Noções primeiras de Direito e de Estado

Resumo: Estudo com noções iniciais a respeito do Direito e do Estado. Texto aula para os alunos de Tópicos de Direito, do curso de Engenharia Mecânica, de Direito Administrativo, do curso de Administração e de Direito Empresarial do curso de Ciências Contábeis da UFMT de Rondonópolis.

Palavras-chave: Direito. Lei. Normas. Regras. Princípios. Sociedade.

Abstract: Study with initial notions of law and the state. Classroom text for students of law topics, the course of Mechanical Engineering, Administrative Law, Travel Management and Corporate Law Accounting Course UFMT Rondonópolis.

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Key-words: Law. Standards Act. Rules. Principles. Society.

Sumário: Resumo. Abstract. Palavras-chave. Key-words. Introdução. Direito. Direito Público e Direito Privado. Estado. Elementos do Estado. Poderes. Personalidade jurídica. Pessoas naturais (físicas) e pessoas jurídicas. Pessoas jurídicas de direito público. Responsabilidade do Estado pelos interesses públicos. Território: pessoa jurídica de direito público. Território: características. Território: natureza. Federação brasileira. Estado de direito. Poderes e Funções. Preponderância no exercício de funções. Constituição Federal. Função administrativa. Função administrativa: definição. Aspectos formal, material, subjetivo ou residual da função administrativa. Funções materialmente administrativas. Bibliografia.

Introdução.

O conhecimento do direito abrange o domínio de noções de um conjunto de normas, regras e princípios inseridos nas leis em geral que criam e condicionam as condições humanas de convívio social. Não se conhece quem possa viver, desde que reunido com um outro ser humano, em um mesmo espaço geográfico sem estabelecer um mínimo de normas que estabeleçam o que um ou outro pode fazer, pode agir, criar, pode, enfim, viver. Este trabalho visa a introduzir as noções iniciais abrangentes da vida em sociedade por meio do estabelecimento das normas. O presente trabalho objetiva, desta forma, desenvolver os conceitos iniciais de Estado e Direito.

Direito

Celso Antônio Bandeira de Mello explica que o  Direito é um conjunto de normas – princípios e regras -, dotado de coercibilidade, ou seja, possuidor da característica do que se pode reprimir, coibir ou conter, que disciplinam a vida social.[1] Faz entender também que o direito se bifurca ou se divide em dois grandes ramos, submetidos a técnicas jurídicas distintas: o Direito Público e o Direito Privado.[2]

Direito Público e Direito Privado

Doutrinadores de renome expõem as diferenças entre direito público e direito privado com diferentes estudos e definições que chegam todas a um ponto comum no sentido de que a divisão é didática e seerve para facilitar a compreensão do próprio direito.

O Direito Público "…se ocupa de interesses da Sociedade como um todo, interesses públicos, cujo atendimento não é um problema pessoal de quem os esteja a curar, mas um dever jurídico inescusável. (…) não há espaço para a autonomia da vontade, que é substituída pela ideia de função, de dever de atendimento do interesse público”.[3]

O Direito Privado “…se ocupa dos interesses privados, regulando relações entre particulares”. O Direito Privado é “…governado pela autonomia da vontade, de tal sorte que nele vige o princípio fundamental de que as partes elegem as finalidades que desejam alcançar, prepõem-se (ou não) a isto conforme desejem e servem-se para tanto dos meios que elejam a seu alvedrio, contanto que tais finalidades ou meios não sejam proibidos pelo Direito”.[4]

Celso Ribeiro Bastos explica que o direito como um conjunto de normas e princípios que regem a atividade do Estado, a relação deste com os particulares, assim como o atuar recíproco dos cidadãos.[5]

Edgar da Mata Machado apresenta diversos autores cada qual sem alcançar uma idéia ou conclusão precisa dos limites porventura existentes na divisão entre o direito positivo público e privado.[6]

Ao estudar a divisão entre direito público e privado, Edimur Ferreira de Faria esclarece que a ordem jurídica é uma, inexistindo, assim, diferentes direitos. O que acontece, porém, é que desde os romanos, o direito já era dividido em público e privado.

