A litigiosidade administrativa tributária municipal como instrumento da concretização da principiologia constitucional tributária

Resumo – Este artigo faz uma abordagem sobre uma das mais importantes ferramentas da esfera municipal tributária: o Processo Administrativo Tributário Municipal, como meio de concretização de direitos fundamentais, e de aproximação da Administração Tributária Municipal e contribuintes, através da concreta aplicação da principiologia constitucional tributária. A Constituição Federal de 1988 ao introduzir em seu texto os conceitos de garantia ao devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, elevou-os ao status de garantia fundamental. No mesmo texto, explicitou a repartição de competência das esferas governamentais, em especial o município, ampliando sua ingerência sobre o espaço local. Para tanto, faz-se necessário o estudo dos conceitos ali exarados pela Carta Magna e toda a principiologia atinente, em todas as etapas da litigiosidade tributária municipal, desde o ato de lançamento do tributo até a decisão em última instância administrativa. Num segundo momento, discorrer sobre os princípios informadores em grupos distintos, em razão da diferenciação doutrinária entre Procedimento Fiscal Municipal – fase administrativa de levantamento de dados – e Processo Administrativo Tributário Municipal – fase da litigiosidade administrativa por excelência.


Palavras-Chave: Processo Administrativo Tributário, Princípios Constitucionais, Administração Municipal.


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Resumen – Este artículo hace un abordaje sobre los desafíos encontrados tanto pela Administración Tributaria Municipal como de los contribuyentes en general, en frente de esta importante herramienta de la litigiosidad tributaria administrativa: él proceso administrativo tributario municipal. La Constitución de 1988 al introducir en su texto los conceptos de la garantía del debido proceso legal, la amplia defensa y lo contradictorio, subiéndolos al status de la garantía fundamental. En el mismo texto explicito la repartición de la capacidad de las esferas gubernamentales, en especial en la municipalidad, ampliando su capacidad de gerenciamiento sobre el espacio local. Para eso, es necesario el estudio de los conceptos allí expresados por la Carta Magna y toda la principiologia pertinente a todas las etapas de la litigiosidad administrativa tributaria adentro del contexto de la municipalidad, desde el lanzamiento del tributo hasta la decisión y la ultima instancia administrativa. Así, los principios informadores deben ser estudiados y puestos en grupos distintos, tiendo en cuenta la diferenciación entre Procedimiento Fiscal de la Municipalidad – fase administrativa del levantamiento de datos –  y Proceso Administrativo Tributario de la Municipalidad – fase de la litigiosidad administrativa por excelencia.


Palabras-llaves: Proceso Administrativo Tributario, Principios Constitucionales, Administración de la Municipalidad


Sumário: 1.Introdução 2.Os conceitos e fundamentos principiológicos constitucionais do processo administrativo tributário 3.Os principios informadores do procedimento e do processo administrativo tributário municipal 4.Considerações finais


INTRODUÇÃO


No Brasil, muitos tributos são exigidos, porém, somente na esfera Federal e estadual são contestados em sua regularidade e legalidade, seja na esperança de rever o lançamento, por serem claramente ilegais e obterem desde logo este reconhecimento; seja para procrastinar a exação, considerando que a discussão seja levada à tutela jurisdicional.


No entanto, possuímos vários tributos na esfera municipal que merecem atenção redobrada dos operadores do direito, dos contribuintes em geral e da administração fazendária. Considerando a desatenção com esta esfera tributária, as Administrações locais cometem inúmeros equívocos reiteradamente sem que haja o questionamento por parte dos contribuintes. Esta realidade denota a despreocupação tanto da Administração Pública, quanto dos procuradores constituídos para a defesa administrativa dos contribuintes.


 Mesmo os que contestam, que são poucos, não recebem o tratamento e o respeito que a Carta Magna preconiza em suas garantias fundamentais: o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório. Prazos não são cumpridos, direitos não são atendidos, minando a legalidade deste expediente administrativo tributário, que será, inegavelmente, inexistente, inválido e ineficaz.


