Uma omissão possível?

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– ou alguém que possa ter “acobertado” (ou “transigido” com…) prática de crime de racismo tem “reputação ilibada” para ser ministro do Supremo?


Resumo: questiona-se no artigo a presumida “reputação ilibada” de candidato  ao cargo de ministro do STF – Supremo Tribunal Federal,possivelmente omisso  na apuração de suposta prática do crime de racismo,no âmbito da Escola da AGU, em Brasília.


Por ter requerido rigorosa e inescapável apuração de suposta prática do crime de racismo contra uma servidora, em julho de 2007, nas dependências da Escola da AGU, em Brasília, recebi como resposta a instauração, no âmbito da Advocacia-Geral da União, de processo administrativo disciplinar contra a minha pessoa, este mesmo procurador federal com mais de década e meia de casa, então, e que desde que assumira a alta responsabilidade, com a elevada atribuição constitucional de representar o Estado brasileiro, judicial e extrajudicialmente – art.131, caput, da Carta Política –, se destacara, nos meios jurídicos, pela intransigente defesa da ética pública e dos interesses institucionais cometidos ao cargo por mandato legal.


Mas a inusitada e despropositada resposta não ficaria perdida ali nos meandros das intrínsecas e peculiares contradições do processo administrativo disciplinar – eis que desprovido das plenas garantias previstas no processo judicial, e assim tanto se presta à apuração de ilícitos administrativos, se conduzido com a boa técnica e a efetiva transparência em seus objetivos, quanto às mais deslavadas manipulações políticas e corporativas, dentre outras, não raro algumas operadas por meios criminosos (não se assegura aqui que seja o caso do apontado processo movido contra este articulista), como os do falso testemunho (Art.342, caput, do Código Penal), o da coação (Art.344, caput, do Código Penal), o do favorecimento pessoal (Art.347, caput, do Código Penal), etc.


Com efeito, a resposta ao regular pedido de esclarecimentos e providências quanto à suposta prática do crime de racismo nas dependências da Escola da AGU teve o seu absurdo final, seguinte: após tomar a iniciativa, em 12 de maio de 2008, de informar, diretamente e por escrito, ao advogado-geral da União, essa e outras questões relacionadas às suas atribuições no exercício do cargo (para as quais entendeu de situá-las no contexto dos grandes e inequívocos problemas que envolvem as carreiras jurídicas da AGU), o procurador federal autor deste artigo foi comunicado, por expediente público interno, de sanção contra a sua pessoa, consistente de suspensão, em cerca de cinco (5) dias, do exercício deste cargo.        


Enquanto procurador federal, esta foi a primeira – e quiçá seja a última, por isto a única, espera-se – sanção que este articulista sofreu, mas como homem público não foi a primeira, como toda a mídia, aqui e alhures, bem e amplamente registrou  no ano de 2006, quando o mesmo concorria para o Senado da República, pelo PDT do Distrito Federal, e viu-se, de repente, afastado da disputa por uma fraude promovida na ata da convenção partidária – e assim registrada pelo Ministério Público Federal/Eleitoral –, ilícito que lhe retirou a candidatura. Injustamente suspenso por três (3) meses, pelo PDT, durante a campanha eleitoral, para ser excluído das eleições – após impugnar, por irregularidades na campanha, o candidato à Presidência da República pelo mesmo partido, o senador Cristovam Buarque –, o autor deste artigo questionou essa suspensão na Justiça e venceu a questão contra o PDT, três (3) anos depois, como destacou o jornal Correio Braziliense, em ampla matéria, na edição do dia 28 de julho deste ano de 2009.


Ao contrário do ocorrido com o processo de suspensão partidária no PDT (junto ao qual, aliás, este articulista já promoveu a sua desfiliação, oportuna e espontaneamente, após 26 anos de militância), aqueles cinco(5) dias de afastamento do cargo de procurador federal por um ato que vem sendo igualmente questionado na Justiça – o autor deste artigo move Ação Anulatória de Ato Administrativo, c/c Indenização por Danos Morais e Materiais contra a União, no foro federal de Brasília – DF, em tramitação na 4ª. Vara Federal (processo Nº2008.34.00.019051-1), embora decorrente de um processo interno tão absurdo quanto o outro, não têm qualquer relevância política, por óbvio, mas o suposto crime de racismo escondido pela referida sanção administrativa, tem SIM, além de relevância ética e moral, ainda mais quando se trata de assunto tempestivamente levado ao conhecimento de um agora candidato ao cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal, a mais alta Corte de Justiça do país.


