Resumo:O presente trabalho trata das controvérsias existentes na doutrina e na jurisprudência pátria envolvendo a aplicação dos institutos da prescrição e decadência nos tributos sujeitos a lançamento por homologação. Analisa, em um primeiro momento, a conceituação dos institutos de direito tributário necessários para a compreensão dos problemas expostos. Ato seguinte, através de uma análise pormenorizada, coloca em destaque as celeumas jurídicas acerca do início do prazo decadencial e prescricional nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, destacando a posição dos Tribunais Superiores e da doutrina.
Palavras-chave: direito tributário. Prescricão. Decadência. Lancamento por homologacão.
Abstract: The present work deals with the existing controversies in the doctrine and the native jurisprudence involving the application of the justinian codes of the lapsing and decay in the tributes citizens the launching for homologation. It analyzes, at a first moment, the conceptualization of the necessary justinian codes of tax law for the understanding of the displayed problems. Following act, through a detailed analysis, places in prominence celeumas legal concerning the beginning of the decadencial and prescriptional stated period in the tributes citizens the launching for homologation, detaching the position of the Superior Courts and the doctrine.
Key words: tax law. Lapsing. Decay. Launching for homologation.
Sumário: Introdução. 1. Conceitos. 1.1. Conceito de lançamento por homologação. 1.2. Conceito de Prescrição e Decadência no Direito Tributário. 2. A decadência e a prescrição nos lançamentos por homologação
Introdução
O tempo tem grande relevância nas relações jurídicas, através das quais operam-se o nascimento e extinção de direitos.
Os princípios jurídicos da segurança e da estabilidade devem, obrigatoriamente, nortear as relações entre as partes envolvidas, pois as relações jurídicas não podem perpetuar-se, sendo imprescindível a estabilização no tempo, através de institutos jurídicos que operam efeitos no decurso do tempo, associados à inércia do titular do direito.
Por isso, o estudo da decadência e prescrição pelos aplicadores do direito é essencial, tratando-se de uma das questões mais tormentosas do direito tributário.
No ramo do direito tributário, tais institutos encontram-se consagrados na Lei Ordinária com status de Lei Complementar 5.172/66 (Código Tributário Nacional), nos artigos 150 e seus parágrafos, 173 e 174.
Neste trabalho, após a conceituação de alguns institutos, tratar-se-á especificamente da decadência e da prescrição nos lançamentos sujeitos a homologação pela Administração, buscando-se detalhar a aplicação dos prazos frente à atuação do Fisco, focando a análise dos repertórios de jurisprudência do STJ e STF, bem como da doutrina. Trataremos, ainda, da edição da Súmula 436 do STJ, que trouxe mais divergências à questão.
1.Conceitos
Inicialmente, traçaremos os conceitos de lançamento por homologação, decadência e prescrição. Vejamos:
1.1. Conceito de lançamento por homologação
Referida espécie de lançamento também é conhecido como “auto-lançamento”, através do qual o contribuinte presta informações ao fisco, através de declarações como DCTF (Declaração de Débitos e Créditos Tributários Fiscais), DIPJ (Declaração de Informações econômicas fiscais da Pessoa Jurídica), DIRPF (Declaração do Imposto de Renda Pessoa Física), entre outras. Uma vez prestadas as informações, o contribuinte realiza o pagamento do montante informado na declaração, em seu respectivo vencimento, conforme legislação própria de cada tributo.
Hodiernamente, a maioria dos tributos enquadram-se nesta categoria de lançamento, haja vista a facilidade e conveniência gerada ao fisco, que apenas aguarda as informações e pagamento. Cite-se como exemplo de tributos sujeitos a tal espécie de lançamento o ICMS, o IPI, o Imposto de Renda e o PIS.
No que se refere a tal modalidade de lançamento, sempre ocorreu, seja na doutrina, seja na jurisprudência, infindável celeuma concernente à contagem e aplicabilidade dos institutos da decadência e prescrição, que veremos mais adiante.
Este tipo de lançamento tem guarida na disposição legal do artigo 150 do CTN. Vejamos:
“Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação ao lançamento.
§ 2º Não influem sobre a obrigação tributária quaisquer atos anteriores à homologação, praticados pelo sujeito passivo ou por terceiro, visando à extinção total ou parcial do crédito.
§ 3º Os atos a que se refere o parágrafo anterior serão, porém, considerados na apuração do saldo porventura devido e, sendo o caso, na imposição de penalidade, ou sua graduação.
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação”.
Assim, no lançamento em questão, ocorre a apuração e o prévio recolhimento do tributo pelo devedor, sem qualquer intervenção prévia da autoridade administrativa. Uma vez efetivada a apuração do montante devido, pode o fisco homologar o que fora declarado, ficando o declarante (sujeito passivo) no aguardo desta ulterior homologação. Esta poderá ser expressa, mediante uma fiscalização através da qual o fisco certificará a legalidade e a exatidão das apurações e recolhimentos realizados. No entanto, em não havendo esta fiscalização pessoal, há que se observar também o lapso temporal para sua realização (homologação tácita), que será de cinco anos dispostos no §4º do artigo 150 do CTN, com ressalvas de entendimentos contrários, pela aplicabilidade do inciso I do artigo 173 do mesmo código.
1.2. Conceitos de prescrição e decadência no Direito Tributário
A prescrição e a decadência, no direito tributário, estão reguladas pelo Código Tributário Nacional, sendo que a noção de lançamento está intrinsecamente ligada com os institutos da prescrição e decadência.
