Reflexões sobre o dever de informação

Introdução


Os profissionais do direito privado (ou ao menos os seus estudiosos) têm se debruçado sobre questões que implicam numa espécie de auto-reflexão, o que tem nos levado a ilações indicativas de uma mudança de paradigmas, quando não se opta pela adjetivação alusiva à crise. No entanto, quer pensemos em termos de crise, quer pensemos em termos de transição paradigmática, o certo é que há uma imersão dos profissionais do direito privado em uma nova grade conceitual-valorativa, a qual tem imposto aos mesmos, noções como dignidade, razoabilidade, solidariedade, lealdade, etc. Em suma, categorias até então muito mais protagonizadas por filósofos do direito, tem crescentemente ganhado espaços nos foros. Não é debalde: a normatividade jurídica ganhou novos contornos, e a prática argumentativa que a cerca (e ao mesmo tempo a constrói) não poderia seguir senda diversa. Este contexto levou-me a uma busca de compreensão de seu significado no âmbito da própria racionalidade jurídica que lhe é subjacente (CÁPRIO, 2006).


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No presente trabalho, procurarei compreender um dos desdobramentos normativos da racionalidade que acompanha a cláusula geral da boa-fé objetiva em nosso sistema jurídico. Refiro-se ao dever de informação. A boa-fé objetiva que nada mais faz do que expressar juridicamente a conformação de nosso paradigma atual àquelas categorias supra referidas. Assim, proponho uma breve análise que, a despeito de sua concisão, tentará representar um esforço de perspectivação holista do fenômeno em tela, o que significa cotejar a norma jurídica com o substrato sociológico que lhe dá sustentação, compreendendo as raízes do dever de informação, a partir de sua contextualização na relação jurídica que lhe serve de base.


Desse modo, pensaremos o dever de informação a partir de duas leis específicas: o Código Civil Brasileiro e o Código de Defesa do Consumidor. Nesta reflexão, procurarei detalhar a interpretação jurídica do dever de informação, sob ambos os prismas.


1. Premissas teóricas: a relação obrigacional numa perspectiva holista


A perspectiva holista nos remete à forma de apreender a realidade estudada a partir de um olhar mais globalizante[1]. No plano jurídico, uma abordagem holista trará certos desdobramentos conceituais e conclusivos, para a área à qual será empregada. Assim, Clóvis do Couto e Silva desenvolveu, no Brasil, a idéia da obrigação como processo (o que traz em si a ideia de conjunto): compõe-se de um conjunto de atividades necessárias à satisfação do interesse do credor (COUTO E SILVA, 1976, p. 10). Estas atividades em geral corporificam deveres jurídicos, pré-negociais, negociais e pós-negociais. Por isso a apreensão da relação como processo evidencia, ao lado dos deveres de prestação (principais e secundários) os deveres de proteção, além de direitos potestativos, sujeições, ônus, expectativas jurídicas, todos coligados … em atenção a uma identidade de fim. Trata-se de uma relação de caráter unitário e funcional. Nesta lógica, para Clóvis do Couto e Silva, os interesses de cada parte contratante encontram a sua fronteira nos interesses do outro figurante, dignos de serem protegidos. Daí dizer que o princípio da boa-fé atua como mandamento de consideração.


A partir da percepção da obrigação como processo, Clóvis do Couto e Silva pondera que o nascimento dos deveres pode resultar de fatores decorrentes da cultura e da imersão de valores que os Códigos revelam no campo social e das transformações e modificações que produzem (para além da autonomia privada, do ato culposo e a disposição legal, além dos usos). (COUTO E SILVA, 1976, p. 74). Estes fatores a que se refere são os conceitos de dano indenizável e a valorização jurídica do contato social. (MARTINS-COSTA, 2005, p. 65).


Para uma adequada compreensão da idéia de deveres anexos à relação obrigacional, parece importante atentar à percepção dinâmica da relação, que a percebe como um processo, como propugna Karl Larenz. A relação obrigacional é composta por sucessivos momentos. Tais momentos restam integrados numa estrutura orgânica com relações recíprocas de instrumentalidade ou de interdependência. Para Larenz, os diversos e complexos vínculos resultantes e emergentes da relação se articulam numa estrutura (num sistema de processos). Referido sistema de processos, ou estrutura, é articulada em vista da necessária colaboração intersubjetiva requerida finalisticamente pela relação obrigacional (LARENZ, 1978).


Para Larenz, em toda relação obrigacional está latente o fim da satisfação do interesse do credor na prestação. Por isso tal relação deve ser considerada um processo. É que a relação obrigacional está, desde o início, encaminhada a alcançar um fim determinado, e a extinguir-se com a obtenção deste fim. (MARTINS-COSTA, 2005, p. 27).


