A criação dos organismos internacionais sob a égide do estado de bem-estar social

Resumo: Essa pesquisa objetiva discorrer sobre a criação das organizações internacionais na estrutura do Estado de Bem-Estar Social, analisar o momento a partir do qual se evidenciou os poderes de tais organismos sobre os Estados e qual é o seu panorama de influência atual. Para a elaboração do presente estudo, foram utilizadas referências bibliográficas e referências eletrônicas. A conclusão é que os organismos internacionais surgiram dotados de poder, nos Anos Dourados do Estado de Bem-Estar Social, influenciando os Estados, por meio de suas competências, de suas características e de seus elementos de poder. O Estado de Bem-Estar Social entrou em crise e foi substituído pelo programa neoliberal e por outras formas de globalização. Atualmente, observa-se a decadência da figura do Estado devido ao neoliberalismo, à globalização e, principalmente, por causa da imensa interferência que os Estados permitem e sofrem das organizações internacionais e das empresas transnacionais.


Palavras-chave: Estado de Bem-Estar Social; criação; poder; organização internacional; globalização; neoliberalismo; decadência do Estado.


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Abstract: This survey aims to write on the creation of international organizations in the structure of the State of Social Welfare, to analyze the moment from which highlighted the powers of such bodies on the states and what is your current landscape of influence. For the preparation of this study, were used electronic bibliographic references and references. The conclusion is that the international bodies emerged endowed with power, the Golden Years of the State of Social Welfare, influencing the States, through their skills, their characteristics and their elements of power. The State of Social Welfare entered into crisis and was replaced by neoliberal program and other forms of globalization. Currently, there is a picture of the state of decay due to neoliberalism, to globalization and, because of the immense interference that States allow suffering and international organizations and transnational corporations.


Keywords: State of Social Welfare; Creation; Power; International organization; Globalization; Neoliberalism; Decadence of the state.


Sumario: 1- Introdução; 2- A  formação do Estado; 2.1- O surgimento do Estado de Direito; 2.2- Do Estado Absoluto ao Estado de Bem-Estar Social; 3- O contexto histórico da instauração e da permanência do Estado de Bem-Estar Social; 3.1- Na Europa; 3.2- Nos Estados Unidos; 4- O Estado de Bem-Estar Social (Welfare State); 5- A criação dos organismos internacionais; 5.1- As características das organizações internacionais; 5.2- A classificação das organizações internacionais; 5.3- O poder das organizações internacionais; 5.3.1- O FMI; 5.3.2- O Banco Mundial; 5.3.3- O BID; 5.3.4- A OCDE; 5.3.5- A ONU; 5.3.5.1- Solução dos litígios entre os Estados; 5.3.6- A Organização Comunitária; 5.4-Os elementos estruturais das organizações internacionais; 5.5- As competências das organizações internacionais; 5.6- A responsabilidade das organizações internacionais; 6- A crise do Estado de Bem-Estar Social; 7- A globalização; 8- O neoliberalismo; 9- A crise do Estado e da soberania; 10- Conclusão; Referências Bibliográficas.


1- INTRODUÇÃO


A história recente revela que a análise das organizações internacionais é extremamente necessária para que se possa compreender a atual conjuntura internacional.


É inegável que tais entidades exerçam uma forte influência tanto no âmbito interno, quanto no âmbito externo dos Estados. Para que se entenda o motivo da referida influência, perfaz-se indispensável a verificação de quais são os seus poderes, as suas competências e a partir de que momento, os organismos internacionais, de fato, começaram a exercê-los na esfera mundial.


Com base nesse aspecto, o presente trabalho procura esclarecer quando, como e o porquê da criação dos organismos internacionais; quais são os seus elementos estruturais, as suas características e de que maneira é realizada a sua classificação; qual é a sua representatividade e a sua responsabilidade na esfera internacional.


Ademais, para que se tenha uma visão completa dos organismos internacionais, também é essencial se observar qual foi a estrutura estatal que propiciou o surgimento das entidades em questão.


Para isso, é preciso uma transgressão na análise das indagações, que são formuladas acerca da origem do Estado, tais como a época do seu aparecimento, os motivos que determinaram e determinam a sua existência, as suas formas e estruturas no decorrer do tempo, inclusive, nos dias de hoje, diante da intensa globalização e dos poderes das organizações internacionais.


Enfim, essa pesquisa, de modo geral, evidencia as particularidades da instituição estatal e das organizações internacionais, com o intuito de entender como se dá a relação entre ambos em um panorama internacional cada vez mais globalizado.


2- A FORMAÇÃO DO ESTADO


Algumas indagações são formuladas acerca da origem do Estado, tais como a época do seu aparecimento, os motivos que determinaram e determinam a sua existência. Alguns autores acreditam que o Estado surgira em um momento anterior ao século XVI, admitindo que a sociedade denominada de “Estado” caracteriza todas as sociedades políticas que, com autoridade superior, fixaram as regras de convivência de seus membros. Outros argumentam que o nome “Estado” só pode ser aplicado à sociedade política dotada de certas características bem definidas, as quais são identificadas no século XVII.


Em relação ao aparecimento do Estado, existem três posições fundamentais: a que defende que o Estado e a sociedade sempre existiram, uma vez que o homem está integrado em uma organização social dotada de poder e com autoridade para determinar o comportamento de todo o grupo; a que admite que a sociedade humana existiu sem o Estado durante um período, até que o ente estatal se formou para atender às necessidades de certos grupos sociais; a que correlaciona a existência do Estado a uma sociedade política dotada de certas características.


Para explicar a formação originária do Estado prevalecem dois grupos: o das teorias que sustentam a formação natural do Estado, ou seja, a sua estruturação não se deu por um ato voluntário, mas sim de maneira espontânea; o das teorias contratualistas, em que a vontade de alguns ou de todos os homens levou à criação da instituição estatal.


Indubitavelmente, há processos que dão origem à criação de novos Estados como: a criação do Estado por formação derivada, ou seja, o surgimento de um Estado decorre de Estados já existentes, por meio do fracionamento (desmembramento de uma parte do território que constitui um novo Estado) ou da união de Estados (adoção de uma constituição comum, desaparecendo os Estados preexistentes que aderiram à união); a criação do Estado por formas atípicas, como por exemplo, depois de grandes guerras as potências vencedoras, visando assegurar o enfraquecimento permanente dos países vencidos ou procurando aumentar o seu próprio território, promovem a criação de novos Estados, em partes do território de um ou mais dos vencidos.


A maneira mais definida de se afirmar a criação de um novo Estado é o seu reconhecimento pelos demais entes estatais. Esse reconhecimento é importante, porém o essencial é que o novo Estado apresente características que são comuns às instituições estatais, que tenha viabilidade, que consiga agir com independência e que mantenha uma ordem jurídica interna eficaz.


2.1- O SURGIMENTO DO ESTADO DE DIREITO


Ao se verificar, historicamente, a fixação do Estado, constata-se que através dos séculos a instituição estatal assumiu várias formas. Para o ilustre autor Georg JELLINEK[1], é possível o estabelecimento de tipos de Estados. Esse autor[2] acredita que todo fato histórico, todo fenômeno social oferecem, além de sua semelhança com outros, um elemento individual que os diferencia dos demais, por mais análogos que sejam.


Assim, dentro da variedade das coisas humanas há algo de permanente e independente das particularidades individuais. Por métodos científicos é possível isolar, sem perder a noção de continuidade e unidade, certos fenômenos sociais ou ainda alguns de seus aspectos particulares. Mediante esse isolamento consegue-se excluir grande parte do individual e, relacionando-se o particular com o geral, faz-se ressaltar esse último.


Logo, por esse método, pode-se procurar de início, o conhecimento dos Estados particulares, descrevendo suas singularidades, tanto por seus aspectos histórico-políticos, quanto pelos jurídicos. Isso significa que o Estado particular não é um fenômeno isolado, mas influíram sobre ele as relações atuais e pretéritas dos demais Estados, ou seja, a evolução total dos entes estatais.


De maneira geral, os autores adotaram uma seqüência cronológica, compreendendo as seguintes fases: Estado Antigo, Estado Grego, Estado Romano, Estado Medieval e Estado Moderno.


Entretanto, segundo Dalmo de Abreu DALLARI[3], foi no Estado Moderno, por meio da concretização do poder soberano como o mais alto de todos dentro de uma precisa delimitação territorial, que se iniciou o Estado de Direito, ou seja, iniciou-se um vínculo jurídico pelo qual uma multidão de pessoas passava a encontrar a própria unidade na forma do direito. Segundo esse autor[4], as características do Estado Moderno são o território, o povo, a soberania e a finalidade.


Para Alexandre GROPALLI[5], a finalidade é uma das características do Estado, porque as pessoas só se integram em uma ordem e vivem sob um poder, em função de um fim a atingir. Além disso, o Estado, sendo dotado de ordem própria e de poder também próprio, é evidente que deverá ter uma finalidade peculiar que justifique a sua existência.


Destaca-se que alguns autores se opõem à característica finalística do Estado. Hans KELSEN[6], por exemplo, entende que a observação do Estado deve se restringir às questões políticas e às técnico-jurídicas.


De qualquer modo, aceita ou não como elemento formador do Estado, a finalidade tem sido reconhecida como de grande importância prática, pois, conforme Marcel de la Bigne VILLENEUVE[7], a legitimação de todos os atos do Estado depende de sua adequação às finalidades, reconhecendo-se que existem circunstâncias em que a instituição estatal é compelida a ceder a outros fins que não os seus, verificando-se uma estreita relação entre os seus fins e as funções que ele desempenha. Dessa maneira, a falta de consciência das finalidades é que faz com que, às vezes, algumas funções importantes, mas que representam apenas uma parte do que o ente estatal deve objetivar, sejam tomadas como finalidade única ou primordial, em prejuízo de tudo o mais.


Max WEBER[8]  é o responsável pela inovação do conceito de Estado Moderno, pois, de acordo com suas explanações, esse Estado surgiu de uma racionalização, fundamentada em um desencantamento pelos elementos mágicos, que explicavam a realidade, para um processo de intelectualização, pautado na razão, na ciência, no funcionalismo especializado, no direito racional, todos eles indispensáveis para a estruturação do capitalismo moderno.


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O Estado Moderno, segundo ele[9], é a comunidade humana que dentro de determinado território, possui o direito de exercer a coação física legítima, ou seja, o Estado é uma relação de dominação de homens sobre homens, por meio da coação legítima e isso só ocorre porque as pessoas dominadas se submetem à autoridade invocada, nesse caso a entidade estatal. Dessa forma, a dominação provém da legalidade, da crença na validade de estatutos legais e da competência objetiva, estruturada em regras racionalmente criadas, isso é, em virtude da obediência, condicionada por motivos de medo e de esperança, ao cumprimento de deveres fixados nos estatutos.


Para esse autor[10], o Estado Moderno é caracterizado pela separação entre o quadro administrativo, que são os seus funcionários, e os meios materiais de sua organização. Logo, esse Estado é uma associação de dominação institucional, monopolizadora da coação física legítima, que reuniu para esse fim, nas mãos de seus dirigentes, os meios materiais de organização. Entretanto, a concentração dos meios materiais, que estão nas mãos dos dirigentes do Estado, deve obedecer, diretamente, aos aparatos da burocracia, a qual se baseia na especialização e no treinamento, ambos racionais.


A especialização refere-se ao desenvolvimento do funcionalismo moderno, o qual é constituído por um grupo de trabalhadores altamente qualificados e especializados que administram imparcialmente e impessoalmente a máquina estatal. O funcionário moderno, como convém à técnica racional da vida moderna, está cada vez mais sujeito, constante e inevitavelmente, a um treinamento específico e especializado.


Paralelamente, ocorreu a racionalização e a sistematização do direito, caracterizados pelo distanciamento dos poderes mágicos e divinos, cujos meios processuais de decisão possuíam um caráter irracional e sobrenatural, para dar lugar aos meios de prova racionais e à fundamentação lógica da sentença. Além disso, Max WEBER[11] enfatiza que não existem lacunas no direito (ele abarca tudo), o que demonstra a característica formal (positiva) do direito racional. Contudo, ele[12] também enfatiza que em relação à justiça, no tempo mais recente, se faz necessário o desejo de se evitar as formalidades dos procedimentos jurídicos normais, para que se tenha uma justiça mais rápida e mais adaptada ao caso concreto.


Darcy AZAMBUJA[13] também classifica como uma característica do Estado Moderno a burocracia, o Estado Burocrata marcado por um governo de funcionários públicos que, pela primeira vez, passam a movimentar e a controlar a máquina administrativa estatal.


O renomado autor Noberto BOBBIO[14] enfatiza em suas lições que no período moderno, as expressões “ciência do Estado”, “doutrina do Estado”, “ciência política”, “filosofia política” passaram a ser utilizadas para indicar o conjunto de atividades do ente estatal, sendo esse o sujeito da esfera política que ordena ou proíbe algo com efeitos vinculadores para todos os indivíduos de um determinado território.


David HELD[15] reforça a idéia de Noberto BOBBIO, demonstrando que a importância do Estado Moderno refere-se a noções de um sistema de poder, cuja incumbência é respaldar um conjunto de regulamentações e controles, que são impostos a governantes e a governados por igual. As atribuições do governo são manter o império da lei, proteger os indivíduos do uso arbitrário da autoridade política e do seu poder coercitivo. Portanto, o Estado é a base sobre a qual é possível a proteção das liberdades existentes, permitindo ao direito a concretização dos seus fins.


Quentin SKINNER[16], sob o mesmo raciocínio, aduz que no Estado Moderno há uma modificação na idéia de governante, pois esse não é mais a base do governo e do poder, mas sim a ordem legal e constitucional da instituição estatal que, demonstrando a sua lealdade diante de seus governados, passa a ser a fonte da lei e da força legítima dentro de um território.


Assim, a partir dessas características, no Estado Moderno, implanta-se o Estado de Direito, uma vez que essa instituição passa a se apresentar como uma força que se põe a si própria, por suas próprias virtudes, em busca da disciplina jurídica. Desse modo, o Estado passa a ser uma força limitada e regulada pelo direito. Isso quer dizer que todos os elementos têm existência fora do ente estatal e serão seus componentes, após sua integração em uma ordem jurídica dentro de um território.


Para José Fernando de Castro FARIAS[17], foi somente a partir da segunda metade do século XIX, que a expressão “Estado de Direito” seria utilizada com base em toda uma construção teórica em torno da questão do ente estatal, pois a maneira pela qual ele havia sido concebido no Estado Absolutista não mais se adequava ao contexto do fim do século XIX.


Ele[18] afirma, ainda, que o Estado de Direito surgira, no Estado Liberal, como justificação e legitimidade do exercício do poder jurídico. Por isso, nesse Estado, o poder arbitrário no qual a autoridade poderia tomar livremente as suas decisões, inclusive, em desacordo com a lei e com os direitos adquiridos seria censurado, pois todos deveriam se submeter ao direito, conferindo proteção aos cidadãos contra o arbítrio da instituição estatal. O Estado, então, passaria a se submeter à norma jurídica, sendo o direito o fator de organização do ente estatal, porém a sua soberania permaneceria intocada.


No Estado de Direito, o processo político é organizado por uma divisão e limitação das competências de decisão e por regras procedimentais, para que o processo ocorra de forma controlada. As competências de regulação estão distribuídas de modo que se constitua um equilíbrio organizativo dos poderes. A partir disso, os controles do Estado de Direito estão conformados de tal forma que sejam independentes dos poderes que devem ser controlados.


O autor Friedrich August Von HAYEK[19] distingue o Estado de Direito como um Estado cujas ações do governo são regidas por normas previamente estabelecidas e divulgadas, as quais tornam possível prever com razoável grau de certeza de que modo a autoridade usará seus poderes coercitivos em dadas circunstâncias, permitindo a cada cidadão o planejamento de suas atividades individuais com base nesse conhecimento. Apesar de nem sempre este ideal ser alcançado, já que os legisladores e os homens incumbidos de aplicar a lei são criaturas falíveis, é indispensável que se reduza tanto quanto for possível a conduta dos órgãos executivos, que exercem o poder de coerção, conforme a lei, a fim de se evitar a anulação dos esforços individuais mediante ação ad hoc pelo governo.


Em um momento subseqüente o autor[20] supracitado distingue o Estado de Direito do governo autoritário, concluindo que no primeiro o governo limita-se a fixar as normas estabelecendo as circunstâncias em que podem ser usados os recursos disponíveis, deixando a cargo do indivíduo a decisão relativa aos fins para os quais eles serão aplicados, permitindo às pessoas prever o comportamento daqueles com quem tem que se relacionar. Enquanto no segundo, o governo dirige o emprego dos meios de produção para finalidades específicas, isso significa que o Estado passa a dirigir as ações individuais, visando a atingir objetivos específicos, o quê torna as suas ações imprevisíveis, sendo difícil para o cidadão o planejamento de seus interesses.


No Estado de Direito, predominam as normas formais que são aquelas que indicam antecipadamente que linhas de ação o Estado deverá adotar em certas situações, definidas em termos gerais, sem referência a tempo, nem a lugar, nem a indivíduos em particular. As normas formais são, pois, instrumentais no sentido de que poderão ser úteis para pessoas ainda desconhecidas, para as finalidades que essas pessoas queiram dar-lhes e em situações que não podem ser previstas em detalhe. Sem dúvida, a partir das normas formais não se conhece seu efeito concreto, os objetivos que atenderão, a que pessoas específicas servirão, mas se sabe que tal norma beneficiará a todas as pessoas a quem elas dizem respeito.


Friedrich August Von HAYEK[21] também relata a sua preocupação com dois fatores do Estado de Direito. Primeiramente, a idéia de que enquanto todas as ações do Estado forem autorizadas pela legislação, o Estado de Direito será preservado, é uma idéia equivocada para ele[22], pois o simples fato de alguém possuir plena autoridade legal para agir não significa que se estaria agindo de acordo com a lei, vez que se evidenciam casos de governos arbitrários que se estruturam no sistema jurídico, porém agem contra os fundamentos do Estado de Direito. Em segundo lugar, ele[23] enaltece que a sociedade deve atentar-se para o excesso do formalismo que pode existir no Estado de Direito, o qual culminaria em uma igualdade formal perante a lei que não proporcionaria, na realidade, uma igualdade material entre os cidadãos.


Nesse instante, é imprescindível enfatizar as conquistas no âmbito jurídico que viriam a influenciar o quadro institucional do Estado Moderno. Ao se iniciar uma análise a partir da cidadania, a qual representa a conquista e a defesa dos direitos políticos, T. H. MARSHALL[24] identifica nela a composição de três partes (civil, política e social), que são caracterizadas por um rol de direitos.


Quando houve a separação das três partes da cidadania, afirma T. H. MARSHALL[25], que o seu distanciamento foi de tal forma que sem distorcer fatos históricos, pode-se identificar o lapso de formação de cada uma ligada a um século respectivo: os direitos civis, no século XVIII, os direitos políticos, no século XIX e os direitos sociais, no século XX.


Conforme as concepções de T. H. MARSHALL[26], os direitos civis ligados à cidadania, correspondem aos direitos necessários à liberdade individual, como a liberdade de ir e vir, a liberdade de imprensa, do pensamento, da fé, de concluir contratos válidos, o direito à propriedade, à igualdade e ao devido encaminhamento processual.


Os direitos políticos ligados à cidadania são: o direito de voto e o sufrágio universal. Todavia, para prover a implementação dos direitos políticos, eram essenciais os direitos sociais que, de acordo com T. H. MARSHALL[27], se originaram da participação nas comunidades locais e nas associações. Os direitos sociais relacionam-se desde o direito a um mínimo de bem-estar econômico e de segurança ao direito de participar da herança social e de levar a vida de um ser civilizado, através, principalmente, da materialização dos sistemas de educação e dos serviços sociais.


Conforme o elucidado, o Estado Moderno de Direito é conceituado como uma ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo. Devido a essa estrutura estatal, incrementou-se a participação política e, paralelamente, ocorreu um alargamento na conquista e na defesa dos direitos dos cidadãos (direitos civis, políticos e sociais) que se manifestaram no seio da esfera pública e que propiciaram a vinculação desses cidadãos a uma territorialidade, limitadora da ação jurídica e política do Estado.


2.2- DO ESTADO ABSOLUTO AO ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL


Enquadrado nas características do Estado Moderno, surge o Estado Absolutista no século XVIII, representado pelo monarca. É inegável que no Estado Absolutista prevalecia a vontade arbitrária do Príncipe, desaparecendo as possibilidades de defesa judicial dos particulares em relação às ofensas provindas do soberano.


Isso significa que o soberano ficava livre de qualquer sujeição, todavia, deveria manter a forma abstrata e geral dos comandos, o que diferenciava o seu governo da arbitrariedade do despotismo[28].


No Absolutismo, encontravam-se fortes tendências para a regulamentação da vida dos súditos, seus pormenores e até mesmo os assuntos mais privados, desde a confissão e a ordem do culto religioso, até ao vestuário de passeio, desde a profissão, até o simples fato de comer e beber. O Estado torna-se o grande tutor de seus cidadãos, em cujas mãos se concentravam o poder político, a soberania, que estava se desenvolvendo, e a política econômica do país.


O direito de intervenção era concedido ao príncipe, a partir do seu dever, enquanto primeiro servidor do Estado, de promover o bem estar geral, de forma pessoal ou por intermédio de funcionários do ente estatal, intervindo diretamente sem limites em todos os domínios, desde que o soberano o considerasse essencial para a promoção do bem público.


Por óbvio, para além da responsabilidade pessoal dos funcionários da instituição estatal pela prática de atos ilícitos, os particulares não dispunham de nenhum mecanismo de defesa perante o Estado.


É importante destacar que no Estado Absoluto o monarca exercia o poder enquanto órgão estatal, ou seja, o monarca seguia as regras e instruções emanadas da figura transcendente do Estado.


Uma das razões para as múltiplas intervenções desse Estado residia na política econômica do mercantilismo que prevalecia naquela época. Os exércitos permanentes, os aparelhos administrativos centralizados e a manutenção das cortes dos soberanos absolutistas provocaram uma enorme necessidade de dinheiro que se pretendia cobrir, sobretudo através de uma balança comercial positiva, o que culminava em um largo dirigismo econômico do Estado em relação à promoção e à orientação da produção industrial e agrícola de maneira a tornar prescindível a importação de produtos estrangeiros e aumentar a exportação dos próprios produtos internos.


Contribuíram para esse efeito as regulamentações dos preços, os direitos alfandegários, as proibições de importação, os prêmios de exportação e as proibições de exportação de matéria-prima.


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Tudo isso concorria para dar origem a essa forma precoce de um Estado administrativo que intervém em todos os setores, restringindo o indivíduo na sua liberdade de atuação e na sua responsabilidade, reduzindo-o a súdito tutelado. m em todos os setores, restringindo o indivorma precoce de um Estado administrativo que interv


Entretanto, o constrangimento individual e a falta de previsibilidade e segurança, provindas da atividade discricionária e ilimitada de um Príncipe, resultaram na reação da burguesia ascendente contra o referido Estado.


Afastada dos lugares de governo, a burguesia necessitava combater as arbitrariedades do Poder, que não correspondiam com a calculabilidade, liberdade e igualdade de oportunidades dos agentes econômicos solicitadas por um pleno desenvolvimento da economia na qual se configurava o emergente poder burguês.