Influenciado pelas construções teóricas formuladas sobre a prescrição e decadência, o CTN fixou dois prazos, sendo o primeiro o lapso de tempo dentro do qual deve ser constituído o crédito tributário, mediante a consecução do lançamento, e o segundo, o período no qual o sujeito ativo, se não satisfeita a obrigação tributária, deve ajuizar a ação de cobrança.[1]O código teve por bem chamar de “decadência” o primeiro prazo, designando o segundo como “prescrição”. Assim sendo, esgotado o prazo dentro do qual o sujeito ativo deve lançar, diz-se que decaiu seu direito, que fora extinto pela decadência. Se em tempo oportuno o lançamento é feito, mas o sujeito ativo, à vista do inadimplemento do devedor, deixa transcorrer o lapso de tempo que tem para ajuizar a ação de cobrança, sem promovê-la, dá-se a prescrição da ação.
Doutrinariamente, a decadência é conceituada como o perecimento do direito pelo não exercício dentro de determinado prazo. Além disso, não comporta suspensão nem interrupção, é irrenunciável e deve ser pronunciado de ofício. Já a prescrição é a perda do direito à ação pelo decurso de tempo. É um prazo para o exercício do direito em juízo, comportando suspensão e interrupção.
Tendo em vista que a doutrina, ao tratar como ato válido para a constituição do crédito tributário apenas a autuação fiscal, temos como entendimento consolidado através da jurisprudência que, somente após inscrito o crédito tributário em dívida ativa e emitida a CDA (certidão de dívida ativa), tem-se aí um título executivo, dotado de certeza, liquidez e exigibilidade, e neste momento não mais se fala em decadência, passando a se computar a prescrição.
Assim, constituído o crédito tributário, entramos na análise de eventual prescrição. Onde termina a primeira, começa imediatamente a segunda.
2. A decadência e a prescrição nos lançamentos por homologação
Nos tributos que se sujeitam a lançamento por homologação, nascem e se desenvolvem as grandes divergências no que tange à aplicação das regras concernentes à decadência e prescrição.
A princípio, nos deparamos com a discussão sobre o termo inicial para a contagem do lapso decadencial.
O Código Tributário Nacional contem dois mandamentos jurídicos, expressos pelo §4º do artigo 150 e artigo 173, incisos I e II:
“Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º …
§ 4º Se a lei não fixar prazo a homologação, será ele de cinco anos, a contar da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.”
“Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se após cinco anos contados.
I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.
Parágrafo único. O direito a que se refere este artigo extingue-se definitivamente com o decurso do prazo nele previsto, contado da data em que tenha sido iniciada a constituição do crédito tributário pela notificação, ao sujeito passivo, de qualquer medida preparatória indispensável ao lançamento.”
Primeiramente, o inciso II do artigo 173 não traz grandes problemas, sendo de simples e fácil aplicação. Nos casos em que, feita a autuação e “constituído o crédito tributário”, o autuado venha a opor defesa administrativa ou buscar amparo jurisdicional, obtendo a anulação do lançamento anteriormente efetuado, por vício formal, terá o fisco, a partir da data desta decisão ou trânsito em julgado, o prazo de cinco anos, “retroativos”, para efetuar um novo lançamento.
No entanto a grande discussão está presente entre o §4º do artigo 150 e o inciso I do artigo 173.
O primeiro dispõe que o prazo para a homologação do crédito tributário será de cinco anos, a contar do fato gerador, e se decorrido este prazo sem manifestação expressa da Fazenda, considera-se homologado o crédito tributário e definitivamente extinto. Já o segundo, dispõe que o prazo para Fazenda Pública constituir o crédito tributário extingue-se em cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que poderia ter sido efetuado, ou seja, a partir de primeiro de janeiro do ano subsequente à ocorrência do fato gerador do tributo.
A primeira vista, os dispositivos citados poderiam parecer tratar de coisas dispares, pois um deles falar em contagem de prazos para homologação e outro em prazo para constituição do crédito tributário. No entanto, os dois termos ocupam o mesmo espaço temporal. Veja-se, ainda, que no §4º do artigo 150, se decorridos cinco anos, ocorrerá a homologação tácita e com ela a extinção definitiva do crédito, o mesmo ocorrendo no artigo 173, onde decorridos cinco anos extingue-se o direito da Fazenda Pública constituir o crédito. Uma vez, prestadas informações pelo contribuinte através de declarações e efetuado o pagamento, fica o contribuinte aguardando a homologação pelo fisco, haja vista que, nesse mesmo período, se o fisco entender que as informações prestadas não condizem com a realidade, ao invés de homologá-la, acabará por promover um lançamento ex officio, ou seja, o autuará, assim constituindo o crédito tributário a que entende devido.
Os Tribunais do país sempre aplicaram divergentes entendimentos, na grande maioria das vezes, com o intuito de favorecer (de forma correta) o jus imperi do poder público, aplicando-se o disposto no inciso I do artigo 173, ao invés do §4º do artigo 150.
Note-se, que se estivermos falando de um tributo que teve seu fato gerador no mês de dezembro, pouco importa, iniciar sua contagem dali ou do primeiro dia de janeiro do ano seguinte, somente se diferenciando por alguns dias.
No entanto, se pensarmos em um tributo cujo fato gerador tenha ocorrido em janeiro de 2001, e aplicarmos ao mesmo o disposto no §4º do artigo 150, o direito constitutivo decairia em fevereiro de 2006, ao passo que, se considerado o inciso I do artigo 173, somente decairia em 01 jan. 2007. Dessa forma, temos que o Estado passaria a ter não apenas cinco anos para homologar o lançamento, mas cinco anos e onze meses. Daí toda a discussão sobre o tema.