A intersubjetividade a que esta perspectiva processual e dinâmica da obrigação nos conduz, impõe que atentemos a uma outra dimensão básica, da qual emerge o dever de informação: a boa-fé objetiva. Antes de pensar a boa-fé como patamar objetivado (nas normas), cumpre refletirmos sobre seu significado mais elementar, o qual certamente nos remeterá à noção de contato social[2] (categoria que a moderna civilística tem tomado crescentemente em conta).


A boa-fé objetiva é um pressuposto da comunicação. (LOPES, 2005, p. 107). Interessante pensarmos na filosofia da linguagem para mostrar o caráter essencial da boa-fé (de seu significado) para as relações sociais em geral, e de que modo o direito deve pressupô-la por essência. Lembremos de Jürgen Habermas, um dos mais comentados sociólogos contemporâneos (e que tem dedicado lugar de destaque ao Direito, em sua obra). Pois bem, a teoria da argumentação pressupõe um tipo de conduta conforme à boa-fé. Habermas indica três pressupostos de validade para que qualquer situação dialogal se implemente: pressuposto da veracidade, pressuposto da verdade e pressuposto da correção normativa (HABERMAS, 1992). Não nos cabe aqui aprofundar a complexidade do pensamento habermasiano, mas apenas pontuar o papel fundamental (e mesmo fundante) da pretensão de veracidade implícita em todo processo comunicativo. Significa: a pretensão de adequação do pensamento com aquilo que se enuncia. Apenas assim é possível falarmos em ação comunicativa e interação espontânea. Aqui vale distinguir: integração social e integração sistêmica. A boa-fé está na base da integração social, ou seja, nas interações movidas por valores compartilhados, expectativas de entendimento recíprocas, etc. A rigor, a ação jurídica seria uma ação estratégica. Mas com a institucionalização da boa-fé, abre-se uma janela para o ético (lembre-se Joseph Esser). Assim, a boa-fé é uma das mais importantes premissas principiológicas da hermenêutica contratual brasileira[3]. E a partir dela vamos perceber o contrato como um complexo, em que para além dos deveres principais (de prestação) teremos os deveres anexos: dentre os quais o de informação.


2. O desdobramento jurídico da boa-fé: deveres anexos


Tomada como pressuposto da comunicação e, portanto, da própria intersubjetividade social, a boa-fé adentra a teoria civil brasileira, inicialmente por influência do Código de Defesa do Consumidor, mas posteriormente pela própria consagração em nosso Código Civil de 2002 (em que pese sua previsão já no vetusto Código Comercial, a boa-fé objetiva passou a ser apropriada pela jurisprudência e pela teoria do direito privado[4], efetivamente, com a entrada do CDC). A boa-fé objetiva tem sido, então, objeto de inúmeras análises e estudos, nos quais, em linhas gerais, diferenciam-se três funções primordiais a ela atribuídas: interpretação, limitação de direitos e criação de deveres[5] (respectivamente nos conduzindo aos arts. 113, 187 e 422).


Judith Martins-Costa, ao tratar do inadimplemento das obrigações, menciona a questão do cumprimento defeituoso. Trata-se de descumprimento que diz respeito à espécie de dever descumprido, e não ao tempo do cumprimento. Assim, o cumprimento defeituoso recobre os deveres secundários, laterais, acessórios e instrumentais, especialmente aqueles derivados da boa-fé (emergentes da terceira espécie de funções acima referidas) (MARTINS-COSTA, 2005, p. 99).   


Jorge Cesa Ferreira da Silva, por sua vez, oferece uma classificação mais simples dos deveres laterais, na qual agrupa em três grandes espécies os mesmos: 1. deveres de proteção; 2. deveres de lealdade e de cooperação e 3. deveres de informação[6] e esclarecimento (Ao comentar o dever de informação, importante lembrar o art. 12, caput e § 1º, que equipara a falta de informação ao defeito do produto) (SILVA, 2002, p. 117)[7].


Neste sentido, interessante a contribuição de Mota Pinto, o qual ilustra bem o caráter de transformabilidade dos deveres instrumentais: exemplo – venda do objeto X a um leigo, pelo preço Y; e venda desse mesmo objeto X a um especialista/conhecedor. No primeiro caso, surgem os deveres de esclarecimento e informação peculiares, que eventualmente podem levar ao dever de indenizar. (In: FERREIRA DA SILVA, P. 447).    


Ao analisar as funções da boa-fé objetiva, Judith MARTINS-COSTA distingue o seguinte: função de otimização do comportamento contratual; função de reequilíbrio do contrato e função de limite no exercício dos direitos subjetivos. 