A partir do advento da empresa capitalista, a burguesia se sentia preparada para se libertar do dirigismo do soberano, exigindo a publicidade dos negócios do Estado, o que contribuiu para o programa revolucionário de racionalização integral da entidade estatal segundo os interesses da sociedade. O Estado racionalizado significava a atuação previsível da Administração, a qual estaria limitada por regras gerais e abstratas (limitação jurídica), em que a autonomia dos cidadãos não estaria mais exposta às arbitrariedades do monarca, pois seriam protegidas pelas decisões racionais da sociedade, representada no órgão da vontade geral[29].


A limitação do ente estatal deu origem a sua personalização jurídica, a qual se revelaria essencial na construção do Estado de Direito, vez que a racionalização da instituição estatal fora responsável pela criação dos sujeitos de direito os quais começaram a constituir relações jurídicas. O monarca que se identificava com o Estado, passa a ser apenas um dos órgãos da pessoa jurídica estatal, ao mesmo tempo em que seus direitos converteram-se em faculdades limitadas pela Constituição.


Na realidade, o desenvolvimento do comércio está intimamente ligado à transformação gradual de um sistema hierárquico organizado em moldes rígidos para um sistema em que os homens podiam pelo menos tentar dirigir a sua própria vida, tendo a oportunidade de conhecer e escolher diferentes formas de existência.


Reinhold ZIPPELIUS[30], em suas dissertações, argumenta que o Estado não poderia mais regulamentar a vida econômica tal como fazia sob a influência do mercantilismo, deveria cumprir apenas três funções: proteger a nação contra atos de violência e ataques de outras nações independentes; salvaguardar todos os membros da própria nação contra agressões ilegais dos seus cidadãos; criar e manter determinadas instituições públicas.


Dentro dessa concepção destaca-se a frase francesa laissez faire, laissez passer, le monde va de lui lui-même, ou seja, deixem as coisas correrem ao seu livre curso, pois assim a economia e a vida da comunidade desenvolver-se-ão na melhor harmonia.


Assim, o Estado de Direito surgiu da luta política resultante dos movimentos e dos ideais prevalecentes no século XIX, além de uma racionalização estatal operada por uma limitação jurídica, em prol da eliminação do arbitrário.


Após a Revolução Francesa, o Estado Liberal substituiu o Estado Absolutista, fundamentado na separação: entre a política e a economia, isso significa que o ente estatal devia se limitar a garantir a segurança e a propriedade dos cidadãos, deixando a vida econômica se auto-regular pelo mercado; entre a instituição estatal e a moral, a moralidade não podia ser assumida pelo Estado, mas sim pela consciência autônoma do indivíduo; entre o ente estatal e a sociedade civil, o Estado é, unicamente, o garantidor da paz social, permitindo à sociedade o seu desenvolvimento, de acordo com as suas próprias regras.


A racionalização liberal surge como uma vitória da Sociedade sobre o Estado e com o Direito em sobreposição ao arbítrio, por meio da limitação da forma de agir do ente estatal, da divisão de poderes, ou seja, do estabelecimento de um conjunto de órgãos com competências constitucionalmente determinadas, prevalecendo o princípio da legalidade, com o objetivo último de proteger os direitos individuais e à subordinação do Poder às exigências da sociedade.


O liberalismo defendia e assegurava o livre exercício da espontaneidade individual, isso porque o indivíduo era tido como melhor árbitro de seus interesses do que a instituição estatal, não podendo existir mal maior do que permitir que outra pessoa julgasse o que convém a cada um. A partir dessa idéia, foi instaurado um Estado mínimo, com funções restritas quase que à mera vigilância da ordem social e à proteção contra ameaças externas.


John Stuart MILL[31] apresenta três objeções fundamentais à interferência do governo: ninguém é mais capaz de realizar qualquer negócio ou determinar como ou por que deva ser realizado do que aquele que está interessado, mesmo que os indivíduos não realizem tão bem o que se tem em vista, como o que fariam os agentes do governo, ainda assim é melhor que o indivíduo o faça, como elemento da própria educação mental; cada função que se acrescenta às que o governo já exerce, provoca maior difusão da influência que lhe cabe sobre esperanças e temores, convertendo, cada vez mais, a sociedade em indivíduos dependentes do poder público, ou de qualquer partido que aspire ao poder.


Dessa forma, no Estado de Direito Liberal, sob a égide da burguesia, os direitos fundamentais seriam assim, os direitos do homem individual, isolado e abstrato, tais como a liberdade pessoal, de consciência, a inviolabilidade de domicílio, o sigilo de correspondência, a propriedade privada.


O autor Friedrich August Von HAYEK[32] disserta em seu livro que o próprio sucesso do liberalismo tornou-se a causa do seu declínio. O homem alcançou o êxito, mas foi se mostrando cada vez menos disposto a tolerar os males ainda existentes e que lhe pareciam insuportáveis e intoleráveis. Por esse motivo, o homem passou a acreditar que não se poderia esperar maior progresso dentro das velhas diretrizes e da estrutura geral que permitira os avanços anteriores, mas apenas mediante a uma completa reestruturação da sociedade.


O Estado Liberal, então, criou as condições para a sua própria decadência através da valorização exacerbada do individualismo, que resultou em um ultra-individualismo, em que o homem agia de forma egoísta e ambiciosamente escrupulosa, ao lado disso, a concepção individualista da liberdade impedia o Estado de proteger os menos afortunados, enquanto os mais fortes, economicamente, usufruíam dos privilégios, causando uma crescente injustiça social. Outra conseqüência grave, que dele derivou, foi a formação do proletariado, ocorrendo a formação de grandes aglomerados urbanos miseráveis, como decorrência da Revolução Industrial, sendo que a burguesia não admitia que o ente estatal interferisse para mudar a situação estabelecida.


Os empresários e os operários eram, certamente, juridicamente livres para celebrar e rescindir contratos de trabalho, porém em termos econômicos, essa liberdade consistia, para o operário, na escolha entre trabalhar sob condições muitas vezes indignas ou morrer de fome. Por tudo isso, o Estado Liberal estava em decadência e medidas sociais deveriam ser estabelecidas pela instituição estatal.


À medida que as esperanças da nova geração se voltavam para algo novo, a compreensão e o interesse pelo funcionamento da sociedade existente sofreram brusca decadência, propiciando também o declínio da consciência de tudo que dependia da existência do sistema liberal. Disso resultou uma completa inversão de rumo, um completo abandono da tradição individualista que criou a civilização ocidental, proporcionando a instauração do Estado de Bem-Estar Social.


No Estado de Bem-Estar Social, a preocupação era com a distribuição do produto social e com a direção e controle do processo produtivo. Essa nova acepção de Estado moldava a esfera econômica, conforme as exigências sociais e os objetivos políticos por ele definidos, em prol das prioridades de desenvolvimento.


 De modo geral, a nova forma estatal passa a garantir os serviços e os sistemas essenciais ao desenvolvimento das relações sociais, diante da complexidade de tal sociedade. Além do mais, o ente estatal também passa a assegurar a estabilidade das relações de produção face às contingências da vida econômica, às flutuações do crescimento e os antagonismos sociais, incrementando políticas econômicas e fiscais conducentes à redistribuição de riquezas, com o intuito de garantir uma vida digna e protegida.


Dessa maneira, ao lado dos direitos e liberdades conquistados no Estado Liberal, surgem os direitos sociais indissociáveis das correspondentes prestações do Estado de Bem-Estar Social e de um novo tipo de relação entre Estado, cidadãos e sociedade.


3- O CONTEXTO HISTÓRICO DA INSTAURAÇÃO E DA PERMANÊNCIA DO ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL


3.1- NA EUROPA


Nas últimas décadas do século XVIII, a Inglaterra iniciou o processo de Revolução Industrial. Os capitais acumulados durante o mercantilismo e as grandes jazidas de carvão mineral, deram as condições para que a Inglaterra fosse a primeira região do globo a realizar a Revolução Industrial.


Com o desenvolvimento da industrialização, em todo o mundo, configurou-se a distinção entre empregados e empregadores, sendo que esse último ao mesmo tempo em que explorava a mão-de-obra daqueles, não se responsabilizava pelos serviços dos seus empregados, negando-lhes qualquer direito.


Dito isso, muitos empregadores se desresponsabilizavam pelos serviços de seus empregados, porém esperavam que esses os obedecessem; recusavam qualquer interferência governamental na administração de seus negócios, mas procuravam transferir ao Estado a responsabilidade por todas as conseqüências públicas adversas de seus próprios atos.


Realça-se que já no início do capitalismo industrial a miséria dos operários era deflagrada. Ademais, com base nas liberdades liberais ocorreram processos de concentração de empresas, formaram-se cartéis e a concorrência ruinosa passou a ser utilizada, neutralizando-se o mecanismo do mercado.


A Alemanha, na época, comparada com a Inglaterra, com a França e com os Estados Unidos, era um Estado retardatário no processo de industrialização e modernização. Devido a esse fato, nesse Estado, a desigualdade só se tornou controvertida no início do século XIX, com o resultado das diferenças de posição social e com a consciência da existência das classes sociais[33].


Apesar de a desigualdade ter sido evidenciada somente no início do século XIX, na Alemanha, o Estado Alemão foi o primeiro a desenvolver políticas para a redução da desigualdade social. Em face das circunstâncias, a estrutura política alemã buscava uma forma de legitimação do poder que corresponderia às exigências da construção de um Estado Social fortemente marcado por uma lógica de solidariedade social através da instituição estatal.


No final do século XIX, sob o impulso conjugado das lutas populares e das intenções políticas de reforma social, é que se assiste à implantação do Estado de Bem-Estar Social Alemão, a partir do progressivo estabelecimento por parte do próprio ente estatal dos seguros contra acidentes de trabalho ou doenças profissionais e do aparecimento de uma legislação laboral tendente a refrear os excessos mais chocantes do capitalismo selvagem, especialmente, nos domínios dos horários de labor e do trabalho infantil e feminino.


Em um momento anterior à Primeira Guerra Mundial, a tendência global se voltava para o desenvolvimento econômico, para a expansão dos mercados, para o progresso técnico, para a elevação do nível de vida da população, para a proteção da livre concorrência, enquanto a função do Estado era garantir: a segurança política, jurídica e social das relações regidas pelo direito privado, a produção de infra-estrutura para o funcionamento do sistema e uma intervenção dirigida a manter os mecanismos do mercado.


Contudo, o desenvolvimento da economia capitalista deflagrou a concentração, a centralização do capital e o controle monopolístico dos mercados, envolvendo os agentes econômicos e os próprios Estados Nacionais em uma concorrência desenfreada que causou a crise global a qual, inevitavelmente, afetou todo o sistema. A própria Guerra Mundial foi um produto natural desse sistema dilacerado.


A Primeira Guerra, acontecimento que realmente dá início ao século XX, pôs fim ao que se convencionou chamar de Belle Époque (1871-1914), período em que as grandes potências européias não entraram em guerra entre si e a burguesia viveu seu grande momento, graças à expansão do capitalismo e à exploração imposta ao proletariado[34].


Essa Guerra teve algumas causas: a rivalidade do poderio naval e a industrialização, responsáveis pelo ressentimento entre a Grã-Bretanha e a Alemanha, que surgia na disputa dos mares e de mercados mundiais; a procura pela Rússia por uma saída para o Mediterrâneo; uma onda de patriotismo insuflada pelos nacionalismos conflitantes franco-alemães que inflamou o apoio popular, levando à mobilização nacional de todas as classes sociais rumo ao conflito, dentre outros fatores[35].


Durante a Primeira Guerra Mundial a situação dos operários se agravou no mundo todo. Após a Guerra, aprovou-se, na Alemanha, a Constituição de Weimar (1919), dando grande ênfase à questão operária. As dificuldades enfrentadas pelas massas operárias propiciaram a ascensão do partido nazista e o início da segunda fase do Estado de Bem-Estar Social Alemão.


A Constituição de Weimar é caracterizada pelas declarações de direitos e normas programáticas voltadas, basicamente, para a sociedade e não para o indivíduo, dando um sentido social aos direitos e buscando reconciliar o Estado com a Sociedade. Essa Constituição representou o constitucionalismo social e influenciou, a partir do primeiro pós-guerra do século XX, as Constituições dos outros Estados que pretendiam encontrar formas de equilíbrio e de transação na ideologia do Estado de Bem-Estar Social[36].


Uma das maiores novidades da Constituição de Weimar é o reconhecimento das garantias institucionais que nada mais é do que a proteção que a Constituição confere a algumas instituições, cuja importância reconhece imprescindível para a sociedade, bem como a certos direitos fundamentais providos de um elemento institucional que os caracteriza. Enfim, a garantia institucional visa preservar, invariavelmente, o mínimo da essencialidade da instituição, que não deve ser atingida nem violada, porque se isso acontecesse, implicaria no perecimento do ente protegido[37].


Alguns dos direitos sociais contemplados pela Constituição de Weimar são: a igualdade material; a subordinação do direito de propriedade ao interesse social ou coletivo; o salário mínimo; as férias anuais do operário, obrigatoriamente, remuneradas; a indenização ao trabalhador dispensado sem justa causa; o amparo à maternidade e à infância; o socorro às famílias de prole numerosa; a instituição da Justiça do Trabalho; a submissão da família, da educação e da cultura à proteção especial do Estado.


Portanto, o poder público, mediante prestações positivas e materiais, cumpre a sua função de concretizar os direitos sociais ou fazer eficazes os princípios para a conservação e para a integridade do Estado de Bem-Estar Social. Logo, o recurso às normas programáticas, tendo em vista reconciliar o Estado e a Sociedade, de acordo com as bases intervencionistas, implantou o constitucionalismo social do século XX e colocou fim, por completo, ao Estado Liberal.


Cabe ressaltar que as próprias necessidades da Guerra exigiam da entidade estatal uma intervenção acentuada na vida econômica, que se perpetuou devido à reconstrução dos Estados, que haviam sido destruídos.


Em 1929, ocorreu uma grande depressão econômica que agravou os problemas econômicos e sociais dos Estados capitalistas, e levou camadas populares a apoiar os movimentos extremistas tanto da esquerda (comunistas) como da direita (fascistas)[38].


Todavia, tanto na crise de 1929, quanto nas crises bancária e monetária que foram evidenciadas naquela época, o Estado de Bem-Estar Social, que já era a estrutura estatal dos Estados europeus, mais uma vez, reafirmou e evidenciou a sua necessidade na regulação e no controle desses setores, quando administrou as crises citadas.


Em 1939, inicia-se a Segunda Guerra Mundial que foi um prolongamento da Primeira, a qual havia deixado na Europa uma série de questões não resolvidas. Após o término da Segunda Guerra, os Estados Unidos, a Grã-Bretanha e a URSS reuniram-se para construir um novo mapa geopolítico europeu, além de instalarem o Tribunal Internacional de Nuremberg para julgar os crimes de guerra dos nazistas.


3.2- NOS ESTADOS UNIDOS


Os Estados Unidos, completado o período de reconstrução da Pós-Secessão, já eram a quarta potência industrial no ano de 1860. No final do século, essa instituição estatal chegou em primeiro lugar, somando as produções combinadas das indústrias britânica e francesa.


A demanda industrial estimulou a expansão da produção de energia, assim como de recursos naturais. A produção carbonífera e a indústria madeireira aumentaram a sua representatividade, ao mesmo tempo em que as imensas reservas de minério de ferro foram descobertas nos Grandes Lagos e em Pittsburgh, estimulando as siderúrgicas. A agropecuária também foi desenvolvida, através da utilização de novas máquinas agrícolas (ceifadoras, colhedoras, equipamento de laticínios), proporcionando a impulsão das indústrias de alimentos.


Entre os anos de 1860 a 1910, a população americana empregada passou de 10,5 para 37 milhões, concentrando-se na indústria manufatureira, que atraiu a população agrícola. Em 1880, a produção de manufaturas já ocupava o trabalho de 7 milhões de operários, com predominância masculina e participação feminina nas indústrias de menor especialização. No ano de 1889, os operários trabalhavam de 50 a 60 horas semanais, perfazendo como salário médio cerca de 22 centavos por hora[39].


Por óbvio, as condições de trabalho nas fábricas eram ruins e as condições de moradia, a assistência social e a sanificação dos trabalhadores eram deficientes. Além disso, existia uma má distribuição de renda na sociedade, pois um terço da riqueza nacional americana pertencia a 2% do total de unidades familiares.


Agitações trabalhistas ocorreram entre os anos de 1881 a 1900, porém as greves tiveram êxito limitado ante a confrontação com as grandes corporações. Mesmo assim, alguns esforços em favor da justiça social foram vitoriosos, progressivamente, até a Primeira Guerra: o trabalho infantil passou a ser proibido e houve a redução do número de horas de trabalho em áreas insalubres.


Apesar da projeção dos Estados Unidos no Hemisfério Ocidental e do Japão expansionista no Extremo Oriente, seria a política européia que lançaria o mundo na Primeira Guerra Global, lutada ainda, mormente no continente europeu.


As primeiras conseqüências da Guerra para os Estados Unidos relacionaram-se à retirada de investimentos mobiliários, ocasionando a crise da Bolsa de Nona York, o crescimento das exportações para a Europa, os empréstimos americanos ao Reino Unido e à França.


A partir do ano 1920, os Estados Unidos vivenciaram uma grande depressão ocasionada pela expansão desordenada do crédito agrícola, pelo crescimento industrial desenfreado, pela introdução de máquinas para a produção com menor emprego de mão-de-obra, pelo acúmulo extensivo de estoques de capital, pelo dinheiro barato, pelas prestações e recurso à hipoteca e pelo declínio do comércio externo pela competição européia.


A expansão do crédito bancário e a especulação financeira nos Estados Unidos geraram uma grave crise econômica, que atingiu o seu limite com a quebra da Bolsa de Nova York. Mais de 9 mil bancos e 85 mil empresas decretaram falência e a cotação das ações caiu em média 85% entre os anos de 1929 e 1932.


A redução dos salários chegou a 60% e o desemprego atingiu 13 milhões de pessoas. A crise ganhou dimensão mundial com a diminuição do crédito norte-americano a outros Estados e com a elevação das tarifas alfandegárias americanas, provocando, conseqüentemente, a retração no comércio exterior[40].


Essa crise econômica mundial demonstrou aos Estados Unidos, de forma drástica, a incapacidade da economia para a sua auto-regulação conjuntural. As crises bancária e monetária, que foram verificadas, naquela época, evidenciaram que a regulação e o controle também eram imprescindíveis naqueles setores.


No auge da crise provocada pela quebra da Bolsa de Nova York, em 1933, Franklin Roosevelt é eleito presidente dos Estados Unidos, encontrando o povo americano em situação alarmante.


Por isso, enfrentou a resistência dos empresários e dos tradicionalistas e lançou seu programa de governo, New Deal (Novo Acordo), que era uma política intervencionista.


O programa instaurado por Roosevelt propunha reformas econômicas e sociais para combater o desemprego e aumentar a produção industrial por meio de investimentos estatais.


A revolução econômica e social da era Roosevelt afetou radicalmente os princípios tradicionais americanos da livre-iniciativa, erigindo todo um mecanismo estatal que iria interferir em todos os setores da economia e da sociedade desse Estado.


Várias agências governamentais, reguladoras do processo econômico, foram impostas. Criaram-se as seguintes leis: da economia, do corpo civil de conservação, de reformulação agrícola, de administração das obras públicas, de recuperação industrial. As despesas orçamentárias levaram à desvalorização da moeda para forçar o aumento dos preços e a diminuição da dívida interna. O padrão ouro foi, temporariamente, suspenso, o metal recolhido aos Bancos Federais de Reserva e o Tesouro passou a cunhar moedas de prata, comprando a produção doméstica.


Fortalecido pela vitória eleitoral, Roosevelt instaurava a segunda fase do New Deal que propiciou o crescimento do PIB, inclusive per capita; da produção industrial; dos preços agrícolas e de mercado.


De modo geral, a sociedade americana aceitou o princípio da regulamentação para a prevenção da própria iniciativa privada, já que se encontrava sem alternativas, reconhecendo e votando pelas transformações sociais dentro do regime democrático-capitalista.


Em suma, evidencia-se que enquanto o Estado de Bem-Estar Social havia sido implantado na Alemanha no final do século XIX, só foi instituído nos outros Estados europeus e nos Estados Unidos após a Primeira Guerra Mundial, nesse último a estrutura do Estado de Bem-Estar Social fora instaurada por meio da política do New Deal, com o intuito de suavizar as conseqüências da desigualdade social e para reerguer o país da depressão.


4- O ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL (Welfare State)


O ilustríssimo autor Léon DUGUIT[41] defendia que no final do século XIX e no início do século XX era preciso repensar o ente estatal, a fim de dar conta da crescente complexidade do Estado e da Sociedade. Certamente, essa nova instituição estatal deveria implicar em uma lógica de predominância da ordem do direito da solidariedade sobre a ordem do individualismo jurídico.


Não bastava uma reformulação do Estado Liberal, mas sim uma mudança no plano das práticas sociais, que testemunhariam a aparição de uma nova forma de Estado.


Conforme as observações de Léon DUGUIT[42], o Estado não poderia permanecer passivo diante dos problemas sociais. Para isso, seria preciso o crescimento do papel da instituição estatal, legitimando a sua intervenção na economia como fator de realização da igualdade e da solidariedade social, ao mesmo tempo em que seria garantida a liberdade da sociedade.


Em um momento posterior ao amadurecimento da idéia quanto à necessidade de transformação da forma de ação estatal, o Estado Liberal foi substituído pelo Estado de Bem-Estar Social, o qual empregava o seu poder para suavizar as conseqüências da desigualdade social.


Desse modo, a estatização e a autonomização do social seriam os dois vetores essenciais da lógica do Estado de Bem-Estar Social (Welfare State).


Frisa-se, que o Welfare State não implicava apenas no reconhecimento da intervenção dos grupos de interesse e organizações sociais na tomada das decisões políticas centrais, mas também na recondução institucional dessas decisões à vontade democrática defendida pela sociedade, tendo o cidadão uma função de participante, e não de mero recipiente da intervenção estatal. Dessa maneira, a estrutura estatal reconhecia os mecanismos da democracia política como forma de materialização do Estado de Direito, rejeitando qualquer atuação discricionária ou arbitrária.


O Estado de Bem-Estar Social foi o resultado de um compromisso entre as classes sociais, em relação à base do crescimento econômico. De certa forma, as classes dominantes aceitaram a redistribuição do produto social por intermédio do Estado, o qual se comprometeu em instrumentalizar e aplicar políticas de redistribuição das rendas em favor de políticas fiscais coerentes com esse propósito, com o fim de se atingir uma paz social[43].


Então, as classes dominantes permitiram, politicamente, o reconhecimento das instituições político-sociais das classes dominadas, em troca, exigiram do Estado a permanência dos fundamentos da produção capitalista. Em contrapartida, as classes dominadas aceitaram esta política de rendas que, em curto prazo, possibilitou o incremento de seu consumo, atrasou a probabilidade de realização de uma revolução social e resultou no reconhecimento de suas instituições próprias, como partidos e sindicatos.