Para melhor demonstrar as divergências de entendimentos jurisprudenciais veja-se esta decisão do Superior Tribunal de Justiça, proferida no Resp 784218:
“TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. DECADÊNCIA. TERMO INICIAL.
1. No lançamento por homologação, o contribuinte, ou o responsável tributário, deve realizar o pagamento antecipado do tributo, antes de qualquer procedimento administrativo, ficando a extinção do crédito condicionada à futura homologação expressa ou tácita pela autoridade fiscal competente. Havendo pagamento antecipado, o fisco dispõe do prazo decadencial de cinco anos, a contar do fato gerador, para homologar o que foi pago ou lançar a diferença acaso existente (art. 150, § 4º do CTN).
2. Se não houve pagamento antecipado pelo contribuinte, não há o que homologar nem se pode falar em lançamento por homologação. Surge a figura do lançamento direto substitutivo, previsto no art. 149, V do CTN, cujo prazo decadencial rege-se pela regra geral do art. 173, I do CTN: cinco anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o pagamento antecipado deveria ter sido realizado.
3. Em síntese, o prazo decadencial para a Fazenda Pública constituir o crédito tributário será: a) de cinco anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ser efetuado, se o tributo sujeitar-se a lançamento direto ou por declaração (regra geral do art. 173, I do CTN); b) de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador no caso de lançamento por homologação em que há pagamento antecipado pelo contribuinte (aplicação do art. 150, § 4º do CTN) e c) de cinco anos a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o pagamento antecipado deveria ter sido realizado nos casos de tributo sujeito à homologação sem que nenhum pagamento tenha sido realizado pelo sujeito passivo, oportunidade em que surgirá a figura do lançamento direto substitutivo do lançamento por homologação.
4. Na hipótese, houve pagamento antecipado e pretende o fisco cobrar diferenças relacionadas à apuração a menor realizada pelo contribuinte. Aplicando-se a regra do art. 150, § 4º, do CTN, deve ser reconhecida a decadência do direito de lançar tributos cujo fato gerador tenha ocorrido em momento anterior aos cinco anos que antecedem a notificação do auto de infração ou da nota de lançamento.
5. Recurso especial provido.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator." Os Srs. Ministros Humberto Martins, Eliana Calmon e João Otávio de Noronha votaram com o Sr. Ministro Relator. [2] (grifei)
Ainda, segundo entendimento de Luciano Amaro:
“Uma observação preliminar que deve ser feita consiste em que, quando não se efetua o pagamento “antecipado” exigido pela lei, não há possibilidade de lançamento por homologação, pois simplesmente não há o que homologar; a homologação não pode operar no vazio. Tendo em vista que o art. 150 não regulou a hipótese, e o art. 149 diz apenas que cabe lançamento de ofício, enquanto, obviamente, não extinto o direito do fisco, o prazo a ser aplicado para a hipótese deve seguir a regra geral do art. 173, ou seja, cinco anos contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que (à vista da omissão do sujeito passivo) o lançamento de ofício poderia ser feito”[3]
Como se pode observar, era entendimento do STJ que nos casos de tributos de lançamento por homologação, o termo inicial para contagem da decadência sofre alterações: Se o contribuinte prestou informações ao fisco e pagou antecipadamente o tributo, no entanto venha posteriormente a autoridade administrativa entender que ocorreram diferenças, aplicar-se-á o termo inicial disposto no artigo 150, §4º, ou seja, a data do fato gerador. Se prestadas, entretanto, as informações e não pago o tributo, vem entendendo a jurisprudência majoritária, pela aplicabilidade do inciso I do artigo 173 (primeiro dia do exercício seguinte), ao invés do §4º do artigo 150 do CTN. Entretanto, quando prestadas as informações ao fisco e pago parcialmente o tributo, fica ao bel prazer do entendimento do julgador, que ora entende que o termo inicial é a ocorrência do fato gerador e ora entende ser, o primeiro dia do exercício seguinte, ou seja, primeiro de janeiro do ano seguinte ao da ocorrência do fato gerador.
De se ressaltar que tal celeuma jurisprudencial perdurou até o julgamento do RECURSO ESPECIAL Nº 973.733 – SC, que analisaremos com mais vagar linhas adiante. Entretanto, desde já adiantamos que tal RECURSO ESPECIAL colocou uma pá de cal no que se refere ao termo inicial da decadência.
O que podemos afirmar, é que há quase um consenso acerca do acerto do STJ na sua interpretação, quando ocorre o pagamento integral do tributo. A grande discussão surge quando o devedor declara o tributo e nada paga. Para o caso, há três interpretações divergentes:
a) Para a primeira, aplicar-se-ia exclusivamente o art. 173, I do CTN, pois sem pagamento, não há nada para homologar, pois faltaria objeto ao lançamento por homologação. Aplica-se no caso a súmula 219 do TFR;
b) Para outra corrente de pensamento, deveria ocorrer a cumulação na aplicação dos arts. 150, §4º e 173, I do CTN. O dies a quo do prazo do art. 173 é o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do art. 150, §4º, do CTN.[4]
c) Para esta, defendida por Hugo de Brito Machado Segundo, citado por Eduardo Sabbag[5], aplica-se exclusivamente o art. 150, §4º do CTN. O fundamento seria o de que a atividade de homologação está ligada à apuração desenvolvida pelo contribuinte, e não ao pagamento propriamente dito. Homologa-se a atividade que motivou o pagamento, e não o pagamento. Tal raciocínio teria fortes implicações no cálculo da decadência.