As relações jurídicas entre os cidadãos particulares ocorreriam dentro do direito privado. Já as relações nas quais estaria presente o Poder Público, ou mesmo o interesse público, seriam pautadas pelo direito público.[7]

De Plácido e Silva define o direito público como o conjunto de leis, criadas para regularem os interesses de ordem coletiva, ou, em outros termos, principalmente, organizar e disciplinar a organização das instituições políticas de um país, as relações dos poderes públicos entre si, e destes com os particulares como membros de uma coletividade, e na defesa do interesse público.[8]

São suas as palavras:

“A norma de Direito Público, pois, tende sempre a regular um interesse, direto ou indireto, do próprio Estado, em que tem vigência, seja para impor um princípio de caráter político e soberano, seja para administrar os negócios públicos, seja para defender a sociedade, que se indica o próprio alicerce do poder público”.[9]

Diógenes Gasparini inicialmente aborda a questão dos dois ramos do direito tratando o mesmo como uma unidade indivisível, maciça, monolítica. Lembra, no entanto, a sua divisão, desde Roma, em dois ramos, quais sejam, o privado e o público. O Direito Público regularia as relações jurídicas em que predomina o interesse do Estado, ao ponto que o Direito Privado disciplinaria as relações jurídicas em que predomina o interesse dos particulares. O critério do interesse é que dividiria, assim, o Direito em dois ramos.[10]   

José Cretella Jr informa que o direito constitui-se em uma unidade desdobrável em dois campos que se comunicam entre si, apesar de informados por princípios distintos. Os dois campos são estabelecidos por motivos didáticos. Os campos do Direito Público e do Direito privado são comunicáveis entre si, embora formados por princípios distintos – os princípios de direito público e os princípios de direito privado.[11] O problema de se dividir o direito em dois ramos esbarra na impossibilidade de se estabelecer, de modo absoluto, fronteiras nítidas entre eles.[12] Desde Ulpiano, no Império Romano, o direito é dividido entre os dois campos público e privado.[13]

Após a utilização de diferentes fórmulas do direito romano, em termos atuais, o direito público pode ser considerado como o responsável pela disciplina das relações jurídicas em que preponderam imediatamente interesses públicos. Já o direito privado é o ramo do direito que disciplina relações jurídicas em que predominam imediatamente interesses particulares. Mediatamente, ou seja, indiretamente o direito público pode produzir efeitos sobre os interesses do particular e, da mesma forma, o direito privado pode agir sobre o próprio Estado.[14]

Hely Lopes Meirelles aponta a divisão do Direito em dois grandes ramos, o Público e o Privado. O Direito Público, ainda, pode ser dividido em Interno e Externo. O Direito Público Interno tem como objeto a regulação dos interesses estatais e sociais. Os interesses individuais só são aqui tratados reflexamente. O Direito Público Externo tem como objetivo reger as relações entre os Estados soberanos e as atividades individuais internacionalmente. O Direito Privado, por sua vez, cuida com predominância dos interesses individuais, de modo a assegurar a coexistência social e a fruição de seus bens.[15] As relações de direito privado aconteceriam no sentido horizontal.[16] Já no direito público temos a verticalidade que impõe ao Poder Público uma posição de superioridade frente aos particulares em função da manutenção do interesse público. 

Carlos Ari Sundfeld destaca o sentido e a utilidade das idéias “direito público” e “direito privado”, que permeiam todo conhecimento jurídico. Posto se tratarem de idéias e não de normas, aponta o autor a possibilidade do ordenamento existir indiferente a elas.

Para o autor, embora a distinção entre direito público e direito privado existisse já no Direito Romano, somente no Estado de Direito é que veio despertar grande interesse.

A partir de então, teriam sido apontados pela doutrina os critérios muitos critérios, dentre os quais se destacou o do sujeito e o do interesse. Direito público, segundo o critério inicial, seria aquele que tem por sujeito o Estado, ao mesmo tempo que o privado é o que regeria a vida dos particulares.

De acordo com o critério do interesse, por sua vez, as normas que cuidassem de interesses públicos seriam públicas, enquanto que as normas que regessem interesses privados seriam privadas. A grande dificuldade representaria a descoberta de quais seriam os critérios diferenciadores entre interesse público e privado.