Ademais, as profundas transformações econômicas, sociais e industriais que haviam ocorrido até esse momento, exigiam uma noção mais ampla do serviço público, não se limitando somente às atividades tradicionais de segurança, de polícia e de justiça. Era preciso dar ao ente estatal condições para o desenvolvimento da solidariedade social cada vez mais complexa, através da organização de um serviço público capaz de garantir as redes de comunicação, as necessidades de transporte público, de energia elétrica, de assistência médica, de ensino. Todos esses elementos sociais deveriam ser conhecidos dos governantes, que submetidos ao direito, seriam obrigados a agir, por meio daqueles, em prol de beneficiar a sociedade.


Além disso, o advento da Segunda Guerra Mundial iria estimular ainda mais o intervencionismo do Estado, pois novas necessidades precisavam ser suprimidas pela iniciativa estatal em relação a vários setores, o quê fez com que essa entidade assumisse amplamente o encargo de assegurar a prestação dos serviços fundamentais a todos os indivíduos, ampliando ainda mais a sua esfera de ação.


A necessidade de controlar os recursos sociais e obter o máximo proveito com o menor desperdício, para fazer face às emergências da guerra, leva a ação estatal a todos os campos da vida social, não havendo mais qualquer área interdita à intervenção do Estado.


Desse modo, o Estado de Bem-Estar Social surge com a proposta de administrar e intervir na sociedade, prestando-lhe serviços, com o objetivo final de minorar a sua situação de miséria, assegurando-lhe um mínimo de subsistência vital.


Por meio de uma política conjuntural, o Welfare State esforça-se por lograr uma estabilidade referente aos preços das mercadorias, uma alta taxa de emprego, um equilíbrio no plano da economia externa, um crescimento econômico constante e suportável, assumindo o Estado, cada vez mais o papel de administrador da justiça distributiva, com crescente tendência ao nivelamento.


As políticas do Estado de Bem-Estar Social fizeram possível certo crescimento econômico, pois funcionou com relativa eficácia a política de redistribuição do produto social que proporcionou uma maior capacidade aquisitiva dos trabalhadores; a aparição dos direitos sociais; uma aproximação notável ao pleno emprego.


Ressalta-se que os direitos sociais, que são obras das doutrinas sociais, cujo surto mais autêntico se iniciou nesse período (século XX), fundamentam-se na concepção de que o Estado deve favorecer a incrementação das aptidões físicas, morais e intelectuais do indivíduo em benefício da sociedade, criando todas as facilidades para o completo desenvolvimento da personalidade humana. Assim, os direitos sociais são normas de ação, obrigações positivas da instituição estatal em promover, assegurar e melhorar a saúde pública e a assistência social sob todas as suas formas[44].


O desenvolvimento dos direitos sociais, as novas funções do ente estatal, a situação de “paz social” vivenciada pelos cidadãos e o crescimento da produção geraram uma euforia capitalista na década dos anos sessenta, porque a sociedade acreditava que o capitalismo havia superado as crises que lhe caracterizaram, sendo possível se falar em um crescimento permanente e auto-sustentado[45].


No entanto, na realidade, os indivíduos estavam completamente dependentes do fornecimento, pelo Estado, de bens de consumo essenciais. Afigurou-se, porém, indesejável confiar às empresas privadas a administração das elementares necessidades existenciais.


Com o decorrer do tempo, a ação do Estado de Bem-Estar Social estendeu-se à assistência social, à proteção ao trabalho, à assistência no desemprego, ao apoio à família, ao fomento da construção habitacional, à preservação do meio ambiente, ao fomento das ciências, dentre outros.


Um excesso de intervenção estatal resultou não só em uma confiança exacerbada pelo planejamento institucional como também em uma única alternativa para todos os casos de necessidade da sociedade, vez que o Estado passou a administrar tudo, dirigindo e tutelando a todos. O resultado disso foi o inchaço do ente estatal que em certo momento não conseguiu mais atender às necessidades do seu povo[46].


5- A CRIAÇÃO DOS ORGANISMOS INTERNACIONAIS


É indiscutível que o mundo é uma sociedade de Estados, na qual, ainda, não há uma interligação jurídica dos fatores políticos. Para se reconhecer um Estado, como pessoa jurídica de direito público, é essencial a comprovação de sua soberania, assim, a referida sociedade política deve demonstrar as suas condições de assegurar o máximo de eficácia para a sua ordenação em um determinado território e que isto ocorra permanentemente.


O que diferencia o Estado das demais pessoas jurídicas de direito internacional público é que só ele tem soberania. Logo, no âmbito interno a instituição estatal é uma afirmação de poder superior a todos os demais, já no externo é uma afirmação de independência.


Realça-se que, de fato, é relativo o conceito de soberania no plano internacional e a sua regulação jurídica é aparente, pois os Estados mais fortes modificam o direito quando lhes convém. Mesmo assim, o reconhecimento jurídico da soberania ainda é importante, uma vez que a sua conseqüência qualifica como ilegítimo o uso arbitrário da força.


Já no século XIX, alguns Estados se convenceram de que, em razão da natureza dos interesses comuns que começavam a surgir, seria mais prática a constituição de órgãos internacionais permanentes, ao invés de se reunirem em conferências diplomáticas de maneira pontual e descontínua, como haviam feito até então.


Diante desse novo panorama, surgiram as primeiras organizações internacionais, as quais tratavam das questões técnicas. Em 1815, foi criada uma comissão fluvial internacional para tratar da administração conjunta da navegação no Reno e, em 1856, criou-se a comissão do Danúbio. Na segunda metade do século XIX, em torno das questões administrativas, foram criados instrumentos de cooperação, tais como a União Telegráfica (1865), a União Postal Universal (1874), a União para a Proteção da Propriedade Intelectual (1883) e a União das Ferrovias (1890).


Nos anos de 1899 e 1907, as duas primeiras Conferências de Haia foram responsáveis pelo encontro entre as experiências multilaterais européias e americanas que tentaram, de forma inédita, estabelecer princípios jurídicos comuns para a organização internacional.


Em 1900, em face das condições de trabalho e de vida dos operários das manufaturas, uma conferência diplomática, realizada em Paris, criou a Associação Internacional para a Proteção legal dos Trabalhadores (AIPLT).


No início do século XX, as disputas entre as grandes potências provocaram a Primeira Guerra Mundial. Terminada a Guerra, surgiu a primeira tentativa para a constituição de uma organização mundial de Estados, que protegesse todos os entes estatais, opondo barreiras aos mais fortes. Essa tentativa fracassou e, posteriormente, ocorreu a Segunda Guerra Mundial.


Depois disso, com a aproximação dos Estados em decorrência da Guerra e devido ao temor, sob a estrutura dos Anos Dourados do Estado de Bem-Estar Social, multiplicaram-se as organizações internacionais, dotadas de personalidade jurídica de direito das gentes, de aptidão para manifestar uma vontade distinta daquela de seus Estados membros e que afirmavam a ilegitimidade da submissão de um povo a outro, culminando em um grande surto de novos Estados e de forças que se preocupavam com o equilíbrio mundial[47].


Na prática, os Estados se integram em uma ordem jurídica, mas não existe nenhum órgão superior de poder a que todos se submetam. Devido a essa ausência é que, nos últimos tempos, têm sido criadas muitas organizações internacionais dotadas de um órgão de poder, modificando os termos de relacionamento entre as instituições estatais.


A maior causa da inter-relação estatal se deu pelo fato de um Estado não poder mais defender uma política econômica isolacionista, já que a sua prosperidade econômica passou a estar em função dos demais Estados, sendo preciso a derrubada das barreiras aduaneiras levantadas pela política protecionista. Dessa forma, o motivo principal do surgimento das organizações internacionais foi a necessidade da manutenção da paz na comunidade internacional, evitando-se que os possíveis litígios entre dois ou mais Estados fossem solucionados por meio da força. Para se evitar métodos violentos foram apresentados, inclusive, modos de soluções pacíficas (medidas diplomáticas, coercitivas e jurídicas)[48].


É verdade que o ingresso de qualquer Estado em uma organização internacional é um ato voluntário que a entidade estatal realiza quando o deseja, pois é imprescindível que no momento em que se proponha ao acordo renuncie a alguns de seus direitos em favor da organização, mas também é verdade que todos sentem a necessidade e mesmo a imperiosidade desse ingresso. Indubitavelmente, as entidades internacionais tendem ao concerto das civilizações e a sua existência e funcionamento são as provas mais concretas da própria existência do Direito Internacional.


Ricardo Antônio Silva SEITENFUS[49] define as organizações internacionais como sendo uma sociedade entre Estados que se constitui por meio de um Tratado, cuja finalidade é o estabelecimento de interesses comuns através de uma permanente cooperação entre seus membros. É essencial destacar que os tratados constitutivos de uma organização internacional têm como objetivo a determinação de direitos e de obrigações entre os Estados membros ou entre esses com as organizações internacionais. Por essa razão, os Estados mais débeis ingressam nas organizações em busca de legitimação e segurança.


Ademais, as organizações introduzem o chamado multilateralismo que é a cooperação internacional de dois ou mais Estados com o intuito de atingir fins comuns e criam normas que os Estados soberanos obrigam-se a respeitar, para que possam integrá-las.


Isso acontece porque os entes estatais, ao manterem suas prerrogativas tradicionais de exercício de poder, concordaram em criar mecanismos multilaterais dotados de instrumentos capazes de atuarem nos mais diversos campos, inclusive de forma preventiva, como por exemplo, quando se trata da manutenção da paz e da segurança internacionais. No entanto, as funções das organizações internacionais são percebidas distintamente por cada Estado membro.


5.1- AS CARACTERÍSTICAS DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


As características principais das organizações internacionais são: a multilateralidade, a permanência e a institucionalização.


A multilateralidade pode caracterizar-se pelo regionalismo ou pelo universalismo. O primeiro pertence ao espaço físico delimitado geograficamente, enquanto o segundo não faz discriminação de origem, de organização política ou de localização dos Estados membros. As relações entre as organizações regionais e as universais são estabelecidas nos tratados constitutivos, sendo que os compromissos assumidos pelas instituições estatais em âmbito regional não podem ser incompatíveis com os firmados na organização universal.


A permanência das organizações internacionais refere-se ao seu prazo indefinido de duração, ou seja, não há limite temporal de existência de uma organização em seu ato constitutivo. Isso não pressupõe que seja perene, pois muitas organizações já não existem mais, além disso, os próprios Estados membros podem desobrigar-se e delas retirar-se, após cumprir o rito previsto no tratado constitutivo[50].


A institucionalização é constituída por três elementos: a previsibilidade, a soberania e a vontade do Estado em se aderir à organização.


Quanto à previsibilidade, a organização, em seus tratados, prevê fatos e condutas que se concretizarão na realidade, atribuindo-lhes conseqüências. Dessa maneira, cria-se um espaço institucional de solução de conflitos e de relacionamento interestatal fundado na estabilidade do sistema e em um maior grau de justiça das decisões coletivas. Naturalmente, essas vantagens dependem da equação de poder compreendida pela organização internacional, tanto quanto da eficácia de sua atuação.


A soberania relaciona-se à necessidade de o Estado redimensionar certas competências que antes pertenciam ao seu absoluto domínio nacional, a partir do momento em que se encere em uma organização internacional.


O último elemento refere-se à vontade manifestada pelo Estado de aderir à organização internacional, condicionando sua posterior aceitação ao processo decisório em curso, contanto que respeite os tratados acordados.


Assim, a existência de uma organização internacional pressupõe a manifestação da vontade dos Estados membros, cuja formalização jurídica se dará pela assinatura de um tratado que implica na responsabilidade estatal. Do ponto de vista jurídico o tratado possui características de um acordo e também representa uma espécie de Constituição, pois determina a estrutura e o funcionamento de um novo ente autônomo.


5.2- A CLASSIFICAÇÃO DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


Ricardo Antônio Silva SEITENFUS[51] relata que após a Segunda Guerra Mundial, identifica-se a seguinte classificação das organizações internacionais: pela natureza de seus propósitos, atividades e resultados; pelo tipo de funções que a elas se atribuem; pelos poderes ou estrutura decisória que elas dispõem; pela sua composição.


A primeira classificação se estrutura, basicamente, em organizações internacionais de objetivos políticos ou em organizações que objetivam a cooperação técnica. Aquelas enfrentam questões essencialmente conflitivas com o objetivo de manter a paz e a segurança internacionais, já essas trabalham com assuntos vinculados à cooperação funcional, buscando a aproximação de posições e a tomada de iniciativas conjuntas em áreas específicas.


As organizações internacionais de natureza política podem pretender agregar todos os Estados do mundo (como a Organização das Nações Unidas – ONU) ou somente alguns deles (como a Organização dos Estados Americanos – OEA).


Seu traço fundamental é o caráter político-diplomático de suas atividades, pois essas influenciam sobre questões vitais dos Estados membros, tais como a sua soberania e a sua independência nacional. Desse modo, para o Estado integrar-se à organização, terá, obrigatoriamente, que observar certas normas de convívio internacional, que tendem a impedir a tomada de decisões militares externas ou mesmo de algumas decisões internas que venham a ferir os compromissos assumidos, sem a anuência prévia da organização internacional, sob pena do referido organismo agir de forma que o Estado membro repare os seus atos lesivos.


Em contrapartida, as organizações de cooperação técnica são delineadas pela natureza dos problemas que só podem ser enfrentados com a ação do coletivo internacional. Trata-se, por exemplo, do combate às epidemias (Organização Mundial da Saúde – OMS) ou a busca de melhoria da produtividade agrícola (Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura – FAO).


A outra classificação se estrutura nas funções das organizações internacionais que podem se estruturar: para aproximar posições dos Estados membros, para que a tomada de decisões seja compatível com os interesses de todos (como a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE); para adotar normas comuns de comportamento de seus membros (ocorre nas áreas de direitos humanos, da saúde pública internacional, dentre outras); para solucionar crises nacionais ou internacionais provindas de catástrofes naturais, conflitos internacionais, guerras civis através de ações operacionais; para prestar serviços aos Estados membros, principalmente, no campo da cooperação financeira e do desenvolvimento (como o Fundo Monetário Internacional – FMI e o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento – Banco Mundial).


A terceira classificação se fundamenta na forma de tomada de decisões, para isso é necessário distinguir como o poder decisional é repartido entre os membros.


As regras do processo de tomada de decisões dividem-se entre aquelas que impõem a unanimidade para que um organismo tome uma decisão, a qual dificilmente será alcançada devido à diversidade entre os parceiros e a disparidade das suas expectativas e atuações, e as que estabelecem diferentes tipos de maioria para definir o resultado das votações, como a maioria quantitativa (considera-se cada Estado como um voto), a maioria qualitativa (a organização diferencia os membros segundo critérios próprios, atribuindo a cada Estado membro um determinado coeficiente a ser computado após a sua votação) e o sistema misto (exige a dupla maioria, quantitativa e qualitativa).


Assim como a observação das regras, a publicização dos debates é um procedimento de suma importância para a tomada de decisões, pois além de conceder transparência e respeito às posições diferenciadas, permite que o próprio processo decisório sofra a influência que a opinião pública nacional exerce sobre seus delegados, bem como revela a possibilidade de afirmar-se uma opinião pública internacional.


Também cabe elucidar o papel dos órgãos permanentes das organizações internacionais, em particular do Secretariado que, de acordo com cada organismo, pode ser dotado de um substancial poder para direcionar a tomada de decisões e controlar a sua aplicação. Um exemplo é o Secretariado-Geral da ONU, porque possui o direito de iniciativa de reunir o Conselho de Segurança. Entretanto, seu poder depende do perfil da organização. Através de tal prerrogativa, pode-se esboçar a autonomia da entidade, porque esse órgão permanente atua em nome da organização.


A última classificação refere-se à composição da entidade internacional que pode ser: regional (a organização se estrutura pela proximidade geográfica dos seus Estados membros, como a Associação das nações do Sudeste Asiático – ASEAN ou pelos interesses e objetivos comuns dos seus membros como a Organização dos Países Exportadores de Petróleo – OPEP); universal (não é feita qualquer discriminação para o ingresso dos Estados, dividindo-se em organizações com objetivos amplos, como a Organização das Nações Unidas – ONU ou com fins específicos, como a Organização Internacional dos Trabalhadores – OIT).


Dalmo de Abreu DALLARI[52], distintamente, classifica as organizações internacionais somente em: organizações para fins específicos (podem agrupar Estados de uma região ou de todas as regiões do mundo, apresentando, sempre, como característica um objetivo limitado a determinado assunto); organizações regionais de fins amplos (sua característica principal é a circunstância de só agrupar Estados de determinadas regiões, tendo competência para conhecer de todos os assuntos que podem interessar aos Estados a ela pertencentes, em favor da convivência harmoniosa e do progresso uniforme daqueles); organizações de vocação universal (pretendem reunir todos os Estados do mundo e tratar de todos os assuntos que pode interessá-los).


Celso D. de Albuquerque MELLO[53] acredita que as organizações internacionais podem ser classificadas de acordo com vários critérios.


Quanto as suas finalidades, elas podem ter finalidades gerais (predominantemente políticas) ou especiais (podem ser políticas, econômicas, militares, científicas, sociais e técnicas).


Quanto a seu âmbito territorial, elas podem ser parauniversais (não possuem qualquer limitação geográfica para que um Estado venha a ser seu membro), regionais (o tratado institutivo determina o seu campo de atuação), quase-regionais.


Quanto à natureza dos poderes exercidos, elas podem ser intergovernamentais (os órgãos são constituídos por representantes das instituições estatais e os Estados executam as decisões dos órgãos) ou supranacionais (os titulares dos órgãos atuam em nome próprio, não como representantes dos Estados, e as decisões são diretamente aplicadas no interior dos Estados membros).


Quanto aos poderes recebidos, elas podem ser de cooperação (procuram coordenar as atividades dos membros) ou de integração (efetiva comunicação entre os Estados de uma região, o que desenvolve o sentido de comunidade entre eles, com o intuito de manterem a paz, de aumentarem suas potencialidades, de realizarem determinados objetivos, de possuírem nova imagem e identidade).


5.3- O PODER DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


Reinhold ZIPPELIUS[54] enaltece que a multiplicação das organizações internacionais foi resultado da intensificação das relações e interdependências econômicas a nível mundial, da enorme aceleração dos transportes internacionais e da troca de informações de natureza econômica, militar, técnica, científica, dentre outras.


Acabada a Segunda Grande Guerra, foram desenvolvidos sistemas intercontinentais de armamento suficientemente potente para aniquilar grande parte da humanidade, surgindo, como conseqüência, sistemas defensivos, como espécies de organizações internacionais, de grande alcance militar.


Ricardo Antônio Silva SEINTEFUS[55] afirma que as organizações internacionais desfrutariam de limitada ou escassa autonomia. Por isso, se para os Estados débeis, as organizações internacionais tendem a representar uma garantia de independência política e uma forma de buscar o desenvolvimento econômico, para os países poderosos elas significam, na maioria das vezes, tão-somente um terreno suplementar, no qual atua seu poder nacional.


Para esse autor[56], como decorrência desta situação, o meio internacional no qual a ação e o discurso das organizações internacionais se manifestam, indicam que a sua ideologia estaria intimamente vinculada a dos Estados membros.


A partir disso, a trajetória ideológica das organizações internacionais repousaria em cinco momentos distintos após o ano de 1945: o funcionalismo (baseada no princípio de que as organizações internacionais deveriam servir os interesses da sociedade, descartando a preponderância da influência dos Estados); o desenvolvimentismo (em plena oposição leste/oeste, as organizações precisariam atuar mais incisivamente na manutenção da paz e da segurança); o transnacionalismo (a incapacidade dos países pobres em dispor de divisas, inviabilizando, portanto, as importações de bens de capital, induziria a oferecer condições para a instalação em solo pátrio de filiais de empresas estrangeiras, assim, as organizações presumiriam que essas empresas seriam os elementos dinâmicos do processo de desenvolvimento); o globalismo (identificaria a escassez de matéria-prima no planeta e os efeitos perversos, do ponto de vista ecológico, da busca incessante pelo crescimento econômico); a globalização (em razão de suas características, a globalização enfraqueceria o papel do Estado e das organizações em benefício das transnacionais privadas).


Logo, tanto o surgimento das organizações quanto a sua evolução, representariam o resultado de um processo de relações de forças, sem, contudo, colocar em risco o poder exercido pelos Estados mais fortes. Nesse sentido, as organizações internacionais formalizariam e institucionalizariam uma espécie de hegemonia consensual.


Sem dúvida nenhuma, a organização internacional, de acordo com os seus interesses, trata distintamente um Estado membro do outro, conforme a sua relevância internacional e o seu poder de imposição. Porém, é inegável a autonomia e o poder que as organizações internacionais possuem em relação aos seus Estados membros.


Acertadamente e sob outro viés, Reinhold ZIPPELIUS[57] defende que as crescentes interdependências e interligações organizatórias entre os Estados contribuíram não só para facilitar a cooperação nos domínios das políticas externa, econômica e de segurança, como também para reforçar e equilibrar os controles internacionais e as relações de poder. Por meio dessa defesa, constata-se que as organizações internacionais, ideologicamente, foram criadas para harmonizar as relações entre os Estados, porém, sua atuação real é politicamente desenvolver relações de poder.


Isso ocorre porque mediante as tradicionais obrigações, derivadas de tratados de direito internacional, não era possível satisfazer ao enorme volume de tarefas de ordenamento e harmonização supranacionais, sendo indispensável à formulação de instituições que defendesse os interesses comuns, coordenasse os interesses divergentes e harmonizasse os interesses antagônicos cuja envergadura ultrapassava os Estados singulares.


O renomado internacionalista Celso D. de Albuquerque MELLO[58] enfatiza que a proliferação das organizações internacionais aconteceu quando os Estados se encontravam debilitados, tanto por razões estruturais como por razões políticas, que os impossibilitavam na concretização de seus objetivos, por isso permitiram que as entidades internacionais os auxiliassem.


Para ele[59], as organizações internacionais, como uma espécie de superestrutura da sociedade internacional, constituem um reflexo das relações internacionais, entretanto, uma vez constituídas, elas passam a influenciar o meio social que lhes deu origem. Por isso, esse autor[60] elenca uma série de funções e potencialidades das entidades internacionais, tais como: exercem influência nas decisões do Estado; desenvolvem meios para controlar conflitos; atuam contra o nacionalismo ao defenderem o internacionalismo; representam um canal de comunicação entre os Estados; constituem um mecanismo para a tomada de decisões; protegem os direitos humanos; garantem a segurança dos Estados; legitimam determinadas situações, bem como asseguram que as suas transformações sejam pacíficas e contribuam, de diversas maneiras, para a formação de normas internacionais.


O célebre autor António Manuel HESPANHA[61] acredita que a criação de instâncias supra-estaduais de regulação, a um nível superior ao dos Estados, aconteceu para que esses organismos pudessem condicionar, decisivamente, as políticas estaduais.


Assim, com esses enormes poderes em suas mãos, as organizações internacionais respondem à necessidade de especificação, promoção e concretização das finalidades comunitárias, ao mesmo tempo em que equilibra os interesses federativos. Inclusive, a prática de negociar e regular, casuisticamente, questões individuais entre os Estados interessados foi abandonada, vez que as organizações internacionais passaram a ser as instituições responsáveis pelo planejamento e pela regulação dessa matéria, devendo realizar uma coordenação multilateral dos interesses de todos os Estados envolvidos.