A primeira corrente provém do entendimento mais recente do STJ, que prevê apenas a aplicação do art. 173, I, do CTN quando não ocorre o pagamento. Tal entendimento veio se desenvolvendo em referido tribunal, até o julgamento do REsp 973.733, que solidificou o pensamento. Vejamos, como exemplo, um julgamento publicado em 2008, ano em que ainda não havia consenso sobre o tema:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRAZO DECADENCIAL DE CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO. QÜINQÜENAL.
1. A ausência de debate, na instância recorrida, sobre os dispositivos legais cuja violação se alega no recurso especial atrai, por analogia, a incidência da Súmula 282 do STF.
2. Tratando-se de tributo sujeito a lançamento por homologação, mas ausente a antecipação do pagamento, ainda que parcial, há de se aplicar a norma prevista no art. 173, I, do CTN, contando-se o prazo qüinqüenal a partir do primeiro dia do exercício seguinte ao daquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, não havendo que se falar em prazo decadencial de dez anos a contar do fato gerador. Precedentes.
3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido”.[6]
Neste caso, em não havendo qualquer pagamento, o fisco teria cinco anos, contados do primeiro do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado para verificar a exatidão do lançamento.
À época, tal entendimento, em que pese prevalente, ainda encontrava certa resistência no próprio STJ e nos Tribunais de Justiça dos Estados e TRFs. No entanto, em 18.05.2009, o recurso especial 973.733-SC foi submetido ao regime previsto no artigo 543-C, do CPC (recurso representativo de controvérsia), ficando sob a égide de julgamento da Primeira Seção.
Vejamos o que foi decidido:
“PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ARTIGO 543-C, DO CPC. TRIBUTÁRIO. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. CONTRIBUIÇÃOPREVIDENCIÁRIA. INEXISTÊNCIA DE PAGAMENTO ANTECIPADO. DECADÊNCIA DO DIREITO DE O FISCO CONSTITUIR O CRÉDITO TRIBUTÁRIO. TERMO INICIAL.ARTIGO 173, I, DO CTN. APLICAÇÃO CUMULATIVA DOS PRAZOS PREVISTOS NOS ARTIGOS 150, § 4º, e 173, do CTN. IMPOSSIBILIDADE.
1. O prazo decadencial quinquenal para o Fisco constituir o crédito tributário (lançamento de ofício) conta-se do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, nos casos em que a lei não prevê o pagamento antecipado da exação ou quando, a despeito da previsão legal, o mesmo inocorre, sem a constatação de dolo, fraude ou simulação do contribuinte, inexistindo declaração prévia do débito (Precedentes da Primeira Seção: REsp 766.050/PR, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 28.11.2007, DJ 25.02.2008; AgRg nos EREsp 216.758/SP, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, julgado em 22.03.2006, DJ 10.04.2006; e EREsp 276.142/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, julgado em 13.12.2004, DJ 28.02.2005).
2. É que a decadência ou caducidade, no âmbito do Direito Tributário, importa no perecimento do direito potestativo de o Fisco constituir o crédito tributário pelo lançamento, e, consoante doutrina abalizada, encontra-se regulada por cinco regras jurídicas gerais e abstratas, entre as quais figura a regra da decadência do direito de lançar nos casos de tributos sujeitos ao lançamento de ofício, ou nos casos dos tributos sujeitos ao lançamento por homologação em que o contribuinte não efetua o pagamento antecipado (Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 163/210).
3. O dies a quo do prazo qüinqüenal da aludida regra decadencial rege-se pelo disposto no artigo 173, I, do CTN, sendo certo que o "primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado" corresponde, iniludivelmente, ao primeiro dia do exercício seguinte à ocorrência do fato imponível, ainda que se trate de tributos sujeitos a lançamento por homologação, revelando-se inadmissível a aplicação cumulativa/concorrente dos prazos previstos nos artigos 150, § 4º, e 173, do Codex Tributário, ante a configuração de desarrazoado prazo decadencial decenal (Alberto Xavier, "Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro", 3ª ed., Ed. Forense, Rio de Janeiro, 2005, págs. 91/104; Luciano Amaro, "Direito Tributário Brasileiro", 10ª ed., Ed. Saraiva, 2004, págs. 396/400; e Eurico Marcos Diniz de Santi, "Decadência e Prescrição no Direito Tributário", 3ª ed., Max Limonad, São Paulo, 2004, págs. 183/199).
5. In casu, consoante assente na origem: (i) cuida-se de tributo sujeito a lançamento por homologação; (ii) a obrigação ex lege de pagamento antecipado das contribuições previdenciárias não restou adimplida pelo contribuinte, no que concerne aos fatos imponíveis ocorridos no período de janeiro de 1991 a dezembro de 1994; e (iii) a constituição dos créditos tributários respectivos deu-se em 26.03.2001.
6. Destarte, revelam-se caducos os créditos tributários executados, tendo em vista o decurso do prazo decadencial qüinqüenal para que o Fisco efetuasse o lançamento de ofício substitutivo.
7. Recurso especial desprovido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008.[7]”
Logo, pela regra do § 7º do art. 543-C do CPC:
“Art. 543-C. Quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. (...)
§ 7º Publicado o acórdão do Superior Tribunal de Justiça, os recursos especiais sobrestados na origem:
I – terão seguimento denegado na hipótese de o acórdão recorrido coincidir com a orientação do Superior Tribunal de Justiça; ou
II – serão novamente examinados pelo tribunal de origem na hipótese de o acórdão recorrido divergir da orientação do Superior Tribunal de Justiça.
Dessa forma, todos os recursos envolvendo a mesma questão poderão ter seguimento denegado ou serão monocraticamente providos, de acordo com o decidido no REsp citado.