Apontando a insuficiência do critério anterior, o autor encerra o seu texto apresentando uma distinção entre direito público e direito privado com base no regime jurídico.[17]

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Agustín Gordillo faz importantes anotações a respeito da divisão do Direito em Público e Privado. Assume o autor que as diferenças entre os mesmos são que no primeiro as relações jurídicas se dão entre o Estado e os particulares, ou entre os seus diferentes órgãos. Exemplifica que na Argentina não há atividade estatal submetida unicamente ao direito comum ou privado. Quando as normas de direito privado são aplicadas nas relações de algum ente estatal, elas serão sempre modificadas ou aproveitadas com as normas de direito público, de modo a fazerem parte deste de alguma forma.

Nas relações de Direito Público sobressalta uma relação de subordinação porque a lei confere ao poder público uma certa superioridade jurídica sobre os particulares, um número de atribuições superiores em relação aos direitos individuais. Na relação de Direito Privado prepondera uma relação de coordenação entre os sujeitos que são iguais.

A raiz desta divisão seria sociológica, visto que tais relações afetariam o “interesse público” (bem comum) ou o “interesse privado” individual, respectivamente. A nota característica das normas de direito público são que as leis que regem as relações dos particulares com o Estado vão acumulando prerrogativas e privilégios para o Estado. Além do mais, alguns dos princípios concernentes a tais leis irão disciplinar relações interiores ao próprio Estado como, por exemplo, a organização, funcionamento e atividade dos poderes públicos e o controle dos serviços públicos monopolizados, os quais se utilizarão de princípios diferentes dos do direito comum.[18]

A par das definições da doutrina, entendemos que a partir da definição do direito como um conjunto de normas que disciplinará as relações sociais em um determinado grupo, parte-se para a divisão do próprio direito em uma árvore que se dividiria em inúmeros e distintos galhos ou ramos.

Os estudiosos da teoria geral do direito, após longas exposições acerca da divisão do direito em dois ramos, público e privado, são assentes em concluir que a divisão público-privado serviria mesmo como um instrumento didático para o ensino da ciência do direito e uma melhor compreensão por parte dos seus estudiosos.

A divisão se justifica por existirem diferentes níveis de relação jurídica entre os cidadãos entre si e entre esses e o Estado, a Administração Pública.

O direito privado se dividiria, fundamentalmente, em dois ramos, ou seja, o civil e o comercial.

Já o direito público é composto de vários sub-ramos, quais sejam, o direito constitucional, o administrativo, o penal, o previdenciário, o eleitoral, internacional público e privado, processual civil e penal, do trabalho, tributário e financeiro. 

A distinção entre público e privado tem uso assistemático dentro da cultura jurídica. Desta forma, seria inócua a busca de uma solução única, baseada em um só critério para, dentro da ciência jurídica, esclarecer o significado de público e de privado.

A adoção de um critério formal para a distinção entre público e privado seria a única forma de construir uma distinção entre os mesmos.

Voltando-se os olhares para as normas jurídicas e para como elas regulam as situações de que cuidam, ou seja, para o regime jurídico por elas criado. Assim, os institutos de direito público se distinguirão dos de direito privado pela sua submissão a um ou a outro regime jurídico.

Distinguir o público do privado significaria conhecer o regime de direito público e o de direito privado.

Por sua vez, para conhecer-se o direito público faz-se necessário o conhecimento dos princípios de direito Público.

Definir significa estabelecer fins, delimitar algo. Ao se descrever uma realidade, fazemos a sua definição. Concluir, no entanto, exige trabalho de consideração acerca do assunto tratado, exige compreensão a respeito do objeto que está sendo abordado.

Para se concluir acerca da natureza dos dois principais ramos do direito ou para se alcançar uma exata noção da realidade das mesmas devemos ter em mente a preponderância dos interesses em questão. Predominando-se os interesses particulares, tem-se o direito privado. Ao contrário, na predominância dos interesses que afetariam todo o grupo social, teríamos o direito público.[19]

Estado

O Estado é ente personalizado que se apresenta externamente nas relações internacionais e internamente na qualidade de pessoa jurídica de direito público.[20]

Predominantemente vive-se hoje em Estados de Direito, ou seja, em Estados juridicamente organizados que obedecem às suas próprias leis.[21]

A organização do Estado é matéria da Constituição. Divisão política do território nacional, estruturação dos Poderes, forma de Governo, investidura dos governantes e os direitos e as garantias dos governados são os principais temas que recebem a denominação de matéria constitucional. Realizada a organização política do Estado soberano, nasce por meio de legislação complementar e ordinária, a organização administrativa das entidades estatais, das autarquias e empresas estatais que realizarão de forma desconcentrada e descentralizada os serviços públicos e as demais atividades de interesse coletivo.[22]