Ora, já é bastante discutido, na esfera pública – especialmente no âmbito da mídia –, o “notável saber jurídico” do advogado José Antonio Dias Toffoli. Quanto à exigência constitucional de “reputação ilibada” de um candidato a uma das onze (11) vagas de Juiz do Supremo Tribunal Federal, essa não pode ser erigida sob a dúvida, ainda mais sob a dúvida em torno de ter o mesmo tido ou não conhecimento da suposta prática de racismo (primeiramente, este articulista tem prova material, já apresentada nos autos do retromencionado processo judicial, de que levou o assunto ao conhecimento do Advogado-Geral da União, e depois, sim, pois a última – a suposta prática de racismo – ainda não foi devidamente apurada) nas dependências da Escola da AGU, que nada apurou sobre o assunto. Ao inverso, suspendeu do exercício de suas atribuições legais, aquele que requereu a apuração – este articulista. Bizarro, para dizer o mínimo, pois ali ainda há o grave aspecto de ocorrência hipotética de um possível crime, o previsto no art.319 do Código Penal – a prevaricação.


Logo mais, em exame de mensagem/proposta enviada pelo Presidente da República, o Senado Federal estará exercendo a sua competência constitucional, prevista no art.52, inciso III, alínea “a”, e assim analisará o nome do advogado José Antonio Dias Toffoli para o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal. Espera-se que assunto tão grave, como a dúvida em torno de seu conhecimento desse assunto, não venha escapar da argüição dos eminentes senadores que irão sabatiná-lo (no âmbito do processo judicial retromencionado, o requerido depoimento do mesmo sobre o tal assunto foi indeferido em primeira instância, mas o agravo de instrumento contra essa decisão foi retido por decisão do Desembargador-Relator do processo, para eventual/possível apelo).    


Desde os anos noventa, quando o Poder Judiciário passou a protagonizar a afirmação do Estado Democrático de Direito no país, na condição de intérprete maior da nova ordem jurídica implantada pela Carta Política vigente, este articulista vem questionando a legitimidade daquele poder (com artigos e ensaios publicados nas mídias, impressa – revistas da AGU e da Procuradoria-Geral do INSS, com destaque – e virtual – JUSNAVIGANDI, CONJUR, OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, ÂMBITO-JURÍDICO, etc. –, livros – como exemplo, Subsídios à Reforma do Judiciário, opúsculo feito em parceria com o procurador federal Marc Cunha, lançado em 2001, e que despertou certo interesse da área jurídica durante a discussão da Reforma do Judiciário –, proposições legislativas – em destaque, a PEC Nº526/2006, da Câmara dos Deputados, em parceria com o também procurador federal e ex-deputado federal Carlos Mota), à luz do inafastável princípio republicano da transitoriedade do poder.


Permeando sempre a tese que sustenta a ilegitimidade do Poder Judiciário brasileiro, pela interpretação sistemática da Carta Política e como decorrência do princípio inscrito no parágrafo único do art.1º desta, este articulista defende a eleição direta dos juízes, com a manutenção do concurso público de provas e títulos, que substituirá os partidos políticos e as suas convenções, para um mandato mínimo de oito (8) anos – renovável até a compulsória –, após o estágio probatório do referido agente político. Cogita-se de vir a ser o concurso público a única condição para o exercício da magistratura, em qualquer instância.   


Na linha de entendimento acima exposta, este articulista sustenta, ainda, ser a garantia constitucional da vitaliciedade instituto absolutamente em desacordo com o princípio republicano da transitoriedade do poder, e embora copiada da Constituição dos Estados Unidos, ela pode ser vista também como relíquia da monarquia, uma peça de museu, portanto, esdrúxula e ridícula para os dias atuais. Desnecessária, assim, já que dela o juiz prescinde, após o vigente Estado Democrático de Direito.       


Inobstante as questões acadêmicas postas acima, o fato concreto é que hoje o juiz goza da vitaliciedade. Assim, se a Carta Política não for alterada quanto a esta, e na hipótese de o advogado José Antonio Dias Toffoli ter seu nome efetivamente aprovado pelo Senado Federal, o mesmo permanecerá no cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal por quase trinta (30) anos, já que a compulsória, aos setenta(70), só lhe chegará em 2037, quando nenhum dos seus pares de origem – ou de logo mais, talvez… – estará mais lá, situação idêntica à que ocorreu com o ex-ministro Moreira Alves, indicado em 1973 pelo então Presidente Emílio Garrastazu Médici, no período mais duro e cruel da ditadura militar.             


Se indaga, então: alguém que poderá ficar tanto tempo no Supremo, como o ainda advogado José Antonio Dias Toffoli, poderá carregar consigo a suspeita de um dia, direta ou indiretamente ter concorrido para o acobertamento da prática de um possível crime de racismo no âmbito da Advocacia-Geral da União? 


A indagação deste articulista, imediatamente acima, não é feita não na sua condição de procurador federal, por óbvio, nem mesmo na sua condição de articulista e escritor, mas enquanto cidadão brasileiro que não se furta de buscar debater, seja no campo do direito ou na esfera pública, as grandes questões nacionais, que principiam também por assuntos como este, ora chamado à reflexão, para a ação possível e legítima.



Informações Sobre o Autor

Láurence Ferro Gomes Raulino

Procurador federal junto à Procuradoria Regional Federal da 1ª. Região, em Brasília – DF


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