Sumário: Resumo. Abstract. Justificativa. Introdução. Ementa. Projetos de Lei. Indexação. Motivação. Artigo 1º. Artigo 2º. Autonomia dos peritos. Artigo 3º. Regime jurídico. Artigo 4º. Vetado. Observação. Artigo 5º. Peritos criminais: especialidades. Artigo 6º. Vigência. Conclusões.
Resumo:[1] A Lei estabelece o regime estatutário para os peritos criminais.
Justificativa.
O trabalho de ler as novas leis ordinárias federais em vigor no Brasil continua.
O desejo de fazer esta tarefa da maneira mais simples possível também.
Na qualidade de ex-aluno e atual professor de duas instituições federais de ensino superior em Minas Gerais e Mato Grosso, tenho um débito com a coletividade que pagou os meus estudos de graduação e, no doutoramento, além de fazê-lo, ainda custeou a minha bolsa de estudos do CNPq. [2] Tais justificativas servem para explicar a gratuidade do meu trabalho de comentar as novas leis nacionais.
Não deixa de ser interessante, em contraponto ao meu pensamento, verificar em notícias nos jornais que bolsistas do CNPq e da CAPES recebem dinheiro de fomento do Poder Público para desenvolverem suas pesquisas no exterior e por lá ficam.
São bolsistas que recebem para desenvolverem pesquisas no exterior e por lá ficam dando um prejuízo muitas vezes irrecuperável aos cofres públicos brasileiros. [3]
A notícia recente é de que o Tribunal de contas da União apurou um calote de aproximadamente R$ 13.200.000,00 por parte de pesquisadores que abandonaram o país.
O pior é que as cobranças judiciais feitas têm pouco sucesso, por razões práticas em razão mesmo dos ex-bolsistas se encontrarem fora da jurisdição das leis brasileiras.
Quando estudei Direito na graduação, nos anos de 1989 a 1994 e me doutorei, de 1996 a 2001, a internet não era uma realidade como a atual.
Os sistemas de e-gov [4] praticamente eram inexistentes e não nos restava senão freqüentar as bibliotecas das faculdades de direito para se ter acesso aos mais novos livros e às mais recentes interpretações do direito em todos os ramos. As novidades legais eram obtidas nas bibliotecas e nas repartições públicas onde se achassem assinaturas do Diário Oficial da União.
Ao mesmo tempo, análises legais não são assuntos que costumam caber em livros porque tomam pouco ou insuficiente espaço para tal relevante tarefa.
Após todas estas explicações, agradeço a paciência dos meus leitores, venho mais uma vez contar com a compreensão dos mesmos no sentido de apontar que este artigo deve ser apenas breve leitura da lei e tradução da mesma para uma leitura mais simples e escorreita, sem fazer necessário ao leitor consultar constante e repetidamente os textos constitucionais e legais.
Não posso negar o sonho de poder escrever alguns comentários a respeito de toda a nova legislação nascida das fontes do direito positivo no Brasil.
Finalmente, escrevo diariamente porque novas leis são criadas todos os dias, porque minha profissão de professor universitário federal em dedicação exclusiva o permite e requer e, acima de tudo, porque acredito no meu país, acredito no povo brasileiro, na pátria brasileira e na bondade da raça humana, acima de tudo, com as bênçãos de Deus!
Introdução.
Interessante a mensagem de Popper, segundo a qual:
“os que não estão dispostos a expor suas idéias à aventura da contestação não tomam parte no jogo da ciência.”[5]
À medida que atualmente se publica com uma velocidade incontestavelmente maior devido à existência da rede mundial de computadores, quem se expõe, ou seja, quem publica textos nas revistas científicas virtuais e nas páginas pessoais (blogs) está basicamente subordinado a duas espécies de críticas:
1. A primeira, como eu mesmo já recebi, de que os textos publicados na rede não são científicos;
2. As publicações na internet não são dotadas de profundidade, de segurança, não são confiáveis, enfim.
Também muitas outras pessoas já criticaram a minha produção na rede mundial de computadores que é bastante volumosa. Volumosa porque baseada em textos diretos que procuram ser entendidos por qualquer pessoa. Volumosa porque não pretendo mostrar que sei escrever com erudição, mas porque quero ajudar as pessoas a compreenderem as novas leis e a elas se sujeitarem, a elas obedecerem!
A frase de Popper, então, funciona como um refrigério, com um consolo, como um alívio, como um conforto moral no sentido de que posso continuar escrevendo e publicando meus artigos e meus livros!
Ementa.
Dispõe sobre as perícias oficiais de natureza criminais e dá outras providências.
Projetos de Lei.
O Projeto de Lei da Câmara, nº 204 de 2008, de autoria do deputado Arlindo Chinaglia gerou a Lei 12.030, de 2009.