 A função de otimização do comportamento contratual é obtida por dois modos diversos: primeiro, pela imposição de deveres de cooperação e de proteção dos recíprocos interesses. São deveres instrumentais da conduta, pois visam ao exato processamento da relação obrigacional, à satisfação dos interesses globais envolvidos, auxiliando na realização positiva do fim contratual e na proteção da pessoa e dos bens da contraparte; segundo, pela interpretação do contrato conforme à função econômico-social que é chamado a realizar (MARTINS-COSTA, 2002, pp. 199-200).


Como expressão do mandamento de consideração dos interesses do alter, temos o exemplo clássico de um acórdão de 1998 (TJRS, Ap. Civ. 598037257), no qual se impôs à seguradora que, previamente à suspensão dos efeitos do contrato, por inadimplemento do devedor, fosse o mesmo notificado acerca dos efeitos do não-atendimento (o dever de considerar os interesses do alter também nos conduz, assim, ao dever de informar). (MARTINS-COSTA, 2002, p. 202). O dever de informação, emergente a partir da boa-fé, conforme referido acórdão, atestaria o caráter da circunstancialidade, que marcaria a boa-fé, já que é um desdobramento das características específicas do contrato que estava em jogo.


Na senda da idéia de otimização do comportamento contratual, podemos encontrar, exemplificativamente, os seguintes deveres: dever de aviso e esclarecimento (advogado que aconselha seu cliente das melhores vias para atingir o escopo; do consultor financeiro de esclarecer a contraparte dos riscos do investimento; do médico, de esclarecer o paciente da relação custo/benefício do tratamento escolhido, ou dos efeitos colaterais do medicamento indicado; ou do sujeito que, na fase pré-contratual, deve informar a contraparte dos fatos que podem ter relevo na formação da declaração negocial); dever de informação (ganha relevo nas relações de consumo – vide artigos 12, in fine, 14, 18, 20, 30 e 31, entre outros do CDC). E, deste modo, adentramos especificamente na questão do dever de informação.


Rubén STIGLITZ situa o dever de informar no plano das obrigações secundárias, provenientes das considerações de cooperação recíproca, a qual emana da cláusula geral da boa-fé objetiva. O fundamento do dever de informar residiria na desigualdade que pressupõe que uma das partes se encontre informada e a outra desinformada sobre um fato que exerça influência sobre o consentimento da última (STIGLITZ, 1997, p.14).


3. O dever de informar: breve nota a partir da contribuição francesa


Destaco a contribuição de Calais-Auloy, o qual assevera que podemos distinguir, teoricamente, duas obrigações de informação: a pré-contratual (visa a esclarecer o consentimento do contratante, antes da conclusão do contrato) e a contratual (nasce do contrato já formado, no sentido de informar o contratante sobre o uso do bem ou serviço fornecido).


Porém, analisando a realidade do direito francês, o autor pondera que a obrigação geral de informação, tal como derivada da jurisprudência civil, não é um grande socorro ao consumidor. Isto porque a falta de informação apenas é sancionada com a nulidade do contrato ou a outorga de perdas e danos (indenização), sanções que supõem a ação individual do lesado. Por esta razão, é mister um prejuízo importante (excepcional) para que o consumidor aja. Na prática acabava sendo ineficaz: quem interporia uma ação por não ter sido informado sobre a composição de um alimento ou sobre o emprego de um aparelho? (pergunta o autor). Por esta razão se realça a utilidade das obrigações de informação postas pelo direito do consumidor. Um texto legislativo ou regulamentar vem precisar as informações que os profissionais devem fornecer aos consumidores. Uma sanção penal ameaça os profissionais que não fornecem ditas informações. Além disso, os agentes administrativos têm poder de controle. Mais uma vez, destaca o autor que a via preventiva e coletiva se revela mais eficaz que o remédio individual e curativo (em tradução livre) (CALAIS-AULOY, 1994, p. 242).


Pondera o autor que a réflexion é o complemento da informação. Não adianta informar o consumidor, se este não refletir antes de contratar sobre as informações que lhe foram dadas. É certo, explica o autor, que a lei não pode obrigar alguém a refletir, se o mesmo não quer. Mas pode a norma obrigar os profissionais a deixar aos consumidores um tempo para reflexão (CALAIS-AULOY, 1994, p. 243).


Com o escopo de garantir a reflexão do consumidor, o art. 134-1 do código do consumo francês obriga os profissionais a remeter a todo interessado que solicitar, um exemplar das convenções que eles habitualmente propõem. Em caso de infração, o profissional terá de pagar multa. Calais-Auloy informa-nos que esta regra visa a lutar contra uma prática de certos profissionais (especialmente seguradoras) que apenas aceitam remeter documentos contratuais após a assinatura, privando o consumidor de qualquer reflexão sobre as cláusulas do contrato antes de sua conclusão. Porém, devemos frisar que no Brasil é muito comum a prática, dentre os Bancos, de não entregarem os documentos contratuais sequer após a assinatura do contrato. Muitas vezes acabam entregando apenas no processo judicial, mediante ordem do juiz. Então, veja-se como o direito à informação é lesado por esta prática.


