Resumo: Questão tormentosa em nossa doutrina e jurisprudência diz respeito à suspensão dos processos criminais por sonegação, diante da opção do contribuinte por alguma forma de parcelamento do débito, popularmente indicado como REFIS, ou Refinanciamento Fiscal, que é uma forma de suspensão do credito tributário. Muito embora cada legislação concessiva do parcelamento disponha sobre tal vertente, a situação somente se materializa naquelas normas envolvendo a União, que detém competência legislativa constitucional sobre processo penal, restando, porém, dúvida se os parcelamentos outorgados pelos Estados e Municípios também teriam o mesmo efeito.
Palavras chave: crédito tributário – suspensão – processo criminal.
Abstract: Question stormy in our doctrine and case law concerning the suspension of criminal prosecution for tax evasion, given the option of the taxpayer by some form of installment debt, commonly indicated as REFIS or Refinancing Tax, which is a form of suspension of the tax credit. While each installment of the concessive legislation providing for such issue, the situation materializes only if those rules involving the Union, which has legislative jurisdiction over constitutional criminal procedure, leaving, however, doubt whether the installments granted by states and municipalities also have the same effect.
Keywords: tax credit – suspension – criminal prosecution.
INTRODUÇÃO
Inicialmente, de rigor destacar que existem decisões no STF e no STJ firmando a possibilidade da extinção da punibilidade nos crimes de “sonegação fiscal” com o parcelamento ou pagamento integral do débito fiscal, mesmo após o recebimento da denúncia.
Quanto aos parcelamentos, em regra as leis editadas pela União, dispõe sobre o sobrestamento dos eventuais processos criminais em andamento.
Nesse sentido, a Lei Federal nº 11.941, editada em 28 de maio de 2009 (conversão da MP 449/2008), instituiu um novo programa de parcelamento e de quitação de débitos tributários com remissão, redução de juros e anistia de multas, total ou parcialmente.
Tal programa abrangeu os débitos com a Receita Federal do Brasil, Procuradoria Nacional e Instituto Nacional do Seguro Social- INSS.
As principais características foram a possibilidade de os débitos vencidos até 30/11/2008 serem parcelados em até 180 (cento e oitenta) vezes ou sua quitação à vista, em ambos os casos com benefícios, e a remissão (perdão) de débitos de até R$ 10.000,00 vencidos até 31/12/2007.
Citada norma trouxe, expressamente, em seu artigo 68[1], a consignação que os eventuais processos criminais cuja matriz hipotética guardasse relação com os débitos parcelados, estariam suspensos com o deferimento do pedido, ressaltando que o beneficio guardaria relação com os termos daquela norma, corrigindo, na verdade, uma omissão do artigo 9º da Lei 10.684/2003, que gerou grande controvérsia desde sua edição.
Nesse ponto, nada de novo, eis que a União tem plena legitimidade para editar normas sobre direito processual penal. A questão que nos propomos a debater refere-se aos parcelamentos de débitos fiscais pelos Estados, Municípios e Distrito Federal, eis que tais entes federados não podem legislar sobre questões processuais, daí surgindo o seguinte questionamento: os processos criminais, por sonegação fiscal desses entes federados, poderiam ser suspensos?
A nosso ver sim. Porém, a matéria está longe de ter uma posição pacifica em tal caminho.
Nesse sentido, buscando-se uma contextualização do problema que propomos à reflexão; relembramos que, inicialmente, o crime de sonegação fiscal fora definido na Lei n.º 4.729, de 14.07.65.
No entanto, a partir da promulgação da Lei n.º 8.137, de 27.12.90; diploma seguinte que tocou o tema em comento, todos aqueles comportamentos considerados crimes de sonegação fiscal passaram a receber a denominação de crimes contra a ordem tributária. Frisando-se, destarte, que os crimes contra a ordem tributária (outrora denominados crimes de sonegação fiscais) são tipificados na Lei n.º 8.137/90.