Os contribuintes não reagem a atitudes ilegítimas da administração, o que os faz assumir prejuízos desnecessários por falta de conhecimento ou má orientação oferecida. Igualmente, abrem mão do uso valioso deste instrumento de contestação dos créditos tributários para ingressar diretamente com ações judiciais.


Sendo assim, faz-se necessária a análise da Principiologia Constitucional Tributária, base de toda fundamentação processual administrativa: ancoradouro de toda a litigiosidade entre a Administração Tributária e os contribuintes.


1 OS CONCEITOS E FUNDAMENTOS PRINCIPIOLÓGICOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO


Todo ancoradouro do processo administrativo tributário se perfaz em princípios constitucionais, expressamente formalizados no corpo da Carta Magna brasileira, que lhe dão origem e sustentabilidade.


Dos comandos constitucionais referidos, mencionados formalmente pela primeira vez em 1988 no corpo do texto da Constituição Federal Brasileira, extraímos os preceitos fundamentais desta matéria ao examinarmos seu artigo quinto, inciso LV, quer sejam: os conceitos de Processo Administrativo, Ampla Defesa, Contraditório, Meios e Recursos. Tais asserções englobam, todavia, tantos outros preceitos e garantias que a Magna Carta, de maneira inequívoca, alcançou ao contribuinte para a sua defesa contra aos atos das Administrações Públicas nas três esferas governamentais.


“Art. 5º, LV, CF/88 – Aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.” [grifo nosso]


O conceito de processo administrativo exprime a idéia de que os mecanismos de controle da legalidade dos atos administrativos devem obedecer a um princípio de jurisdicionalização, ou seja, ao modelo de processo que se desenvolve nos tribunais, ressalvadas as especificidades decorrentes, seja da natureza indisponível dos direitos em presença, seja da natureza não independente do órgão de julgamento, integrado na Administração.[1]


Qualificamos, portanto, como processo administrativo, aludido no inciso acima exposto, o procedimento de revisão dos atos administrativos de iniciativa dos administrados ou os procedimentos sancionatórios que lhes respeitam, assegurando aos particulares, tal como nos processos judiciais, o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.


Ainda, o fato de estar expressamente referido em um dos incisos do artigo 5º da Magna Carta, o processo administrativo foi elevado ao status de garantia fundamental.[2]


Como bem observa Odete Medauar em sua obra A Processualidade no Direito Administrativo, o direito de insurgir-se contra ato da Fazenda Pública na esfera administrativa torna-se mais que uma escolha do contribuinte: uma obrigação administrativa, pois


“a exigência de processo administrativo abrange, portanto, situações em que dois ou mais administrados apresentam-se em posição de controvérsia entre si, perante uma decisão a respeito que deva ser tomada pela administração, por exemplo, as situações de licitações, concursos públicos, licenciamento ambiental. E também os casos de controvérsia entre administrados (particulares ou servidores) e a Administração, como por exemplo, licenças em geral, recursos administrativos em geral, reexame de lançamento – processo administrativo tributário.” [3]


Já o Direito de Defesa e o Contraditório são, por seu turno, manifestações do princípio mais amplo do devido processo legal e o significado imediato deste direito constitucionalmente reconhecido é a exigência de que o exercício do poder jurídico-público se faça nos termos de um procedimento justo.[4] Tal implica para o particular afetado, em princípio, o direito de conhecer os fatos e o direito invocado pela autoridade, o direito de ser ouvido pessoalmente e de apresentar provas e, ainda, de confrontar as posições dos adversários.[5]


     Como enfatiza a doutrinadora Odete Medauar “o devido processo legal, sob o ângulo do poder público, consiste na obrigatoriedade de atuar mediante processo em determinadas situações”. E continua:


“A combinação dos incisos LIV e LV do artigo 5º resulta na imposição de processo administrativo que ofereça aos sujeitos oportunidade de apresentar defesa, suas provas, de contrapor seus argumentos a outros, enfim, a possibilidade de influir na formação do ato final. O devido processo legal desdobra-se, sobretudo, nas garantias do contraditório e ampla defesa, aplicadas ao processo administrativo”.[6]


“Art. 5º, inciso LIV: ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.” [7]