Além disso, Calais-Auloy aduz que a lei atribui aos consumidores um prazo de reflexão, ou seja, o contrato só é definitivamente concluído com a expiração de um prazo no qual o consumidor pode refletir sobre as informações que lhe foram dadas.


De certa forma, no Brasil temos o direito de arrependimento, nas compras realizadas fora do estabelecimento comercial (art. 49 do CDC). Podemos, assim, associá-la à questão da reflexão.


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4. O dever de informação na perspectiva consumerista


Se percebermos a dimensão de poder, ínsita no elemento informação, poderemos contemplar com mais facilidade o significado da desigualdade informacional, a qual é típica do mercado de consumo hipercomplexo no qual convivemos. A doutrina alemã vem se referindo à equidade informacional. O direito à informação[8] é multifacetado. Isto porque seu conteúdo e eficácia apresentam-se de diferentes modos, conforme a situação de fato e de direito sob enfoque.


O dever de informação deve ser apreendido, antes de mais nada, como uma premissa principiológica da hermenêutica contratual brasileira. Aqui invoco a contribuição de José Reinaldo de Lima Lopes, para quem no art. 6º, II e III do CDC, temos direitos básicos. O inciso II, por exemplo, traz a educação como direito básico. A educação como direito básico, conforme o art. 6º, II, se constitui em um pressuposto de interpretação para a aplicação do direito. O inciso III traz o direito à informação. Pressupondo que o consumidor tem direito à educação e à informação, em caso de conflito deve-se indagar se o fornecedor lhe deu a educação/informação para o consumo. (LOPES, 2005, p. 102).


O dever de informar apóia-se no reconhecimento de um déficit informacional do consumidor perante o fornecedor. É que este detém conhecimento especializado acerca de dados do processo de produção e fornecimento dos produtos e serviços no mercado de consumo.


Claudia Lima Marques identifica o princípio da transparência, no art. 4º, caput, do CDC. Define o mesmo como informação clara e correta sobre o produto a ser vendido, sobre o contrato a ser firmado. Trata-se de lealdade e respeito nas relações entre fornecedor e consumidor. (MARQUES, 2006, p. 715).


É este princípio de transparência que se constitui em fonte do dever de informar instituído pelo CDC. Assim, este dever se refere às características do produto e serviço, mas também ao conteúdo do contrato. O inciso III do art. 4º, ao conferir o direito à informação realiza a transparência no mercado de consumo, tal como almejado pelo caput do art. 4º. Mas a base do dever de informar é o art. 6º, III do CDC: vide STJ e a polêmica dos preços indicados por códigos de barras em gôndulas.


A profundidade da importância do princípio de transparência adentra aquilo que se denomina inversão de papéis: o consumidor que se encontrava numa posição que o compelia à atividade (ativa), no sentido de ter de buscar a informação, de instrumentalizar-se de conhecimentos técnicos, e o fornecedor, que estava na posição passiva, de quem já possuía as informações.


Como reflexos do princípio da transparência, temos o dever de informar o consumidor, seja: 1º através da oferta, clara e correta (publicidade ou qualquer outra informação suficiente – art. 30), sobre as qualidades do produto ou serviço e as condições do contrato, sob pena de o fornecedor responder por falha da informação (art. 20) ou ser forçado a cumprir a oferta nos termos em que foi feita (art. 35); seja: 2º através do próprio texto do contrato (vide art. 46 e 54, § 3º do CDC).  


Analiticamente, podemos visualizar a seguinte grade normativa, como caracterizadora da positivação do dever de informação no CDC: Assim, tem-se: o direito básico à informação do consumidor (art. 6º, III); depois, nas diversas fases da relação de consumo, temos: art. 8º e 10 (informação sobre riscos e periculosidade); art. 12 e 14 (defeitos de informação); 18 e 20 (vícios de informação); 30, 31, 33, 34 e 35 (eficácia vinculativa da informação, sua vinculação à oferta e proposta, e as consequências da violação do dever de informar), art. 36 (dever de informar na publicidade), art. 46 (ineficácia em relação ao consumidor, das disposições contratuais não informadas), art. 51 (abrangência, pelo conceito de cláusula abusiva, daquelas que não foram suficientemente informadas ao consumidor), 52 e 54 (deveres específicos de informação nos contratos), todos do CDC.