De outra parte, o crime de apropriação indébita previdenciária fora definido, inicialmente, na Lei n.º 4.357, de 16.07.64. Posteriormente, a Lei n.º 8.212, de 24.07.91, que dispõe sobre o plano de custeio da seguridade social, definira o crime de apropriação indébita previdenciária. Entretanto, a partir da promulgação da Lei n.º 9.983, de 14.07.2000, o crime fora tipificado no artigo 168-A do Código Penal Brasileiro, mantendo-se, inobstante, sua denominação original.
Atualmente, portanto, temos que o crime de sonegação fiscal, hoje denominado crime contra a ordem tributária, está definido na Lei n.º 8.137/90 e o crime de apropriação indébita previdenciária está previsto no artigo 168-A do Código Penal.
Assim, nos artigos 1º e 2º da Lei n.º 8.137, de 27.12.90, encontramos o rol de condutas que podem constituir crime contra a ordem tributária (sonegação fiscal)[2].
Por sua vez, como já referido,o crime de apropriação indébita previdenciária, atualmente, é definido no artigo 168-A do Código Penal [3].
Tem-se, portanto, que a extinção da punibilidade dos crimes contra a ordem tributária (sonegação fiscal) era disciplinada pelo artigo 14 da Lei n.º 8.137/90, norma que estabelecia que o pagamento do débito tributário feito antes do recebimento da denúncia criminal era causa excludente da punibilidade. No entanto, tal dispositivo fora revogado pelo art. 98 da Lei n.º 8.383/91.
O art. 34 da Lei n.º 9.249/95, contudo, voltou a admitir a mencionada extinção de punibilidade.
Quanto à extinção da punibilidade do crime de apropriação indébita previdenciária, temos que o § 2º, do artigo 168-A do Código Penal[4] determina que a extinção de punibilidade ocorre nas hipótese em que o agente declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições, valores, importância ou mesmo valores, de forma espontânea, assim como, presta as informações devidas às Previdência Social.
Nesse diapasão, é importante observar que o autor de um crime contra a ordem tributária (sonegação fiscal) poderia ter extinta a sua punibilidade, desde que pagasse o débito tributário até o recebimento da denúncia.
Por sua vez, quanto ao crime de apropriação indébita, o autor do crime só teria a extinção de sua punibilidade se efetuasse o pagamento do débito fiscal até o início da ação fiscal.
Ocorre que a partir da promulgação da Lei n.º 10.684, de 30 de maio de 2003; a extinção da punibilidade, nos crimes de sonegação fiscal e apropriação indébita previdenciária, ganhou novo regramento. O dispositivo que veiculou essa inovação foi o artigo 9º [5] do referido diploma normativo.
Assim, a referida norma, que dispôs sobre um dos REFIS editado pelo Governo Federal, determinou a suspensão dos processos criminais em andamento, mediante a adesão ao parcelamento.
E por tal razão, diversos questionamentos surgiram, tais como, se o artigo 9º se aplicaria também a futuros parcelamentos, ou a parcelamentos já existentes. Vale frisar, aliás, que a discussão perdura até os dias atuais.
Entretanto, o que importa saber é se teríamos algum amparo jurídico, de caráter geral, que sustente o sobrestamento dos processos criminais diante do parcelamento dos débitos fiscais de outros entes federados.
DOS CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTARIA
Os crimes popularmente chamados de ‘sonegação fiscal”, atualmente, tem disciplina fixada pela lei 8.137/90, como já fora referido.
Trata-se de figura penal diferenciada pela sua própria natureza jurídica. Por envolver tributo, não há como se analisar o tipo criminal sem lançarmos um olhar mais aprofundado sobre a estrutura jurídica dessa relação obrigacional.
Assim, apesar de ter, como função principal, a geração de recursos financeiros para o Estado, o tributo também funciona no intuito de interferir no domínio econômico, a fim de promover estabilidade. Por tal razão, diz-se que o tributo tem função híbrida.
Na primeira hipótese, temos a denominada função fiscal, ao passo que, na segunda, temos a chamada função extrafiscal.
Ainda nesse passo, é importante lembrarmos que o tributo não se constitui em penalidade decorrente da prática de ato ilícito, uma vez que o fato descrito pela lei, o qual gera o direito de cobrar o tributo (hipótese de incidência), será sempre algo lícito [6].