O Estado Federal brasileiro compreende a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios. Estas são, assim, as entidades estatais brasileiras que possuem autonomia para fazer as suas próprias leis (autonomia política), para ter e escolher governo próprio (autonomia administrativa) e auferir e administrar a sua renda própria (autonomia financeira). As demais pessoas jurídicas instituídas ou autorizadas a se constituírem por lei ou se constituem de autarquias, ou de fundações, empresas públicas, ou entidades paraestatais. Ou seja, estas últimas são as componentes da Administração centralizada e descentralizada.

A organização da Administração ocorre em um momento posterior à do Estado. No Brasil, após a definição dos três Poderes que integram o Governo, é realizada a organização da Administração, ou seja, são estruturados legalmente as entidades e os órgãos que realizarão as funções, por meio de pessoas físicas chamadas de agentes públicos. Tal organização se dá comumente por lei. Ela somente se dará por meio de decreto ou de normas inferiores quando não implicar na criação de cargos ou aumento da despesa pública.[23]

Estado de direito

“A evolução da instituição acabou culminando no surgimento do Estado de Direito, noção que se baseia na regra de que ao mesmo tempo em que o Estado cria o direito deve sujeitar-se a ele. A fórmula do rule of law prosperou de tal forma que no mundo jurídico ocidental foi ela guindada a verdadeiro postulado fundamental”.
O autor utiliza obra de Manoel Gonçalves Ferreira Filho para trazer a informação segundo a qual a expressão “Estado de Direito” foi trazida da Alemanha (Rechtsstaat), em obra de Welcker, publicada em 1813.[24]

Elementos do Estado

 Os três elementos do Estado são o povo, o território e o governo soberano. O povo pode ser entendido como o componente humano de cada Estado. Já o território pode ser concebido como a base física sobre a qual se estabelece o próprio Estado.

 Governo soberano, por sua vez, é o elemento condutor do Estado. Ele detém e exerce o poder absoluto de autodeterminação e auto-organização emanado do povo.

 A chamada vontade estatal se apresenta e se manifesta por meio dos Poderes de Estado.

Poderes

Poderes de Estado são os três conhecidos como Legislativo, Executivo e Judiciário. A sua ação deve ser harmônica e independente. Eles são imanentes e estruturais ao próprio Estado. Cada um dos mesmos realiza de forma precípua uma função.

 O Poder Legislativo realiza a função normativa daquele Estado. O Executivo administra, ou seja, realiza a função administrativa de converter a lei em ato individual e concreto. O Poder Judiciário realiza a função judicial.

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 Entretanto, é de se ressaltar que todos os poderes praticam atos administrativos, ainda que restritos à sua organização e funcionamento.

 O Poder estatal é uno e indivisível. O que há, na verdade é a distribuição das três funções estatais precípuas entre órgãos independentes e harmônicos.

 Charles Louis de Secondat, o barão de Montesquieu, ao escrever, em 1748, "O Espírito das Leis" previu o equilíbrio entre os Poderes e não a separação ou divisão dos mesmos.

 O governo é a resultante da interação dos três Poderes de Estado.[25]

 Para Brandão Cavalcanti:

“A administração pública compreende, em seu sentido mais restrito, o conjunto dos órgãos destinados à execução direta dos serviços públicos e das leis e órgãos permanentes do Estado e por ele mantidos, em seu sentido mais lato, o conjunto de organismos afetados à execução dos serviços públicos, direta ou indiretamente, isto é, também dos serviços delegados ou concedidos.”[26]

Personalidade jurídica

O Estado possui capacidade de adquirir direitos e contrair obrigações na ordem jurídica.[27]

Pessoas naturais (físicas) e pessoas jurídicas

A personalidade jurídica é a aptidão genérica para a pessoa adquirir direitos e contrair obrigações. Explica Maria Helena Diniz:

“Deveras, sendo a pessoa natural (ser humano) ou jurídica (agrupamentos humanos) sujeito das relações jurídicas e a personalidade a possibilidade de ser sujeito, ou seja, uma aptidão a ele reconhecida, toda pessoa é dotada de personalidade.[28]

“A personalidade é o conceito básico da ordem jurídica, que a estende a todos os homens, consagrando-a na legislação civil e nos direitos constitucionais de vida, liberdade e igualdade”.[29]

Capacidade é a “medida jurídica da personalidade”. Diniz cita Teixeira de Freitas que considera capacidade a “manifestação do poder de ação implícito no conceito de personalidade”.[30]

Desta forma, conclui, para ser pessoa basta que o ser humano exista, e, para ser capaz, o homem ou a mulher precisa satisfazer os requisitos necessários para agir por si próprio, como sujeito ativo ou passivo de uma relação jurídica.

