Resumo: O direito de superfície nasceu com os romanos e retorna, inicialmente pelo Estatuto da Cidade e após pelo Código Civil, ao nosso ordenamento jurídico depois de mais de um século de desuso. A regulação do instituto de forma diferenciada pelo Estatuto da Cidade e pelo Código Civil dá margem a divergências doutrinárias e jurisprudenciais que podem levar o indivíduo ao erro, além de poder se tornar em um campo profícuo para demandas judiciais. Entender o instituto e as possibilidades de sua aplicação passa obrigatoriamente pela analise da derrogação do Estatuto da Cidade pelo Código Civil situação que necessita de uma maior abordagem pela doutrina e pela jurisprudência.
Palavras chave: Direito de Superfície, Código Civil, Estatuto da Cidade.
Sumário: 1. Introdução; 2. A origem do Direito de Superfície; 3. Dupla normatização do Direito de Superfície; 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
O direito de superfície retornou ao ordenamento jurídico brasileiro depois de um longo período no esquecimento, no entanto entender as suas finalidades e estabelecer regras claras para sua aplicação são imperativos que necessitam de uma atenção prioritário por parte dos aplicadores do Direito, a fim de se evitarem ‘armadilhas’ legais ou a desconfiguração do instituto como meio e forma de causar prejuízos a outrem.
2. A ORIGEM DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
A origem do direito de superfície remonta aos romanos, em uma confirmação prática do princípio que o direito nasce do fato como ensina Nader (2006). As grandes conquistas de Roma, o enriquecimento de parcela privilegiada do povo romano, deram origem aos primeiros latifúndios que ficavam restritos pela utilização da locação como meio de renda; em parte devido ao prazo, inicialmente de no máximo cinco anos; e, após, expandido e elevado a categoria de direito real, mas ainda limitado pelo princípio da acessão. Era necessária uma relativização do princípio ‘superficies solo cedit’ (a superfície segue o solo) com a finalidade de que fosse melhor aproveitada a propriedade (RIZZARDO, 2002).
A localização do instituto no tempo é polêmica, mas renomados autores, entre eles Rizzardo (2006) entendem que seu início se deu no período clássico (126 a.C. até o fim do reinado de Diocleciano, em 305 d.C.) atingindo o ‘status’ de direito real no período pós-clássico (305 d.C.até 565 d.C. incluindo o reinado de Justiniano, chamado por seu caráter regenerador, de direito justinianeu) (MOTA, 2005). Citando Nader (2006, p. 362).
“Quanto ao período pós-clássico, divergem os romanistas a respeito, inexistindo, a rigor, uma fonte segura a indicar que o superficiarius passou a ser protegido por uma actio in rem. Os textos do Corpus Juris Civilis a este respeito estão interpolados, de forma que não permitem uma conclusão, como anota Fritz Schulz: “Este problema tem sido estudado a fundo e discutido com verdadeiro fanatismo recentemente, sem que os romanistas tenham chegado à unanimidade de pareceres.”
O direito de superfície passou a ser utilizado inicialmente com a instalação de tabernas em terrenos públicos onde a propriedade do solo continuava com o Estado Romano e, após permitindo que fosse destacada a propriedade da superfície do solo, possibilitando que particulares construíssem no solo alheio. No Direito Romano o direito de superfície era restrito a construções, não se permitindo que fosse estendido a plantações (VENOSA, 2006).
No decorrer dos tempos o instituto foi incorporado ao Código austríaco de 1.811, no BGB do direito Alemão e no Código italiano de 1.942 (RIZZARDO, 2006), entretanto não foi previsto no Código Napoleônico e o Código Civil português somente conheceu o instituto em 1.948 (VENOSA, 2006).
Na legislação pátria o instituto foi recepcionado por força de uma lei de 1.823, e vigorou até ser abolido pela Lei n.º 1.237, de 24 de setembro de 1.864.
Após este longo período de esquecimento o direito de superfície retornou ao arcabouço jurídico brasileiro na Lei n.º 10.257, 10-07-2001, que instituiu o Estatuto da Cidade, embora alguns autores, como Silvio Rodrigues (2002), que entendem que antes desta data por meio do Decreto-Lei n.º 271, de 28-02-1.967 o legislador já o havia reinserido no ordenamento jurídico pátrio, mesmo que sem sucesso. Na verdade o Decreto-Lei n.º 271/67 cuidou da chamada ‘concessão de uso’ instituto de natureza administrativa e que, embora mantenha similaridades com o direito de superfície, dele se diferencia, pois a propriedade do solo e da superfície, no caso da ‘concessão de uso’, se mantêm nas mãos do Estado/concedente. De acordo com Nader (2006. p. 358).