Como para a consecução das finalidades fundamentais de uma organização internacional, exige-se a utilização de meios imprescindíveis, é necessário que essa entidade seja dotada de personalidade jurídica. Por causa dessa personalidade, as organizações internacionais possuem direitos e deveres que devem depender dos seus objetivos e funções, enunciados ou implícitos em seu ato constitutivo e desenvolvidos na prática.


Os critérios essenciais de aferição da personalidade jurídica pelas organizações internacionais devem ser: a associação permanente de Estados, dotada de órgãos próprios e que pratica fins lícitos; a distinção, em termos de poderes e fins jurídicos, entre a organização e os seus Estados membros; a existência de poderes jurídicos que possam ser exercidos no plano internacional, e não unicamente no âmbito dos sistemas nacionais de um ou mais Estados[62].


Paul REUTER[63] insiste em afirmar que a personalidade jurídica de direito das gentes não é a fonte da competência da organização, mas seu resultado. Se os Estados membros projetam a organização internacional, conferindo-lhes prerrogativas próprias e autonomia em relação a cada Estado membro, por óbvio, há a personalização desse ente internacional. Logo, o elemento mais indicativo e expressivo da personalidade jurídica de uma organização é a sua competência para celebrar tratados em seu próprio nome.


No entanto, uma organização pode existir, mas não possuir os órgãos e objetivos necessários para ter personalidade jurídica. Entidades conjuntas de Estados podem ter competências restritas e independência limitada, não possuindo personalidade jurídica, como é o caso das agências e órgãos subsidiários das organizações, tais como a Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento, o Alto Comissário para os Refugiados e o Departamento de Assistência Técnica em relação às Nações Unidas.


Contudo, a maior parte das organizações são sujeitos de direito internacional, possuem a capacidade de serem titulares de direitos e deveres internacionais e possuem a prerrogativa de fazerem valer os seus direitos através de reclamações internacionais.


Esses direitos que lhe são reconhecidos, muito embora não sejam estipulados ou homologados nos textos de suas regulamentações, são competências e obrigações que constam, de maneira implícita, no texto de seus estatutos, logo, não são taxativos, mas sim decorrência das atribuições que lhes são inerentes.


As organizações internacionais têm poderes similares aos do Estado, fazendo com que a soberania deste seja diminuída. Os poderes das entidades internacionais são: o poder de concluir os tratados (o instrumento constituinte não confere, normalmente, a faculdade geral de concluir tratados, mas tal faculdade pode ser estabelecida pela interpretação do instrumento como um todo e pelo recurso aos poderes implícitos[64]); o poder de possuir privilégios e imunidades (para funcionarem com eficácia, as organizações exigem um mínimo de liberdade e segurança jurídica para os seus bens, suas sedes, seus funcionários, para os representantes dos Estados membros acreditados junto das referidas organizações); o poder de patrocinar reclamações internacionais (que dependerá da existência de personalidade jurídica e da interpretação do seu instrumento constituinte, à luz dos fins e funções da organização); o poder de proteção funcional dos agentes e dos seus familiares (ainda é uma questão polêmica, sobretudo, em relação à determinação das prioridades entre o direito de proteção diplomática do Estado e o direito de proteção funcional da organização); o poder de missão (o instrumento constituinte de uma organização pode permitir expressa ou tacitamente o envio de representantes oficiais para os Estados e para outras organizações), dentre outros poderes.


É importante ressaltar que a independência em termos jurídicos, a personalidade jurídica própria e a subjetividade própria de direito internacional público, permitem às organizações executarem o direito internacional com justiça, assumindo, inclusive, funções de arbitragem para resolverem imparcialmente as discordâncias entre os Estados. Aliás, a autonomia jurídica das organizações implica no fato de possuírem uma ordem jurídica própria, ou seja, o seu próprio direito comunitário interno.


O direito interno das organizações internacionais provém da manifestação de vontade da própria entidade, representada por um estatuto que regulamenta o funcionamento dos seus órgãos, as suas relações com os Estados membros e as suas relações com seus funcionários. O referido estatuto é originário, independente, autônomo e válido, conforme o parecer da Corte Internacional de Justiça.


Através de sua autonomia jurídica, as organizações internacionais têm o direito de exigir dos Estados membros o cumprimento das obrigações resultantes da relação comunitária, todavia, deve respeitar o domínio reservado da jurisdição interna de cada Estado.


A regra geral é a de que só as partes de um tratado estejam vinculadas pelas obrigações que nele contém. Uma exceção a essa regra aparece na Carta das Nações Unidas a qual define que a organização assegurará, inclusive, que os Estados que não sejam membros das Nações Unidas atuem de acordo com os seus princípios, na medida em que tal seja necessário para a manutenção da paz e segurança internacionais.


Dentro da organização, o órgão competente delibera sobre algum assunto e a sua eficácia será medida pelo sistema constitucional da organização. A força compulsiva dessa decisão eficaz obriga o Estado membro a acolhê-la, pois a partir do momento que passou a ser membro da organização, estimou válidos os seus mecanismos jurídicos. Nesse contexto, o Estado estará vinculado àquilo que a decisão realmente é, um ato obrigatório, editado pela organização, de cujos estatutos pronama sua legitimidade[65].


Os meios técnicos que poderão ser utilizados para especificar e concretizar os fins dos organismos são: a convocação de conferências internacionais, a elaboração de projetos de tratados e de outras recomendações, a elaboração de uma estratégia de defesa, a adoção de decisões específicas juridicamente vinculativas e a adoção de disposições gerais vinculativas a nível interno dos Estados membros.


Inclusive, em relação a determinadas questões, as organizações internacionais adotam normas jurídicas com aplicabilidade direta a nível interno dos Estados membros, podendo, dessa forma, interferir no domínio funcional dos órgãos legislativos daqueles.


Isso quer dizer que as organizações, ao exercerem os seus poderes, criam por meio de deliberações, normas internacionais, que, ora terão valor obrigatório, como as resoluções, os regulamentos e as decisões, ora não o terão, como as recomendações, os votos e os ditames.


Quanto às sanções, as organizações internacionais dispõem de um vasto leque de instrumentos: a declaração de violação de obrigações contratuais por parte de um Estado membro, a solicitação a um tribunal internacional para que formule um parecer sobre tais violações de obrigações, a suspensão dos direitos do Estado membro transgressor, a suspensão dos pagamentos e de outras prestações ao membro transgressor e ainda a exclusão de um membro da organização. Além disso, em caso de ameaça ou ruptura da paz mundial, o Conselho de Segurança pode, por resolução própria, adotar medidas coercitivas não-militares, econômicas ou de outra natureza, e, em último recurso, medidas militares, até mesmo contra Estados que não são membros da ONU.


No caso concreto, a aplicação de um ou outro instrumento, para a transposição das tarefas comunitárias, pela organização internacional, dependerá da sua própria legislação interna em relação à respectiva matéria.


Em suma, constata-se que as organizações internacionais originaram-se com poder, nos Anos Dourados do Estado de Bem-Estar Social, face à complexidade das relações entre os entes estatais, e não adquiriram tal poder ao longo do século XX. Essa afirmativa pode ser comprovada por meio da análise da justificativa do surgimento de algumas organizações internacionais, assim como a observância das suas finalidades. Tais aspectos serão verificados posteriormente.


5.3.1- O FMI


Os Estados Unidos, ainda durante a Guerra (1944), tiveram a iniciativa da realização da Conferência em New Hampshire Woods, EUA, que ficou conhecida como Conferência de Bretton Woods, contando com a presença das Nações Unidas e as associadas a ela na guerra, com o escopo de sedimentar a cooperação econômica internacional. Desse evento, foram criados o Fundo Monetário Internacional[66] (FMI), o Banco Internacional para a Reconstrução e o Desenvolvimento[67] (conhecido como Banco Mundial) e o GATT[68] (Acordo Geral para Comércio e Tarifas Aduaneiras)[69].


De modo geral, o propósito era o de fomentar o intercâmbio mundial pelo incentivo de práticas do livre-comércio, garantindo os fluxos globais de capitais de investimentos e de ajuda econômica aos países em desenvolvimento.


As questões de ordenação dos fluxos financeiros e de ajuda ficaram a cargo de duas novas agências internacionais das Nações Unidas: o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD), mais conhecido como Banco Mundial. Porém, cabe realçar que essas duas organizações internacionais não desempenham as mesmas funções, vez que o Banco Mundial apresenta-se como uma típica instituição de auxílio ao desenvolvimento, enquanto o FMI restringe-se ao auxílio à administração monetária externa do Estado membro.


As funções do FMI, em 1944, eram as seguintes: promover a cooperação monetária internacional, expandindo o comércio mundial; manter a estabilidade cambial, através da cooperação dos seus membros, evitando depreciações competitivas; propiciar o estabelecimento de um sistema multilateral de pagamentos para transações correntes e eliminação de restrições cambiais, capazes de entravarem o intercâmbio internacional; moderar desequilíbrios graves nos balanços de pagamentos, pelo adiantamento de recursos do Fundo, concedidos mediante salvaguardas adequadas, para evitar crises capazes de colocarem em perigo as prosperidades nacionais e internacionais.


É essencial destacar que no plano financeiro, o FMI serviu, inicialmente, aos interesses imediatos dos Estados Unidos, através da criação do sistema de paridades, em termos de ouro e de dólares, declaradas pelos associados do Fundo, resultando na vinculação da moeda americana ao metal. A referente conversibilidade moeda-metal funcionou entre governos, possibilitando a reintrodução do “padrão-ouro” que foi o responsável pela regulamentação cambial. Assim, os Estados Unidos, donos de cerca de 40% do estoque mundial do ouro monetizado, veriam o dólar transformar-se na moeda universal[70].


Em sua primeira etapa, o FMI procurou dar ênfase ao monitoramento e à regulamentação de medidas de recuperação econômica conseqüentes das crises de balanços de pagamento. O seu instrumento básico fora as políticas de câmbios flutuantes que deveriam ser adotadas nos programas de estabilização, juntamente com medidas de contenção orçamentárias e de equilíbrio na expansão monetária.


No entanto, a imposição de critérios rígidos de recuperação econômica, com base em programas formais, passaram a ser aceitos pro forma pelos Estados, que a rigor estavam conscientes da impossibilidade de levá-los a termo. Os atrasos na concessão de ajuda do Fundo acabaram por conduzir às moratórias, seguidos de novas composições e negociações atrasadas.


Na atualidade, o FMI tem a função de facilitar os pagamentos multilaterais, fixar as paridades monetárias e contribuir para a sua estabilização, bem como manter sob controle as restrições impostas às transferências de divisas[71]. Enfim, cabe ao FMI auxiliar financeiramente países com dificuldades em suas balanças comerciais[72].


A liberação de recursos é condicionada, pelo Fundo, à adoção de medidas de reforma estrutural dos países solicitantes da ajuda do FMI. As medidas em questão são conhecidas como programas de ajustes, as quais definem a política orçamentária, a emissão monetária, a taxa de câmbio, a política comercial e os pagamentos externos. Tais decisões são formalizadas por meio de uma carta de intenções, que o Estado entrega ao Fundo como compromisso que assegura o cumprimento das metas anuais.


Assim, os recursos somente serão liberados se as metas estabelecidas na carta de intenções forem atingidas. Os conselhos do Fundo não são impositivos, pois um Estado que não aceita suas diretrizes tem liberdade de deixar a organização.


Não se pode olvidar que muitas vezes, o Fundo é obrigado, por motivos políticos, a integrar em seus critérios de recuperação econômica interesses de seus principais membros.


Entretanto, com certeza, o aval do Fundo concedido a um Estado em desenvolvimento representa, também, um sinal à comunidade financeira internacional sobre a solidez da política financeira adotada por esse Estado, o que deflagra o poder de tal organismo internacional.


5.3.2- O Banco Mundial


Desde o início, a função do Banco Mundial é prestar auxílio aos Estados necessitados. Porém, decorrida uma década de surgimento, de financiamento e com a criação da Corporação Financeira Internacional (1956) e da Associação Internacional do Desenvolvimento (1960), o Banco Mundial mudou sua ótica desenvolvimentista, passando a dar prioridade aos países com menor desenvolvimento.


Nos dias de hoje, a função do Banco Mundial é promover o desenvolvimento estável, sustentável e eqüitativo dos Estados, auxiliando na diminuição da pobreza mundial. É formado de cinco instituições inter-relacionadas que desempenham prerrogativas específicas: BIRD (Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento); AID (Associação Internacional de Desenvolvimento); IFC (Corporação Financeira Internacional); AMGI (Agência Multilateral de Garantia de Investimentos); CIADI (Centro Internacional para Arbitragem de Disputas sobre Investimentos)[73].


O Banco Internacional para a Reconstrução o Desenvolvimento (BIRD) e a sua organização filiada Corporação Financeira Internacional (IFC) concedem créditos de auxílio para o desenvolvimento produtivo e para a reparação de estragos de guerra. Os créditos concedidos pela Associação Internacional para o Desenvolvimento (AID) também se destinam ao auxílio dos Estados em vias de desenvolvimento.


O Banco Mundial apresenta um caráter ambíguo de poder. Por um lado, utiliza técnicas de um banco comercial, pois fornece recursos financeiros aos Estados membros, cobrando juros e auferindo lucros que permitem a sua sustentação, também capta recursos no mercado de capitais e nas disponibilidades oferecidas pelos Estados membros. Por outro lado, em razão de seus objetivos, pode ser apresentado como sendo um serviço público internacional.


Por fim, evidencia-se que o Banco Mundial, atualmente, desenvolve uma política de financiamento de projetos produtivos de longo prazo, como por exemplo, os na área da educação, da reforma agrária e do meio ambiente. Além disso, organizou programas para formar recursos humanos nos países em via de desenvolvimento e, sobretudo, aconselhou políticas públicas. Nessas circunstâncias o Banco que até então tentava apresentar-se como uma instituição absolutamente desvinculada de valores políticos e ideológicos, tem demonstrado uma posição sobre temas que deveriam ser de interesse restrito dos países em via de desenvolvimento.


5.3.3- O BID


Em 1959, foi criado o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID, voltado para o desenvolvimento da América Latina, cuja estrutura repousa na experiência do Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento – Banco Mundial.


É de suma importância realçar que paralelamente ao surgimento do BID, eclodiam problemas políticos e comoções sociais na América Latina. Logo, o surgimento do BID não foi despropositado, pois foi um instrumento de auxílio para que os Estados Unidos, preocupados com a perda do seu domínio na América Latina e buscando a “fidelização” cubana, instaurasse a sua “Aliança para o Progresso”.


Em princípio, o BID só seria integrado por Estados da América Latina, no entanto, modificações foram feitas em seus estatutos, permitindo o ingresso do Canadá, do Japão e de Estados da Europa Ocidental[74].


O principal objetivo do BID é estimular o crescimento econômico dos Estados membros, através da concessão de empréstimos, tanto de recursos próprios quanto de capital de origem privada. O Banco, por meio de seus poderes, além de conceder empréstimos, supervisiona, aconselha o planejamento econômico e elabora estudos técnicos.


5.3.4- A OCDE


A Europa encontrava-se devastada após a Segunda Guerra Mundial. Para reerguê-la os Estados Unidos ofereceram um auxílio econômico conhecido como Plano Marshall. Para coordenar este plano, foi criada, em 1948, a Organização Européia de Cooperação Econômica – OECE, cujo objetivo consistia em planejar o desenvolvimento econômico dos Estados membros[75].


Em 1960, representantes de vinte Estados membros decidiram substituir a OECE por uma nova entidade internacional chamada Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico – OCDE[76], a qual possibilitou o ingresso de Estados que haviam atingido certo grau de desenvolvimento, independentemente de sua localização geográfica.


Os objetivos da OCDE são: a necessidade de ampliar o desempenho econômico, com o crescimento da oferta de emprego; a melhoria do nível de vida dos povos dos Estados membros; a contribuição para o crescimento da economia mundial; a expansão do comércio internacional em bases multilaterais e não-discriminatórias.


Enfim, a OCDE é um órgão internacional e intergovernamental que reúne os países mais industrializados para que, através de seu poder, estabeleçam políticas as quais potencializem seu crescimento econômico, e colaborem com o desenvolvimento dos Estados membros.


5.3.5- A ONU


Em 1919, após a Primeira Guerra Mundial, na Paz de Versalhes, foi criada a Liga das Nações, primeira organização dotada de fins políticos e de um sistema de sanção incipiente, com poder regulamentar e personalidade internacional que almejava a paz entre os Estados.


A luta pelo pacifismo nos Estados Unidos, principal responsável pela origem da Liga das Nações, foi instrumentalizada pelo Tratado de Versalhes o qual possuía 26 artigos e era composta por três categorias de membros: originários (aqueles que assinaram o Tratado de Versalhes, excluindo-se os Estados inimigos); convidados (os que haviam permanecido neutros no conflito) e os admitidos (eram os que tinham a sua candidatura aprovada por 2/3 da Assembléia).


O Pacto da Liga das Nações era estruturado em três órgãos: o Conselho, cujos objetivos eram o desarmamento, o controle dos territórios sob mandato, o controle da proteção das minorias, a exclusão de membros; a Assembléia a qual admitia os novos membros aprovava o orçamento, elegia os membros não permanentes; Secretariado que era a parte administrativa. A liga também possuía dois organismos autônomos, a Organização Internacional do Trabalho – OIT, que fora criada no Tratado de Versalhes e a Corte Permanente de Justiça Internacional – CPJI, que teve o seu estatuto formulado em 1920.


De fato, desde a declaração da Segunda Guerra Mundial a Sociedade da Liga das Nações parou de funcionar. Oficialmente, entretanto, ela existiu de 1920 a 1947, quando, na sua 21ª Sessão, foi dissolvida, ou seja, as suas contas foram encerradas e todos os seus bens foram transferidos para a Organização das Nações Unidas – ONU[77].


Em 1945, diante do término da Segunda Guerra Mundial, aconteceu a Conferência de São Francisco, denominada de Conferência das Nações Unidas para a Organização Internacional, na qual se originou as Nações Unidas, por meio da Carta da ONU.


Destaca-se que no dia 10 de dezembro de 1948, a ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos do Homem, texto de referência que estabelece os direitos naturais de todo ser humano, independentemente de nacionalidade, cor, sexo, religião, orientação política ou sexual. Não é uma lei, mas tem grande força moral e norteia boa parte das decisões tomadas pela comunidade internacional.


A ONU é uma pessoa jurídica de direito internacional público, tendo a sua existência, organização, objeto e condições de funcionamento previstos no seu instrumento de constituição, que é a Carta das Nações Unidas. Apesar de sua vocação universal, a ONU resultou de um acordo de Estados, celebrado nos moldes de um tratado. Cabe salientar que cada Estado preservou a sua soberania, podendo retirar-se da Organização quando o desejar e também sendo possível o ingresso de novos Estados através da adesão, conforme processo previsto na Carta.


Com o intuito de se estruturar um sistema global para a manutenção da segurança coletiva, com a liderança dos Estados Unidos e com mais o apoio de 50 nações, a Carta de São Francisco foi o instrumento que estabeleceu a criação de um órgão permanente, com autoridade, com poder efetivo e com discernimento para a preservação da paz mundial. A Carta, então, é a lei básica da ONU, formada de um preâmbulo e de 111 artigos, tendo como anexo o Estatuto da Corte Internacional de Justiça – CIJ, que é sua parte integrante[78].


A ONU foi criada para concretizar as determinadas funções: ser a guardiã da paz e da esperança; desenvolver relações amistosas, entre os Estados, fundadas no respeito ao princípio da igualdade dos direitos e da autodeterminação dos povos; conseguir uma cooperação internacional para resolver os problemas internacionais de caráter econômico, social, cultural ou humanitário; promover e estimular o respeito aos direitos humanos e às liberdades fundamentais para todos e ser um centro destinado a harmonizar a ação dos Estados para a consecução desses objetivos.


Salienta-se que a ONU não é um superestado, embora reúna quase a totalidade dos Estados existentes. Os seus membros são originários (Estados que assinaram a Carta) ou eleitos (são admitidos pela Assembléia Geral mediante recomendação do Conselho de Segurança) e no total constituem o número de 183 membros.


Para serem admitidos como membros, todos os Estados deverão aceitar as obrigações contidas na Carta, estando dispostos e aptos a cumprir tais determinações. No entanto, na realidade, considerações políticas têm exercido um papel importante na admissão de alguns membros, pois, em mais de uma oportunidade, os Estados membros, mais influentes, utilizaram o veto, abusivamente, para impedir o ingresso de Estados que possuem todos os elementos exigidos.


Isso acontece porque a ONU consagrou, desde o início, a supremacia do Conselho de Segurança. Essa tutela firmou-se no direito de veto de seus cinco membros: China, Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e União Soviética livres, por conseguinte, para imporem ações diplomáticas ou militares. A igualdade dos Estados perdeu assim sua consistência mundial.


Além do mais, os membros da ONU poderão ser suspensos do exercício dos seus direitos e dos seus privilégios, quando contra eles for levada a efeito qualquer ação preventiva ou coercitiva por parte do Conselho de Segurança, o qual, posteriormente, poderá restabelecê-los. Se violarem, persistentemente, os princípios da Carta, poderão ser expulsos pela Assembléia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança.


A estrutura orgânica da ONU se perfaz pelo funcionamento de seis órgãos especiais e por órgãos subsidiários que forem considerados necessários. Os órgãos especiais são: a Assembléia Geral, o Conselho de Segurança, o Conselho Econômico e Social, o Conselho de Tutela, o Secretariado e a Corte Internacional de Justiça.


A Assembléia Geral é composta de todos os membros da entidade, cabendo a cada Estado membro apenas um voto. Assim, suas decisões são tomadas pela maioria simples ou, nas questões importantes, por 2/3 dos membros presentes e votantes. Suas funções são: eleger os membros não permanentes do Conselho de Segurança; eleger os membros do Conselho Econômico e Social e os do Conselho de Tutela; admitir novos membros; suspender os direitos e os privilégios dos membros ou suspendê-los; tutelar as questões orçamentárias; elaborar recomendações acerca da manutenção da paz e da segurança internacionais.


O Conselho de Segurança é estruturado por cinco membros permanentes, e por dez membros não-permanentes, sendo que cada um deles tem apenas um voto. As suas decisões são tomadas pelo voto afirmativo de nove de seus membros, quando se trata de questões processuais e pelo voto afirmativo de nove membros mais os permanentes, em todos os outros assuntos. A exigência do voto afirmativo de todos os membros permanentes do Conselho é o reconhecimento do direito de veto, de qualquer deles contra a maioria, ou até a unanimidade dos demais. Na prática, qualquer membro da ONU que não fizer parte do Conselho poderá participar da discussão em pauta sem ter, portanto, o direito de veto. As suas atribuições são: regulamentar os litígios entre os Estados membros da ONU; regularizar as questões de armamento; agir nos casos de ameaça à paz e de agressão; decidir as medidas a serem tomadas para o cumprimento das sentenças da CIJ.