Segundo Maria Helena Diniz, pessoa natural é o ser humano considerado como sujeito de direitos e obrigações.

Segundo o Direito Civil brasileiro, a expressão “pessoa natural” designa o ser humano tal como ele é.[31]

As pessoas jurídicas nascem das necessidades humanas em razão do ser humano ser essencialmente social, para poder atingir seus fins e objetivos, unindo-se a outros homens e formando agrupamentos. A necessidade de personalizar-se tais grupos, para que possam participar da vida jurídica, individualmente e com nome próprio, fez com que a própria norma de direito os tornasse sujeitos de direitos e de obrigações.[32]

Pessoas jurídicas de direito público

O Código Civil de 2002, no seu artigo 41, incisos I a III, “…atualizou o elenco de pessoas jurídicas de direito público, mencionando entre elas as pessoas que, por serem federativas, representam cada compartimento interno do Estado federativo brasileiro: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios”.[33]

Responsabilidade do Estado pelos interesses públicos.

O Estado representa legalmente os interesses públicos.[34]

Território: pessoa jurídica de direito público

Ressalta Carvalho Filho que, diferentemente do Código de outrora, o Código de 2002 faz referência aos Territórios e os confirma na qualidade de pessoas jurídicas de direito público sem autonomia política e sem integrar a federação.[35]

Território: características

Os Territórios seriam, assim, pessoas administrativas descentralizadas integrantes da União e reguladas por lei complementar federal.[36]

Território: natureza

Há na bibliografia quem entenda os Territórios como possuidores de natureza de autarquias territoriais.[37]

Federação brasileira

No regime federativo brasileiro “…todos os componentes da federação materializam o Estado, cada um deles atuando dentro dos limites de competência traçados pela Constituição”.[38]

Poderes e Funções

Poderes são segmentos estruturais em que se divide o poder geral e abstrato que tem origem na soberania do Estado. Poderes de Estado são as estruturas internas destinadas à execução de certas funções. Segundo a Constituição Federal de 1988, art. 2º, são Poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.[39]

Cada Poder de Estado possui uma função que lhe é preponderante.

Poder Legislativo – função normativa ou legislativa;

Poder Executivo – função administrativa;

Poder Judiciário – função jurisdicional.[40]

A função legislativa ou normativa visa a criar direito novo. A função jurisdicional tem como objetivo a solução dos litígios. Já a função administrativa mira a gerir os interesses coletivos da forma mais ampla, como consequência das numerosas tarefas do Estado na atualidade.[41]

Preponderância no exercício de funções

Os Poderes não exercem suas funções de modo exclusivo. Ocorre a denominada preponderância no exercício das funções por cada Poder. Critérios políticos definem cada função e estão expressos na Constituição. Os Poderes estatais também realizam funções atípicas que pertencem a outro Poder, desde que a Constituição o defina e autorize.

O Poder Legislativo também exerce a função jurisdicional quando realiza o que prevê o art. 52, I e II da Constituição Federal. O Poder Legislativo também exerce a função administrativa ao organizar seus serviços internos, como previsto nos arts. 51, IV , e 52, XIII , da Constituição Federal.

O Poder Judiciário também exerce a função normativa ao elaborar regimentos internos dos Tribunais e a função administrativa ao organizar os seus serviços, segundo o artigo 96 da Constituição de 1988.