“A diferença fundamental entre a concessão de uso e a superfície consiste no fato de que, na primeira, não se verifica a cisão das propriedades, pois o concedente preserva o domínio do solo e da superfície, assumindo o concessionácie, assumindo o concessionconcedente preserva o domi coisas. tconsistindo numa espomo direito real resoluperfamento elboradorio apenas o direito real de uso e gozo. Destarte, na concessão de uso não se opera a exceção ao princípio das acessões: superfícies solo cedit.”
Entretanto, embora não se possa confundir a ‘concessão de uso’ regulada pelo Decreto-Lei n.º 271/67 com o ‘direito de superfície’, o fato é que; seja pela regulação do instituto do direito de superfície no Código Civil italiano que influenciou sobremaneira a Lei n.º 10.406, de 10.01.2002, que instituiu o atual Código Civil brasileiro; seja pela vigência do referido Decreto-Lei[1] o instituto foi novamente regulado pelo Código Civil em Vigência nos artigos 1.369 a 1.377. Citando Figueira JR (2004, p. 1.254).
“Infere-se da Exposição de motivos do anteprojeto, da lavra de Miguel Reale (DOU de 13-6-1975), que “tendo sido firmado o princípio da enumeração taxativa dos direitos reais foi mister atender à chamada ‘concessão de uso’, tal como já se acha em vigor, ex vi do Decreto-Lei n. 271, de 28 de fevereiro de 1967, que dispõe sobre loteamento urbano. Trata-se de inovação recente na legislação pátria, mas com larga e benéfica aplicação. Como a lei estende a ‘concessão de uso’ às relações entre particulares, não pode o Projeto deixar de contemplar a espécie. Consoante justa ponderação de José Carlos Moreira Alves, a ‘migração’ desse modelo jurídico, que passou da esfera do Direito Administrativo para o Direito Privado, veio restabelecer, sob novo enfoque, o antigo instituto da superfície”.
Trazido novamente a vida pelo Estatuto da Cidade e pelo Código Civil o direito de superfície, tratado como direito real por ambos os diplomas legais, tem uma conceituação diferente da original prevista no Direito romano que não admitia sua extensão as plantações (VENOSA, 2006), sendo possível sua aplicação tanto as construções como as plantações.
3. DUPLA NORMATIZAÇÃO DO DIREITO DE SUPERFÍCIE
O direito de superfície pode ser entendido como um direito real onde o proprietário ou fundeiro passa ao superficiário os poderes sobre a superfície do terreno, e por sua vez, este último, passa a ser proprietário de tudo o que se acrescer a superfície do solo.
Renomados autores, entre eles Nader (2006) entendem que o direito de superfície veio substituir a enfiteuse, que tem origem grega, devidos as vantagens que o primeiro apresenta sobre a segunda. Nesse sentido o Código Civil, no art. 1.225, não prevê a ‘enfiteuse’ como direito real e o art. 2.038 vedou a criação de novas enfiteuses ou subenfiteuses.
A reinserção do direito de superfície na legislação brasileira é justificada por vários autores como sendo uma tentativa do legislador, galgado em fundamentos sociológicos e constitucionais de alcançar a função social da propriedade e como meio de diminuir o problema latente de invasões de terras, já que possibilitaria um maior acesso a terra, de acordo com Figueira JR ( 2004, p. 1.254.)
“A mola propulsora do direito de superfície é, sem dúvida, o incremento da função social da propriedade e o seu enquadramento para um determinado fim, concebido num determinado modelo, previamente elaborado pelo seu titular, em sintonia com os preceitos sócio-econômicos, políticos e jurídicos, e com o estado democrático de direito. É justamente nesse quadro matizado por uma pigmentação altamente sociológica da propriedade que não se permite o desvio de função (destinação) preliminarmente definida no instrumento de concessão, seja para mais, seja para menos, independentemente de pagamento pela diferença apurada.”
A regulação do instituto por dois diplomas legais, Código Civil e Estatuto da Cidade têm causado uma grande polêmica entre os aplicadores do direito, pois se tratando de leis da mesma época, que regulam a matéria de forma diferenciada, principalmente com relação ao prazo, determinado ou indeterminado, e possibilidade de utilização do subsolo, cria uma situação de insegurança jurídica e um campo propício às demandas judiciais.