E nessa toada, pela própria natureza do tributo, e ante a elevada carga tributária do Brasil, verifica-se, de um modo geral, a inexistência de uma reprovação social dos crimes tributários; ou, ao menos, uma reprovação social que se verifica nos crimes ordinários.
Tal pormenor é apontado por Jefferson Aparecido Dias, o qual assevera que:
“Imaginemos dois casos: no primeiro, uma pessoa desempregada e viciada em drogas abre a porta de um carro (que estava trancada) e subtrai o rádio do veículo, que pretende vender para sustentar o seu vício; no segundo caso, um grande empresário, durante anos, deixa de recolher à Previdência Social os valores das contribuições sociais que descontou de seus empregados. A partir desses dois exemplos, pergunta-se: Qual das duas condutas sofrerá maior reprovação social? Quem será considerado “criminoso”?
Não é difícil concluir que, para a maioria das pessoas, apenas o autor do furto do rádio será considerado um criminoso e, nessa condição, merecedor da represália estatal por meio da aplicação do direito penal.
Claro que alguns desaprovarão a conduta do empresário, mas bastará ele alegar que sua conduta foi provocada pela excessiva carga tributária brasileira e que o pagamento correto dos tributos levaria ao fechamento de sua empresa que restarão poucos a não concordarem com a sua postura.
Esses exemplos, apesar de singelos, demonstram como não existe uma reprovação social à pratica dos crimes tributários e previdenciários que, para muitos, é uma reação legítima dos indivíduo contra o Estado brasileiro que, nos últimos anos, tem se especializado em majorar tributos.(…)
Assim, deixar de pagar tributos é algo aceitável e até mesmo considerado correto para grande parte da sociedade, que reconhece tal conduta como a única reação possível contra um Estado que, ano a não, aumenta a carga tributária sobre os seus cidadãos”.[7]
De outra parte, há que se asseverar, por sua vez, que as figuras penais descritas pela 8.137/90 pressupõem uma ação ou omissão ilícita e dolosa do agente, que vise reduzir ou anular o pagamento de tributo [8].
Diante dessas disposições normativas, poder-se-ia entender o porquê de Pedro Roberto Democain advogar a tese de que: findo o prazo para o pagamento do tributo, de cuja supressão ou redução se cogita, está consumado o crime descrito no artigo 1º, inciso I, da Lei 8.137/90.
Portanto, a partir desse posicionamento doutrinário, o momento consumativo seria o instante em que se vence o prazo para pagamento do tributo[9].
Porém, a doutrina mais acertada acolhe, como momento consumativo, o fim do prazo para a denuncia espontânea do contribuinte, conforme determina o artigo 138 do Código Tributário Nacional[10].
Assim, o término do prazo para o pagamento do tributo tem apenas o efeito de emprestar à instauração da ação fiscal, a condição de marco definidor da consumação do crime, na medida em que afasta a espontaneidade da denúncia [11].
Desse modo, somente há consumação se se esgotaram as possibilidades de espontaneidade do contribuinte. A objetividade jurídica da norma penal é a fraude, não a mera inadimplência.
Ocorre que como o legislador penal busca apenar o embuste, a falsidade, a mentira, o desaparecimento desse tipo de situação, retira a tipicidade criminal.
Assim, tais figuras penais pressupõem a forma dolosa, acompanhada de qualquer espécie de falsidade.
Aliás, oportuna a menção do parecer do ilustre Sub-Procurador Geral da Republica Eitel Santiago de Brito Pereira, onde:
“a interpretação rigorosa dos preceitos da lei penal, perseguida pelo Recorrente, não concorre para melhorar as condições de vida da sociedade brasileira. O encarceramento de empresários, pela perpetração de crimes fiscais, deve ser reservado para situações excepcionalíssimas, pois pode provocar até o desaparecimento de algumas empresas, aumentando o intolerável nível de desemprego existente na atualidade. De que adiantaria mandar para as cadeias, já abarrotadas de delinqüentes violentos, pessoas que, mesmo cometendo ilícitos tributários, exercem atividades comerciais lícitas e produtivas, absorvendo mão de obra em suas empresas? Tal providência não se justifica, nem atende aos reclamos de uma política criminal construtiva. Notadamente, se os responsáveis pela infração procuram se compor com o Fisco, providenciando, ainda que de forma parcelada, a quitação das exações devidas.”[12]
Portanto, é perfeitamente defensável a tese que propugna pela excepcionalidade da aplicação da lei penal nos crimes de natureza tributária.