Para James Marins, que expõe o Devido Processo Legal como Princípio autônomo dos demais, que denota sentido estritamente processual e corresponde ao direito a uma estrutura lógica de garantias individuais de raiz constitucional, seja ao processo administrativo ou judicial, quais sejam: a) direito a impugnação administrativa à pretensão fiscal (art. 5°, LIV da CF/88); b) direito a autoridade julgadora competente (art.5° LIII); c) direito ao contraditório (art.5°, LV); d) direito à cognição formal e material ampla (art. 5°, LV); e) direito à produção de provas (art. 5°, LV); f) direito a recurso hierárquico (art. 5°, LV).[8] [9]


Podemos complementar, ainda, que o direito de ampla defesa, conceito extraído da Magna Carta, reveste hoje a natureza de um direito de audiência nos termos do qual nenhum ato administrativo suscetível de produzir conseqüências desfavoráveis para o administrado poderá ser praticado de modo definitivo sem que a este tenha sido dada a oportunidade de apresentar as razões (fatos e provas) que achar convenientes à defesa dos seus interesses. A expressão ‘defesa’ resulta de o princípio se ter consolidado historicamente nos procedimentos e processos administrativos de tipo acusatório, como os sancionadores – de que o paradigma é o processo disciplinar. Mas daí evoluiu para os procedimentos administrativos de tipo ablatório, tendente a restringir, por qualquer forma, a liberdade ou a propriedade do cidadão, em relação aos quais não se verifica uma acusação prévia, pelo que a intervenção do particular não visa uma ‘defesa’, em sentido próprio ou direito de audiência das suas razões. [10]


Com efeito, o próprio direito norte-americano, apenas reconhece a necessidade de ‘audiência prévia’ nos casos em que existe uma controvérsia sobre fatos e a discussão contraditória seja o método racional para o seu esclarecimento. Um exemplo de casos em que se considera que a discussão contraditória seria desnecessária é constituído pelas decisões baseadas numa aplicação mecânica de cálculos matemáticos, como o lançamento de tributos.[11]


Desta maneira, inconcebível seria a realização de audiência prévia dos interessados nos tributos que são lançados de ofício, pela autoridade fazendária, como o IPTU, por exemplo.


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Duas são as razões que desaconselham tal audiência: em primeiro lugar, o caráter estritamente vinculado do lançamento quanto ao seu conteúdo torna menos relevante a prévia ponderação de razões e interesses apresentados pelo particular do que nos atos discriminatórios; em segundo lugar, o fato de se tratar de um procedimento de massas, dirigido a um amplo universo de destinatários, tornaria praticamente inviável o desempenho da função, se submetida ao rito da prévia audiência individual.[12]


Assim, a garantia constitucional de ampla defesa não atua necessariamente pelo direito de audiência prévia a prática do lançamento, a qual os doutrinadores chamam de ato primário, mas sim através do direito de impugnação, ou de reclamação contra o lançamento, que será exercida após ato administrativo obrigatório, que é o lançamento tributário, pelo qual o particular toma a iniciativa da instauração de um processo administrativo em que o seu direito de audiência terá legitimidade concreta.


Podemos concluir desta feita, que o princípio do contraditório encontra-se relacionado com o princípio da ampla defesa por um vínculo instrumental; enquanto o princípio da ampla defesa afirma a existência de um direito de audiência do particular, o princípio do contraditório reporta-se ao modo do seu exercício.


 Esse modo de exercício,


“caracteriza-se por dois traços distintos: a paridade das disposições jurídicas das partes no procedimento ou no processo, de tal modo que ambas tenham a possibilidade de influir, por igual, na decisão; e o caráter dialético do método de investigação e de tomada de decisão, de tal modo que a cada uma das partes seja dada a oportunidade de contradizer os fatos alegados e as provas apresentadas pela outra.”