O Conselho Econômico e Social é composto de cinqüenta e quatro membros da ONU, sendo que suas decisões são tomadas pela maioria dos membros presentes e votantes. Suas competências são: realizar estudos e apresentar relatórios acerca de assuntos internacionais em âmbito econômico, social, cultural, educacional, sanitário; fazer recomendações destinadas a promover o respeito e a observância dos direitos do homem e das liberdades fundamentais; preparar projetos de convenções, a serem submetidos à Assembléia Geral; formular acordos com as entidades especializadas, vinculadas às Nações Unidas, coordenando-as; fornecer informações ao Conselho de Segurança.


O Conselho de Tutela deveria ser composto por três categorias de membros: os que se encontrarem à frente da administração de territórios tutelados; os membros do Conselho de Segurança que não estiverem administrando territórios tutelados e outros membros eleitos, em número suficiente para que o total dos membros do Conselho de Tutela fique dividido em partes iguais, entre os membros das Nações Unidas que administrem e os que não administrem os territórios tutelados. Como, atualmente, só existem dois territórios tutelados não existem mais membros eleitos, logo, quatro membros permanentes do Conselho de Segurança, que não administram territórios, nele têm assento.


O Secretariado é o órgão administrativo, no qual compreende um Secretário Geral e uma equipe numerosa que o auxilia. O Secretário Geral é eleito pela Assembléia Geral, mediante recomendação do Conselho de Segurança. Esse órgão é responsável somente perante a organização e todos os seus componentes gozam de certas imunidades. Em geral, as funções do Secretário Geral são: apresentar um relatório anual à Assembléia sobre os trabalhos do organismo; poder chamar a atenção do Conselho de Segurança para qualquer assunto que possa ameaçar a manutenção da paz e da segurança internacionais. Quanto ao Secretariado, uma de suas prerrogativas é registrar e publicar todo tratado firmado pelo Estado membro, depois de sua entrada em vigor.


A Corte Internacional de Justiça (CIJ) é o principal órgão judiciário das Nações Unidas. O seu estatuto é, substancialmente, idêntico ao da Corte Permanente de Justiça Internacional (CPJI) que perdurou durante a Liga das Nações. A partir do seu estatuto, o Estado membro, quando se aderiu à entidade, assumiu o compromisso de se conformar com a decisão da Corte em qualquer caso em que for parte. Inclusive, os membros só poderão confiar a solução de suas divergências a outros tribunais, em virtude de acordos já vigentes ou que possam ser concluídos no futuro. A Corte se compõe de quinze juízes eleitos, tendo em vista a sua moral e a sua reconhecida competência em direito internacional, não podendo figurar na CIJ, dois juízes nacionais do mesmo Estado. A eleição é feita ao mesmo tempo, mas separadamente, pela Assembléia Geral e pelo Conselho de Segurança, de uma lista de candidatos apresentados pelos grupos nacionais de árbitros da Corte Permanente de Arbitragem ou pelos respectivos governos. Poderão ser eleitos os membros da própria Corte, quando a comissão mista se convencer de que não conseguirá chegar a acordo sobre o preenchimento de algum ou de alguns lugares. Excepcionalmente, também poderá ser eleito alguém que não figure na lista, quando, após o terceiro escrutínio, ainda restando lugares a preencher, se constituir uma comissão mista de seis membros, dos quais três da Assembléia e três do Conselho, e essa comissão indicar, por unanimidade, algum nome que preencha as condições exigidas, mas que não tenha sido incluído na lista. Em resumo, a função da Corte Internacional de Justiça é decidir, de acordo com o direito internacional, as controvérsias que lhes são apresentadas.


É de extrema importância observar que a ONU apresenta falhas em sua estrutura e em seu funcionamento tais como: o respeito à soberania dos Estados, pois implica em tantas limitações que, praticamente, acabam por anular qualquer possibilidade de ação da ONU, no sentido de garantir a aplicação da Declaração Universal dos Direitos do Homem; o direito de veto dos membros permanentes do Conselho de Segurança porque, na realidade, acentuou a discriminação entre os Estados (essa foi uma exigência dos Estados Unidos e da União Soviética para integrarem a organização, e como a sua constituição seria inviável sem a presença desses dois Estados, os demais tiveram que ceder); a falta de eficácia das decisões, pois sendo apenas uma confederação e não dispondo de meios concretos para impor a sua vontade, a ONU praticamente se limita a fazer recomendações, que muitas vezes não são atendidas, sem que nada possa ser feito; a falta de recursos próprios, dependendo de contribuição financeira de seus membros, muitos dos quais não efetuam regularmente os pagamentos devidos, mas, ainda que todos o fizessem, os recursos seriam insuficientes, fazendo com que a ONU dependa da ajuda especial dos grandes Estados para os empreendimentos mais importantes, o que reduz a sua eficiência e afeta a sua própria independência[79].


Embora se declare baseada no princípio da igualdade de todos os seus membros, a ONU é, na realidade, dirigida por uma pentarquia, pelas cinco potências que dispõem do abusivo direito de veto no seio do Conselho de Segurança, detendo, por conseguinte, o comando da organização, decidindo, em última instância sobre a paz ou a guerra no mundo.


Além do mais, examinando-se a Carta da Organização das Nações Unidas vê-se que a prática do veto impede que o Conselho de Segurança tome qualquer medida contra uma potência que nele tenha assento permanente, mesmo que essa potência ponha em perigo a paz e a segurança internacional.


 De tudo isso se conclui que o princípio da igualdade soberana de todos os membros, tão defendida na Carta da Organização das Nações Unidas, é uma fantasia. As cinco potências influenciam muito esse organismo, mesmo assim, a ONU é dotada de certo poder que faz dela uma organização respeitada pelos demais Estados-Nações.


5.3.5.1- Solução dos Litígios entre os Estados


Diversos processos (pacíficos ou coercitivos) podem resolver as controvérsias existentes entre dois ou mais Estados, sem que seja necessária a guerra.


A partir disso, organizações de caráter internacional ou regional determinam que os desentendimentos que possam surgir entre os seus membros devem ser solucionados através de medidas diplomáticas, políticas (órgãos políticos das Nações Unidas) ou jurídicas (arbitragem, Cortes regionais e especializadas).


Um exemplo de medida jurídica que pode ser intentada entre os Estados soberanos é o encaminhamento dos seus litígios à Corte Internacional de Justiça (CIJ), órgão da ONU, conforme estabelece a Carta da Organização das Nações Unidas[80].


É imprescindível que os Estados litigantes aceitem a jurisdição da Corte que buscará resolver o conflito, mediante a aplicação do direito internacional. O acórdão proferido pela Corte de Haia é, tal como as sentenças arbitrais, definitivo e obrigatório, podendo ser executório em algumas situações excepcionais. A Carta da Organização das Nações Unidas determina que os Estados membros devam cumprir as decisões da CIJ que lhe digam respeito. O não cumprimento do acórdão pelo Estado membro representa um ato ilícito que propicia a outra parte a denunciar o fato ao Conselho de Segurança, e caso este julgue necessário, tomará medidas próprias para fazer aquele cumprir o acórdão.


Portanto, a Carta das Organizações Unidas é taxativa ao combater os meios violentos para a solução de litígios entre seus membros. Tal Carta prevê que as partes, em uma controvérsia que possa ameaçar a segurança e a paz internacionais, devam chegar a uma solução por meio da negociação, do inquérito, da mediação, da conciliação, da arbitragem, do recurso aos acordos regionais. Caso não seja possível um acordo entre os litigantes, o próprio Conselho de Segurança tomará as medidas cabíveis para a solução do conflito.


Se determinados Estados, em virtude de possuírem os mesmos vínculos geográficos, raciais, históricos se congregam em torno de um acordo regional, deverão resolver entre si os problemas que possam causar a ruptura do vínculo. Todavia, se fracassarem, o litígio deverá ser submetido à análise do Conselho de Segurança.


Dessa forma, os diversos organismos regionais de caráter político procuram solucionar as controvérsias entre os seus membros, antes que a ONU deles tome conhecimento.


A Carta da Organização das Nações Unidas também impõe aos seus membros que esses se abstenham, em suas relações internacionais: de ameaçar ou fazer uso da força contra a integridade territorial; de comprometer a independência política de qualquer Estado; de praticar ações incompatíveis com o ideal das Nações Unidas, incentivando-os a extinguir por meios pacíficos as suas divergências.


Para se chegar às soluções pacíficas, a Assembléia Geral poderá estimular medidas sobre o desarmamento e a regulamentação dos instrumentos de guerra, enquanto o Conselho de Segurança se encarregará de formular os planos a serem submetidos aos Estados membros, para tornar estável um sistema de regulamentação do armamento.


O emprego da força, pela ONU, só é tolerado quando o Conselho de Segurança levar a efeito, por meio de forças aéreas, navais ou terrestres, a ação que julgar inevitável para manter ou restaurar a paz e a segurança internacionais.


Em contrapartida, o preceito do artigo 2º, parágrafo 7º, da Carta estabelece que não poderá haver a intervenção da ONU “em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna de qualquer Estado”. A referida norma tem sido, atualmente, o argumento justificador de uma série de atitudes de indiferença ou de rebeldia ante as recomendações pacificadoras do Conselho.


Enfim, verifica-se que a guerra, como solução de uma controvérsia entre Estados, é rechaçada, porque é um ato contrário ao Direito Internacional, constituindo um crime contra as normas jurídicas existentes e obrigatórias para os membros da Comunidade Internacional. Conseqüentemente, os conflitos devem ser resolvidos pela força do direito e não pelo direito da força.


5.3.6- A Organização Comunitária


Nos dias de hoje, as etapas de integração internacional deflagram organizações supranacionais (comunidades supranacionais) cujo principal exemplo se encontra na União Européia, que se legitima pela interdependência econômica, pela mobilidade de mão-de-obra, pelo Estado Democrático de Direito, pela política externa e por outros fatores que integram os Estados membros. Uma característica específica e exata dessa organização comunitária é o fato dela ter a faculdade de adotar disposições diretamente vinculativas a nível interno dos Estados membros.


Relevante não é só o fator do efeito das decisões adotadas pela organização comunitária, mas também o número, a importância e o prazo de atribuição de suas funções, assim como os meios de execução de que dispõe a organização, conforme o grau de sua autonomia jurídica em relação aos seus membros.


Além desses, para uma avaliação da verdadeira força de integração e das tendências evolutivas de uma organização devem ser considerados ainda outras questões, como as relações de interdependência ao nível da economia, da política, da defesa, da afinidade cultural, das concepções ideológicas, da intensidade, da tendência auto-afirmativa nacional manifestada a nível interno dos Estados membros.


Considerando o grau de integração atingido com fundamento nos critérios acima mencionados, observa-se que os órgãos da União Européia podem adotar determinadas disposições com aplicabilidade direta a nível interno dos Estados membros, sobretudo quanto à política econômica, à administração da economia e à política monetária.


As decisões elegidas pela maioria dos órgãos comunitários são, em medida considerável, vinculativas para todos os Estados membros, existindo órgãos importantes que estão independentes de quaisquer instruções dos Estados membros.


O quadro institucional da União Européia é formado pelo Parlamento Europeu; pelo Conselho da União Européia; pela Comissão das Comunidades Européias; pelo Tribunal de Contas e pelo Tribunal de Justiça.


O Parlamento Europeu é constituído pelos representantes do povo, que por meio da eleição direta, elege os eurodeputados para um mandato de cinco anos. Suas funções são: legislativa, em conjunto com o Conselho, orçamental, de controle e de força impulsionadora. Além disso, no Parlamento funcionam dezessete comissões que realizam audiências públicas.


O Conselho da União Européia é formado por um colegiado de representantes, em nível ministerial de cada Estado membro e esses representantes têm a competência para vincular, com suas decisões, os Estados que representam. Os Estados têm votos com pesos diferentes, mas há a possibilidade de que uma minoria de Estados, em razão da proporcionalidade, vença as votações. Para diminuir os gravames aos Estados menores, para a votação, é preciso de votos de representantes de, no mínimo, 62% da população européia, sendo que existem matérias que demandam a unanimidade dos votos. O Conselho desempenha as seguintes funções: legislativa (pode ser o único a decidir, nos casos em que o Parlamento é órgão consultivo; pode decidir com a colaboração do Parlamento, nos casos em que esse é órgão colaborador; a decisão pode provir do regime bicameral; pode encaminhar a proposta legislativa à Comissão, vez que é o órgão que tem a iniciativa do poder legislativo); orçamental; governamental (o Conselho adota as medidas que serão executadas pela Comissão, podendo, ainda, reservar para si a execução de determinados atos em casos devidamente fundamentados); de coordenação (coordena a Política Externa e de Segurança Comum – PESC; o Pacto de Estabilidade e Crescimento – PEC, avaliando as finanças dos Estados membros e coordena as Orientações Gerais das Políticas Econômicas dos Estados membros e da Comunidade – OGPE)[81].


A Comissão das Comunidades Européias é estruturada em um colegiado de vinte representantes dos Estados membros, um de cada Estado (Dinamarca, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, Irlanda, Grécia, Portugal, Áustria, Suécia, Finlândia, Chipre, Estônia, Eslováquia, Eslovênia, Hungria, Lituânia, Letônia, Malta, Polônia e República Checa, esses em sistema de rodízio) e dois da Alemanha, França, Reino Unido, Itália e Espanha. Os representantes têm absoluta independência em relação a seus Estados e a particulares. A deliberação é por colegiado, desde que presentes mais da metade dos comissários (dezesseis), em casos urgentes, é possível a deliberação por escrito, dispensada a reunião colegiada, sendo, ainda, possível a delegação da capacidade de deliberar a funcionários de órgãos dependentes da Comissão. Suas atribuições são: promoção do interesse comunitário; garantia do cumprimento dos tratados e dos acórdãos dos tribunais; em regra, possui a titularidade da iniciativa legislativa. Como instrumento para a consecução das suas competências, a Comissão tem alguns poderes: de controle (exige informações dos Estados membros e dos particulares); de autorização de medidas derrogatórias das disposições comunitárias por parte dos Estados membros e dos particulares; de imposição de sanção a particulares que infringem o direito comunitário; de gestão, de execução orçamentária e de controle dos fundos. A Comissão também, de modo geral, executa as deliberações do Conselho[82].


O Tribunal de Contas da União Européia é formado por um representante de cada Estado membro. A nomeação do representante é feita pelo Conselho após prévia consulta ao Parlamento. Suas competências são: examinar a legalidade e a regularidade da execução orçamentária; fiscalizar, mediante envio de documentos pelas instituições ou mediante visita; enviar o relatório de execução orçamentária do Tribunal às instituições fiscalizadas. A deliberação do Tribunal de Contas é feita por maioria, em seguida, as contas são auditadas por um revisor independente.


O Tribunal de Justiça das Comunidades Européias é composto por vinte e cinco juízes, um de cada Estado membro, todos são nomeados de comum acordo por todos os Estados membros, e são assistidos por oito advogados-gerais. O Tribunal trata da matéria constitucional, administrativa, cível e trabalhista, exercendo jurisdição voluntária (consulta) e contenciosa.


O direito reinante na União Européia é o comunitário, que se distingue tanto do interno (nasce da vontade do Estado e por ele pode ser modificado ou revogado, não impondo nenhuma obrigação para os demais) quanto do internacional (disciplina no âmbito internacional os direitos e os deveres das pessoas internacionais). O direito comunitário objetiva, através de imposições de normas elaboradas por seus órgãos institucionais, adotar preceitos obrigatórios não só para os Estados membros, mas, por igual, aos seus nacionais, exatamente porque ocorreu a renúncia expressa dos Estados membros ao exercício dessas competências[83].


No direito comunitário, os órgãos criados pelos Estados agem em nome da Comunidade e não dos Estados membros, sendo, portanto, um direito autônomo, com peculiaridades próprias. Sua finalidade é promover a interação entre os componentes dos órgãos supranacionais, eliminando as controvérsias e estabelecendo uma supranacionalidade extensiva a todo nacional dos Estados integrantes da comunidade.


Por tudo isso, os preceitos do direito comunitário se incorporam automaticamente no ordenamento jurídico doméstico de cada Estado membro, sem necessidade de nenhuma norma de direito interno que as adote. Também cabe lembrar que o direito comunitário tem primazia sobre o direito interno, conforme prescrevem, implicitamente, os Tratados constituintes da Comunidade.


Os preceitos do ordenamento jurídico comunitário surgem da deliberação coletiva dos Estados membros da União Européia, através dos tratados normativos, que são regras de caráter geral que objetivam nortear as relações entre os signatários e que constituem o direito originário encontrado nos Tratados de Paris, de Roma, de Luxemburgo, de Amsterdam, de Maastricht e pelas normas oriundas dos Institutos Comunitários no desempenho de suas atividades, que formam o direito derivado e que compreende os regulamentos (obrigatórios em todos os seus elementos e diretamente aplicável em todos os Estados membros), as diretivas (vincula o Estado membro destinatário quanto ao resultado a alcançar, deixando às instâncias nacionais a competência quanto à forma e aos meios), a decisão (forçosos em todos os seus elementos para os destinatários), as recomendações e os pareceres (não são vinculatórios) utilizados pelo Parlamento Europeu em conjunto com o Conselho e com a Comissão.


É essencial enaltecer que na omissão dos ordenamentos jurídicos, o Tribunal de Justiça das Comunidades Européias, para resolver os conflitos que lhes apresenta, se utiliza dos princípios gerais de direito, os quais são regras que se impõem a todos os Estados e por eles devem ser obedecidos por se tratarem de ilações lógicas do direito a sua existência.


As organizações internacionais não dispõem de território, nem de população, porém a União Européia, em seus tratados, consideram os cidadãos dos Estados membros do bloco como sujeitos a uma jurisdição supranacional, ao menos no que se refere a uma parte das competências estatais que são transferidas à ordem jurídica comunitária. Essa peculiaridade leva à construção de uma estrutura que propicia, em alguns casos, a demanda direta de um particular junto a organismos europeus, o quê inova toda uma perspectiva, já estruturada, entre a população e os organismos internacionais.


Por tudo isso, afirma-se que a União Européia deflagra o poder de suas organizações supranacionais em relação aos Estados membros que concordaram em se submeter a elas.


5.4- OS ELEMENTOS ESTRUTURAIS DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


Os elementos estruturais gerais são distintos de uma organização internacional para outra. Por causa disso a orgânica da organização varia conforme as suas funções materiais.


Algumas instituições possuem funções predominantemente técnicas, enquanto outras possuem funções não-políticas ou até mesmo políticas. A forte influenciação das disposições organizativas pela função real do organismo evidencia-se de modo particularmente notório no Conselho de Segurança. A efetivação dos seus meios coercitivos conduziu a atribuir as cinco maiores potências (Estados Unidos, China, França, Grã-Bretanha e Rússia) um lugar no Conselho de Segurança, outorgando-lhes um direito de veto em todas as decisões de fundo, o quê caracteriza uma perspectiva do poder político.


Em uma organização internacional também se verifica a burocracia. Na verdade, as competências dos órgãos burocráticos têm uma extensão diversa, conforme o caso concreto. Um exemplo disso é a comparação entre as competências do Secretário Geral da ONU e as da Comissão da Comunidade Européia, pois enquanto as competências do primeiro (denunciar as situações de ameaça à paz, elaborar a ordem do dia para a Assembléia Geral da ONU) são relativamente modestas, as competências da segunda são decisivas (adotar as regulamentações jurídicas da Comunidade e as disposições vinculativas a nível interno dos Estados membros).


Paralelamente, existem órgãos que representam os diversos Estados membros, as suas opiniões e os seus interesses, principalmente quando se trata da formação da vontade política da organização e do controle do órgão burocrático.


A estrutura de uma organização internacional também varia conforme as suas finalidades. Geralmente, elas apresentam: um Conselho, que é o órgão executivo, no qual estão representados, apenas, alguns Estados; uma Assembléia, na qual estão representados todos os Estados membros; e um Secretariado que é a parte administrativa.


Quanto à eleição do Diretor ou do Secretário, dependerá de cada entidade internacional, vez que em algumas esses cargos são eleitos na Assembléia e em outras são eleitos no Conselho. Cada organização também estabelecerá a periodicidade das reuniões de sua Assembléia ou Conferência, que poderá ser anual, a cada dois anos, a cada três anos, a cada quatro anos e até mesmo a cada cinco anos[84].


Freqüentemente, os órgãos de uma organização são fixados nos tratados que as criam, porém órgãos subsidiários poderão ser criados posteriormente.


Ao lado dos seus órgãos, as organizações internacionais possuem os seus funcionários, que as colocam em funcionamento. Os funcionários são agentes, admitidos pelo organismo internacional, que se dedicam permanentemente e exclusivamente a ele e cuja situação jurídica é estatutária e não contratual.


Esses agentes, para bem desempenharem suas atividades, passam a gozar de privilégios e imunidades semelhantes às dos agentes diplomáticos, no momento em que as organizações assinam acordos de privilégios e imunidades com os Estados onde estão as suas sedes. Os privilégios e imunidades serão os seguintes: imunidade de jurisdição para os atos praticados no exercício de funções oficiais; isenção de impostos sobre os salários; esposa e dependentes não estão sujeitos a restrições imigratórias e registro de estrangeiros; isenção de prestação de serviços; facilidades de câmbio; facilidades de repatriamento estendidas à esposa e aos dependentes em caso de crise internacional. No entanto, tais imunidades só são concedidas para os mais altos funcionários internacionais, cabendo ao Secretário Geral da ONU declarar quais são os funcionários que devem usufruir desses benefícios. Em relação ao Secretário Geral e aos Subsecretários Gerais, bem como suas esposas e filhos, além dos benefícios elencados, também gozarão dos privilégios, das imunidades, das isenções e das facilidades, que, conforme o direito internacional, são concedidos aos agentes diplomáticos.


Ainda, é importante compreender que os funcionários internacionais se sujeitam às medidas disciplinares que estão previstas no estatuto interno do organismo e que qualquer litígio de ordem jurídica que surja entre os agentes e a entidade, deverá ser resolvido pelos Tribunais Administrativos Internacionais os quais são jurisdições especiais instituídas por algumas organizações para solucionar, justamente, esses conflitos jurídicos.


5.5- AS COMPETÊNCIAS DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


A materialização de uma organização está condicionada à conclusão, à assinatura, à ratificação e à entrada em vigor de seu tratado constitutivo. O Estado para fazer parte da entidade internacional, deverá aceitar o seu tratado constitutivo a partir do processo de ratificação. Com o término desse processo e com a sua adesão ao organismo, o ente estatal não poderá mais concluir nenhum outro tratado que viole os preceitos estipulados no tratado institutivo da organização internacional da qual ele passou a fazer parte.


O tratado constitutivo adquire o caráter de uma norma constitucional da organização, sendo que as demais normas a ela se subordinarão. As características do referido tratado são: o seu prazo de duração indeterminado; a sua execução realizada por vários atos; a sua interpretação feita pela própria organização; a sua primazia sobre os outros tratados; no silêncio do tratado, os Estados não podem denunciá-lo. Na concepção de Celso D. de Albuquerque MELLO, realmente, o Estado membro não pode se retirar de uma organização, quando o seu tratado constitutivo não prevê o direito de retirada, já que o Estado limitara espontaneamente a sua vontade quando se aderiu ao organismo. Todavia, verifica-se, na prática, que a instituição estatal retira-se da organização quando quiser, porque ela não tem meios de obrigá-lo em sentido contrário.


