catorze) anos de idade. […]3. Recurso especial parcialmente provido”. (STJ, Recurso Especial 628.522/RJ, 2008, grifo nosso)
Verifica-se, portanto, que o menor, vítima de acidente e com redução da capacidade laborativa, a partir dos seus 14 anos, deverá receber pensão do ofensor. O pagamento da pensão deverá corresponder ao grau da seu sequela, de acordo com o salário mínimo da data do evento danoso.
3.5 Pagamento mensal ou parcela única
Nos termos do artigo 950, parágrafo único do Código Civil, o pagamento das parcelas devidas em razão da pensão correspondente à importância do trabalho para que se inabilitou, ou da depreciação que ele sofreu, poderá ser arbitrada e exigida de uma só vez.
Na hipótese de redução da capacidade laborativa, as sequelas, na grande maioria, são permanentes e irreversíveis. Em raciocínio após a leitura do artigo 950 e parágrafo único do Código Civil, se as sequelas são permanentes, pode a vítima exigir o pagamento de uma só vez, porém as decisões do órgão superior têm seguido diferente posicionamento.
Entendimento majoritário no STJ tem determinado o pagamento das prestações devidas, vencidas e não pagas, em parcela única, porém as vincendas devem ser pagas de forma mensal, até o fim da vida da vítima, com 13º, terço constitucional e férias. Neste sentido, a decisão do STJ apresenta que
“É cabível a fixação de pensão mensal equivalente a um salário mínimo até o fim da vida da vítima, ainda que não haja provas do exercício de atividade remunerada, tampouco de eventual remuneração recebida antes do ato ilícito, mas desde que configurada a redução de sua capacidade laboral, segundo a jurisprudência do STJ.” (STJ, EREsp 812761 / RJ, grifo nosso)
Apesar de contrário ao contido no Código Civil (art. 950, § único), as decisões do STJ tem se pronunciado no sentido justo e correto, pois é incoerente pagar indenização por parcela única a um futuro incerto da vítima. Seria enriquecimento ilícito da vítima do acidente que, em razão de um fato, poderia receber todos os vencimentos de sua sobrevida em parcela única.
Para a vítima do acidente resta a redução da capacidade laborativa e a sobrevida. Seu futuro é cercado de incertezas e surpresas, assim como a de qualquer cidadão. Pode a vítima, a qualquer momento, falecer em razão de outro fato, doença ou infortúnios e, nesta hipótese, não é razoável o deferimento de pagamento em parcela única.
Correto é o provimento de pensão mensal e vitalícia, até a data de óbito da vítima, sem possibilidade de recebimento de forma antecipada, pois se acidente não houvesse, a esta não teria seus vencimentos antecipados.
Outrossim, como o pagamento da pensão não tem vínculo com a relação de trabalho entre patrão e empregado, ou relações previdenciárias, correto é o entendimento que estende o pagamento da pensão até o fim da vida da vítima.
A redução de prejuízo decorrente da redução da capacidade laborativa será suportada pela vítima pelo restande de sua sobrevida. Portanto, qualquer entendimento que delimite o fim do pagamento da pensão, seja pela expectativa de vida calculada pelo IBGE até 65 anos, ou até aposentadoria, será equivocado e trará prejuízos ainda maiores para o ofendido.
3.6 Constituição de capital
Na hipótese de não deferimento do pagamento em parcela única da indenização devida, necessitará o ofendido pagar mensalmente a pensão e os acréscimos previstos em lei.
Portanto a vítima dependerá da solidez e solvência do causador do acidente pelo restante de sua sobrevida. No sentido de evitar prejuízo e incertezas na vida do ofendido, o artigo 475-Q do CPC determina a constituição de capital para assegurar o pagamento do valor mensal da pensão.
A garantia é de vital importância em razão da celeridade, das variações e das incertezas econômicas atuais. A experiência comum adverte ser temerário asseverar que uma pessoa, por mais patrimônio que tenha, permanecerá solvente por longo prazo e com o mesmo status econômico.
Sobre a matéria o STJ, inclusive, editou-se súmula determinando ser devida a constituição de capital para a garantia de pagamento da pensão, independentemente da situação financeira do demandado. (STJ, Súmula 213). Observa-se que o pedido de constituição de capital somente fará sentido se não for deferido o pagamento de pensão em parcela única.
4. PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL
Salvo a hipótese de acordo extrajudicial, a vítima deverá propor sua pretensão de indenização no poder judiciário para tentar satisfazer os danos suportados.
A pretensão que versar sobre indenização por danos materiais, corporais e morais, será de grande complexidade e irá requerer atenção especial do advogado responsável pela lide.
Nos termos do artigo 275, II, “e” do CPC, deve, por tratar de acidente de trânsito, observar a ação e o rito sumário. Há, entretanto, possibilidade de conversão para o rito ordinário diante de prova técnica de complexidade, fato este que certamente acontecerá com a prova pericial médica (CPC, art. 277, §5º).
Para título ilustrativo, apenas com intuito de auxiliar o leitor interessado, sem a pretensão de esgotar o tema, segue exemplo dos pedidos a serem formulados em ação similar aos já citados:
“a) A citação do réu, por carta aviso de recebimento, para, se desejar, no prazo legal, apresentar contestação e provas, sob pena dos efeitos da revelia;
b) A procedência dos pedidos do autor para condenar o réu ao pagamento da indenização:
b.1) Indenizar DANOS MORAIS, na quantia equivalente a XXX salários mínimos, ou, alternativamente, em outro valor, inclusive maior se for o caso, conforme entender justo Vossa Excelência, diante da gravidade e irreversibilidade dos danos morais consumados.
b.2) Indenizar DANOS ESTÉTICOS, na quantia equivalente a XXX salários mínimos, ou, alternativamente, em outro valor, inclusive maior se for o caso, conforme entender justo Vossa Excelência, diante da gravidade e irreversibilidade dos danos estéticos.
b.3) Indenizar os DANOS MATERIAIS do veículo, conforme anexos recibos, no valor de R$ XXXXX, acrescidos de juros e correção monetária;
b.4) Indenizar os DANOS MATERIAIS emergentes pelo tempo que o autor ficou totalmente incapacidade de trabalhar, devido desde a data do acidente até a alta médica, com parcela mensal correspondente ao salário mínimo da data do acidente, além de férias, 13º e terço constitucional proporcionais.
b.5) Indenizar DANOS MATERIAIS modalidade lucros cessantes, pensão mensal de caráter alimentar, correspondente a 100% do salário mínimo da data do acidente, ou em outra porcentagem de redução da capacidade laborativa, que deverá ser apurada em perícia e resposta aos quesitos. O termo inicial da pensão devera ter como fonte de cálculo o dia seguinte a alta médica, até a data de morte do autor, tudo com 13º, férias, terço constitucional e correção do salário mínimo anualmente;
b.5.1) Requer seja o réu condenado ao pagamento da indenização em parcela única (art. 950, parágrafo único, do CC), com a dedução das somas eventualmente pagas no curso da demanda, ou o pedido alterntivo “b.5.2”.
b.5.2) Requer seja o réu condenado ao pagamento das pensões mensais vincendas devidas todo quinto dia útil do mês, assegurado o recebimento de todas as parcelas vencidas desde o sinistro de uma só vez.
c) as intimações, art. 39 CPC, sejam encaminhadas para XXXXXXXX, OAB/XX nº XXXX, advogado devidamente constituído, endereço impresso do rodapé e recebe intimações pelo D.J.;
d) A produção de provas por todos os meios admissíveis em direito; a invalidez advinda do acidente por perícia médica; depoimento do réu causador do acidente; testemunhas arroladas ao final.
e) pagar custas processuais e honorários advocatícios de 20% sobre o somatório dos danos morais e materiais, estes acrescidos também dos alimentos vencidos até a data da execução do julgado e mais um ano dos vincendos (alternativamente, não ocorrendo o pagamento em parcela única), conforme sufragado pelas Turmas que compõem a Seção de Direito Privado do STJ, de que é mostra o julgamento no Resp 109.675/RJ;
f)O processamento do feito pelo rito ordinário, em razão da necessidade de dilação probatória e a possibilidade de perícia técnica de grande complexidade (CPC, art. 277, §5º);”
Verifica-se claramente que os pedidos formulados são apenas exemplos genéricos, pois o caso concreto conterá suas peculiaridades e pedidos necessários. Poderá ocorrer também a necessidade de pedido de assistência judiciária, de pagamento de tratamentos médicos ou afins.
Na sequência do pedido, do mesmo modo será de grande valia a indicação das testemunhas do acidente para evitar qualquer alegação de preclusão, além de descrever os quesitos para perícia e indicar assistente técnico.