Conforme o CDC, a informação deve ser clara e adequada: arts. 12, 14, 18, 20, 30, 33, 34, 46, 48, 52 e 54. A informação é elemento que afeta a essência do negócio jurídico, na medida em que a informação repassada ou requerida integra o conteúdo do contrato (arts. 30, 33, 35, 46 e 54). Por outro lado, se falha a informação, ela representará a falha (ou vício) na qualidade do serviço ou produto oferecido (arts. 18, 20 e 35 do CDC).


Entende-se que a cláusula ou prática que considere o silêncio do consumidor como aceitação (a exemplo da previsão do art. 111 do CC), mesmo com falha da informação, não pode prevalecer (arts. 24 e 25), acarretando a nulidade da cláusula no sistema do CDC (art. 51, I)[9].


Do V Congresso Brasileiro de Direito do Consumidor/Brasilcon, pode-se extrair algumas conclusões: Nos contratos relacionais, o dever de informação adequada perdura por toda a performance ou execução contratual; os fundamentos legais para obrigar à informação adequada nos contratos relacionais de consumo residem nos arts. 6º, III e V; 20§ 2º, 31, 36, 37, 46 e 66.  Nesta modalidade de contratos, é dever do fornecedor/prestador, manter o consumidor adequada e permanentemente informado sobre todos os aspectos da relação contratual, especialmente aqueles ligados aos riscos, qualidade do produto ou serviço, ou qualquer outra informação relevante para a sua decisão de consumo, durante todo o período em que perdurar a relação contratual (MARQUES, 2007, p. 57).


Cumpre mencionar um desdobramento importante do dever de informação: dele poderá emergir a responsabilização solidária e subsidiária do comerciante. Antônio Herman Benjamin lembra que apenas três são as hipóteses em que esta responsabilidade se dá: impossibilidade de identificação do responsável principal; ausência, no produto, de identificação adequada do responsável principal, e por fim, a má conservação dos produtos perecíveis. As duas primeiras hipóteses claramente nos remetem ao direito à informação. Vide art. 13, I e II, o qual deve ser lido em conjunto com o art. 31 do CDC (exemplo de produto mal identificado: lata de conservas escrita em língua estrangeira) (in MARQUES, 2007, p. 133).


Deve-se destacar a noção de oferta emergente a partir do CDC: art. 30. Toda informação, mesmo a publicidade, suficientemente precisa, constitui uma oferta vinculando o fornecedor. Ou seja, se constitui em proposta contratual. (MARQUES, 2006, p. 724). Assim, qualquer informação ou publicidade que precisar, por exemplo, os elementos essenciais da compra e venda (objeto e preço) será tida como oferta vinculante.


Uma questão importante é pensar a publicidade como meio de informação. (MARQUES, 2006, p.779). A publicidade como promessa negocial de qualidade do produto.


Analisando o art. 35, Claudia Lima Marques pondera que uma interpretação bastante razoável seria no sentido de perceber a inclusão dos termos apresentação e publicidade[10] ao lado do termo oferta, como criando uma obrigação legal, unilateral, de fazer, de cumprir o prometido a toda uma massa de consumidores. O artigo em tela prevê, de fato, que o consumidor poderá exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da publicidade. Assim, pode-se destacar o efeito saneador do mercado, que teria tal interpretação, na medida em que ações coletivas exigindo o cumprimento de promessas feitas em publicidades podem ser ajuizadas. Com isso não seria preciso recorrer ao art. 37 (que trata da publicidade enganosa). Desse modo, a informação falsa caracterizaria tanto um ato ilícito (art. 37) quanto uma promessa unilateral, uma obrigação de fazer exigível legalmente (art. 35). (MARQUES, 2006, p. 782). 


Uma norma que considero fundamental é a do art. 36 do CDC: esta norma preserva a informação, como direito do consumidor, na medida em que veda o disfarce da publicidade. O consumidor tem direito de saber que a mensagem é publicitária. Esta regra, porém, não implica em vedação à prática do merchandising. A solução, que se colhe junto a Herman Benjamin, vai no sentido de impor aos espetáculos (televisivos ou teatrais, etc.), a prévia informação ao público, de que ali ocorrerá uma situação publicitária. (in: MARQUES, 2006, p. 786).


Lembre-se que para assegurar o novo dever de informação sobre as qualidades e características do produto, o sistema do CDC inclui a falta ou falha na informação como vício do produto ou serviço. Vide art. 18. O art. 20, inovando no direito brasileiro, conecta a falha/falta de informação ao vício do serviço[11].


Assim, no art. 18 e ss., o CDC trata dos vícios por inadequação, que são os antigos vícios redibitórios do CC (art. 441). A diferença para com o art. 35, é que os vícios por inadequação pressupõem um vínculo contratual originário entre consumidor e fornecedor (apesar da responsabilidade solidária para com os demais integrantes da cadeia de produção).