O Poder Executivo exerce principalmente a função administrativa. Também se ocupa da função normativa ao exercer seu poder regulamentar de produzir normas gerais e abstratas ou ao criar medidas provisórias e, ainda, ao criar leis delegadas, tudo de acordo com o art. 84, IV, com o art. 62 e com o art. 68 da Constituição Federal.
Diz o autor:

A função jurisdicional típica, assim considerada aquela por intermédio da qual conflitos de interesses são resolvidos com o cunho de definitividade (res iudicata), é praticamente monopolizada pelo Judiciário, e só em casos excepcionais, como visto, e expressamente mencionados na Constituição, é ela desempenhada pelo Legislativo.[42]

Constituição Federal

“Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I – processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

II – processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;

Art. 51. Compete privativamente à Câmara dos Deputados:

IV – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

XIII – dispor sobre sua organização, funcionamento, polícia, criação, transformação ou extinção dos cargos, empregos e funções de seus serviços, e a iniciativa de lei para fixação da respectiva remuneração, observados os parâmetros estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias;

Art. 96. Compete privativamente:

I – aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos;

b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo exercício da atividade correicional respectiva;

c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos de juiz de carreira da respectiva jurisdição;

d) propor a criação de novas varas judiciárias;

e) prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, obedecido o disposto no art. 169, parágrafo único, os cargos necessários à administração da Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei;

f) conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem imediatamente vinculados;

II – ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169:

a) a alteração do número de membros dos tribunais inferiores;

b) a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver;

c) a criação ou extinção dos tribunais inferiores;

d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;

Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República:

IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;

Art. 62. Em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional.

Art. 68. As leis delegadas serão elaboradas pelo Presidente da República, que deverá solicitar a delegação ao Congresso Nacional.”[43]

Função administrativa

A ideia inicial a respeito de função administrativa é, em primeiro momento, do alemão Otto Mayer ao distinguir Direito Administrativo de Direito Constitucional nas seguintes palavras: …administrativa é a atividade do Estado para realizar seus fins, debaixo da ordem jurídica.[44]

Função administrativa: definição

Carvalho Filho define: Função administrativa é aquela exercida pelo Estado ou por seus delegados, subjacentemente à ordem constitucional e legal, sob regime de direito público, com vistas a alcançar os fins colimados pela ordem jurídica.[45]

Aspectos formal, material, subjetivo ou residual da função administrativa

 Segundo Carvalho Filho, a visão de Mayer indicava que a função administrativa teria duas faces: a subjetiva e a formal. O aspecto subjetivo teria a ver com o sujeito da função. O aspecto formal, por sua vez, relaciona-se com os efeitos da função no mundo jurídico.

 A doutrina e a prática, no entanto, apontam critérios que se completam para estabelecer o contorno preciso da função administrativa:

a) subjetivo ou orgânico – realça o sujeito, o agente da função;

b) objetivo material – examina o conteúdo da atividade;

c) objetivo formal – explica a função pelo regime jurídico (conjunto de normas) em que se situa a sua disciplina;

d) residual – não representa criação de norma legal e nem soluciona lides em concreto, ou seja, não é nem a função normativa e nem a função jurisdicional.[46]

Funções materialmente administrativas

São funções materialmente administrativas, dentre outras, as atividades do Poder Judiciário. Exemplos: a) decisões em processos de jurisdição voluntária; b) poder de polícia do juiz nas audiências;

Também são funções materialmente administrativas no Poder Legislativo as “leis de efeitos concretos”, ou seja, os atos legislativos que não traçam normas gerais e abstratas, mas interferem na ordem jurídica de pessoas determinadas.

Exemplos: …a) lei que concede pensão vitalícia à viúva de ex-presidente.
Residual – onde não há criação de direito novo ou solução de conflitos de interesses na via judicial, a função exercida, sob o aspecto material, é administrativa.[47]

 

Referências
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013;
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012;
DE PLÁCIDO E SILVA, Vocabulário Jurídico, 27ª edição, 4ª tiragem, ano 2007, Rio de Janeiro: Forense, 2008.
HEGEL, G. W. F. Princípios da Filosofia do Direito, tradução Orlando Vitorino. São Paulo: Martins Fontes, 1997 (Clássicos);
HOUAISS, Grande Dicionário Beta. Acessado em 03/05/2014 e disponível na página http://houaiss.uol.com.br/;
MAFRA, Francisco. Direito público e direito privado. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n. 20, fev 2005. Acessado em 03/05/2014 e disponível no endereço:
https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artig o_id=872;
MAFRA FILHO, Francisco de Salles Almeida. Coleta de dados. Espaço do facebook acessado em 02/05/2014, disponível na página Francisco Mafra Filho no endereço: https://www.facebook.com/groups/pesquisajuridica; 
 
Notas:
[2] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013, p.27.