O Projeto de Lei 204, de 2008 – (PL 204), por sua vez, se originou do (PL 3653) de 1997.
A ementa do Projeto de Lei é a mesma da Lei 12.030.
A informação da sua situação no Legislativo é de que o mesmo foi convertido em norma jurídica.
O veto recebido pelo artigo 4º da nova Lei 12.030 recebeu a denominação de veto 42, de 2009.
Indexação.
A indexação da matéria recebeu os seguintes termos:
“Obrigatoriedade; Perito; Quadro Efetivo; Especialização; Realização; Perícia; Interesse; Estado; Exigência; Concurso Público; Regime Especial de Trabalho; Inclusão; Perito Criminal; Médico Legista; Carreira Típica de Estado; Proibição; Subordinação; Autoridade Policial; Órgão Técnico; Garantia; Autonomia”.
Há ainda na indexação observações no sentido de que as perícias oficiais de interesse do Estado serão efetuadas por peritos integrantes de quadro permanente de órgão especializado.
Motivação.
O Presidente da República sancionou o Projeto de Lei aprovado pelo Congresso Nacional e que acabou por gerar a presente Lei nº 12.030, de 17 de Setembro de 2009.
Artigo 1º.
O artigo 1º da Lei 12.030 informa que a mesma estabelece normas gerais para as perícias oficiais de natureza criminal.
Para se estabelecer o significado de normas gerais, é necessário o recurso à doutrina de Diogo de Figueiredo Moreira Neto. O autor é citado em parecer jurídico à disposição da internet e explica amplamente o tema. [6]
Normas gerais seriam, assim, declarações principiológicas que cabe à União:
“editar, no uso de sua competência concorrente limitada, restrita ao estabelecimento de diretrizes nacionais sobre certos assuntos, que deverão ser respeitadas pelos Estados-membros na feitura das suas respectivas legislações, através de normas específicas e particularizantes que detalharão, de modo a que possam ser aplicadas, direta e imediatamente, às relações e situações concretas a que se destinam, em seus respectivos âmbitos políticos.”
As normas gerais estabelecem princípios, regras jurídicas gerais, linhas mestras e diretrizes. Não se servem a pormenorizar, nem a esgotar o assunto legislado. Devem ser aplicáveis de maneira uniforme a todos os entes públicos, ou seja, devem possuir caráter nacional. Devem ser regras uniformes para todas as situações homogêneas.
As normas gerais devem ser uniformes para todas as situações homogêneas. As normas gerais só serão cabíveis quando preencherem lacunas constitucionais ou dispuserem sobre áreas de conflito.
As normas gerais não são normas de aplicação direta, são limitadas, no sentido de não poderem violar a autonomia dos Estados, devem referir-se a questões fundamentais.
A partir das considerações acima, é de se esperar que os Estados-membros estabeleçam, doravante, suas próprias leis que criem as normas específicas para as perícias oficiais criminais.
Artigo 2º. Autonomia dos peritos
No exercício da atividade de perícia oficial de natureza criminal, é assegurado autonomia técnica, científica e funcional, exigido concurso público, com formação acadêmica específica, para o provimento do cargo de perito oficial.
A lei não desperdiça palavras e nem as joga ao vento sem qualquer nexo para serem aplicadas. Inicialmente, o artigo 2º da Lei 12.030 assegura aos peritos criminais autonomia técnica, científica e funcional.
Os peritos oficiais têm, assim, autonomia técnica.
Autonomia quer dizer independência e significa capacidade de alguém se autogovernar. Autonomia é a capacidade, é a faculdade de traçar as normas de sua conduta, sem que sinta imposições restritivas de ordem estranha. É o direito de se administrar livremente, dentro de uma organização mais vasta, regida por um poder central. É o
direito de um indivíduo tomar decisões livremente; liberdade, independência moral ou intelectual.
Técnica é, segundo Houaiss, o conjunto de procedimentos ligados a uma arte ou ciência; é a parte material dessa arte ou ciência. [7]
Autonomia técnica é a capacidade de escolher e efetivar os meios mais adequados e melhor indicados para a realização das perícias criminais.
Já ciência é área sistematizada do conhecimento. Científico é algo aplicado à ciência ou na mesma adotado, com rigor e objetividade. Científico é aquilo voltado para o campo da ciência, que revela rigor científico. O que é científico deve possuir fundamentos precisos e metodológicos.
Autonomia científica pode ser entendida como a faculdade de se escolher as áreas do conhecimento que vão permitir aos peritos descobrirem, apurarem as condições em que os crimes investigados aconteceram.