Os vícios por inadequação devem ser distinguidos dos vícios por insegurança (art. 12 e ss.). Estes últimos pertencem a um regime extracontratual, fundado na responsabilidade objetiva, visando a reparar os danos extracontratuais ou à saúde do consumidor. Já nos vícios por inadequação, a responsabilidade, no que se refere à reparação, concentra-se no objeto da relação contratual (produto ou serviço).


Quanto à informação sobre o conteúdo do contrato, urge pontuar o seguinte. No art. 46[12] do CDC temos, tecnicamente, um dever de oportunizar o conhecimento sobre o conteúdo do contrato. Analiticamente, podemos incluí-lo no campo dos deveres de informação. A sanção imposta é a desconsideração da manifestação de vontade do consumidor, que não teve referida oportunidade. Ou seja, desconsidera-se a aceitação. O contrato celebrado nestes termos é tido como inexistente. Claudia Lima Marques traça um paralelo com a regra da oferta, que continua a obrigar o fornecedor. A sanção prevista no art. 46, assim, nos traz a idéia de que mesmo um contrato formalizado, acabado, pode vir a ser declarado inexistente em face de um defeito de informação na fase pré-contratual. Esse artigo é, normalmente, utilizado em conjunto com o art. 54 (que trata especificamente dos contratos de adesão). A decisão racional, de contratar, é o que busca o art. 46 (inclusas aí as informações quanto ao preço, taxas de juros, condições e garantias oferecidas). (MARQUES, 2006, p. 793).


Pode-se ponderar que o direito à informação não possui conteúdo dado a priori. É necessário, ao revés, que se verifique nos contratos e relações jurídicas de consumo respectivas, quais as informações substanciais cuja efetiva transmissão ao consumidor constitui dever intransferível do fornecedor. Não basta transmitir dados, é necessário ter o cuidado para constatar se o consumidor está em condições de entender. Isto especialmente porque o dever de informação incide de forma combinada com o de colaboração e de respeito à contraparte. (MIRAGEM, 2008, p. 122).


No caso da informação pré-contratual, o ponto fundamental é a essencialidade da mesma para determinar um consentimento informado. Assim, as informações pré-contratuais deverão incidir em todos os aspectos relevantes para uma tomada de decisão. Mesmo informações que venham a levar o destinatário a se afastar do negócio, devem ser transmitidas, sob pena de incidir-se no chamado dolo reticente: celebrar um contrato, retendo determinadas informações.


Em linhas gerais, poderíamos esboçar a ideia de que a informação a que tem direito o consumidor é aquela que se baseia na boa-fé e que implique em viabilizar, à outra parte, o conhecimento preciso do (s) objeto (s) do contrato (características essenciais), bem como suas condições jurídicas de aquisição (preço e condições), em uma seqüência lógica. Trata-se da construção de uma relação jurídico-reflexiva. Este dever é acentuado mais em alguns do que em outros contratos/serviços, como os contratos de grande envergadura econômica, em contraposição a outros que não necessitam de maiores dados, como em coisas de fácil uso e acesso.


Mas em todas as situações, a informação deve guardar duas características primordiais: adequação e veracidade. Adequação[13]: nos remete à finalidade. Será adequada a informação apta a atingir os fins que se pretende alcançar com a mesma. No caso, o fim primordial é o esclarecimento do consumidor.


Mas como podemos perceber de tudo o que até aqui se expôs, o dever de informação, além de ter como fonte última a boa-fé objetiva, também decorre de toda uma normatividade específica, a ele referida. Assim, da violação do dever de informar, decorrem vários efeitos jurídicos, no âmbito do direito do consumidor. Daí a necessidade de atentar às sanções previstas em tais normas. É mister verificar as circunstâncias e qual o objeto da informação não prestada ao consumidor (lembrando o caráter de circunstancialidade, anteriormente referido).


5. O dever de informar a partir do Código Civil


No âmbito do Código Civil (CC), destaco a previsão do art. 422, a qual contempla uma das funções, teoricamente reconhecidas, da boa-fé objetiva, qual seja, a função de criação de deveres de conduta. Assim, o dever de informar está associado à ideia de lealdade, que acompanha a noção de boa-fé, como um de seus desdobramentos. Parece-me que a própria característica do dever de informação, conforme acima descrevi (não ser dotado de conteúdo a priori, nos exigindo uma aferição no caso concreto), se coaduna com o perfil da boa-fé objetiva, que é justamente uma cláusula geral, o que significa, ser portadora de uma série de características, que civilística com tanta precisão já explorou (vide C. W. Canaris, por exemplo).