É necessário que sejam traçados parâmetros bem definidos em relação a aplicação de uma outra lei ou até mesmo se ambas as leis têm condições de viger paralelamente, já que o Código Civil, lei posterior, poderia ter derrogado os artigos do Estatuto da Cidade que cuidam do direito de superfície.
A análise da derrogação[2] do Estatuto da Cidade pelo arts. 1.369 a 1.377 do Código Civil deve ser analisado principalmente levando em consideração dois critérios: o que diz que a lei posterior revoga a lei anterior e o que informa que a lei geral não revoga a especial.
Na análise de Bobbio[3] existe uma antinomia quando duas normas se contradizem em situações de tempo, espaço, pessoa e matéria.
No caso em questão na análise temporal caberia a aplicação do critério que a lei posterior revoga a lei anterior, visto que a Lei 10.257, de 10 de julho de 2.001 é anterior a Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002.
O preceito é regulado pelo art. 2º, § 1º do Decreto-Lei n.º 4.657, de 04 de setembro de 1.942 (LICC), declarando expressamente que a lei nova revoga a anterior[4] quando for com ela incompatível ou regular totalmente a matéria que tratava a anterior.
Quanto ao critério espacial, ambas as normas são aplicáveis no território brasileiro como um todo, já que se trata de leis federais, não apresentando maiores dificuldades.
Com relação ao critério pessoal também não existem grandes dificuldades já que ambas as normas são aplicáveis a todo cidadão que pretenda utilizar o direito de superfície no âmbito urbano (já que a área rural aplica-se apenas e tão somente o Código Civil). Neste ponto alguns autores têm entendido que o Estatuto da Cidade constitui-se em um microssistema a exemplo do Código de Defesa do Consumidor e da Lei de inquilinato, o que justificaria a sua aplicação àqueles casos onde houvesse planos de urbanização implantados. Citando Venosa (2006, p. 426)
“O Estatuto da Cidade, Lei nº 10.257/2001, por nós já mencionado, mormente no capítulo em que tratamos do usucapião, atravessou o Código Civil, pois são leis da mesma época, porque também disciplina o direito de superfície, nos arts. 21 a 23. Tal obriga o intérprete a definir a aplicabilidade de ambos os diplomas legais sobre a mesma matéria. Esse estatuto entrou em vigor noventa dias após a sua publicação, portanto antes do vigente Código Civil. É de se perguntar se, no conflito de normas, o presente Código, como lei posterior, derroga os princípios do Estatuto. Se levarmos em conta a opinião aqui tantas vezes defendidas de que o Estatuto da Cidade institui um microssistema, tal como o Código de Defesa do Consumidor e a Lei de Inquilinato, portanto, sob essa óptica, o Estatuto vigorará sobranceiro no seu alcance de atuação, em princípio, sobre as demais leis, ainda que posteriores. A matéria, no entanto, é polêmica, e longe está da unanimidade.”
Esse entendimento inclusive foi adotado pela Jornada do Direito Civil[5] promovido pelo STJ-CEJ/CJF, depois de uma votação entre os membros da comissão de direito das coisas que apresentou teses totalmente antagônicas, vencendo aquela que entendia que o Código Civil não derrogou o Estatuto da Cidade. De acordo com Figueira JR (2004, p. 1.249)
“Esse nosso entendimento foi seguido por diversos membros integrantes da Comissão de Direito das Coisas da Jornada de Direito Civil, STJ-CEJ/CJF. Por coincidência, foram apresentados dois Enunciados contendo teses diametralmente opostas; a da Advogada da União, Sônia Regina M. Moreira Alves Mury, defendendo a disciplina do instituto jurídico do direito de superfície pelo novo Código Civil, derrogando-se, neste particular, o Estatuto da Cidade, após a sua entrada em vigor, e, de outra parte, a do Professor Ricardo César Pereira Lira, no sentido da não-derrogação do Estatuto da Cidade. Curiosamente, por um único voto, venceu o Enunciado contrário ao NCC, conforme veremos mais adiante”.
Embora a posição adotada, na forma do enunciado 93 da Jornada do Direito Civil, seja no sentido de que não houve a derrogação, o tema esta longe de uma posição unânime entre os doutrinadores.