Entretanto, oportuno ressaltar que, em que pese a solidificação junto ao STJ, para parte da doutrina, tal entendimento fora afetado pela edição da Súmula 436 do STJ, trazendo insegurança ao ordenamento, por haver orientações antagônicas dentro do próprio STJ.
Prescreve a Súmula 436 do STJ:
“A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco.”
Explicando o teor de referida súmula, ensina Kiyoshi Arada:
“Dessa forma, com o recebimento da GIA/DCTF ou outro documento equivalente, o fisco homologa tacitamente a atividade exercida pelo contribuinte, constituindo definitivamente o crédito tributário, sem necessidade de aguardar o decurso do prazo de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador, como dispõe o § 4°, do art. 150, do CTN.
Lembre-se que a constituição do crédito tributário é ato privativo do agente administrativo (art. 142 e art. 150, do CTN). Em outras palavras, com a entrega da GIA/DCTF ao fisco dá-se, ipso fato, a constituição definitiva do crédito tributário por homologação tácita.
A primeira consequência do enunciado dessa Súmula é que a homologação tácita pelo fisco não extingue o crédito tributário, senão após o seu pagamento. Assim, surgem momentos distintos para a constituição do crédito tributário e para a sua extinção, inovando a doutrina vigorante e afastando-se dos textos do CTN.
O que o CTN permite é a homologação expressa do fisco no ato do recebimento da declaração do contribuinte ou poucos dias após esse recebimento. A homologação tácita pressupõe decurso do prazo de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador. Ao teor da Súmula em questão fica o contribuinte impossibilitado de promover a denúncia espontânea da infração (art. 138 do CTN), pois não será mais possível requerer a re-ratificação das informações prestadas seguida, se for o caso, do pagamento da eventual diferença, acrescida de juros e correção monetária.
Considerando que a Súmula 436 do STF foi editada e publicada em 13-5-2010 segue-se que o decidido em caráter repetitivo no Resp. n° 573.733 em 2009 não mais prevalece.
Entretanto, como vimos, o Pleno do CARF está aderindo, por maioria de votos, à tese esposada naquele Resp. n° 973.733, que se acha suplantada pela Súmula 436.
A confusão é generalizada, gerando insegurança jurídica.
Embora o CTN fixe o prazo decadencial de 5 anos aplicável a todos os tributos na forma da Súmula vinculante nº 8 do STF, já tivemos o prazo de 5 anos, de 10 anos, de 6 anos e agora prazo zero. É muita oscilação considerando que o textos do CTN que regem a matéria em nada mudaram desde o seu advento.
Tanto a tese dos 5 + 5, como a tese da aplicação do prazo do art. 173, I, do CTN, assim como a tese da constituição definitiva do crédito tributário pela entrega da declaração do contribuinte reconhecendo o débito é fruto do ativismo judicial que está se acentuando cada vez mais, nem sempre para suprir a omissão do legislador, mas para “legislar” em sentido diverso.
Só a vontade imparcial da lei estável, certa ou errada, pode propiciar segurança jurídica aos contribuintes.”[8]
Vemos que a edição de referida Súmula trouxe mais uma celeuma, pois pacificou entendimento de que o crédito tributário passa a ser constituído no momento da entrega da declaração.
A Súmula baseou-se em votações do STJ relacionadas com o tema, sobretudo referentes à discussão do momento em que uma empresa poderia ser considerada em débito com o fisco e o prazo de prescrição para ajuizamento da ação de cobrança. O entendimento da Súmula parte do entendimento de que, se tratando de crédito tributário originado de informações do contribuinte, sua constituição definitiva deve ser considerada no momento da apresentação do documento ao fisco.
Em resumo, o entendimento da Súmula acaba com o prazo decadencial, relegando toda discussão para a análise da prescrição. Além disso, usurpa competência cabente ao Fisco, na medida em que toma como “lançamento” ato realizado pelo contribuinte.
Antes mesmo da edição de referida Súmula, já havia no STJ entendimento neste sentido, no qual a decadência fora expressamente afastada. Vejamos:
“PROCESSUAL CIVIL – EXECUÇÃO FISCAL – VIOLAÇÃO DO ART 535 DO CPC – INOCORRÊNCIA – PRESCRIÇÃO – TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO – CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO – DECLARAÇÃO – AUSÊNCIA – REGRA DE CONTAGEM DO PRAZO – TERMO INICIAL – VENCIMENTO. 1. Não há violação do art. 535 do CPC quando o Tribunal de origem emite juízo de valor sobre as questões suscitadas em embargos de declaração. 2. A respeito do prazo para constituição do crédito tributário, esta Corte tem firmado que em regra segue-se o disposto no art. 173, I, do CTN, ou seja, o prazo decadencial é de cinco anos contados "do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado". 3. A apresentação de Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais – DCTF, de Guia de Informação e Apuração do ICMS – GIA ou de outra declaração semelhante prevista em lei é modo de constituição do crédito tributário, dispensando-se outra providência por parte do fisco. Nessa hipótese, não há decadência em relação aos valores declarados, mas apenas prescrição do direito à cobrança, cujo termo inicial do prazo quinquenal é o dia útil seguinte ao do vencimento, quando se tornam exigíveis. Pode o fisco, desde então, inscrever o débito em dívida ativa e ajuizar a ação de execução fiscal do valor informado pelo contribuinte. Além disso, a declaração prestada nesses moldes inibe a expedição de certidão negativa do débito e o reconhecimento de denúncia espontânea. 4. Recurso especial não provido.”[9]
A segunda corrente sobre o prazo inicial da decadência, é oriunda do antigo entendimento do STJ, o qual, a partir de 1995, passou a entender viável a cumulação de prazos entre os artigos 150 §4º e 173, I do CTN. Para tal entendimento, os dois artigos continham normatividade concorrente. Dessa forma, o prazo decadencial passou a encontrar lastro na intitulada tese dos “cinco mais cinco”, por meio da qual, o dies a quo do prazo do artigo 173 é o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do art. 150, §4º.[10]
Para o STJ à época:
“TRIBUTÁRIO – TRIBUTOS SUJEITOS A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO -DECADÊNCIA – PRAZO.