Finalmente, autonomia funcional é uma decorrência da própria natureza do trabalho público no sentido de que os peritos não necessariamente são subordinados aos seus superiores hierárquicos para realizarem suas funções. As suas obrigações funcionais se esgotam na realização das perícias e não na subordinação hierárquica de acatar determinações superiores a respeito de como devem trabalhar ou de quais métodos e técnicas de análise devem utilizar para apurarem as condições em que aqueles crimes foram cometidos.
Artigo 3º. Regime jurídico
Em razão do exercício das atividades de perícia oficial de natureza criminal, os peritos de natureza criminal estão sujeitos a regime especial de trabalho, observadas a legislação específica federal e a de cada Estado-membro a que se encontrem vinculados.
O regime especial de trabalho tem a ver com o próprio conjunto de autonomias a que estão sujeitos os peritos criminais e com a necessidade de apresentarem resultados práticos. Aquilo que os peritos devem ser capazes de fazer, isto sim, é de apresentarem resultados práticos de todas as perícias que forem realizar.
O regime jurídico será o estatutário e com as particularidades geradas pelo conjunto de autonomias que possuirão os peritos de agora em diante.
Artigo 4º. Vetado.
A Mensagem 758, de 17.08.2009, do Presidente da República ao Presidente do Congresso Nacional (que é o Presidente do Senado Federal) explica as razões pelas quais foi vetado um dispositivo do projeto de lei então aprovado.
O veto ocorrido foi feito com base no artigo 66, §1º da Constituição Federal que prevê a participação do Presidente da República no processo legislativo e prevê a possibilidade deste último sancionar ou não o projeto de lei aprovado no Poder Legislativo.
É que o Presidente da República pode considerar o projeto, integral ou parcialmente, inconstitucional ou contrário ao interesse público.
Para motivar o seu veto, o Presidente da República se socorreu da opinião do Ministério da Justiça a respeito do artigo 4º do PL 204/2008 que previa que:
“As atividades de perícia oficial de natureza criminal são consideradas como exclusivas de Estado.”
Foi razão do veto o fato de que ao determinar as atividades de perícia oficial de natureza criminal exclusivas de Estado, o artigo 4º poderia suscitar a interpretação de que restariam derrogados os §§ 1º e 2º do art. 159 do Código de Processo Penal, que estabelecem a possibilidade de, na falta de perito oficial, a perícia criminal ser realizada por particulares designados pelo juiz.
Tais dispositivos representariam importantes garantias à adequada apuração das circunstâncias e autoria das infrações penais, e sua eventual derrogação pelo presente projeto de lei, de fato, não atenderia ao interesse público, haja vista o risco de paralisação de inquéritos policiais e ações penais que, dependendo de exame pericial, não pudessem contar, na comarca na qual tramitam, com perito oficial.
Observação
É obrigatório observar que, quando a lei prevê regime estatutário especial aos peritos criminais, e que previa a sua carreira como exclusiva de Estado, a lei era condizente com a realidade.
O veto presidencial, no entanto, pode acabar gerando situações inusitadas em que os particulares acabam tendo que realizar atividades típicas do Poder Público.
Prever peritos criminais particulares é o mesmo que privatizar as Polícias militar e civil; é o mesmo que confiar a particulares atividades que são essencial e naturalmente públicas.
Erraram o Ministro da Justiça e o Presidente da República. Errou também o Poder Legislativo ao não derrubar tal veto à mais nova lei em vigor no país.
Derrogar os dispositivos do Código de Processo Penal apontados seria mais condizente com a realidade atual do nosso país.
Artigo 5º. Peritos criminais: especialidades.
Observado o disposto na legislação específica de cada estado a que o perito se encontra vinculado, são peritos de natureza criminal os peritos criminais, peritos médico-legistas e peritos odontolegistas com formação superior específica detalhada em regulamento, de acordo com a necessidade de cada órgão e por área de atuação profissional.
Artigo 6º. Vigência.
A Lei nº 12.030 entrará em vigor no dia 17 de dezembro de 2009, 90 (noventa) dias após a data de sua publicação.
Conclusões.
Mais uma vez entrará em vigor no Brasil uma legislação cheia de boas intenções mas com erros técnicos que podem dificultar a sua plenitude de vigência.
Quero ressaltar que perícias criminais serem exercidas por particulares são uma grave afronta ao interesse público. O artigo que foi vetado pelo Presidente da República impediria q eu isto acontecesse.
Esta lei terá bastante utilidade prática, mas deixa de corrigir uma falha do Código de Processo Penal ao permitir a realização de perícias criminais por particulares, designados pelo juiz da causa.
Informações Sobre o Autor
Francisco Mafra.
Doutor em direito administrativo pela UFMG, advogado, consultor jurídico, palestrante e professor universitário. Autor de centenas de publicações jurídicas na Internet e do livro “O Servidor Público e a Reforma Administrativa”, Rio de Janeiro: Forense, no prelo.