“O fato de ser assegurada a existência de um direito à defesa e à audiência não envolve necessariamente um modo contraditório do seu exercício, podendo a Administração limitar-se a considerar as razões apresentadas pelo administrado, sem, contudo se envolver num diálogo procedimental paritário. E daí a extrema relevância de o inciso do LV do artigo 5º da Constituição Federal assegurar cumulativamente a dupla garantia da ampla defesa e do contraditório. (XAVIER, 2005)” [13]


A impugnação administrativa constitui-se, por excelência, em resistência formal do contribuinte à pretensão fiscal do Estado sobre seus bens, e é direito que se assegura ao cidadão como meio de ver verificado o primado da legalidade através do devido processo legal.[14]


Esta impugnação, conforme Marçal Justen Filho (apud Marins, 2001) “é que caracteriza o conflito de interesses deduzido administrativamente, instaurando o litígio administrativo entre o órgão exator e o contribuinte, faz nascer o processo administrativo que recebe a incidência da norma constitucional garantidora da ampla defesa: contraditório e devido processo legal.


Esta ferramenta do contribuinte de utilizar todos os meios e os recursos previstos em lei para satisfazer a confirmação de sua contrariedade, como anteriormente referimos, foi elevada a status constitucional apenas em 1988, quando o texto da Magna Carta assegurou esta garantia, declarada expressamente aplicável aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral. [15] As constituições anteriores apenas referiam esta garantia aos acusados em matéria criminal.


A palavra meios, referida no texto constitucional se relaciona a todas as faculdades instrumentais indispensáveis para que a defesa se revista da amplitude requerida pela garantia outorgada.


Transpondo este conceito na matéria tributária processual administrativa, são os meios inerentes à ampla defesa, o direito de participação nos processos, o direito a informação, a fundamentação dos atos administrativos, a publicidade, a impossibilidade de provas obtidas por meios ilícitos, o direito à prova nos três corolários (o direito de acesso à prova, o direito à apreciação de prova e o direito à impugnação de prova).[16]


2 OS PRINCIPIOS INFORMADORES DO PROCEDIMENTO E DO PROCESSO ADMINISTRATIVO TRIBUTÁRIO MUNICIPAL


Feitas as considerações sobre os preceitos fundamentais e constitucionais que servem de base para a existência do processo administrativo tributário, passaremos a discorrer sobre os princípios que advém destes primados, divididos em Princípios do Procedimento Administrativo Tributário, Princípios do Processo Administrativo Tributário e Princípios Comuns às duas divisões.


Para Marcus Vinicius Neder, integrante do Conselho de Contribuintes de Brasília, os princípios informadores e reguladores do processo administrativo tributário resultam da miscelânea de três áreas da ciência jurídica: Direito Administrativo, Direito Tributário e Direito Processual Civil (informação verbal).[17]


O Direito Administrativo, como meio de revisão pela própria administração de seus atos; o Direito Processual Civil, com a autocomposição; e o Direito Tributário, como fase do processo de constituição do crédito tributário.[18]


No entanto, o doutrinador James Marins, relaciona e divide os princípios de maneira diversa, separando-os em Princípios comuns ao processo e o procedimento tributário, Princípios do procedimento administrativo tributário, e os Princípios do processo administrativo tributário.


Esta divisão recebe o nome de Quadro de Princípios[19] e representa as “diferenças entre o grupo de princípios aplicável que define a diferença da natureza da Ação Estatal: formalizadora (fiscalizatória ou apuratória) ou julgadora do litígio”. E continua:


“Esta afirmativa pode ser observada comparativamente: com o início do procedimento deve ser atendido o princípio da cientificação, segundo o qual o contribuinte deve ser formalmente comunicado de que o procedimento fiscalizatório está sendo realizado. O princípio da cientificação, no entanto, não implica abertura de contraditório, pois o princípio do contraditório irá presidir somente a etapa processual. Não há contraditório no procedimento administrativo, mesmo que o contribuinte seja chamado a se pronunciar ou a oferecer explicações sobre os atos ou documentos de interesse tributário.”


 


Princípios Constitucionais Gerais da Administração Pública

 

Princípio da Legalidade, Princípio da Finalidade,

Princípio da Razoabilidade, Princípio da Proporcionalidade,

 Princípio da Motivação, Princípio da Impessoalidade,

Princípio da Publicidade, Princípio da Moralidade,

 Princípio da Responsabilidade, Princípio da Eficiência.