Estabelece o artigo 173, inciso I do CTN que o direito da Fazenda de constituir o crédito tributário extingue-se após 05 (cinco) anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento por homologação poderia ter sido efetuado. Se não houve pagamento, inexiste homologação tácita. Com o encerramento do prazo para homologação (05 anos), inicia-se o prazo para a constituição do crédito tributário.
Conclui-se que, quando se tratar de tributos a serem constituídos por lançamento por homologação, inexistindo pagamento, tem o fisco o prazo de 10 anos, após a ocorrência do fato gerador, para constituir o crédito tributário.”[11]
Segundo o STJ, assim, no lançamento por homologação, utilizava-se o art. 150, §4º do CTN, cujo prazo é o de 5 anos, a contar do fato gerador, cumulando-o, posteriormente, com o qüinqüênio a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado. Tal entendimento garantia ao fisco o prazo de 11 anos para efetivar o lançamento, contados da data do fato gerador.
Ainda, o STJ, ao considerar o dies a quo como o dia em que se deu a perda do poder de lançar, deslocava para o infinito a ocorrência da decadência, dando-se ao tempo verbal “poderia” um “poder que já não possui”, deflagrador da circularidade em “looping”.
Com efeito, o próprio STJ, reconhecendo a interpretação errônea da lei, no julgamento do RESP 923.805/SC asseverou:
“3. Deveras, é assente na doutrina: "a aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173, o que conduz a adicionar o prazo do artigo 173 – cinco anos a contar do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido praticado – com o prazo do artigo 150, § 4º – que define o prazo em que o lançamento poderia ter sido praticado como de cinco anos contados da data da ocorrência do fato gerador. Desta adição resulta que o dies a quo do prazo do artigo 173 é, nesta interpretação, o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do artigo 150, § 4º.
A solução é deplorável do ponto de vista dos direitos do cidadão porque mais que duplica o prazo decadencial de cinco anos, arraigado na tradição jurídica brasileira como o limite tolerável da insegurança jurídica.
Ela é também juridicamente insustentável, pois as normas dos artigos 150, § 4º e 173 não são de aplicação cumulativa ou concorrente, antes são reciprocamente excludentes, tendo em vista a diversidade dos pressupostos da respectiva aplicação😮 art. 150, § 4º aplica-se exclusivamente aos tributos 'cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa'; o art. 173, ao revés, aplica-se aos tributos em que o lançamento, em princípio, antecede o pagamento.(…)
A ilogicidade da tese jurisprudencial no sentido da aplicação concorrente dos artigos 150, § 4º e 173 resulta ainda evidente da circunstância de o § 4º do art. 150 determinar que considera-se 'definitivamente extinto o crédito' no término do prazo de cinco anos contados da ocorrência do fato gerador. Qual seria pois o sentido de acrescer a este prazo um novo prazo de decadência do direito de lançar quando o lançamento já não poderá ser efetuado em razão de já se encontrar 'definitivamente extinto o crédito'? Verificada a morte do crédito no final do primeiro quinquênio, só por milagre poderia ocorrer sua ressurreição no segundo." (Alberto Xavier, Do Lançamento. Teoria Geral do Ato, do Procedimento e do Processo Tributário, Ed. Forense, Rio de Janeiro, 1998, 2ª Edição, págs. 92 a 94). 5. Desta sorte, como o lançamento direto (artigo 149, do CTN) poderia ter sido efetivado desde a ocorrência do fato gerador, é do primeiro dia do exercício financeiro seguinte ao nascimento da obrigação tributária que se conta o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário, na hipótese, entre outras, da não ocorrência do pagamento antecipado de tributo sujeito a lançamento por homologação, independentemente da data extintiva do direito potestativo do o Estado rever e homologar o ato de formalização do crédito tributário efetuado pelo contribuinte.[12]
No que se refere ao terceiro posicionamento, entende parte da doutrina que se aplica o art. 150 do CTN mesmo no caso de ausência de pagamento antecipado, como relatamos acima. É a tese defendida, por exemplo, por Hugo de Brito Machado Segundo e seu pai Hugo de Brito Machado. Ensina o segundo:
“Em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, o prazo de decadência começa da data do fato gerador respectivo. Lançar, neste caso, é simplesmente homologar a apuração que tenha sido feita pelo contribuinte, com base na qual foi antecipado o respectivo pagamento. Se não ocorreu o pagamento antecipado, mas o contribuinte prestou à autoridade a informação quanto ao montante do tributo devido, pode esta, no mesmo prazo, fazer a homologação expressa e determinar a inscrição do crédito tributário como Dívida Ativa. Se não o faz, o direito de lançar estará extinto pela decadência, nos termos do art. 150, §4º do Código Tributário Nacional.”[13]
No concernente à prescrição nos lançamentos por homologação, temos que, uma vez efetuado o pagamento, sendo este suficiente e correto, ocorrerá a homologação tácita ou expressa, extinguindo-se o crédito. Inexistindo o que cobrar, não haverá que se falar em prescrição.
O mesmo se pode dizer daquele que devendo declarar e pagar, nada faz. Neste caso, não houve lançamento, falando-se apenas em decadência.
