Assim como as pessoas jurídicas de
direito privado, no Brasil, têm no estatuto o
instrumento para reger suas relações jurídicas, no campo do Direito
Internacional Privado as pessoas jurídicas estrangeiras possuem, do mesmo modo,
seu estatuto pessoal. No âmbito do Direito pátrio, o art. 19 da antiga Lei de
Introdução ao Código Civil (Lei no 3.071, de 1o
de janeiro de 1916) já reconhecia às pessoas jurídicas estrangeiras a
possibilidade de atuar em território nacional. A atual legislação brasileira
reconhece personalidade jurídica às associações, sociedades civis e fundações
estrangeiras, desde que estas tenham sido regularmente constituídas segundo o
que dispuser a lei de seu país de origem acerca da criação de pessoas
jurídicas. Por conseqüência, a matéria relativa à formação da
personalidade, capacidade jurídica e denominação
regem-se por aquelas leis, e
não pela lei brasileira. É esta a redação do art. 11 da Lei de Introdução ao
Código Civil Brasileiro (Decreto-Lei no 4.657, de 4 de
setembro de 1942): Art. 11 As
organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as sociedades e as
fundações, obedecem à lei do Estado em que se constituírem.
§ 1o Não poderão, entretanto, ter no Brasil filiais, agências ou estabelecimentos antes de serem
os atos constitutivos aprovados pelo Governo brasileiro, ficando sujeitas à lei
brasileira. Existem dois modos de uma pessoa jurídica estrangeira necessitar de
atuar em nosso país: ou para a prática de um ato isolado, ou para aqui se
fixar, mantendo uma sede de seus negócios. As duas situações recebem tratamento
diverso. O professor Amilcar de Castro, reconhecido
autor de Direito Internacional Privado, publicado pela Forense, com a clareza
que lhe é peculiar, esclarece muito bem o tema: Atualmente, pois, constituída
uma sociedade, ou uma fundação, no estrangeiro, quatro podem ser as pretensões
de seus dirigentes, no Brasil: a) deslocar a sede para o Brasil, a fim de vir
aqui funcionar; b) conservar a sede no estrangeiro e ter no Brasil
filiais, agências ou estabelecimento; c) conservar a sede no estrangeiro
e exercer atividade no Brasil, sem manter aqui filial, agência ou
estabelecimentos; ou então d) apenas recorrer aos tribunais brasileiros. Nas duas primeiras hipóteses, deverão antes fazer
aprovar os atos constitutivos das organizações pelo governo, e ficarão sujeitas
às leis brasileiras. Nas duas últimas hipóteses, não há necessidade de
qualquer aprovação ou reconhecimento por parte do governo brasileiro; e
continuam a obedecer à lei do Estado em que se constituíram, podendo exercer
aqui atividade, desde que não seja esta contrária à ordem pública. Com a
autorização, não perde a entidade o seu caráter de estrangeira. Quaisquer
prerrogativas conferidas às sociedades nacionais, que foram além do regime
comum de direito privado, somente serão extensíveis às sociedades ou fundações
estrangeiras autorizadas se houver reciprocidade de tratamento nos seus países
de origem para as sociedades ou fundações brasileiras, ressalvados os casos em
que a lei brasileira não permitir, expressamente, a concessão da vantagem ou
prerrogativa (como é o caso, por exemplo, da declaração de utilidade pública
federal, disciplinada pela Lei no 91,
de 28 de agosto de 1935, cujo art. 1o, interpretado a contrario
sensu, veda a declaração para sociedades,
associações ou fundações constituídas no estrangeiro). Em observância clara ao
§1o do art. 11 da Lei de Introdução ao Código Civil, os atos
constitutivos das organizações destinadas a fins de interesse coletivo, como as
sociedades e as fundações, devem ser aprovadas pelo governo brasileiro. Para tanto, necessário se faz o uso de
requerimento subscrito pelo presidente, representante legal ou procurador da
associação, sociedade ou fundação, dirigido ao Excelentíssimo Senhor Presidente
da República Federativa do Brasil, no qual, após a devida qualificação, o
representante legal da entidade solicita autorização para o seu funcionamento
no território brasileiro. Faz-se necessária a apresentação, na Divisão
de Outorgas e Títulos do Ministério da Justiça, juntamente com o requerimento
de autorização, da documentação da entidade que comprove sua regular existência
e seu regular funcionamento. São eles: 1. cópia do inteiro teor do Estatuto e,
se houver, da escritura da instituição; 2. relação, mediante ata de eleição, dos membros
da Diretoria e dos conselhos, com a especificação dos cargos exercidos e da
duração dos mandatos; 3. cópia da ata da Assembléia Geral que autorizou
o funcionamento da entidade no Brasil, se se tratar
de associação ou sociedade civil; 4. procuração para o representante no Brasil,
ao qual devem ser concedidos poderes para aceitar as condições em que a
autorização será concedida; 5. cópia da ata do Conselho Deliberativo ou do
Conselho Curador que autorizou o funcionamento no Brasil, se se tratar de fundação de direito privado. É importante
esclarecer que todos os documentos devem estar autenticados, na conformidade da
lei nacional da instituição requerente, e legalizados no consulado brasileiro
no local de sua sede. Deverão também ser apresentadas as respectivas traduções
para o português, feitas por tradutor público juramentado brasileiro. Por último, e não por isso sem
menor importância, urge salientar que, em se tratando de fundação, conferiu o
Direito brasileiro específico tratamento legislativo a essa pessoa jurídica,
atribuindo ao Ministério Público o papel de velar por elas, acompanhando-as e
fiscalizando-as (art. 26 do Código Civil), cabendo por certo a oitiva, no curso
da tramitação, do requerimento do Ministério da Justiça, do representante do
Ministério Público competente para autorizar o seu funcionamento e a realização
de suas atividades nos Estados-membros e/ou no Distrito Federal, tudo para que
possa previamente ter o governo brasileiro a segurança necessária de que a
fundação apresenta no seu estatuto, finalidades, órgãos e patrimônio
compatíveis e consentâneos com as entidades brasileiras e com a legislação que
as rege.
Informações Sobre o Autor
José Eduardo Sabo Paes
Promotor de Justiça no DF – Autor do livro: Fundações e Entidades de
Interesse Social – Aspectos Jurídicos, Administrativos, Contábeis e Tributários