Enfim, o tratado constitutivo das entidades internacionais se apresenta como instrumento delineador de seus direitos e obrigações, além de outorgar suas competências.


De modo geral, são atribuídas às organizações as seguintes competências: normativa, operacional, impositiva e de controle.


A competência normativa das organizações internacionais pode ser dirigida ao exterior ou ao interior da própria entidade, objetivando a melhoria de seu funcionamento.


A competência normativa dirigida ao exterior manifesta-se por meio das convenções (tratados firmados pelos Estados, membros ou não, ou com as outras organizações internacionais); das conferências diplomáticas que se realizam após a convocação dos Estados membros pelo organismo; das convenções a serem aplicadas pelos Estados membros, servindo, a organização, como guarda material e gestora dos tratados (como no caso do Conselho da Europa) e das recomendações (dirigem-se aos Estados membros sob a forma de simples proposta, mas caso os Estados membros não as acatem, deverão justificar as suas razões).


As organizações que desempenham o papel de coordenação, em questões essencialmente técnicas do convívio internacional, possuem outra forma de exercício da competência normativa, a capacidade de editar regulamentos, destinados aos Estados membros com o objetivo de uniformizar as condutas perante situações comuns. Um exemplo dessa competência normativa encontra-se na Organização Mundial da Saúde, a qual é responsável por editar regulamentos sanitários.


Em relação à competência de controle, essa pode ser detectada com base tanto no tratado constitutivo quanto em convenções paralelas. A iniciativa do processo de controle por parte de uma organização contra um Estado que não cumpre suas obrigações, pode ser feita de três formas: um Estado pode acusar o suposto infrator; a própria organização pode fazê-lo por meio do seu direito de iniciativa, conforme relatório dos Estados, ou informações oriundas de órgãos privados ou através de inspeções regulares realizadas por funcionários internacionais ou agentes mandados pela organização; a iniciativa também pode partir do controle de pessoas ou de grupos.


O controle pode exercer-se de maneira total em um território delimitado ou pode restringir-se à aplicação das normas originárias ou derivadas. Os seus efeitos dependerão, na maioria das vezes, de sua publicização como forma de pressão da opinião pública frente ao Estado, supostamente, infrator.


É preciso elucidar que a criação da Organização Mundial do Comércio – OMC indica, em outro patamar, o controle das organizações internacionais sobre os compromissos dos Estados membros, objetivando demonstrar as controvérsias comerciais entre os parceiros e permitindo-lhes a tomada de represálias, sob a proteção da Organização Internacional do Comércio, caso o Estado se considere lesado.


Outra competência da organização internacional é a operacional que se desenvolve de maneira permanente ou pontual, junto a setores específicos e problemas concretos dos Estados membros. A operação permanente, geralmente, se desenrola nos países em desenvolvimento através da ajuda à gestão técnica, econômica e social. Já a operação pontual auxilia na resolução de problemas circunstanciais, tais como catástrofes naturais, epidemias ou conflitos militares que afetem profundamente a população civil.


Frisa-se que a organização dessas operações dependerá dos poderes, das competências e dos meios materiais que as entidades internacionais dispõem.


Em relação à competência impositiva, essa se refere à possibilidade da organização internacional de impor suas decisões externamente, conforme o seu tratado constitutivo e sua natureza.


A competência impositiva é natural quando se trata de organizações internacionais comunitárias ou de subordinação, como no caso das diretrizes da União Européia. Nas organizações de concertação, a imposição é uma exceção que dependerá de circunstâncias específicas e de interpretações dos direitos das entidades internacionais e dos compromissos assumidos pelos Estados membros.


Cabe enfatizar que a competência impositiva só poderá ser exercida contra os Estados mais débeis, inclusive, em se tratando da Organização das Nações Unidas, essa competência não poderá ser aplicada aos membros permanentes do Conselho de Segurança[85].


As decisões impositivas das organizações internacionais podem ser aplicadas, exclusivamente, para a manutenção da paz e da segurança internacionais. No entanto, as entidades internacionais capazes de assumi-las são somente as que mencionam, em seu tratado constitutivo, que tal objetivo esteve na origem de sua criação.


O problema é que a imposição de uma decisão do coletivo internacional ao ente estatal que decide não acatá-la constitui ato violento que pode ser interpretado como uma ingerência indevida nos assuntos internos desse Estado. Define-se a ingerência pelo seu caráter impositivo ou coercitivo, em que um organismo internacional ou um país impõe a um Estado determinada conduta ou situação que ele não desejaria por si, atacando a sua soberania.


Uma importante maneira de intervir nos assuntos internos das instituições estatais é representada pela concessão de empréstimos de entidades internacionais, como o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacional e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, na medida em que os tomadores dos empréstimos adotem medidas internas impostas por referidas instituições.  Assim, a negociação das dívidas externas de muitos Estados, o processo de privatização e o gerenciamento da máquina pública, o papel da instituição estatal, são assuntos que ao vincular-se com estratégias externas, fogem do domínio do Estado.


Também é possível a identificação da competência impositiva da Organização das Nações Unidas, ao se analisar os acontecimentos históricos, como a tomada de sanções econômicas em relação ao Iraque, desde 1990, e ao Haiti, a partir de 1993, em que ocorreu uma ruptura das relações diplomáticas e comerciais até um bloqueio, resultante na ruptura de todas as relações econômicas desses países com o resto do mundo; como a tomada de medidas coercitivas de caráter militar, representadas pela intervenção na Somália ou pela autorização concedida pela ONU à OTAN para intervir no conflito da ex-Iuguslávia; como a intervenção em um conflito interno de um Estado membro, por exemplo, quando a ONU interviu contra a Unita em Angola, no ano de 1993, dispondo-se a colocar um fim na situação de instabilidade política ou de guerra civil.


A justificativa da ONU para essas ingerências se fundamenta na prerrogativa da manutenção da paz, mas para isso, a entidade em questão envia forças de interposição e intervém nos assuntos internos do Estado com o objetivo de auxiliá-lo a exercer suas competências.


5.6- A RESPONSABILIDADE DAS ORGANIZAÇÕES INTERNACIONAIS


As organizações internacionais são sujeitos de direito internacional público. Apesar de carecerem de uma realidade física e de um espaço territorial, as organizações são produtos de uma elaboração jurídica resultante da vontade conjugada de certo número de Estados.


Por ser pessoa jurídica de direito público, uma organização pode, com efeito, incidir em conduta internacionalmente ilícita, porém, deverá arcar com a sua responsabilidade perante a outra pessoa jurídica de direito internacional público que tenha sofrido o dano (material ou imaterial) e que, por isso, terá o direito a uma reparação, assim como, se a vítima do dano for a organização, será ela que terá direito a uma reparação adequada.


Desse modo, os organismos internacionais são responsáveis pelos atos dos seus órgãos competentes e dos incompetentes; pelos atos de particulares, dentro de suas sedes, se a organização não toma providências para evitá-los ou reprimi-los e perante os seus próprios funcionários.


O Estado membro do organismo poderá ser responsável por ato praticado pela organização, se ele foi o responsável pelo ato ilícito ou o tolerou, tendo meios para evitá-lo e não o fez.


Responsável pelo ato ilícito, de acordo com o direito das gentes, a organização deve a outra personalidade jurídica internacional uma reparação correspondente ao dano que lhe tenha causado. Essa reparação é de natureza compensatória e não punitiva.


A particularidade da responsabilização da entidade internacional, é que pode repercutir nos Estados membros, pois se uma organização for obrigada a pagar uma indenização, esse pagamento será feito por contribuições[86] dos Estados membros, já que ela não possui independência financeira.


A forma de reparação se dará em conformidade com o dano. Se o dano foi moral, a compensação será o pedido formal de desculpas e a punição das pessoas responsáveis. Mas, se o dano teve expressão econômica, a reparação deverá ser em dinheiro. Outro modo de reparação é a restauração do statu quo ante, ou seja, é a recolocação das coisas no estado em que se encontravam antes do ato ilícito.


6- A CRISE DO ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL


Aproximadamente, entre os anos de 1945 e 1973, o capitalismo passou por uma fase de intensa prosperidade. A referida época é caracterizada por um relevante crescimento econômico, por um rápido crescimento da produtividade, por uma estabilidade estrutural em relação aos empregados e aos desempregados e por recessões débeis e curtas. Por tudo isso, esse período é conhecido como os Anos Dourados.


As revoluções, durante esses anos, se intensificaram tais como: as revoluções “comunistas”, inspiradas pela Revolução de Outubro, na Iugoslávia, na China, na Indochina, em Cuba; as revoluções para a libertação das colônias na Ásia, na África e no Caribe, levando à emancipação de vários países antes submetidos ao domínio colonialista; o movimento pela paz nos Estados Unidos, durante a Guerra do Vietnã; o movimento estudantil-operário de 1968 na França, protestando contra o autoritarismo das instituições da sociedade civil; os grandes movimentos cívicos políticos, que do ponto de vista formal não se equipararam às revoluções, pois não praticavam a violência nem pretendiam a tomada de poder, mas causavam profundas mudanças supra-estruturais alcançadas pela adoção da democracia política, sem a necessidade de desalojar do governo os seus ocupantes eventuais.


Em 1950, a cortina de ferro dividia os domínios dos Estados desenvolvidos em sistema capitalista e no sistema intitulado “socialismo real”. Esse último estava sendo aderido por várias ex-colônias e Estados subdesenvolvidos, devido aos seus atrasos econômicos que conseqüentemente fragilizavam o capitalismo e suas instituições supra-estruturais. Logo, pela primeira vez, o capitalismo se defrontava com um sistema de produção distinto[87].


Ainda antes do fim da Segunda Guerra, conforme o já elucidado, os Estados aliados celebraram a conferência de Bretton Woods que propunha um novo sistema financeiro internacional através da criação do FMI e do Banco Mundial. Porém, na realidade, essas duas instituições intergovernamentais tinham por objetivo permitir a retomada da globalização, mas agora dirigida por elas em conjunto com os governos nacionais. Inclusive, o FMI e o Banco Mundial, influenciados pelos Estados Unidos, iniciaram uma política de pressão aos governos clientes para que eles restringissem e reduzissem a intervenção estatal na economia.


Por conseqüência, todas essas transformações foram determinantes para o declínio dos Anos Dourados no Estado de Bem-Estar Social. Todavia, o “golpe final” se deu pelos protestos contra o privilégio dos Estados Unidos de não precisar se submeter à disciplina monetária que o FMI impunha aos demais Estados, quando vários governos deixaram de acumular reservas cambiais em dólares, passando a fazê-lo em ouro, o que ocasionou a crise do dólar e representou o primeiro passo para a substituição da hegemonia dos Estados Unidos sobre o mundo capitalista pela hegemonia compartilhada com a Europa e com o Japão.


A partir de 1974, a economia capitalista começou a apresentar oscilações conjunturais com recessões profundas e longas, o ritmo de crescimento passou a cair e as taxas de desemprego tornaram-se cada vez mais altas.


O fim dos Anos Dourados também foi marcado por grandes lutas de classe dos principais Estados. A rebeldia operária-estudantil foi motivada pelo fato de o conteúdo do trabalho industrial permanecer sendo rotineiro, extenuante, alienador e cada vez mais insuportável para trabalhadores jovens, com altos níveis de escolaridade e capacidades inaproveitadas.


E mais, quando o ritmo de crescimento da produção e da produtividade começou a cair, tendo como resultado o repasse dos custos aumentados da força de trabalho para os preços, a inflação nos Estados desenvolvidos começou a subir fortemente, sobretudo entre os detentores de ativos financeiros, o que incluía boa quantidade de operários. A crise inflacionária também foi agravada pela crise do petróleo, a OPEP (cartel dos países exportadores de petróleo) conseguiu aumentar violentamente o preço do petróleo por duas vezes, o que desencadeou fortes pressões inflacionárias nos Estados dependentes desse combustível.


Além dos fatores elucidados, outros elementos contribuirão para a limitação do Estado de Bem-Estar Social.


Do ponto de vista das classes dominantes, cada vez mais era difícil o controle social e político da sociedade. Quanto às classes dominadas, essas começaram a perceber os efeitos perversos do Estado de Bem-Estar Social, como o crescimento da burocracia estatal e o reforço dos poderes e da capacidade de influência dos órgãos estatais[88].


A estrutura estatal encontrava-se endividada, diante dos gastos públicos para manter todos os benefícios concedidos pela instituição estatal aos seus cidadãos. Esse informe assinalava a crescente dificuldade das políticas redistributivas para fazer frente ao aumento das demandas sociais.


Além disso, os órgãos estatais hipertrofiaram e continuaram a funcionar. A organização política, que deveria ser um aparelho regulado, seguro e rápido para cumprir com eficiência um objetivo certo limitado, transformou-se em uma engrenagem desconjuntada[89].


As demandas sociais suscitavam um incremento da pressão fiscal para enfrentá-las, o quê, com o tempo, resultou em custos de produção crescentes, influenciando na competitividade econômica da empresa, com a conseguinte queda da capacidade de contribuição fiscal.


O Estado de Bem-Estar Social que havia integrado as classes dominadas e lhes concedido direitos sociais, que tratava de resolver demandas sociais coletivas, nos termos da acumulação privada, agora, via-se diante de um dilema: ou seria superado pelas classes dominadas através do socialismo, ou resolveria a crise a favor das classes dominantes por meio de políticas de privatização, cuja premissa fundamental era a utilização do Estado para debilitar as instituições das classes trabalhadoras (como os sindicatos) e desmontar as instituições da política de rendas pró-salários (como os contratos permanentes de trabalho) para disciplinar essas classes. Por óbvio, a crise ficou decidida em favor das classes dominantes.


A solução da crise que marcou o fim dos Anos Dourados ocorreu quando os governos e as cúpulas empresariais começaram a entender que a crise só seria eliminada de uma maneira favorável aos interesses capitalistas se, em lugar do pleno emprego, fosse restabelecido um ambiente de “sadia competição” no mercado de trabalho e se fosse instaurado o programa neoliberal que prometia ao mesmo tempo estabilizar os preços e recuperar as taxas de lucro[90].


As políticas neoliberais e mistas, postas em prática desde então, reduziram o Estado de Bem-Estar Social a pouco mais que Estado de Assistência, ou seja, perdeu-se a escala móvel de salários e a segurança no emprego, destruiu-se a progressividade do sistema fiscal, desproveram-se de eficácia os direitos sociais, descarregou-se de capital o custo da assistência pública aos usuários, privatizaram-se as empresas estatais, dentre outras medidas que foram implantadas por essas novas políticas.


A partir de então, tende-se à materialização do rompimento com o sindicato, deslegitimando e desprestigiando as instituições políticas e sociais dos trabalhadores, fazendo-as publicamente suspeitas.


A opinião de Juan Ramón CAPELLA[91] é que a “ajuda do Estado”, em que consistiu o Estado de Bem-Estar Social, não se preocupava com um desenvolvimento social efetivo, mas serviu unicamente para paralisar política e socialmente as grandes massas de trabalhadores em prol da preservação do sistema capitalista. Após a sua derrocada, o que se observa são as populações ocidentais em posições miseráveis e as catástrofes ecológicas.


Em suma, todos os fatores sociais, econômicos e políticos relatados reforçaram a crise do Estado de Bem-Estar Social e foram fundamentais para a grande reviravolta ideológica conhecida como neoliberalismo.


7- A GLOBALIZAÇÃO


José Eduardo FARIA[92] salienta que o fenômeno da globalização não é recente, pois as suas manifestações podem ser encontradas no período das expedições marítimas portuguesas e espanholas, no século XV; na exploração manufatureira, no século XVI; na exploração do ouro e da prata nas Américas, com o advento do mercantilismo e do colonialismo europeu, nos séculos XVII e XVIII; na comercialização de produtos pela internacionalização em grande escala, proporcionada pela adoção do padrão-ouro, facilitando as trocas cambiais, no final do século XIX e início do século XX.


O célebre autor Eric J. HOBSBAWM[93] denomina o período após 1870 de “mundo unificado”, vez que até aquele ano, os Estados se relacionavam de maneira tênue, pois havia uma fraqueza dos laços econômicos entre os Estados. O desenvolvimento do comércio internacional fez com que uma rede de relações se estabelecesse entre os entes estatais, unindo cada vez mais as várias regiões do mundo.


Mas, foi em 1980 que se consolidou um novo panorama da globalização, iniciada após a Segunda Guerra Mundial. A partir desse momento, surgem diversos conceitos que objetivam esclarecer esse novo processo.


Para Néstor García CANCLINI[94], a globalização é uma interação das atividades econômicas e culturais dispersas, bens e serviços gerados por um sistema de muitos centros, no qual se destaca a velocidade com que se percorre o mundo, desprezando-se as fronteiras geográficas.


Boaventura de Souza SANTOS[95] define a globalização como o conjunto de relações sociais que se traduzem na intensificação das interações transnacionais, sejam elas práticas interestatais, práticas capitalistas globais ou práticas sociais e culturais interestatais.


Marcos Antonio de MORAES e Paulo Sérgio Silva FRANCO[96] argumentam que a globalização estrutura-se na liberalização econômica, ou seja, os Estados abandonaram gradativamente as barreiras tarifárias que protegiam a sua produção da concorrência estrangeira e se abrem ao fluxo internacional de bens, de serviços e de capitais.  A principal causa da abertura das fronteiras dos Estados foi o acontecimento da recente revolução nas tecnologias de informação. Sendo assim, verifica-se uma crescente homogeneização cultural, uma evolução e uma popularização das tecnologias de informação, tais como o computador, o telefone, a televisão, que são essenciais para a agilização do comércio, para o fluxo de investimentos e para a atuação das transnacionais, permitindo uma integração de todos os pontos do planeta, mesmo que distantes.


Sob o viés econômico da inédita globalização, José Eduardo FARIA[97] descreve algumas de suas características como: o surgimento de um processo de superação das restrições de espaço pela minimização das limitações de tempo; o aumento do volume de informações; as complexas e intensas interações transnacionais em que a empresa privada, progressivamente, substitui o Estado como ator principal; a enorme dimensão alcançada pelos movimentos transnacionais de capital; a formação de uma hierarquia dinâmica de acesso e trocas desiguais entre os fatores de produção, com amplitude mundial.


Dessa maneira, a peculiaridade que torna singular a globalização econômica que se vivencia, trata-se da ampliação do comércio mundial e o seu gigantesco crescimento.


Para se compreender essa nova forma de globalização econômica, também se faz necessária a análise do papel das empresas transnacionais no mundo globalizado, bem como da nova divisão do trabalho gerada pelo referido fenômeno[98].


A empresa nacional cujo território de concorrência estava ligado, mais ou menos, ao território nacional, e que saía para conquistar mercados no estrangeiro, cedeu lugar à empresa transnacional, que põe os trabalhadores em concorrência, não mais apenas com os seus compatriotas, mas com os trabalhadores do outro lado do mundo, que são obrigados a aceitar salários de miséria[99].


As transnacionais são formadas por uma matriz e por suas filiais. A matriz é um centro de decisão financeiro e suas filiais são empresas que exploram algumas atividades.


Na realidade, não se vê mais nas transnacionais contemporâneas estruturas nas quais várias etapas de produção de um bem são executadas, mas evidencia-se a fragmentação e a dispersão do processo de produção por várias entidades estatais, através das filiais e dos fornecedores. Assim, obtém-se um produto final global composto de várias partes desenvolvidas em vários Estados, sendo aproveitadas, ao máximo, as vantagens comparativas de cada um, isso significa que as empresas visam atingir um mercado consumidor global, utilizando mão-de-obra, tecnologia e matéria-prima existentes em todo o planeta. Inclusive, as relações de trabalho passam a ser estipuladas sob contratos variados de trabalho. O novo processo de produção caracteriza a nova divisão internacional do trabalho ao mesmo tempo em que torna obsoletas as fronteiras dos Estados.


Diante de tal abordagem, conclui-se que é inegável o poder das empresas transnacionais que, efetivamente, as torna protagonistas privilegiadas dentro da economia mundial, conquistando uma autonomia em relação aos Estados, a ponto de limitar a sua política, além de instaurarem uma nova forma de produção do trabalho que se dissemina em vários Estados, sobretudo naqueles que lhe propiciam condições atrativas.


Inclusive, cabe relembrar que uma das transformações mais dramáticas produzida pela globalização econômica reside na enorme concentração de poder econômico por parte das empresas multinacionais.


A globalização econômica também se perfaz pela unificação dos mercados financeiros. De fato, tal mercado é dominado por certas economias, pelos Estados mais ricos e por aqueles cuja moeda é utilizada como moeda internacional de reserva e que, com isso, dispõe, no interior dos mercados financeiros, de uma grande margem de liberdade. Desse modo, o mercado do capital internacional tende a reduzir a autonomia do capital nacional e, particularmente, a proibir a manipulação, pelos Estados nacionais, das taxas de câmbio, das taxas de juros, que são cada vez mais determinadas por um poder concentrado nas mãos de um pequeno número de instituições estatais.


Outro fator da globalização econômica é o movimento diário de capitais especulativos no planeta, ou seja, é o deslocamento de massas crescentes de capitais da esfera produtiva para a esfera financeira, tornando ainda mais vulnerável a economia mundial, pois, dada a elevada fluidez dos referidos capitais, esses podem realizar movimentos bruscos em âmbito internacional, possibilitando a geração de crises econômicas[100].


Além do que, por óbvio, a globalização econômica implicou em diversas alterações para as políticas econômicas nacionais que passam a seguir as seguintes exigências: as economias nacionais devem abrir-se ao mercado mundial e os preços domésticos devem adequar-se aos preços internacionais; deve ser dada prioridade à economia de exportação; as políticas monetárias e fiscais devem ser orientadas para a redução da inflação e da dívida pública; os direitos de propriedade devem ser claros e invioláveis; o setor empresarial do Estado deve ser privatizado, dentre outras modificações.


Cabe frisar que em suma, a globalização econômica é sustentada pelo consenso econômico caracterizado pela criação de três principais inovações institucionais: as restrições à regulação estatal da economia; os novos direitos internacionais de propriedade internacional para investidores estrangeiros, inventores e criadores de inovações suscetíveis de serem objeto de propriedade intelectual e a subordinação, cada vez mais acentuada, dos Estados às entidades internacionais.


Entretanto, Boaventura de Souza SANTOS[101] enfatiza que as características gerais da globalização não vigoram de modo homogêneo em todo o mundo. Pelo contrário, articulam-se de modo diferenciado, conforme as condições nacionais e locais, como a trajetória histórica do capitalismo nacional, a estrutura de classes, o nível de desenvolvimento tecnológico, o grau de institucionalização dos conflitos sociais.     


Além da globalização econômica, é possível se vislumbrar enfoques da globalização nas dimensões: política, social, ambiental e cultural. Esses enfoques diferenciados existem devido à crescente interconexão em vários níveis da vida cotidiana em diversos lugares do mundo[102].


Quanto à esfera política da globalização, observa-se uma interconexão dos Estados e das entidades internacionais, sendo que, cada vez mais, aqueles ficam privados da possibilidade de articularem uma política autônoma de desenvolvimento.