AS HIPOTESES DE SUSPENSÃO DO CREDITO TRIBUTÁRIO POSSIBILIDADE DE NOVAÇÃO DE DÍVIDA
Como os crimes contra a ordem tributaria carregam as particularidades retro-expostas, não podemos esquecer de mencionar que o Código Tributário Nacional traz algumas situações de suspensão da exigibilidade do crédito tributário [13].
Desse modo, dentro de qualquer das hipóteses indicadas pelo artigo 151 do Código Tributário Nacional não há de se cogitar em exigibilidade do crédito tributário.
Nesse raciocínio, se houve o parcelamento, o contribuinte eventualmente denunciado criminalmente, de forma espontânea, fulminou com o embuste, a fraude; pois trouxe, a autoridade fazendária, todos os elementos do reconhecimento do débito. Muito embora a suspensão do crédito tributário, não implique, a priori, na extinção da punibilidade.
Entretanto, raciocínio oposto surge se entendermos a presença da novação de divida.
Esse sempre foi o entendimento quase que pacifico no STJ.:
“Quando o parcelamento ocorre antes do inicio da persecução penal: O acordo de parcelamento do débito tributário, efetivado antes do recebimento da denúncia, enseja a extinção de punibilidade prevista na Lei 9249/95, art. 34, porquanto a expressão "promover o pagamento" deve ser interpretada como qualquer manifestação concreta no sentido de pagar o tributo devido. 2. "Habeas Corpus" conhecido; pedido deferido.”[14].
Em outra decisão, cujo Acórdão é da lavra do Ministro GILSON DIPP, notamos o mesmo raciocínio:
“Tenho entendido que a manifestação concreta no sentido de saldar a dívida – como no caso de parcelamento do débito junto ao Estado – em momento anterior ao recebimento da exordial acusatória, afasta a justa causa para a ação penal, ainda que restando eventual discussão extra-penal dos valores. Com efeito, o parcelamento do débito deve ser entendido como equivalente à promoção do pagamento. Destarte, o próprio art. 14 da Lei nº 8.137/90 não fazia distinção se o promover seria integral ou parcelado, razão pela qual se tem como suficiente o ato de saldar a dívida – o que sobressai do próprio parcelamento. De outro lado, o parcelamento cria nova obrigação, extinguindo a anterior, pois, na realidade, verifica-se uma novação da dívida – o que faz a equivalência ao art. 14 da Lei n.º 8.137/90, para o fim de extinguir a punibilidade do autor do crime. Desta maneira, o instituto envolve transação entre as partes credora e devedora, alterando a natureza da relação jurídica e retirando dela o conteúdo criminal para lhe atribuir caráter de ilícito civil lato sensu. Não obstante, o Estado credor dispõe de mecanismos próprios e rigorosos para satisfazer devidamente os seus créditos, pois a própria negociação realizada envolve previsões de sanção para a inadimplência. A questão de eventual inadimplência ainda poderá ser resolvida no Juízo apropriado, pois na esfera criminal só restará a declaração da extinção da punibilidade. Devido a tal conclusão, penso que se torna efetivamente irrelevante saber se foram pagas poucas ou muitas parcelas, pois o que interessa é que o acordo de parcelamento foi celebrado antes do recebimento da denúncia, possuindo efeito jurídico igual ao pagamento. Destarte, para efeitos penais, o parcelamento extingue a dívida, criando outra obrigação, razão pela qual se deve ter como efetuado o pagamento, para este fim.” [15]
De outra parte, é necessário pontuar que existem vozes discordantes na doutrina, as quais postulam pela tese de que o parcelamento se constitui em mera causa de suspensão da exigibilidade do tributo. Nesse sentido José Paulo Baltazar Júnior:
“Com a devida vênia, discordo dessa orientação, pois o parcelamento sob o nome de moratória é qualificado como mera causa de suspensão da exigibilidade do crédito tributário (CTN, art. 151, I), e não de sua extinção, operada, por exemplo, pelo pagamento (CTN, art. 156). Assim é que, descumpridas as condições do parcelamento, será esse rescindido, remanescendo o crédito tributário, que estava suspenso, com todos os seus privilégios. Daí por que não se pode falar, no caso, em novação” (STF, Inq. 1028-6/RS, Moreira Alves, PI; Rosa: 251, Bello Filho: 491: 2; Lima 112-115)[16].