 

Princípios comuns ao Procedimento e ao Processo Administrativo Tributário

 

Princípio da Legalidade Objetiva

Princípio da Vinculação

Princípio da Verdade Material

Princípio da Oficialidade

Princípio do Dever de Colaboração

Princípio do Dever de Investigação

 










Princípios do Procedimento Administrativo fiscal



Princípios do Processo Administrativo Tributário




 Princípio da Inquisitoriedade

Princípio da Cientificação

Princípio do Formalismo Moderado

Princípio da Fundamentação

Princípio da Acessibilidade

Princípio da Celeridade

Princípio da Gratuidade


 

Princípio do Devido Processo Legal

Princípio do Contraditório

Princípio da Ampla Defesa

Princípio da Ampla Instrução Probatória

Princípio do Duplo Grau de Cognição

Princípio do julgador competente

Princ. da Ampla competência Decisória



2.1 Princípios Comuns ao Procedimento e ao Processo Administrativo Tributário


Na divisão de James Marins, temos os seguintes princípios: Legalidade Objetiva significa que o processo deve ser instaurado com o fundamento nos estritos ditames da lei, para assegurar a sua adequada aplicação; o da Vinculação, em garantia adicional ao princípio da legalidade objetiva, a função tributária do Estado deve se realizar através da atividade administrativa plenamente vinculada; o da Verdade Material, em que se busca prova dos fatos que fundamentam a pretensão fiscal e a decisão jurídica aparece como fruto de uma discussão racional no processo; o da Oficialidade, segundo esse princípio, compete à própria Administração impulsionar o processo até seu ato-fim, adotando as providências necessárias para que o processo chegue ao seu término, mesmo nos casos em que tenha sido iniciado pelo contribuinte; o da Colaboração, no sentido de que todos têm o dever de colaborar com a Administração em sua tarefa de formalização tributária[20]. Tanto os contribuintes como terceiros, tem, não apenas a obrigação de fornecer documentos solicitados pela autoridade fazendária, mas também o dever de suportar as atividades averiguatórias, referentes ao patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas dos contribuintes e que possam ser identificados através do exame de mercadorias, livros, arquivos, documentos fiscais ou comerciais, etc.[21]; o de Investigação, pois o dever de investigar deve corresponder a poderes investigatórios. O código Tributário Nacional disciplina a fiscalização tributária em seus artigos 194 a 200[22], e cuida de estabelecer regras gerais concernentes aos poderes da administração no exame de mercadorias, livros, arquivos, documentos comerciais e fiscais e a obrigação do contribuinte e de terceiros em colaborar com a investigação fazendária.