A meu sentir não entendo que caiba razão a quem defende que não houve derrogação por se tratar de um microssistema. O problema se descortina pela análise da própria analogia utilizada pelos defensores desta teoria, já que justificam seu pensamento no Código de Defesa do Consumidor e na Lei de Inquilinato. Vale lembrar que ambos os diplomas utilizados como paradigmas, traçam diretrizes e conceitos sobre quem pode ser considerado como consumidor ou locatário, de acordo com cada caso, o que inocorre no caso do Estatuto da Cidade que em seu art. 1º, parágrafo único informa que estabelece normas de uso da propriedade urbana voltada ao bem-estar de todos os cidadãos. Já no caso da Lei 8.078/90, de 11 de setembro de 1.990, que dispõe sobre a proteção do consumidor, no art. 2º estabelece claramente a quem aquela lei se destina conceituando não só quem pode ser considerado como consumidor, mas também fornecedor. No caso da Lei n.º 8.245, de 18 de outubro de 1.991, que dispõe sobre as locações dos imóveis urbanos, o art. 1º estabelece claramente que as locações de prédios urbanos serão por ela regulada. Como se vê os diplomas legais citados, Código de Defesa do Consumidor e Lei de Inquilinato delimitam claramente seu raio de atuação e destinação, porquanto o Estatuto da Cidade, na seara do critério pessoal, como o Código Civil são voltados e aplicados aos cidadãos em geral.
Quanto ao critério da matéria (ou critério da especialidade) onde vigora o princípio que a lei especial derroga a lei geral também penso que não ocorre possibilidade de prevalecerem às normas do Estatuto da Cidade. De acordo com Gonçalves (2006, p. 45):
“Além dos critérios cronológico e hierárquico já mencionados, destinados a solucionar antinomias aparentes ou conflitos normativos, desponta na ordem jurídica o da especialidade (lex specialis derogat legi generali), pelo qual a norma especial revoga a geral quando disciplinar, de forma diversa, o mesmo assunto”.
Na lição de Diniz (2002) uma norma pode ser considerada especial quando possui na sua definição todos os elementos da norma geral e mais algumas particularidades que lhe dão o caráter de especialidade. Ocorre que tanto o Estatuto da Cidade como o Código Civil tratam o tema como igual abrangência e critérios, se descompatibilizando apenas no tocante ao prazo do exercício do direito de superfície e na possibilidade de utilização ou não do subsolo. Na verdade o Código Civil chega a traçar, no art. 1.377, a possibilidade de que o ente de direito público interno possa utilizar-se do direito de superfície, bem como prevê a possibilidade de extinção pela desapropriação, donde desponta particularidades não aventadas pelo Estatuto da Cidade.
Bobbio ao pensar estes critérios fez um comparativo de forma que fossem analisados os conflitos entre o critério hierárquico e o cronológico, entre o critério da especialidade e o cronológico e entre o critério hierárquico e o de especialidade. Na análise do primeiro conflito (hierárquico e cronológico), segundo Bobbio (1999), prevalece o primeiro, ou seja, o hierárquico, vez que a lei hierarquicamente inferior não derroga lei superior, razão de afirmar que o princípio lex posterior derogat priori não vale quando a lex posterior é hierarquicamente inferior a lex priori. Na análise do segundo conflito (especialidade e cronológico), Bobbio informa que este conflito tende o ocorrer quando uma norma anterior especial não é compatível com uma norma posterior geral, o que leva a conclusão da existência de uma exceção ao princípio lex posterior derogat lex priori, uma vez que a lei geral posterior não impede o seguimento da lei especial anterior. Na análise do terceiro e último conflito (hierárquico e especialidade), Bobbio ensina que é o caso de uma norma superior e geral incompatível com outra inferior e especial, nesta hipótese caberá ao aplicador do direito aplicar uma ou outra norma, pois o respeito a ordem jurídica pressupõe a obediência a hierarquia das leis, mas a justiça exige a adaptação do direito as necessidades sociais e neste caso deve ser usada a lei especial, ou seja, neste caso não haverá revogação e os institutos deverão ser utilizados em harmonia.
Analisando as teorias dos conflitos sugerida por Bobbio e levando em consideração que o Código Civil e o Estatuto da Cidade não se adequam a nenhum daqueles conflitos, posto que são normas de mesma hierarquia e ambas traçam diretrizes de mesma especialidade para o instituto do direito de superfície, entendo que deva prevalecer a análise levando em consideração apenas o critério cronológico para afirmar a derrogação ou não do Estatuto da Cidade pelos arts. 1.369 a 1.377 do Código Civil.