O problema referente à prescrição surge quando não há pagamento correspondente ao valor corretamente declarado. Neste caso, o STF e o STJ tem entendido que a constituição definitiva do débito, para fins de prescrição, ocorrerá no momento da entrega da declaração. Neste caso, o prazo de 5 anos de prescrição, previsto no art. 174 do CTN, inicia-se da data do vencimento da dívida, constante de declaração. No espaço temporal entre a data da entrega da declaração e o vencimento, não corre prazo de prescrição, consoante decidido no Resp 658.138/PR. Entende-se, neste caso, que o contribuinte declarou por conta própria o débito fiscal por ele reconhecido, por meio de procedimento não impositivo, o que à semelhança de um lançamento, dota-o de exigibilidade, tendo o condão de constituir o crédito. Em verdade, ele se “autonotifica” com a entrega da declaração, não havendo decadência.
Neste sentido, decidiu o STJ no julgamento do Resp nº 764859/PR:
“PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO FISCAL. LANÇAMENTO. DCTF. DÉBITO DECLARADO E NÃO PAGO. AUTO-LANÇAMENTO. PRESCRIÇÃO. SUSPENSÃO. DESPACHO CITATÓRIO. ART. 8º, § 2º, DA LEI Nº 6830/80. ART. 219, § 4º, DO CPC. ART. 174, DO CTN. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. PRECEDENTES.
1. Agravo regimental contra decisão que desproveu agravo deinstrumento.
2. Acórdão a quo segundo o qual: “… 2. Nos casos em que o contribuinte comunica a existência de obrigação tributária, como na DCTF e na GFIP, o crédito fiscal é exigível a partir da data do vencimento, podendo ser inscrito em dívida ativa e cobrado em execução, independentemente de qualquer procedimento administrativo. 3. Considerando-se constituído o crédito tributário a partir do momento da declaração realizada (ou da data da vencimento, quando posterior), não há mais falar em prazo decadencial, incidindo a prescrição nos termos em que delineados no artigo 174, do CTN. 4.Decorridos mais de cinco anos entre a data da entrega da declaração e a citação do Executado, correto o reconhecimento da prescrição do crédito tributário. 5. A regra do art. 2º, §3º, da Lei n. 6.830/80, que determina a suspensão do prazo prescricional pela inscrição do débito em dívida ativa, resta afastada pelo art. 174 do Código Tributário Nacional, norma de hierarquia superior. 6. O art. 8º, § 2º, da LEF deve ser interpretado em harmonia com os dispositivos do Código Tributário Nacional”.
3. “O prazo prescricional da execução fiscal é de cinco anos, contados do lançamento do débito tributário. Inscrito o crédito em dívida ativa e não promovido o executivo fiscal dentro no prazo suspensivo de 180 dias, o qüinqüênio é contado computando-se o tempo transcorrido antes da inscrição, por tratar-se de suspensão e não interrupção do prazo” (REsp nº 146480/RS, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 21/08/2000).
4. O art. 40 da Lei nº 6.830/80, nos termos em que foi admitido no ordenamento jurídico, não tem prevalência. A sua aplicação há de sofrer os limites impostos pelo art. 174 do CTN. Repugnam os princípios informadores do nosso sistema tributário a prescrição indefinida. Após o decurso de determinado tempo sem promoção da parte interessada, deve-se estabilizar o conflito, pela via da prescrição, impondo-se segurança jurídica aos litigantes. Os casos de interrupção do prazo prescricional estão previstos no art. 174 do CTN, nele não incluídos os do art. 40 da Lei nº 6.830/80. Há de ser sempre lembrado de que o art. 174 do CTN tem natureza de Lei Complementar.
5. A mera prolação do despacho que ordena a citação do executado não produz, por si só, o efeito de interromper a prescrição, impondo-se a interpretação sistemática do art. 8º, § 2º, da Lei nº 6.830/80, em combinação com o art. 219, § 4º, do CPC e com o art. 174 e seu parágrafo único do CTN. Precedentes desta Corte e do colendo STF.
6. “Considerando-se constituído o crédito tributário a partir do momento da declaração realizada, mediante a entrega da Declaração de Contribuições de Tributos Federais (DCTF), não há cogitar-se da incidência do instituto da decadência, que retrata o prazo destinado à 'constituição do crédito tributário', in casu, constituído pela DCTF aceita pelo Fisco. Destarte, não sendo o caso de homologação tácita, não se opera a incidência do instituto da decadência (artigo 150, § 4º, do CTN), incidindo a prescrição nos termos em que delineados no artigo 174, do CTN, vale dizer: no qüinqüênio subseqüente à constituição do crédito tributário, que, in casu, tem seu termo inicial contado a partir do momento da declaração realizada mediante a entrega da DCTF” (REsp nº 389089/RS, Rel. Min. Luiz Fux, DJ de 16/12/2002).
7. “A constituição definitiva do crédito tributário ocorre com o lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo. Em se tratando de débito declarado pelo próprio contribuinte e não pago, não tem lugar a homologação formal, sendo o mesmo exigível independentemente de notificação prévia ou instauração de procedimento administrativo.”(REsp nº 297885/SC, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 11/06/2001).
8. Nos tributos sujeitos a lançamento por homologação, a declaração do contribuinte por meio da Declaração de Contribuições e Tributos Federais – DCTF – elide a necessidade da constituição formal do débito pelo Fisco. Há de se extinguir a execução fiscal se os débitos declarados e não pagos , através da DCTF, estão atingidos pela prescrição.
