Os Estados, entendendo que a restituição imediata e
preferencial prevista no art. 150, §7º, da Constituição Federal, somente se
daria quando o fato gerador presumido não ocorresse, não alcançando situações
nas quais o mesmo ocorresse com valor distinto do previsto, firmaram o Convênio
ICMS 13/97, cuja ementa é “harmoniza procedimento referente a aplicação do
§7º, artigo 150, da Constituição Federal e do artigo 10 da Lei Complementar
87/96, de 13.09.96”, o qual dispõe, em sua Cláusula Segunda, abaixo transcrita,
o não cabimento de restituição dá-se a efetiva a operação em valor inferior ao
presumido.
“Cláusula segunda. Não caberá a restituição ou
cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação subseqüente à
cobrança do imposto, sob a modalidade de substituição tributária, se realizar
com valor inferior ou superior àquele estabelecido com base no artigo 8º da Lei
Complementar 87, de 13 de setembro de 1996”.
A Confederação Nacional do
Comércio–CNC adentrou com Ação Direta de Inconstitucionalidade–ADI, alegando a
existência, no dispositivo acima transcrito, de afronta à Constituição Federal.
O Pleno do Supremo Tribunal Federal
– STF, julgando Medida Cautelar em Ação Direta de Inconstitucionalidade onde se
questiona a legalidade da cláusula 2ª do Convênio ICMS 013/97, deferiu a
suspensão cautelar da eficácia da respectiva cláusula que, a título de
disciplinar o regime de substituição tributária, estabeleceu a impossibilidade
de restituição ou de cobrança complementar do ICMS quando a operação ou prestação
subseqüente à cobrança do imposto se realizar em valor inferior ou superior ao
antecipadamente estabelecido, reconhecendo, à primeira vista, a ofensa ao §7°
do art. 150 da Constituição Federal.
E nem poderia ser de forma diversa,
visto que, segundo o relator, Min. Ilmar Galvão, em seu voto na ADI acima
mencionada, “Salta aos olhos que o CONFAZ conferiu interpretação literal ao
texto da norma do §7º do art. 150 da CF, ao prever a restituição do imposto
pago tão-somente na hipótese de inocorrência da operação subseqüente, ou quando
for esta realizada sob regime de isenção, dispensando-a nas hipóteses,
supostamente mais freqüentes, de operações posteriores por valores abaixo ou
acima do valor da base de cálculo presumida. Ao fazê-lo, é fora de dúvida que desnaturou,
por completo, a norma do referido parágrafo 7º, que tem por essência assegurar
a pronta restituição do tributo recolhido por antecipação e que, eventualmente,
venha a mostrar-se indevido, o que, obviamente, ocorre não apenas na hipótese
da cláusula primeira, mas também na da cláusula segunda que, por isso, não pode
subsistir.”
Todavia, em uma reviravolta
surpreendente, o Supremo Tribunal Federal, julgou, quanto ao mérito, a mesma
ADI como improcedente. Desta vez, o relator, Min. Ilmar Galvão, argumentou que “não
havia interesse jurídico em verificar posteriormente o tributo pago a maior ou
a menor porque a finalidade do instituto da substituição tributária, por meio
da presunção de valores, é justamente tornar viável o sistema de arrecadação do
ICMS… Seria uma dificuldade enorme calcular o valor de cada operação
realizada pelos inúmeros contribuintes”
Argumentou o Min. Moreira Alves, que
o art. 150, §7º “não trata de garantia máxima, mas de garantia de existência
do sistema”.
Ou seja, a título de “garantia do sistema”,
permite-se o que talvez venha a ser o maior confisco da história brasileira,
visto que, no atual entendimento do Supremo Tribunal Federal, os Estados podem
cobrar antecipadamente imposto a título de substituição tributária, sob uma base
estipulada por eles, sem que haja a possibilidade de restituição em caso de as
efetivas operações de venda ao consumidor se darem por valores inferiores ao
presumido.
Indo um pouco mais adiante, já que os Estados não
estarão obrigados à restituição de diferenças decorrentes de fatos geradores
ocorridos a menor, encontra-se “resolvido” o problema de sua adequação à Lei de
Responsabilidade Fiscal, basta que cobrem valores absurdos, a título de
substituição tributária, situação que infelizmente já ocorre, como bem colocado
pelo Min. Marco Aurélio, presidente do STF, segundo quem “dificilmente o
Estado presume um valor inferior”.
O art. 150, §7º, segundo o Min. Carlos Velloso, foi
concebido para ser “uma garantia constitucional ao contribuinte e uma
verdadeira limitação ao poder de tributar do Estado, …para dar máxima
eficácia a essa garantia constitucional, o excesso cobrado do substituto
tributário também teria que ser restituído.”
Todavia, se o art. 150, §7º, foi algum dia uma
garantia em caso de excesso de cobrança a título de substituição tributária,
encontra-se agora o contribuinte completamente desamparado.
A alternativa que restou, aos contribuintes, para
minimizar eventuais abusos por parte da Administração Tributária é a de
fiscalizá-la em relação aos critérios adotados quando da fixação da base de
cálculo de ICMS para fins de substituição tributária.
Tradicionalmente compete, à Administração
Tributária, a fiscalização dos contribuintes, de modo a evitar ou minimizar
sonegação de tributos, todavia, o julgamento do Supremo Tribunal Federal deixou
aos contribuintes o papel de agentes fiscalizadores da Administração
Tributária.
E de absurdo em absurdo caminha assim o sistema
tributário brasileiro.
Se o Direito é, como afirmam os mais diversos
doutrinadores, reflexo da evolução do homem, a tomar-se por base o caminho que
vem trilhando o Direito Tributário no Brasil, possível concluir-se que o ser
humano vem em um processo de involução e que Darwin talvez estivesse errado.
Informações Sobre o Autor
Dênerson Dias Rosa
Consultor Tributário, ex-Auditor Fiscal da Secretaria da Fazenda do Estado de Goiás e sócio da Dênerson Rosa & Associados Consultoria Tributária.