É relevante recordar o binômio necessidade/utilidade e a existência de duas normas que regulam o mesmo instituto de forma antagônica se contrapõe ao referido pressuposto além do que implica na inobservância do dever de coerência resultado do dever de certeza e do dever de justiça. Citando Bobbio (1999, p. 113):
“A coerência não é condição de validade, mas é sempre condição para a justiça do ordenamento. É evidente que quando duas normas contraditórias são ambas válidas, e pode haver indiferentemente a aplicação de uma ou de outra, conforme o livre-arbítrio daqueles que são chamados a aplicá-las, são violadas duas exigências fundamentais em que se inspiram ou tendem a inspirar-se os ordenamentos jurídicos: a exigência de certeza ( que corresponde ao valor da paz ou da ordem), e a exigência da justiça (que corresponde ao valor da igualdade). Onde existem dias normas antinômicas, ambas válidas, e portanto ambas aplicáveis, o ordenamento jurídico não consegue garantir nem a certeza, entendida como possibilidade, por parte do cidadão, de prever com exatidão as conseqüências jurídicas da própria conduta, nem a justiça, entendida como o igual tratamento das pessoas que pertencem à mesma categoria.)”
Nesse caso entendo, como defende Joel Dias Figueira Jr., que o Código Civil derrogou o Estatuto da Cidade, sendo, portanto o primeiro aplicável a todos os casos de direito de superfície, urbano ou rural, mesmo, no caso de urbano, onde exista plano de urbanização.
Sem se falar que o fato do Estatuto da Cidade possibilitar a estipulação do direito de superfície por prazo indeterminado pode trazer inconvenientes perigosos, como adverte Venosa (2006. p. 426-427).
“A admissão do prazo indeterminado é inconveniente, mormente porque o Estatuto não disciplina o prazo razoável de resilição. Assim, nesse aspecto, temos dois tratamentos diversos para o mesmo instituto em nosso ordenamento. De qualquer forma, quando o direito de superfície for concedido opor prazo indeterminado, devem as partes se acautelar prevendo um prazo razoável para a denúncia vazia.”
A importância do instituto do direito de superfície nesta nova experiência, dependerá de inúmeros fatores como afirma Rodrigues(2002), mas principalmente a meu sentir da forma como o mesmo será entendido e aplicado, caminho que passa obrigatoriamente por normas claras e bem definidas, o que inocorre no presente momento legislativo.
4. CONCLUSÃO
É certo que os Direitos Reais por sua característica se propagam no tempo, ora com grande adesão e utilização por parte da sociedade para depois cair em desuso, ora esquecidos e reanimados por questões sociais ou legais que se modificam ou evoluem.
No caso especifico do direito de superfície lembra o Professor Paulo Nader(2006) a grande importância que o instituto teve no decorrer dos tempos, citando como exemplo que mais da metade da cidade Londres, na Inglaterra, foi construída sobre terras de propriedade do Duque de Westminster.
A experiência brasileira não foi profícua no primeiro momento em que o direito de superfície adentrou a sistema jurídico nacional, ainda na época do Brasil Colônia, entretanto como dissemos anteriormente os direitos reais se apresentam ora com mais ou menos força de acordo com inúmeras variáveis sociais, políticas e legais.
Ainda como referenciado anteriormente o retorno do instituto do direito de superfície a legislação pátria busca atender os anseios constitucionais de melhor justiça social, acesso e utilização racional da terra, por quem não tem acesso ou não têm condições de retirar dela o potencial que poderia.
O momento histórico brasileiro tem passado por grandes mudanças, em grande parte devido a inclusão no ordenamento constitucional do princípio da dignidade da pessoa, deixando evidente que o ser humano é o centro e fim de toda a ordem jurídica. Neste ponto a constituição colocou nos arts. 1º, III, 170, caput e 226, § 7º o principio da dignidade da pessoa como norma jurídica fundamental que deve transpassar e concatenar toda a ordem jurídica nacional.
O direito de superfície retorna ao ordenamento jurídico brasileiro escorado na função social da propriedade, entretanto, como já dito alhures o sucesso do intento depende de regras claras e bem definidas, o que é incompatível com a existência ao mesmo tempo de dois diplomas legais que abordem o tema com igual profundidade, mas estabelecendo regras diversas, especialmente com relação a duração do direito de superfície e a possibilidade de utilização do subsolo.
É importante que sejam traçadas diretrizes claras e seguras para que o instituto possa ser buscado pelo cidadão de forma consciente e eficaz.
Informações Sobre o Autor
Wesllay Carlos Ribeiro
Doutorando em Direito pela PUC Minas, Mestre em Direito pela UNESA, Professor Assistente da Universidade Federal de Alfenas – Campus Varginha UNIFAL-MG