[3] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013, p.27.

[4] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013, p.27.

[5] BASTOS, Celso Ribeiro,  Curso de Direito Administrativo, 5º edição, São Paulo: Saraiva, 2001.

[6] MATA MACHADO, Edgar da. Elementos de Teoria Geral do Direito,  Belo Horizonte: UFMG, 1995, Pp. 170-186.

[7] FARIA, Edimur Ferreira de,  Curso de Direito Administrativo Positivo, 3ª edição, Belo Horizonte: Ed. Del Rey, 2000.

[8] DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico,  Rio de Janeiro: Forense, 2001.

[9] DE PLÁCIDO E SILVA. Vocabulário Jurídico,  Rio de Janeiro: Forense, 2001, verbete Direito Público.

[10] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo, 7ª edição, São Paulo: Saraiva, 2002. P.1.

[11]  CRETELLA JR, José. Direito Administrativo Brasileiro, 2ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2000. Pp.5-6.

[12]  __________. Manual de Direito Administrativo, 7ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2000. P.3.

[13]  Manual de Direito Administrativo, 7ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2000. P.3.

[14]  Curso de Direito Administrativo, 17ª edição, Rio de Janeiro: Forense, 2000. Pp. 3-4.

[15]   MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 24ª edição, São Paulo: Malheiros, 1999, pp. 31-32.

[16] CRETELLA JR.,  Manual….Pp. 3-4.

[17] SUNDFELD, Carlos Ari, Fundamentos de Direito Público, 3ª edição, 3ª tiragem, São Paulo: Malheiros, 1998, pp. 128-132.

[18] GORDILLO, Agostín. Tratado de Derecho Administrativo, Tomo I – Parte General – 7ª edicion, Belo Horizonte: Del Rey e Fundación de Derecho Administrativo, 2003. Pp. V-15 – V – 16.

[19] MAFRA, Francisco. Direito público e direito privado. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, VIII, n. 20, fev 2005. Acesso em maio 2014. Disponível em: <https://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo-id=872.

[20] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[21] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1978, Pp. 37-38.

[22] MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 1999, PP. 56-57.

[23] MEIRELLES, Hely Lopes, Direito Administrativo Brasileiro, São Paulo : Malheiros, 1999, P. 58.

[24] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[25] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1978, P. 39.

[26]  BRANDÃO CAVALCANTI, Themístocles. Tratado de Direito Administrativo, vol I, 4ª edição, Rio de Janeiro/São Paulo: Freitas Bastos, 1949/50. P. 8.

[27] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[28] DINIZ, Maria Helena “Curso de Direito Civil Brasileiro”, 1º volume, 20ª edição revista e aumentada, São Paulo: Saraiva, 2003, p.116.

[29] DINIZ, Maria Helena “Curso de Direito Civil Brasileiro”, 1º volume, 20ª edição revista e aumentada, São Paulo: Saraiva, 2003, p.116.

[30] Diniz, ob. cit. ant. apud Antônio Chaves, “Capacidade civil” em Enciclopédia Saraiva do Direito, v.13, p.2.

[31] DINIZ, Maria Helena “Curso de Direito Civil Brasiliero”, 1º volume, 20ª edição revista e aumentada, São Paulo: Saraiva, 2003, p.137.

[32] DINIZ, Maria Helena “Curso de Direito Civil Brasiliero”, 1º volume, 20ª edição revista e aumentada, São Paulo: Saraiva, 2003, p.205.

[33] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[34] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo, 30ª edição. São Paulo: Malheiros, 2013, p.27.

[35] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[36] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[37] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[38] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.2.

[39] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05/10/1988. Acessado em 02/05/2014 no endereço: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituição.htm.

[40] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, pp.2-3.

[41] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.5.

[42] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.3.

[43] BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, de 05/10/1988. Acessado em 02/05/2014 no endereço: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituição.htm.

[44] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.4.

[45] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, Pp.4-5.

[46] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.4.

[47] CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 25ª ed. rev. ampl. e atual. até a Lei 12.587, de 3/1/2012. Edição Especial. São Paulo: Atlas, 2012, p.5


Informações Sobre o Autor

Francisco Mafra.

Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.


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