Isso acontece porque, na globalização das economias, os Estados perdem a capacidade de ação e de regulação, recorrendo, cada vez mais, a arranjos interestatais, intensificando a sua participação em organizações internacionais que partilham a condução da economia mundial e interagindo com novos atores estratégicos, globais ou supranacionais, que já não se restringem ao FMI, ao Banco Mundial e à OCDE, mas alargam-se às Nações Unidas, às ONG’s internacionais e às comunidades epistêmicas de peritos transnacionais[103].


Sob o ponto de vista político, é detectada a crise global pela queda dos preços dos artigos primários, pela crise da dívida externa dos países do Terceiro Mundo e do seu empobrecimento. Para solucionar o problema das dívidas, os Estados têm adotado programas de ajuste estrutural definidos pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial, tendo como resultado a redução do poder aquisitivo da população e o direcionamento da produção para o mercado externo, gerando o empobrecimento de muitas populações, causando ainda, a sua desestabilização monetária e a sua deterioração econômica[104].


Ademais, a globalização política se fundamenta em alguns componentes: o consenso do Estado fraco, pois a economia neoliberal necessita de uma sociedade civil forte e para que ela exista é preciso que o Estado seja fraco, tendencialmente, mínimo; o consenso da democracia liberal a qual visa dar forma ao Estado fraco, preconizando a convergência da liberdade política com a liberdade econômica, as eleições livres e os mercados livres; o consenso sobre o primado do direito e do sistema judicial, que busca a vinculação entre a globalização política e a globalização econômica, ou seja, um modelo estruturado nas privatizações, pois a iniciativa privada e a primazia dos mercados necessitam de uma previsibilidade e de uma confiança que só podem provir do direito e do sistema judicial, os quais criam expectativas normativamente estabelecidas e resolvem litígios de forma conhecida por todos.


Assim, o movimento, que se tornou possível pela política de desregulamentação financeira, em direção a um mercado puro e perfeito se realiza através da destruição de todas as medidas políticas, colocando em risco as estruturas coletivas capazes de resistirem à lógica do mercado puro, como os grupos de trabalho, os coletivos de defesa e até mesmo a família[105].


Na dimensão social da globalização, constata-se que a economia global levou o Terceiro Mundo à fome a ao empobrecimento, ocasionando a exclusão social. O empobrecimento não está interligado à escassez de recursos econômicos, mas sim ao desenvolvimento tecnológico que gerou a ampliação da produção, reduziu os postos de trabalho, aumentando o desemprego e a baixa remuneração.


O aumento do desemprego de longa duração e a generalização de empregos precários foram fenômenos responsáveis pelas crescentes desigualdades sociais e pela miséria crônica de uma parte significativa da população. Além disso, a crise do emprego se transforma em uma crise social a partir da proliferação de oportunidades de emprego que não mais oferecem estabilidade, segurança, salário e condições de trabalho, já que os direitos sociais estão sendo desvalorizados[106].


Diante disso, quando o desemprego atinge taxas muito elevadas e a precariedade afeta uma parte muito importante da população, o trabalho se torna algo desejável a qualquer preço, submetendo os empregados à exploração dos empregadores. A concorrência pelo trabalho é acompanhada de uma concorrência no trabalho, o qual precisa ser conservado, custe o que custar, contra a chantagem da demissão, o que, muitas vezes, impede a mobilização e a reivindicação dos trabalhadores.


Devido a essa circunstância social, a informação sobre as diferenças de oportunidades, não apenas a nível econômico, mas também no acesso a um conjunto de bens e serviços que assegurem um melhor bem-estar, como o acesso à educação, à saúde, à habitação e a um rendimento mínimo, seduz e promove o crescimento da pressão migratória dos países pobres para os países ricos[107].


A dimensão ambiental da globalização se manifesta no impacto negativo que a industrialização, decorrente da produção industrial e agrícola, do desenvolvimento das biotecnologias e da urbanização acelerada, causa ao meio ambiente, colocando em risco os ecossistemas. Aliás, a destruição do meio ambiente, seja pela derrubada de florestas ou pelo uso inadequado do solo, tornou vastas extensões de terras inapropriadas para o uso.


Outros problemas ambientais são detectados como a contaminação, as emissões de gás carbônico, a desertificação, a erosão, a perda da biodiversidade, a pesca predatória, a poluição (proporcional ao modo de produção e de vida da população em um Estado), dentre outros exemplos de desequilíbrio ecológico causado pela exploração da atividade econômica.


Como o problema ambiental, na atualidade, transcende fronteiras nacionais, com o intuito da preservação ecológica do planeta, são realizados vários encontros internacionais tratando da questão ambiental[108].


Na dimensão cultural da globalização, evidencia-se a mundialização da cultura, ou seja, a disseminação de produtos culturais americanos e europeus em escala global, gerando a padronização de certa cultura tanto em âmbito mundial quanto em âmbito local. A globalização cultural é propiciada pela avançada tecnologia de comunicação, responsável pela ligação de partes remotas do planeta em tempo real, resultando em uma interconexão cultural em âmbito global.


8- O NEOLIBERALISMO


O poder excessivo dos sindicatos, o movimento operário com suas pressões reivindicativas sobre os salários e sobre o Estado para que aumentasse cada vez mais os gastos sociais, foram alguns dos elementos responsáveis pela destruição dos níveis necessários de lucros das empresas e desencadearam processos inflacionários que desembocaram em uma crise generalizada das economias de mercado. A solução para a crise, aproximadamente nos anos 70, foi o neoliberalismo, que fez com que a política da Europa do Oeste se inclinasse para propostas com a menor participação do Estado, atribuindo ao mercado a solução de muitos problemas[109].


Um dos principais criadores do neoliberalismo foi Friedrich August Von HAYEK. Esse autor[110] refutava o socialismo, direcionando sua crítica à planificação das economias socialistas a qual, segundo ele[111], cerceava a liberdade. Para Friedrich August Von HAYEK[112], a concorrência seria o mecanismo mais adequado, pois coordenaria os esforços humanos individuais e eliminaria a regulação da economia pelo Estado.


A concorrência, de acordo com as teorizações desse autor[113], seria a única forma das atividades poderem ser ajustadas umas as outras sem a intervenção coercitiva ou arbitrária da autoridade, sendo regulamentada pela criação de uma estrutura legal cuidadosamente elaborada para mantê-la e estimulá-la a produzir os resultados mais benéficos.


Partindo do referido pressuposto, os agentes, no mercado, deveriam ser livres para vender e comprar a qualquer preço, desde que houvesse um interessado na transação, e todos deveriam ser livres para produzir, vender, comprar tudo que pudesse ser produzido e vendido. Qualquer tentativa de controlar os preços ou as quantidades da mercadoria impediria à concorrência de coordenar os esforços individuais, porque as modificações do preço deixariam de registrar as condições do mercado e não mais forneceria ao indivíduo a informação precisa para que ele pudesse orientar as suas ações.


Friedrich August Von HAYEK[114] também concluiu que em nome da viabilização da concorrência, seria importante a limitação imposta às condições de trabalho pelos direitos trabalhistas e o acesso aos serviços sociais, porém enfatiza que essas vantagens não podiam ser otimizadas a ponto de tornar ineficaz a concorrência em vários setores da vida econômica.


Por fim, ele[115] enuncia o princípio orientador, em nome da defesa da concorrência e da ausência da regulação do mercado, mencionando que uma política de liberdade para o indivíduo seria a única política que de fato conduziria ao progresso.


Outro autor criador do neoliberalismo foi Milton FRIEDMAN[116] o qual explicita que no mundo moderno há uma intensa interdependência entre as instituições estatais que passam a possuir uma grande liberdade comercial. Por causa disso, na esfera econômica dos Estados, tanto no âmbito externo quanto no interno, verifica-se um entrelaçamento entre a economia e a política, posto que a liberdade de comércio internacional seria a provedora da harmonia e da paz entre os entes estatais, prevalecendo a cooperação e não o conflito. A prevalência do conflito só se daria, conforme esse autor, quando os governos intercedessem na economia, criando restrições ao mercado.


Desse modo, o que se constata com a análise dos pensamentos de Friedrich August Von HAYEK e de Milton FRIEDMAN é a autêntica concepção liberal, ou seja, um Estado mínimo que se incumbe de algumas funções reduzidas, mas que garanta a liberdade dos indivíduos de comerciarem e que proteja o livre mercado (ordem espontânea econômica). O neoliberalismo, então, nada mais é do que o conjunto de medidas e políticas econômicas que se manifestam no âmbito da globalização econômica.


José Fernando de Castro FARIAS[117] defende que o neoliberalismo insurgiu devido à falência do Estado de Bem-Estar Social. Logo, a perspectiva neoliberal buscou a redução do problema da crise do Estado de Bem-Estar Social, opondo a virtude do mercado ao Estado distribuidor.


Já Pierre BOURDIEU[118] considera a globalização e o neoliberalismo como discursos poderosos, que tem força social, mas que, na realidade, são as armas principais das lutas contra as conquistas do Welfare State. Isso significa que a filosofia neoliberal pretende apagar todos os vestígios do Estado de Bem-Estar Social, pois os consideram obstáculos ao funcionamento harmonioso dos mercados. O programa neoliberal tende assim, a favorecer, globalmente, a ruptura entre a economia e as realidades sociais.


Para Pierre BOURDIEU[119], a instauração do neoliberalismo decorreu de um trabalho constante feito por intelectuais, por jornalistas, por homens de negócios, com o intuito de tornar óbvia uma visão neoliberal revestida de racionalização econômica. Esse trabalho de imposição produziu efeitos profundos, pois foi fundamental para a apresentação do neoliberalismo como um processo inevitável. A partir disso, vários pressupostos passam a ser impostos como óbvios: admite-se o crescimento máximo, a produtividade, a competitividade, as irresistíveis forças econômicas e abandona-se a esfera social.


Há, também, todo um jogo com as conotações e associações de palavras como flexibilidade, maleabilidade, desregulamentação, que tendem a fazer crer que a mensagem neoliberal é uma mensagem universalista de libertação.


A estabilização dos preços, certamente, tornou-se a alavanca com a qual o neoliberalismo pretendia se auto-afirmar. Ele[120] conseguiu convencer a opinião pública de que estabilidade e pleno emprego são incompatíveis. No entanto, como a estabilização neoliberal reduz o crescimento da economia[121], os neoliberais precisaram encontrar um culpado pelas sucessivas recessões, que foram o movimento sindical e o Estado de Bem-Estar Social[122].


Os sindicatos, então, passaram a ser culpados pelo desemprego involuntário ao sustentar a legislação do trabalho que proíbe a contratação de trabalhadores por menos de um salário mínimo, por jornadas maiores que a legal ou sem benefícios prescritos. Por causa disso, os governos neoliberais trataram de revogar essa legislação com o intuito de “flexibilizar” esses direitos, para torná-los itens contratuais negociáveis em lugar de obrigações do empregador. Gradualmente, o poder dos sindicatos de mobilizar os trabalhadores foi sendo, severamente, reduzido.


Quanto ao Estado de Bem-Estar Social os governos neoliberais lançaram-se em uma ofensiva para destruí-lo ou, no mínimo privatizá-lo, com a justificativa de que era preciso reduzir o tamanho do Estado, transferindo ao mercado de seguros o programa de seguridade social de responsabilidade pública.


Contudo, nos lugares em que existiram mudanças ocasionadas pelo neoliberalismo, os resultados prometidos raramente foram alcançados. A eliminação do poder sindical e dos direitos dos trabalhadores não ajudou a reduzir o desemprego e a privatização dos serviços sociais não melhorou a sua qualidade.


Ademais, segundo os autores Marcos Antonio de MORAES e Paulo Sérgio Silva FRANCO[123], a nova ordem trazida pelo neoliberalismo é a unificação do mundo em um mercado único, formada por alianças comerciais regionais, sendo que os mercados financeiros é que passam a impor suas leis e seus preceitos ao mundo.


Os neoliberais, guiados por uma visão de liberalismo econômico, anunciam que só o mercado pode ser a solução dos grandes problemas da sociedade contemporânea.


Nilson Araújo de SOUZA[124] define o neoliberalismo como uma ideologia da oligarquia financeira que domina o mundo, na atual etapa do capitalismo. De acordo com esse autor[125], o neoliberalismo, corporificado em um conjunto de propostas que recebeu o apelido de Consenso de Washington, é uma tentativa de responder à necessidade do capitalismo moderno, partindo da concepção de uma nova liberdade. No entanto, o neoliberalismo prega, formalmente, a liberdade de todos, pois, na prática, somente alguns indivíduos usufruem de tal liberdade.


O que se percebe é uma crise global e mundial que abarca todo o planeta, sendo a primeira vez que isso acontece na história contemporânea, já que, na atualidade, ainda não há instrumentos de intervenção, nem definição de políticas que possam reverter essa situação, em âmbito mundial, em curto prazo.


De fato, o neoliberalismo e a globalização são os grandes responsáveis pela diferença, ainda maior, entre os Estados capitalistas (pobres e os ricos), agora Norte-Sul, devido à abertura dos mercados, ao fim das restrições comerciais e à implantação de um comércio mais amplo, supervisionado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) que substituiu o Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT).


Em caráter urgente, é preciso combater o mito da globalização e do neoliberalismo, que tem por função a restauração do capitalismo radical cuja única lei é a do lucro máximo, mas racionalizado e cínico.


9- A CRISE DO ESTADO E DA SOBERANIA


Quando o surgimento do Estado é analisado, observa-se, primeiro, uma concentração de força física e de força econômica, em seguida, tem-se uma concentração de capital cultural e uma concentração de autoridade. Na medida em que avança, o Estado adquire autonomia, torna-se parcialmente independente das forças sociais e econômicas dominantes.


Contudo, é indiscutível que a origem do Estado se deu pelo acordo de vontade dos indivíduos e que esse ente, em todos os países, é, em parte, o vestígio das conquistas sociais.


O intrigante é que desde o surgimento do Estado até o presente processo de globalização verifica-se o fortalecimento dos poderes do ente estatal, entretanto, a atual globalização produz o enfraquecimento de seus poderes.


O que se constata é que as peculiaridades do fenômeno da globalização e o do neoliberalismo, que lhe dá suporte, demonstram que está havendo a crise do Estado, decorrente da relativização da delimitação das fronteiras nacionais.


Kenichi OHMAE[126] afirma que os pressupostos básicos de sustentação do Estado não mais se apresentam. Por isso, o Estado perdeu o seu papel como unidade significativa de participação na economia, tornando-se uma unidade disfuncional.


Conforme a explanação de Kenichi OHMAE[127], as fronteiras políticas ainda existem, mas o que importa para os indivíduos em um mundo global, sem fronteiras, é o atendimento de suas demandas de consumo. O atendimento ao consumo dependerá do crescimento da economia, que está diretamente ligado à abertura cada vez maior das fronteiras, fazendo com que o conceito de soberania, atrelado à idéia de Estado, cada vez mais caía no vazio.


António Manuel HESPANHA[128] elucida que a instituição estatal, tal como tinha sido construída pela teoria política liberal, dissolve-se e desaparece. De acordo com suas concepções, o Estado está em crise, pois o interesse geral está sendo mitigado pelas particularidades, os regionalismos estão se sobrepondo ao centralismo, o império da lei está sendo atacado, dentre outros elementos que contribuem para a derrocada estatal.


O anúncio do fim do ente estatal como modelo de organização política se torna usual na teoria política mais recente, tendo em vista que, progressivamente, o Estado perde a sua eficiência e sua legitimidade, abandonando o imaginário político.


Em relação ao declínio do Estado, Eric J. HOBSBAWM[129] assegura que tal fato estaria ligado à transnacionalização da economia. Isso significa que as organizações, cujo campo de atuação não se limita pelas fronteiras de um território, começaram a ganhar espaço, como as empresas transnacionais e o mercado de moeda internacional.


No auge do livre mercado, as funções antes exercidas por órgãos públicos do Estado, foram entregues ao próprio mercado. Ademais, a entidade estatal também perde rapidamente poder e função para várias entidades supranacionais e empresas privadas, assim como, perde seu monopólio de poder efetivo e seus privilégios históricos dentro de suas fronteiras.


Apesar das circunstâncias, Eric J. HOBSBAWM[130]  acredita que o Estado não está se enfraquecendo, nem se desintegrando, mas sim perdendo, em certa medida, o seu monopólio sobre os meios de coerção. Para ele[131], as políticas neoliberais implantadas foram medidas que reforçaram o processo de crise pelo qual o Estado vem passando.


Octavio IANNI[132], embora, também reconheça a limitação da soberania do Estado e o abalo na sua base, não aceita o término da estrutura estatal, pois tal estrutura criada pelo capitalismo, certamente, será recriada por ele, diante das novas necessidades.


Segundo esse autor[133], o capitalismo continua tendo bases nacionais, entretanto, elas não serão mais determinantes devido à dinâmica do capital que, agora, rompe e ultrapassa fronteiras geográficas, culturais e civilizatórias.


Além do mais, algumas características do Estado foram transformadas: as mudanças em âmbito nacional passam a ser determinadas por exigências de instituições, organizações e corporações multilaterais que pairam acima dos Estados; a moeda nacional torna-se reflexa da moeda mundial; os fatores de produção passam a ser organizados e dinâmicos devido a sua reprodução em âmbito mundial; todo o aparelho estatal é levado a reorganizar-se segundo as exigências do funcionamento mundial dos mercados, dos fluxos dos fatores de produção, das alianças estratégicas entre as corporações.


Nilson Araújo de SOUZA[134] também discorre sobre a necessidade de defesa dos Estados como estratégia decisiva de resistência à ação destruidora do neoliberalismo, já que o ente estatal, por meio da racionalidade, tem a capacidade de compatibilizar o conjunto dos seus recursos disponíveis com o conjunto das necessidades sociais.


Pierre BOURDIEU[135], diante do mesmo pensamento, disserta que o neoliberalismo objetiva a extinção do Estado e o reinado absoluto do mercado e do consumidor, fazendo do bem público um bem privado.


No entanto, ele[136] prega a necessidade das lutas críticas dos intelectuais, dos sindicatos e das associações contra o enfraquecimento do Estado, defendendo as funções universais que ele cumpre e que podem ser cumpridas tão bem, se não melhor, por um Estado Supranacional capaz de controlar as forças do mercado financeiro e proibir a regressão das conquistas sociais. É preciso, portanto, tentar criar a base organizacional de um verdadeiro internacionalismo crítico, que se oponha ao neoliberalismo.


10- CONCLUSÃO


Em relação à origem do Estado existem algumas posições fundamentais que justificam o seu aparecimento e os motivos que determinaram a sua formatação. As diversas teorias pretendem entender o fenômeno estatal, partindo do pressuposto que o Estado não é um elemento isolado, mas que influíram sobre a sua criação aspectos sociais, econômicos e até mesmo políticos.


Com o transcorrer do tempo, a evolução total dos entes estatais, possibilitou a identificação de vários tipos de Estado. Mas foi no Estado Moderno, que o povo, o território, a soberania e a finalidade se concretizaram como sendo as características do ente estatal. Diante das referidas características, o Estado de Direito foi implantado, vez que essa instituição passa a se apresentar como uma força que se põe a si própria, por suas próprias virtudes, em busca da disciplina jurídica.


O Estado, então, passa a ser uma força limitada e regulada pelo direito, ou seja, o Estado Moderno de Direito se estrutura em uma ordem jurídica soberana que tem por fim o bem comum de um povo. Devido a essa estrutura estatal, incrementou-se a participação política e, paralelamente, ocorreu um alargamento na conquista e na defesa dos direitos dos cidadãos (direitos civis, políticos e sociais) que se manifestaram no seio da esfera pública e que propiciaram a vinculação da sociedade a uma territorialidade, limitadora da ação jurídica e política do Estado.


O Estado Absoluto é a primeira configuração do Estado Moderno porque é, a partir dessa nova estrutura estatal que se passou a garantir os serviços e os sistemas essenciais ao desenvolvimento das relações sociais, tendo em vista a complexidade da sociedade. Todavia, o monarca exercia o poder enquanto órgão estatal, ou seja, ele seguia as regras e as instruções emanadas da figura do Estado, mas ele era o órgão estatal, o que comprometia os elementos fundamentais do Estado de Direito.


O Estado Liberal substituiu o Estado Absolutista, fundamentado na separação: entre a política e a economia, o ente estatal devia se limitar a garantir a segurança e a propriedade dos cidadãos, deixando a vida econômica se auto-regular pelo mercado; entre a instituição estatal e a moral, a moralidade não podia ser assumida pelo Estado, mas sim pela consciência autônoma do indivíduo; entre o ente estatal e a sociedade civil, o Estado é, unicamente, o garantidor da paz social, permitindo à sociedade o seu desenvolvimento, de acordo com as suas próprias regras.


Devido às concepções liberais desse Estado, no século XIX, foram evidenciadas sérias desigualdades entre os cidadãos, instigando o Estado Alemão a desenvolver políticas para a redução da desigualdade social. Em face das circunstâncias, de modo geral, a estrutura política alemã buscava uma forma de legitimação do poder que corresponderia às exigências da construção de um Estado Social fortemente marcado por uma lógica de solidariedade social através do ente estatal.


Após a Primeira Guerra Mundial, aprovou-se, na Alemanha, a Constituição de Weimar (1919) a qual deu grande ênfase à questão operária, além de ser a responsável pelo início da segunda fase do Estado de Bem-Estar Social Alemão.


De fato, o Estado de Bem-Estar Social (Welfare State) só foi implantado nos demais Estados Europeus e nos próprios Estados Unidos, no pós-guerra. Nos Estados Unidos, no auge da crise provocada pela quebra da Bolsa de Valores de Nova York, o presidente americano Roosevelt, enfrentando a resistência dos empresários e dos tradicionalistas, lançou seu programa de governo New Deal, que era uma política intervencionista.


O Estado de Bem-Estar Social é marcado pela intensa interferência da instituição estatal na sociedade, no mercado, na economia, por meio de um planejamento institucional, que busca atender as necessidades da sociedade, administrando, dirigindo e tutelando a todos.


Posteriormente à Segunda Guerra Mundial, com a aproximação dos Estados e devido ao temor, sob a estrutura dos Anos Dourados do Estado de Bem-Estar Social, multiplicaram-se as organizações internacionais, que pela primeira vez, foram dotadas de um sistema de sanção incipiente, com poder regulamentar e personalidade jurídica de direito internacional.


Na realidade, a proliferação de organismos internacionais se deu pelo fato de não existir nenhum órgão superior de poder a que todos os entes estatais pudessem se submeter. Por causa disso, os Estados se integraram em uma ordem jurídica, formando as organizações internacionais as quais possuem um órgão de poder, resultando em uma modificação dos termos de relacionamento entre as instituições estatais. Ou seja, após a Segunda Guerra Mundial, devido à intensificação das relações entre os Estados, não era mais possível se satisfazer ao enorme volume de tarefas de ordenamento e harmonização supranacionais, sendo indispensável à formulação de instituições que defendessem os interesses comuns, coordenassem os interesses divergentes e harmonizassem os interesses antagônicos cuja envergadura ultrapassava os Estados singulares.


A necessidade da manutenção da paz na comunidade internacional também foi um fator determinante para o surgimento das entidades internacionais, pois algumas delas evitam os possíveis litígios beliculosos entre dois ou mais Estados, sugerindo métodos de solução pacífica, como as medidas diplomáticas, coercitivas e jurídicas.