9. Precedentes desta Corte superior.
10. Agravo regimental não-provido.”[14]
Entretanto, tal entendimento encontra vozes renitentes na doutrina, que entendem que se deve guardar certas restrições, pois caso contrário, estaríamos suprimindo a existência da decadência, e mais ainda, afrontando o Código Tributário Nacional, mais precisamente, seu art. 142, o qual determina que compete privativamente a autoridade administrativa constituir o crédito tributário.
Neste sentido:
“TRIBUTÁRIO – EXECUÇÃO FISCAL – IMPOSTO DE RENDA – PRESCRIÇÃO – NÃO-OCORRÊNCIA – AUSÊNCIA DE PAGAMENTO DO DÉBITO DECLARADO – INSCRIÇÃO NA DÍVIDA ATIVA – CITAÇÃO – TR E SELIC – NULIDADE DA TDA – DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL NÃO-DEMONSTRADA.
1. Em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação, a fixação do termo a quo do prazo decadencial para a constituição do crédito deve considerar, em conjunto, os artigos 150, § 4º, e 173, inciso I, do Código Tributário Nacional.
2. In casu, o tributo restou declarado e não-pago, inserindo-se na hipótese de lançamento de ofício, pela qual o prazo de decadência passa a correr a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ser realizado. (art. 173, inciso I, do CTN).
3. "Nas exações cujo lançamento se faz por homologação, havendo pagamento antecipado, conta-se o prazo decadencial a partir da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CNT). Somente quando não há pagamento antecipado, ou há prova de fraude, dolo ou simulação é que se aplica o disposto no art. 173, I, do CTN". (Resp 183.603/SP, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 13.8.2001).
4. Não havendo discordância da autoridade fazendária quanto ao valor declarado pelo contribuinte, o lançamento poderá ser feito com a inscrição do débito na dívida ativa, que constitui definitivamente o crédito e dá início à contagem do prazo prescricional de cinco anos, previsto no artigo 174 do CTN.
5. Na espécie, consoante consta do v. acórdão recorrido, a inscrição do débito na dívida ativa ocorreu em 24.7.1997, de modo que o ajuizamento da execução em 1.3.1999 não ultrapassou o qüinqüênio estabelecido pelo CTN para cobrança do crédito tributário pela Fazenda.
Agravo regimental improvido.
Acórdão – Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça "A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator." Os Srs. Ministros Eliana Calmon, João Otávio de Noronha e Castro Meira votaram com o Sr. Ministro Relator.” [15] (grifei)
Neste julgado, entende o órgão colegiado, a existência do lapso decadencial e posteriormente o prescricional. Determinando a contagem inicial da prescrição após a efetiva constituição do crédito tributário e sua inscrição, não se falando no início do lustro prescricional a partir da entrega da declaração. Entretanto, observa-se que a decisão acata também a tese dos “cinco mais cinco” acima explicitada, a qual já se encontra defasada em relação ao atual entendimento do STJ.
Conclusão
Ante as ponderações lançadas neste trabalho, podemos concluir que a jurisprudência a doutrina sempre divergiram sobre a aplicação dos prazos de decadência e prescrição nos tributos sujeitos a lançamento por homologação.
No que se refere à decadência, mais precisamente sobre o prazo inicial de sua contagem, prevalece que, uma vez declarado o tributo e pago, aplica-se ao caso o art. 150, parágrafo 4. do CTN, iniciando-se o prazo da ocorrência do fato gerador. Entretanto, caso declarado corretamente o tributo e não pago, surgem as posições divergentes, quais sejam:
a)Para a primeira, tese prevalente no STJ, aplicar-se-ia exclusivamente o art. 173, I do CTN, pois sem pagamento, não há o que homologar, faltando objeto ao lançamento por homologação.
b) Para outra, deveria ocorrer a cumulação na aplicação dos arts. 150, §4º e 173, I do CTN. O dies a quo do prazo do art. 173 é o primeiro dia do exercício seguinte ao do dies ad quem do prazo do art. 150, §4º, do CTN. É a tese defendida pelo Fisco, por lhe ser mais benéfica, criando a regra do “cinco mais cinco”.
c) Já a última, defendida, dentre outros, por Hugo de Brito Machado Segundo, aplica-se exclusivamente o art. 150, §4º do CTN. O fundamento seria o de que a atividade de homologação está ligada à apuração desenvolvida pelo contribuinte, e não ao pagamento propriamente dito. Homologa-se a atividade que motivou o pagamento, e não o pagamento. Tal raciocínio teria fortes implicações no cálculo da decadência.
No referente à prescrição, não há maiores problemas quando o contribuinte declara o tributo corretamente e o paga, haja vista que o débito extingue-se. Também não maiores suscitações quando o contribuinte nada declara e nada paga, pois, neste caso, não houve lançamento, falando-se apenas em decadência. O problema referente à prescrição surge quando não há pagamento correspondente ao valor corretamente declarado. Neste caso, o STF e o STJ tem entendido que a constituição definitiva do débito, para fins de prescrição, ocorrerá no momento da entrega da declaração. Neste caso, o prazo de 5 anos de prescrição, previsto no art. 174 do CTN, inicia-se da data do vencimento da dívida, constante de declaração.
Entretanto, tal entendimento encontra divergências na doutrina. Entendem alguns, que se deve guardar certas restrições, pois caso contrário, estaríamos suprimindo a existência da decadência, e mais ainda, afrontando o Código Tributário Nacional, mais precisamente, seu art. 142, o qual determina que compete privativamente a autoridade administrativa constituir o crédito tributário.
Informações Sobre o Autor
Luciano Carlos de Melo
Procurador do Estado de São Paulo. Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Rio Preto, Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade do Sul de Santa Catarina