5. QUESITOS PARA PERÍCIA E INDICAÇÃO DE ASSISTENTE TÉCNICO
Novamente sem a pretensão de esgotar todas as possibilidades de quesitos a serem formulados, seguem novos exemplos:
“a) Com base nos documentos anexos à inicial, é possível concluir que o examinado sofreu acidente de trânsito, em qual data?
b) Na data da realização da perícia judicial, apresenta o examinado sequelas advindas do acidente de trânsito, quais? Guardam estas sequelas nexo causal com o acidente?
c) Indicar a data de alta médica do examinando.
d) Em um conceito cível de apuração de invalidez permanente, sem critérios previdenciários ou penais, apresenta o examinado invalidez permanente de membro, sentido ou função, a invalidez permanente é total ou parcial?
e) Em um critério cível de apuração de invalidez permanente, qual o grau que padece o examinado?
f) Quais os parâmetros, tabelas ou doutrinas utilizadas por esse perito para apurar eventuais seqüelas, ou invalidez permanente em vítimas de acidente de trânsito.
g) De acordo com a Tabela para Cálculo de Percentuais de Indenização em Caso de Invalidez Permanente por Acidente – Seguro Obrigatório de Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres, ou por sua carga, a pessoas transportadas ou não – Medida Provisória 451/2008, qual o percentual da invalidez do examinado?
h) Como o DPVAT não apura qualquer aspectos de redução de capacidade laborativa, mas apenas sequelas que enquadram na tabela da Medida provisória 451/2008, qual o grau de invalidez decorrente do acidente, nos termos da tabela?
i) Apresenta o examinando sequela fisíveis, deformidade permanente? Há dano estético?
Indica como assistente técnico o médico XXXXXX.
Quesitos são de grande importância, pois a conclusão do médico determinará nos autos a extensão do dano causado. Isto refletirá no valor da condenação, em possível dano estético e, principalmente, caracterizar a redução da capacidade laborativa.
É importante também estar atento à profissão da vítima, pois conforme a atividade exercida, haverá danos com maior extensão. Um exemplo seria o da costureira profissional que sofre graves sequelas no polegar, pode a vítima inclusive não retornar a sua atividade laborativa. Esta mesma sequela poderá não ter tamanha implicação em outro profissional, por exemplo.
A característica da sequela deve ser cabalmente descrita na inicial e tratada com suas peculiaridades pelo médico responsável pelo exame. Os quesitos, neste sentido, devem ser completos para demonstrar ao julgador o dano causado.
CONCLUSÃO
Por todos esses aspectos, pode-se concluir que é possível o pagamento de pensão mensal, na modalidade dano material lucros cessantes para a vítima que, em decorrência do ato ilícito por outrem praticado, tenha sua capacidade laborativa reduzida.
Conforme mencionado, o pagamento será proporcional ao grau da redução da capacidade e o rendimento auferido pela vítima na data do acidente (ato ilícito praticado pelo ofensor), além de férias, 13º e terço constitucional, sendo esses os reflexos dos rendimentos mensais.
A não comprovação do rendimento mensal da vítima na data do acidente, não ilide da responsabilidade do ofensor em pagar pensão mensal a qual será devida independente da sua comprovação, podendo ser a vítima, inclusive, menor de idade. Na hipótese de não comprovação, o valor da pensão terá como base o salário mínimo da data do fato.
Embora a lei traga expressa determinação de pagamento em parcela única da pensão obrigatória, as decisões do STJ, de forma acertada, tem seguido entendimento de ter como termo final a morte do ofendido. Para garantir o pagamento da pensão, é importante também o deferimento da constituição de capital em bens do causador do acidente.
Verifica-se que, de forma geral, procura o poder judiciário tornar indene o prejuízo suportado pela vítima a qual terá reflexos no restante de sua sobrevida pelos danos suportados. A lei é omissa em diversos pontos e compete ao julgado, com grande margem discricionária, julgar da melhor forma a recompor o prejuízo causado e seguir as decisões proferidas pelo STJ que, em sua grande maioria, propiciam a melhor recomposição indenizatória para o ofendido.
Informações Sobre o Autor
Bruno Augusto Sampaio Fuga
Mestrando em Direito Negocial pela UEL. Pós-graduado em Processo Civil IDCC. Pós-graduado em Filosofia Jurídica e Política UEL/PR. Advogado. Professor na UNOPAR