Inobstante, em se considerando o primeiro posicionamento expendido, tem-se que o STJ, à luz da redação anterior do artigo 14 da Lei 8.137/90, acolhendo o entendimento que parcelamento pode ser sinônimo de novação, porque não poderíamos estender o mesmo para aqueles casos em que o parcelamento ocorreu após a denúncia?
Ora, seria um raciocínio lógico, pois o parcelamento é um reconhecimento de débito, onde o contribuinte renuncia a qualquer direito de questionamento, situação típica da novação.
OS CASOS DE SUSPENSÃO DO PROCESSO CRIMINAL POR SONEGAÇÃO FISCAL
Nos crimes contra a ordem tributária, a legislação brasileira em regra valoriza a função arrecadatória do Estado em detrimento da função repressiva.
Assim, o pagamento do tributo ou contribuição social, ressalvando-se alguns poucos momentos históricos, sempre foi causa de extinção da punibilidade no ordenamento jurídico brasileiro.
Do mesmo modo, no direito comparado, encontramos varias nações que também impõe a mesma função a seus diplomas penais.
Entretanto, a questão do pagamento, como causa de extinção da punibilidade, frequentemente resvala em um ponto muito controverso quando se trata de parcelamento. Isso porque, sempre remanesce a pergunta: poderia o parcelamento ser equiparado ao pagamento?
Nesse sentido, como já referido, a assertiva somente se justificaria se pensarmos no parcelamento como novação de divida a resposta pode ser positiva.
Desse modo, outra questão vem à baila. Ou seja, o parcelamento antes de oferecida a denúncia tem o condão de extinguir o parcelamento?
Nesse sentido, o STJ em 02 de Setembro de 2002, ao analisar o HC 11.598-SC, em Acórdão da lavra do Ministro Gilson Dipp, decidiu que, nos crimes de sonegação fiscal, o parcelamento da dívida antes do oferecimento da denúncia extingue a punibilidade. O Ministro Relator trouxe, em seu voto vencedor, vários pontos que justificavam a decisão, como v.g.:
“O pagamento equivale ao parcelamento; O parcelamento cria nova obrigação e extingue a anterior; Há novação da dívida; A transação entre as partes altera a relação jurídica e retira seu conteúdo criminal; O Estado dispõe de mecanismos próprios e rigorosos para cobrar essa dívida; A negociação envolve sanções para o caso de descumprimento da obrigação; O inadimplemento das parcelas deve ser resolvido no juízo apropriado; O parcelamento extingue a dívida anterior, surgindo uma nova; O Direito penal não deve preocupar-se com atos que não sejam relevantemente anti-sociais.
Ocorre que a partir da promulgação da Lei n.º 10.684, de 30 de maio de 2003; a extinção da punibilidade nos crimes de sonegação fiscal e apropriação indébita previdenciária ganhou novo regramento.
A referida lei, em suma, prevê a suspensão da punibilidade quando do parcelamento do débito, ficando a extinção da punibilidade sujeita à quitação do débito. Dessa forma, o simples parcelamento da dívida fiscal acarretará a suspensão do processo criminal até o final pagamento. Comprovando o contribuinte que quitou sua dívida, outrora parcelada, com o fisco, poderá requerer a extinção do feito em decorrência da quitação da dívida.
Ademais, a lei não faz qualquer menção ao recebimento da denúncia, silenciando, outrossim, quanto ao momento processual em que o pagamento integral do débito pode ser feito, com a conseqüência extinção da punibilidade.