As características principais das organizações internacionais são: a multilateralidade, a permanência e a institucionalização. Além disso, como para a consecução das finalidades fundamentais de uma organização internacional exige-se a utilização de meios imprescindíveis, é necessário que essa entidade seja dotada de personalidade jurídica. Por causa dessa personalidade, as organizações internacionais possuem direitos e deveres que devem depender dos seus objetivos e funções, enunciados ou implícitos em seu ato constitutivo e desenvolvidos na prática.


O tratado institutivo das entidades internacionais atribui-lhes as seguintes competências: normativa, operacional, impositiva e de controle. Contudo, caso o organismo pratique conduta ilícita deverá arcar com a sua responsabilidade perante a outra pessoa jurídica de direito internacional público que tenha sofrido o dano, reparando-a adequadamente.


Certamente, os organismos internacionais possuem vários poderes que ao serem exercidos, inclusive, criam por meio de deliberações normas internacionais que às vezes terão valor obrigatório e às vezes não o terão.


Em suma, conforme os motivos que fundamentam o surgimento das organizações internacionais, constata-se que elas se originaram com poder político, face à complexidade das relações entre os Estados e não adquiriram tal poder ao longo do século XX.


Para averiguar essa afirmação, foi essencial a análise de algumas entidades internacionais como o FMI, o Banco Mundial, o BID, a ONU, a OCDE. Percebe-se que esses organismos internacionais exercem, desde a sua origem e de várias maneiras, os seus poderes, influenciando os entes estatais. Em contrapartida, verifica-se que eles não são controlados, nem totalmente manipulados pelos Estados mais fortes, mas são regidos pelos seus próprios interesses, por isso, muitas vezes, deixam-se influenciar pelos Estados mais fortes.


Já a Organização Comunitária, como a União Européia, é formada de organizações supranacionais. O que a diferencia é o fato dela ter a faculdade de adotar disposições diretamente vinculativas a nível interno dos Estados membros, vez que esses concordaram em se submeter à referida organização.


Os Anos Dourados do Estado de Bem-Estar Social perduraram, aproximadamente, até os anos setenta, quando uma série de mudanças e acontecimentos sociais, políticos e econômicos contribuíram para o seu declínio. A estrutura estatal encontrava-se endividada, diante dos gastos públicos para manter todos os benefícios concedidos pela instituição estatal aos seus cidadãos. Assim, a organização política, que deveria ser um aparelho regulado, seguro e rápido para cumprir com eficiência um objetivo certo limitado, transformou-se em uma engrenagem desconjuntada.


A solução da crise que marcou o fim dos Anos Dourados ocorreu quando os governos e as cúpulas empresariais começaram a entender que a crise só seria eliminada de uma maneira favorável aos interesses capitalistas se, em lugar do pleno emprego, fosse restabelecido um ambiente de “sadia competição” no mercado de trabalho e se fosse instaurado o programa neoliberal que prometia ao mesmo tempo estabilizar os preços e recuperar as taxas de lucro.


Logo, o neoliberalismo foi instaurado e as suas políticas, postas em prática desde então, reduziram o Estado de Bem-Estar Social a pouco mais que Estado de Assistência, ou seja, perdeu-se a escala móvel de salários e a segurança no emprego, destruiu-se a progressividade do sistema fiscal, desproveram-se de eficácia os direitos sociais, descarregou-se de capital o custo da assistência pública aos usuários, privatizaram-se as empresas estatais, dentre outras medidas que foram implantadas por essas novas políticas. O programa neoliberal tende assim, a favorecer, globalmente, a ruptura entre a economia e as realidades sociais.


Ademais, iniciou-se um novo panorama de globalização o qual passa a se caracterizar pelo conjunto de relações sociais nas quais se interagem de forma global, as empresas transnacionais, as práticas capitalistas, culturais e sociais.


Isso significa que os Estados abandonaram gradativamente as barreiras tarifárias que protegiam a sua produção da concorrência estrangeira e se abriram ao fluxo internacional de bens, de serviços e de capitais.  A principal causa da abertura das fronteiras dos Estados foi o acontecimento da recente revolução nas tecnologias de informação. Sendo assim, verifica-se uma crescente homogeneização cultural, uma evolução e uma popularização das tecnologias de informação, tais como o computador, o telefone, a televisão, que são essenciais para a agilização do comércio, para o fluxo de investimentos e para a atuação das transnacionais, permitindo uma integração de todos os pontos do planeta, mesmo que distantes.


As empresas transnacionais se tornam protagonistas privilegiadas dentro da economia mundial, conquistando uma autonomia em relação aos Estados, a ponto de limitar a sua política, além de instaurarem uma nova forma de produção do trabalho que se dissemina em vários Estados, sobretudo naqueles que lhe propiciam condições atrativas.


Na globalização das economias, os Estados perdem a capacidade de ação e de regulação, recorrendo, cada vez mais, a arranjos interestatais, intensificando a sua participação em organizações internacionais que partilham a condução da economia mundial e interagindo com novos atores estratégicos, globais ou supranacionais.


Essa nova concepção de globalização não se restringe ao aspecto econômico, mas passa a influenciar a dimensão social, política, ambiental e cultural.


Sob o ponto de vista político, é detectada a crise global pela queda dos preços dos artigos primários, pela crise da dívida externa dos países do Terceiro Mundo e do seu empobrecimento. Para solucionar o problema das dívidas, os Estados têm adotado programas de ajuste estrutural definidos pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Mundial, tendo como resultado a redução do poder aquisitivo da população e o direcionamento da produção para o mercado externo, gerando o empobrecimento de muitas populações, causando ainda, a sua desestabilização monetária e a sua deterioração econômica.


Na dimensão social da globalização, constata-se que a economia global levou o Terceiro Mundo à fome a ao empobrecimento, ocasionando a exclusão social. O empobrecimento não está interligado à escassez de recursos econômicos, mas sim ao desenvolvimento tecnológico que gerou a ampliação da produção, reduziu os postos de trabalho, aumentando o desemprego e a baixa remuneração.


A dimensão ambiental da globalização se manifesta no impacto negativo que a industrialização, decorrente da produção industrial e agrícola, do desenvolvimento das biotecnologias e da urbanização acelerada, causa ao meio ambiente, colocando em risco os ecossistemas. Aliás, a destruição do meio ambiente, seja pela derrubada de florestas ou pelo uso inadequado do solo, tornou vastas extensões de terras inapropriadas para o uso.


Na dimensão cultural da globalização, evidencia-se a mundialização da cultura, ou seja, a disseminação de produtos culturais americanos e europeus em escala global, gerando a padronização de certa cultura tanto em âmbito mundial quanto em âmbito local.


O que se percebe é uma crise global e mundial que abarca todo o planeta, sendo a primeira vez que isso acontece na história contemporânea, já que, na atualidade, ainda não há instrumentos de intervenção, nem definição de políticas que possam reverter essa situação, em âmbito mundial, em curto prazo.


É indiscutível que o neoliberalismo e a globalização são os grandes responsáveis pela intensa disparidade entre os Estados do Norte e os do Sul. Também são os causadores do enfraquecimento dos poderes estatais e da crise do Estado, decorrente da relativização da delimitação das fronteiras nacionais e da transnacionalização da economia, já que as organizações internacionais e as empresas transnacionais ganham mais espaço e por meio de seus poderes, influenciam cada vez mais os entes estatais.


As entidades estatais também perdem, rapidamente, poder e função para várias entidades supranacionais e empresas privadas, assim como, perdem seu monopólio de poder efetivo e seus privilégios históricos dentro de suas fronteiras.


Por tudo isso, em caráter urgente, é preciso combater o mito da globalização e do neoliberalismo, que tem por função a restauração do capitalismo radical, e lutar contra o enfraquecimento do Estado, pois existem funções que só podem ser bem cumpridas pela instituição estatal ou pela implantação de um Estado Supranacional capaz de controlar as forças do mercado financeiro e proibir a regressão das conquistas sociais.


 


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Notas:

[1] JELLINEK, Georg. Teoría General del Estado. Buenos Aires: Albatroz, 1954. Páginas 22-30.

[2] Idem.

[3] DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de teoria geral do Estado, 21. ed. atual. São Paulo: Saraiva, 2000. Páginas 51-59.

[4] Idem.

[5] GROPPALI, Alexandre. Doutrina do Estado. São Paulo: Saraiva, 1962. Páginas 103-104.

[6] KELSEN, Hans. Teoría General del Estado. México: Nacional, 1959. Página 52.

[7] VILLENEUVE, Marcel de la Bigne. L’Activité Étatique. Paris: Sirey, 1954. Página 6.

[8] WEBER, Max. Economia e Sociedade: fundamentos da sociologia compreensiva, v. 2. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2004. Páginas 517-543.

[9] WEBER, Max., op. cit., páginas 517-543.

[10] Idem.

[11] Ibidem, páginas 142-153.

[12] WEBER, Max., op. cit., páginas 142-153.

[13] AZAMBUJA, Darcy. Teoria Geral do Estado. Porto Alegre: Globo, 1973. Páginas 145-148.

[14] BOBBIO, Noberto. Dicionário de Política. Brasília: UnB, 1997. Página 954.

[15] HELD, David. La democracia y el orden global: del Estado moderno al gobierno cosmopolita. Barcelona: Paidós, 1997. Página 60.

[16] SKINNER, Quentin. As Fundações do Pensamento Político Moderno. São Paulo: Companhia das Letras, 1996. Páginas 9-10.

[17] FARIAS, José Fernando de Castro. A Teoria do Estado no Fim do Século XIX e no Início do Século XX: os enunciados de Léon Duguit e de Maurice Hauriou. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1999. Páginas 41-70.

[18] Idem.

[19] HAYEK, Friedrich August Von. O caminho da servidão. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1990. Páginas 86-96.

[20] HAYEK, Friedrich August Von, op. cit., páginas 86-96. 

[21] Idem. 

[22] HAYEK, Friedrich August Von, op. cit., páginas 86-96. 

[23] Idem.                               

[24] MARSHALL, T. H.. Cidadania, Classe Social e Status. Rio de Janeiro: Zahar, 1967. Páginas 60-105.

[25] Idem.

[26] Idem.

[27] Idem.

[28] HESPANHA, António Manuel. Cultura Jurídica Européia: síntese de um milênio. Portugal: Tito Lyon de Castro, 2003. Páginas 85-88.

[29] NOVAIS, Jorge Reis. Contributo para uma Teoria do Estado de Direito: do Estado de Direito Liberal ao Estado Social e Democrático de Direito. Coimbra: Suplemento ao Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, 1987. Páginas 09-39.

[30] ZIPPELIUS, Reinhold, op. cit., página 367-370. ZIPPELIUS, Reinhold. Teoria Geral do Estado. München: Fundação Calouste Gulbenkian, 1994. Página 376-379.

[31] MILL, John Stuart. Da Liberdade. São Paulo: Ibrasa, 1963. Páginas 53, 87, 123, 124.

[32] HAYEK, Friedrich August Von, op. cit., páginas 38-47.

[33] BENDIX, Reinhard. Construção Nacional e Cidadania. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1996. Páginas 211-244.

[34] MORAES, Marcos Antonio de; FRANCO, Paulo Sérgio Silva. Geopolítica: apocalipse do século XX. Campinas: Átomo, 2006. Páginas 16-29.

[35] GRIECO, Francisco de Assis. A Supremacia Americana e a ALCA. São Paulo: Aduaneiras, 1998. Páginas 95-99.

[36] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros Editores Ltda., 2003. Páginas 231-237.

[37] Ibidem, páginas 536-545.

[38] MORAES, Marcos Antonio de; FRANCO, Paulo Sérgio Silva, op. cit., páginas 113-118.

[39] GRIECO, Francisco de Assis, op. cit., páginas 67-78.

[40] GRIECO, Francisco de Assis, op. cit., páginas 105-108.

[41] DUGUIT, Léon. Traité de Droit Constitucionnel. T.I. 3ª ed. Paris: Ancienne Librairie Fontemoing & Cie, 1923. Página 640.

[42] Idem.

[43] CAPELLA, Juan Ramón. Os Cidadãos Servos. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1998. Páginas 92-93.

[44] AZAMBUJA, Darcy, op. cit., páginas 166-168.

[45] CAPELLA, Juan Ramón, op. cit., páginas 92-93.

[46] ZIPPELIUS, Reinhold, op. cit., páginas 468-476.

[47] DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., páginas 263-274.

[48] ARAUJO, Luis Ivani de Amorim. Das Organizações Internacionais. Rio de Janeiro: Forense, 2002. Páginas 03-13.

[49] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2000. Páginas 21-26. 

[50] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 21-26.

[51] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 35-42.

[52] DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., páginas 263-274.

[53] MELLO, Celso D. de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Público. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. Páginas 583-609.

[54] ZIPPELIUS, Reinhold, op. cit., páginas 519-533.

[55] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 43-49.

[56] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 43-49.

[57] ZIPPELIUS, Reinhold, op. cit., páginas 519-533.

[58] MELLO, Celso D. de Albuquerque, op. cit., páginas 583-609.

[59] Idem.

[60] Idem.

[61] HESPANHA, António Manuel, op. cit., páginas 35-40.

[62] BROWNLIE, Ian. Princípios de Direito Internacional Público. Oxford: Oxford University Press, 1990. Páginas 707-733.

[63] REUTER, Paul. Droit International Public. Paris: PUF, 1973. Páginas 126-127.

[64] O Tribunal Internacional de Justiça acredita na possibilidade de aplicação da doutrina dos poderes implícitos, argumentando que os direitos e os deveres de uma organização devem depender do seu fim e funções, tal como se encontram especificados ou implícitos nos textos constitutivos e desenvolvidos na prática. Assim, nos termos do Direito Internacional, deve considerar-se que a organização possui os poderes que, embora não previstos expressamente na Carta, lhe são conferidos por interferência necessária como sendo essenciais para o desempenho dos seus deveres, logo, resultam de uma interpretação necessária extraída da Carta.

[65] REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público: curso elementar. São Paulo: Saraiva, 2002. Páginas 132-135.

[66] No dia 22 de julho de 1994, em New Hampshire, EUA, realizou-se a Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas, que originou o FMI por meio do Acordo do Fundo Monetário Internacional, o qual entrou em vigor na data de 27 de dezembro de 1945. Esse acordo sofreu alterações em 28 de julho de 1969, concretizadas por meio da Resolução nº 23-5. No dia 1º de abril de 1978 ocorreram outras modificações pela Resolução nº 31-4 e outras aconteceram em 11 de novembro de 1992 pela Resolução nº 45-3.

[67] O Banco Mundial proveio do Acordo do Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento que foi assinado em Bretton Woods, EUA, em 1944.

[68] O GATT surgiu em 1994 pelo Acordo de Marrakesh, estabelecendo a Organização Mundial do Comércio e parte dos Acordos da Rodada do Uruguai, assinados em Marrakesh.

[69] Observa-se que o autor, em 1999, era advogado na Divisão para a América Latina e o Caribe do Departamento Legal do Banco Mundial. Cf. NINIO, A. Banco Mundial e meio ambiente: perspectivas legais e institucionais. Revista de Direito da Associação dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 5, n. 10, 1999. Páginas 1-5.

[70] GRIECO, Francisco de Assis, op. cit., páginas 135-142.

[71] ZIPPELIUS, Reinhold, op. cit., páginas 519-533.

[72] NINIO, A., op. cit., páginas 1-5.

[73] SOBRE o Banco Mundial. Disponível em: www.bancomundial.org.br / index.php / content / view /6.html. Acesso em 5 set. 2007.

[74] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 212-213.

[75] CORPORATE social responsability: partners for progress. Disponível em: www. oecd.org/ document/37/0,2340,em _2649 _201185 _2429925 _ 1 _1 _ 1_ 1,00.html. Acesso em 10 set. 2007.

[76] A OCDE originou-se da Convenção para Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômicos, assinada em Paris, em 1960.

[77] MELLO, Celso D. de Albuquerque, op. cit., páginas 583-609.

[78] SILVA, Geraldo Eulálio do Nascimento e; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2002. Páginas 210-224.

[79] DALLARI, Dalmo de Abreu, op. cit., páginas 263-274.

[80] REZEK, José Francisco, op. cit., páginas 348-355.

[81] LOBO, Maria Teresa do Cárcomo. Manual de Direito Comunitário: a ordem jurídica da União Européia. Curitiba: Juruá, 2004. Páginas 90-115.

[82] LOBO, Maria Teresa do Cárcomo, op. cit., páginas 90-115.

[83] ARAUJO, Luis Ivani de Amorim, op. cit., páginas 125-129.

[84] MELLO, Celso D. de Albuquerque, op. cit., páginas 583-609.

[85] SEITENFUS, Ricardo Antônio Silva, op. cit., páginas 51-85. 

[86] O financiamento das organizações internacionais é realizado por meio de contribuições dos Estados membros, para o pagamento das despesas da entidade. A fixação da quantia com que cada Estado deve contribuir dependerá de critérios estabelecidos por cada organismo internacional, através de um órgão que recebe competência para isso ou pelo próprio tratado institutivo da organização. Mas também, as organizações podem contrair empréstimos.

[87] SINGER, Paul. Uma Utopia Militante: repensando o socialismo. Petrópolis: Vozes, 1998. Páginas 153-176.

[88] CAPELLA, Juan Ramón, op. cit., páginas 93-97.

[89] AZAMBUJA, Darcy, op. cit., páginas 131-136.

[90] SINGER, Paul, op. cit., páginas 153-176.

[91] CAPELLA, Juan Ramón, op. cit., páginas 93-97.

[92] FARIA, José Eduardo. O Direito na Economia Globalizada. São Paulo: Malheiros, 1999. Páginas 60-70.

[93] HOBSBAWM, Eric J. A Era do Capital 1848-1875. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982. Páginas 66-80.

[94] CANCLINI, Néstor García. Consumidores e Cidadãos: conflitos multiculturais da globalização. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 1997. Página 10-20.

[95] SANTOS, Boaventura de Souza. A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 2002. Páginas 25-94.

[96] MORAES, Marcos Antonio de; FRANCO, Paulo Sérgio Silva, op. cit., páginas 91-97.

[97] FARIA, José Eduardo, op. cit., páginas 60-70.

[98] LIMA, Abili Lázaro Castro de. Globalização Econômica Política e Direito: análise das mazelas causadas no plano político-jurídico. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. Páginas 143-156.

[99] BOURDIEU, Pierre. Contrafogos: táticas para enfrentar a invasão neoliberal. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998. Páginas 119-127.

[100] SOUZA, Nilson Araújo de. O Colapso do Neoliberalismo. São Paulo: Global, 1995. Páginas 45-50.

[101] SANTOS, Boaventura de Souza, op. cit., páginas 25-94.

[102] LISZT, Vieira. Cidadania e Globalização. Rio de Janeiro: Record, 1998. Páginas 84-100.

[103] CARAPINHEIRO, Graça. A Globalização do Risco Social. In: SANTOS, Boaventura de Souza (org.). A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 2002. Páginas 206-223.

[104] LISZT, Vieira, op. cit., páginas 84-100.

[105] BOURDIEU, Pierre, op. cit., páginas 135-148.

[106] HESPANHA, Pedro. Mal-Estar e Risco Social num Mundo Globalizado: novos problemas e novos desafios para a teoria social. In: SANTOS, Boaventura de Souza (org.). A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 2002. Páginas 163-167.

[107] BAGANHA, Maria Ioannis. A cada Sul o seu Norte: dinâmicas migratórias em Portugal. In: SANTOS, Boaventura de Souza (org.). A Globalização e as Ciências Sociais. São Paulo: Cortez, 2002. Páginas 136-141.

[108] ANDERSON, Perry. Um Balanço do Neoliberalismo. In: BORÓN, Atílio; GENTILI, Pablo (org.). Pós-Neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. São Paulo: Paz e Terra, 1998. Páginas 9-12.

[109] MORAES, Marcos Antonio de; FRANCO, Paulo Sérgio Silva, op. cit., páginas 91-97.

[110] HAYEK, Friedrich August Von, op. cit., páginas 40-63.

[111] Idem.

[112] Idem.

[113] Idem.

[114] Idem.

[115] HAYEK, Friedrich August Von, op. cit., páginas 40-63.

[116] FRIEDMAN, Milton. Libertad de Elegir. Buenos Aires: Planeta-Agostini, 1993. Páginas 60-69.

[117] FARIAS, José Fernando de Castro, op. cit., páginas 41-70.

[118] BOURDIEU, Pierre, op. cit., páginas 81-85.

[119] BOURDIEU, Pierre, op. cit., páginas 42-60.

[120] Idem.

[121] O programa neoliberal não pretende o crescimento econômico. A determinação do crescimento econômico pelo mercado, sem a interferência do Estado e o equilíbrio do orçamento público, que permite à autoridade monetária regular a oferta de meios de pagamento e de crédito de modo a preservar a estabilidade dos preços, conduzem a economia à estagnação. É que o livre funcionamento dos mercados tende a concentrar a renda e o faz com mais rigor à medida que os instrumentos fiscais de redistribuição (salários mínimos, impostos progressivos, subsídios ao consumo dos pobres) são revogados. A concentração da renda reduz a propensão a consumir e como os ricos consomem menos de seus rendimentos que os pobres e se uma parte maior da renda vai para os ricos, a parcela consumida de toda renda cai e a parcela poupada aumenta. Mas, para que a demanda efetiva não diminua é preciso que o investimento aumente na mesma medida que aumenta a poupança. Como a prioridade é evitar pressões inflacionárias, o investimento público é contido para não gerar déficit e o investimento privado é debilitado pela frouxidão da demanda, tendo como resultado a minimização da acumulação de capital e do crescimento da economia.

[122] SINGER, Paul, op. cit., páginas 153-176.

[123] MORAES, Marcos Antonio de; FRANCO, Paulo Sérgio Silva, op. cit., páginas 91-97.

[124] SOUZA, Nilson Araújo de, op. cit., páginas 9-21.

[125] Idem.

[126] OHMAE, Kenichi. O Fim do Estado-Nação: a ascensão das economias regionais. Rio de Janeiro: Campus, 1996. Páginas 4-10.

[127] OHMAE, Kenichi, op. cit., páginas 50-58.

[128] HESPANHA, António Manuel, op. cit., páginas 35-40.

[129] HOBSBAWM, Eric J. O Novo Século: entrevista a Antonio Polito. São Paulo: Companhia das Letras, 2000. Páginas 36-42.

[130] Idem.

[131] Idem.

[132] IANNI, Octavio. Teorias da Globalização. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1996. Páginas 33-49.

[133] Idem.

[134] SOUZA, Nilson Araújo de, op. cit., páginas 69-75.

[135] BOURDIEU, Pierre, op. cit., páginas 42-60.

[136] Idem.


Informações Sobre o Autor

Fernanda Sabah Gomes Soares

Doutora em Direito Internacional (Universidad de León, Espanha), Mestre em Direito (Universidad de León, Espanha), Especialista em Direito Comparado (Università di Urbino Carlo Bo, Itália), Especialista em Teoria Geral do Direito (Academia Brasileira de Direito Constitucional). Pesquisadora do Núcleo de Estudos em Tribunais Internacionais (NETI-USP) e do Centro de Estudos em Direito do Mar “Vicente Marotta Rangel” (CEDMAR-USP). Professora e Advogada


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