Nas figuras da responsabilidade pré-negocial (ou pré-contratual), da culpa post pactum finitum e da responsabilidade pós-negocial, vamos perceber uma ampliação da tutela das relações obrigacionais. Assim, especificando os deveres de conduta que, a partir da boa-fé objetiva, podemos consubstanciar tais figuras, podemos citar: informação de riscos descobertos após a celebração do pacto, o dever de informar o parceiro contratual sobre alguma circunstância que poderá implicar a invalidade do negócio, a prestação de informações verdadeiras e completas, etc. (USTÁRROZ, 2010, p. 54)


Ainda pelo prisma da boa-fé, tem-se sustentado a desnecessidade da questão da escusabilidade ou não do erro (este é o parecer da I Jornada de direito Civil do Conselho da Justiça Federal). (MIRAGEM, 2005, p. 43). No CDC, por exemplo, se dispensa a imprevisibilidade, exigindo-se apenas a superveniência do fato (art. 6, V). Pode-se dizer que aqui estamos diante de um esforço teórico no sentido de consagrar a tese do princípio da confiança, que tem sido aclamado como princípio base da própria boa-fé, segundo alguns (vide Claudia Lima Marques). Neste sentido, tem-se sustentado uma aproximação da noção de imprevisibilidade (constante nos artigos 317 e 418 do CC) àquilo que se tem reconhecido como defeito de erro do negócio jurídico, cujo caráter escusável ou não, quando exigido, se dá em acordo com as circunstâncias particulares do indivíduo que manifestou a vontade viciada, ou da cognoscibilidade de quem a recebe.


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O art. 421 do CC, ao consagrar a função social dos contratos, juridifica a necessidade de consideração dos interesses do alter, na medida em que há a necessidade de atentar-se ao dano social sofrido pela comunidade e pelos próprios contratantes em decorrência do inadimplemento. Em suma, as conseqüências do contrato ganham centralidade a partir deste dispositivo. Inegavelmente, uma pactuação calcada num déficit informacional, poderá gerar efeitos extremamente nefastos a ao menos uma das partes. Mas para além das partes, a função social dos contratos tem sido aclamada como a cláusula geral que consumou o envilecimento definitivo do princípio da relatividade dos contratos. Como pondera Jacques Ghestin, Podemos constatar que os desenvolvimentos contemporâneos estenderam as conseqüências propriamente jurídicas dos contratos em relação a terceiros e que a idéia de que uma sociedade seria constituída de uma soma de relações inter-individuais…não é mais defensável (tradução livre) (GHESTIN, 1992, p. 10). Assim, o dever de informação é fundamental também para a não-causação de danos à relações jurídicas outras, circundantes à relação contratual em questão.


Assim, a função social, que representa, nas palavras de Miguel Reale, a consagração do princípio da socialidade, nos remete, do mesmo modo, ao paradigma da confiança (portador de um potencial considerável de socialidade, como resta claro, inclusive da contribuição de Nicklas Luhmman). Como acentua Paulo Nalin (NALIN, 2006, p. 148):


“A transparência está em harmonia e consagra a confiança negocial, pois, quando o predisponente não informa com adequação os termos da avença, levando o aderente a assumir deveres contrários aos seus interesses patrimoniais e existenciais, caracteriza-se a violação da confiança depositada no outro e na sua postura contratual.”


Urge lembrar, ainda, as possibilidades abertas pela perspectiva do diálogo das fontes, em especial na sua modalidade diálogo sistemático de complementariedade, pelo qual uma das leis complementa a aplicação da outra. Assim, tem-se sustentado a possibilidade de utilização do CDC de forma complementar, a partir de situações concretas, na aplicação do próprio Código Civil. Em matéria de dever de informação, pode-se ter aí um horizonte ampliado, na medida em que a normatividade consumerista é significativamente mais detalhada neste item[14].


Conclusão


Uma abordagem holista nos permite dimensionar os fundamentos do dever de informação, presente no direito privado contemporâneo. Esta perspectiva implica a contemplação da relação obrigacional a partir de sua totalidade (ou, seu conjunto). É a partir deste prisma que a noção de boa-fé objetiva ganha sentido no âmbito da reflexão jurídica. Aliás, a noção que lhe é mais elementar, de confiança, é evidenciada, e percebida como geradora de conseqüências. A partir daí, a delimitação sociológica dos espaços de socialização, como instâncias nas quais a aproximação intersubjetiva (viabilizadora do contato social), assume importância inegável, posto que reposiciona a confiança como elemento nuclear do próprio mundo jurídico (já que este só tem sentido quando pensado a partir das relações humanas – logo, pressupõe a intersubjetividade). Estas são as premissas para pensarmos os chamados deveres anexos (derivados da boa-fé objetiva), dentre os quais perfila-se o dever de informação.  


A informação, que na sociedade contemporânea implica em posição de poder, sendo que este último passa a ser visto como algo relacional, ou líquido, para usarmos a metáfora de Bauman. Esta característica pode ser estendida à informação.