Inobstante tal raciocínio, pelo magistério de Hugo de Brito Machado, é possível, como se verá, a extinção da punibilidade nos crimes contra a ordem tributaria, pelo parcelamento do débito, desde que se entenda cabível a suspensão do processo, e desde que cumpridas inteiramente pelo réu as condições dessa suspensão. A lei estabelece que nos crimes para os quais a pena mínima cominada não seja superior a um ano, estejam ou não tais crimes abrangidos pela competência dos denominados Juizados Especiais, o Ministério Publico, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena. Assim, nos crimes previstos nos artigos 2º e 3º da Lei 8.137/90, desde que presentes os demais requisitos legais, é induvidoso o cabimento da suspensão do processo, porque as penas cominadas nesses dispositivos são de seis meses de detenção e um ano de reclusão, respectivamente. Leva problema, então, saber se no crime previsto no art. 1º da Lei 8.137/90, é também cabível a suspensão do processo, posto que a pena mínima cominada, nesse caso, é de dois anos de reclusão. Se, o crédito tributário foi constituído por iniciativa do contribuinte, vale dizer, se este fez o que seria uma denúncia espontânea e apenas não efetuou o pagamento, o pedido de parcelamento do débito constituirá forma evidente de arrependimento posterior.”[17]
Portanto, em que pese as opiniões em contrário, nos crimes de sonegação fiscal, o parcelamento da dívida antes do oferecimento da denúncia extingue a punibilidade.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teor dos apontamentos supra, podemos sugerir como resposta ao questionamento inicial, que nas imputações criminais da Lei 8.137/90, quanto aos tributos não federais, eis que nesses a União quando disciplina o parcelamento pode, exercendo sua competência legislativa processual penal dispor sobre a suspensão dos processos criminais, poderá haver também o sobrestamento penal face ao parcelamento do débito, desde que os delitos estejam na alçada dos Juizados Especiais Criminais (arts 2º e 3º da Lei 8.137/90), ou, em casos de tipificação pelo artigo 1º pode-se ainda acolher a tese que o artigo 9º da Lei n.º 10.684, de 30 de maio de 2003, continua a gerar efeitos, independente do parcelamento contido na norma que o criou, o que daria ao contribuinte o direito em sobrestar eventuais ações criminais.
Por fim, na pior das hipóteses, com a adesão ao parcelamento podemos ainda acolher a tese de Luiz Flavio Gomes [18], segundo a qual ao aplicar-se a regra do artigo 16 do CP, que prescreve a redução da pena de um a dois terços da pena, onde teríamos por conseqüência a redução da pena mínima de dois anos para oito meses na imputação do artigo 1º da Lei 8.137/90, o que daria ao contribuinte o direito em sobrestar o feito pelas leis dos Juizados Especiais.
Informações Sobre os Autores
Alexandre Gazetta Simões
Mestrando em Teoria do Direito e do Estado pelo Centro Universitário Eurípedes de Marília (UNIVEM). Pós-graduado, com Especialização em Gestão de Cidades (UNOPEC). Direito Constitucional (UNISUL). Direito Constitucional (FAESO). Direito Civil e Processo Civil (FACULDADE MARECHAL RONDON). Direito Tributário (UNAMA). graduado em Direito (ITE-BAURU. Analista Judiciário Federal – TRF3. Professor de graduação de Direito na Associação Educacional do Vale do Jurumirim (EDUVALE AVARÉ). Membro do Conselho Editorial da Revista de Direito do Instituto Palatino. Membro do Conselho Editorial da Revista Acadêmica de Ciências Jurídicas da Faculdade Eduvale Avaré. – Ethos Jus. Co-autor da obra “Ativismo Judicial – Paradigmas Atuais” (2011) Letras Jurídicas. Co-Organizador da obra “Ensaios Sobre a História e a Teoria do Direito Social” (2012) Letras Jurídicas
José Antonio Gomes Ignacio Junior
Graduado em Direito e Administração de Empresas, Pos Graduado com Especialização em Direito Tributario (UNIVEM) e Direito Publico (UNOPAR/IBDP). Mestrando em Teoria do Direito e do Estado (UNIVEM). Professor universitario em curso de Direito.