A sociedade contemporânea convive com a tensão do risco (BECK, 1992). Desse modo, a informação acerca dos perigos do produto sobreleva de importância, ao mesmo tempo em que nos sinaliza os impasses que ainda restam em aberto: vide questão dos transgênicos, que nos remete ao duplo fundamento para o direito è informação – segurança e liberdade de escolha. (MARQUES, 2006, p. 776).


 


Referências bibliográficas

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Notas:

[1] Lembremos a asserção de Hegel, de que se olharmos apenas para as árvores não enxergaremos a floresta.

[2] Interessante a ponderação feita por Benatti, de que os deveres pré-contratuais encontram sua fonte no contato social que nasce entre as partes com a finalidade de preparar o conteúdo do futuro contrato (BENATTI, 1970, p. 29).

[3] Fundamentando a percepção da relação como um processo de cooperação, Judith Martins-Costa insere a boa-fé na condição de marco do giro epistemológico pelo qual passa o direito privado, saindo de uma perspectiva na qual o foco recaia sobre a causa da relação obrigacional (que engendrou a Teoria da Vontade) para uma perspectiva que foca os efeitos de dita relação. E aí chegamos à valorização dada à legítima confiança que despertamos nos outros por nossa conduta. 

[4] Pondere-se, como bem lembra Daniel Ustárroz, que a ausência da previsão normativa da boa-fé objetiva no Código Civil de 1916 não impediu que alguma doutrina e jurisprudência iniciasse um processo de construção, no direito brasileiro, com destaque para Clóvis do Couto e Silva (USTÁRROZ, 2010, p. 22)

[5] No dizer de Rubén Stiglitz, princípios morais como a boa-fé, a lealdade, a honestidade na atuação/execução, a cooperação, a sinceridade, o auxílio e a proteção à parte fraca ou vulnerável, se constituem em diretivas com fundamento ético, e são acolhidas pelo direito como deveres positivos, acessórios aos efeitos principais, razão pela qual são deveres jurídicos (STIGLITZ, 1997, p.12).

[6] Informar é comunicar, compartilhar o que se sabe de boa-fé, é cooperar com o outro. Trata-se de é exteriorizar, compartilhar. Ao mesmo tempo que a informação é um estado subjetivo (o saber ou o não saber), a informação é um processo interativo (que se denomina normalmente de comunicação). Ao mesmo tempo, informação é conteúdo: dados, saberes, imagens, sons, palavras, etc. Acima de tudo, informação é um direito (MARQUES, 2006, p. 772).

[7] Conforme Antonio Orti Vallejo, classificam-se as informações pré-contrauais em dois grupos: 1. as que se referem à prestação objeto do contrato; 2. as que se referem às condições jurídicas de aquisição de um produto ou contratação de um serviço (VALLEJO, 1992). 

[8] Num plano constitucional, podemos citar, exemplificativamente, sua consagração no art. 51.1 da Constituição espanhola e no art. 5, XIV da CF brasileira.

[9] Mas Claudia Lima Marques entende que mesmo no sistema geral do CC também podemos chegar à conclusão da nulidade: art. 424 do CC.  (MARQUES, 2007, p. 57).

[10] Na ausência de contrato, Bruno Miragem assevera que, a despeito do caráter mais difuso da informação, a mesma deve manter-se rente à precisão. Este é o caso da publicidade. Na medida em que esta também conta com eficácia vinculativa de natureza contratual (art. 30), deverá oferecer informação precisa, clara e objetiva (art. 31). Deve apresentar-se ao consumidor com seu caráter promocional e publicitário em acordo com o princípio da identificação (art. 36). Ou seja, não pode o fornecedor ocultar sua publicidade, apresentando-a como informação desinteressada. (MIRAGEM, 2008, p. 123).

[11] Interessante consultar, a respeito, a jurisprudência (STJ) acerca da solidariedade entre os fornecedores: produto da confiança criada pela aparência da publicidade.

[12] Menciona o art. 46: a informação deve ser dada e deve ser inteligível. O autor defende que este artigo permite que definamos uma espécie de abusividade (formal): cláusulas abusivas em razão da qualidade do consentimento. Isto porque o dispositivo conduz à ineficácia do contrato celebrado em sua afronta. (MIRAGEM, 2008, p. 179). 

[13] Bruno Miragem entende que uma informação adequada, em uma relação contratual, deve conter: as condições da contratação; as características dos produtos ou serviços objeto da relação de consumo, eventuais corolários e riscos da contratação.

[14] A respeito da relação dialogal entre CDC e CC, Claudia Lima Marques possui vasta construção teórica (vide: MARQUES, 2003).


Informações Sobre o Autor

Marcos Cáprio Fonseca Soares

Doutorando em Direito e mestre em Sociologia pela UFRGS. Advogado, sociólogo e pesquisador


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