2.2 Princípios do Procedimento Administrativo/Fiscal Tributário


Os princípios atinentes somente ao Procedimento Administrativo Fiscal representam a regular atuação do Agente Fiscal, bem como a participação do contribuinte no apuramento dos dados fiscalizados pela administração fazendária, quer sejam: o da Inquisitoriedade, que apesar do termo lembrar o período da inquisição da Igreja Católica, o procedimento preparatório que pode vir a se tornar um processo. É um inquérito, apuração e averiguação. No entanto, processo e inquisitoriedade são conceitos antagônicos: pois de for inquisitório não pode ser processo. No âmbito do procedimento fiscal ele significa uma atuação mais célere e eficaz por parte da Administração e a permissão ao contribuinte de participar no iter do julgamento, através dos poderes de ampla defesa, contraditório e recursos;[23] o da Cientificação, através deste princípio, assiste ao contribuinte o direito de ser notificado formalmente sempre que houver qualquer atividade administrativa que se refira à sua esfera de interesse jurídico, de modo a que se dê integral cumprimento ao princípio da cientificação. Deve ser tido como inválido e, portanto, insuscetível de amparar o lançamento fiscal todo o procedimento fiscalizatório ou apuratório realizado sem conhecimento do contribuinte. Vale relembrar, que esta cientificação não se aplica aos tributos de lançamento de ofício, no momento deste; o do Formalismo Moderado, segundo este princípio, o processo administrativo deve ser simples e informal, com requisitos mínimos indispensáveis a regular constituição e segurança jurídica dos atos que compõe o processo; o da Fundamentação, em que o autor Celso Antonio Bandeira de Mello define esse princípio como “o da obrigatoriedade de que sejam explicitados tanto o fundamento normativo quanto o fático da decisão, de molde a poder-se avaliar a procedência jurídica e racional perante o caso concreto”; o da Acessibilidade, em caráter complementar ao princípio anterior, o princípio da acessibilidade assegura ao contribuinte o acesso a qualquer expediente administrativo que se refira a sua esfera de interesse jurídico.[24] Não basta para o atendimento integral ao primado em tela pelo mero acesso aos autos: a acessibilidade deve ser útil. Alei 9.784/99, consagrou o princípio do acesso útil aos autos ao assegurar ao administrado a vista dos autos, e a faculdade de obter cópias de documentos neles contidos como também conhecer as decisões proferidas; o da Celeridade, na qual a investigação fiscal, como ato preparatório de lançamento, deve ser estruturado e conduzido de modo a que atinja celeremente seu escopo formalizador da obrigação e, portanto do crédito tributário, fonte indispensável de manutenção das atividades do Estado. [25] A celeridade procedimental reduz o desgaste decorrente do inevitável atrito na relação Administração Fiscal e contribuinte. A morosidade é cara e lesiva, é social e economicamente indesejável: procedimento administrativo bom é aquele que evita o desgaste entre fisco e contribuinte. Procedimento de baixo atrito é procedimento rápido; procedimento rápido é procedimento barato; e procedimento rápido e barato é procedimento eficaz;[26] o da Gratuidade, na qual os procedimentos e os processos administrativos fiscais devem ser gratuitos, sobretudo porque são realizados no atendimento do interesse do Estado em promover a autotutela tributária.      O artigo 2º, inciso XI, da Lei 9.784/1999, diz que o processo administrativo tributário deve pautar-se pelo critério da proibição de cobrança de despesas processuais, ressalvadas as previstas em lei. [27]


2.3 Os princípios do Processo Administrativo Tributário


De acordo com o Quadro de princípios acima exposto do autor James Marins, são os seguintes princípios que integram a litigiosidade administrativa: o do Devido Processo Legal, o do Contraditório, o de Ampla Defesa, que anteriormente já foram explanados; o da Ampla Instrução Probatória, eis que no âmago do princípio da ampla defesa emerge o direito a produção de provas, ou, mais propriamente, o direito à utilização de todos os meios de prova pertinentes à lide submetida a julgamento administrativo.[28] Estes meios de prova poderão ser materiais, como a apresentação de documentos técnicos – a produção de perícias contábeis ou a apresentação de pareceres jurídicos -, ou ainda meios pessoais, testemunhais, conforme demandar a natureza da lide;[29] o do Duplo Grau de Cognição, a idéia de revisão recursal dos julgamentos administrativos ou judiciais atende a necessidade de qualidade e segurança da prestação julgadora e é imperativo jurídico expresso no artigo 5°, LV da Constituição Federal de 1988.[30] Denomina-se de hierárquico o recurso que submete a revisão da decisão a órgão julgador, monocrático ou colegiado, de hierarquia superior, competente para a reapreciação e rejulgamento da lide fiscal. Para que se dê cumprimento ao dispositivo constitucional em tela, a estrutura administrativa destinada ao julgamento das lides fiscais deve comportar ao menos uma etapa de revisão hierárquica dos julgamentos fiscais. Segundo Celso Alves Feitosa, é de suma importância a existência de revisão hierárquica dos processos administrativos, justamente como forma de disponibilizar ao contribuinte demonstração de impessoalidade e imparcialidade da decisão proferida. Desta forma os órgãos de julgadores administrativos de segunda instância, formados, em regra, por uma composição paritária – representantes do órgão lançador e de seus segmentos da sociedade – dão garantia da impessoalidade e imparcialidade necessária e imprescindível à aplicação da Justiça Fiscal Administrativa[31]; o do Julgador Competente, este primado, que expressa o direito fundamental à autoridade julgadora competente, decorre explicitamente da dicção dos incisos XXXVII e LIII do artigo 5° da Constituição Federal, segundo os quais não haverá juízo ou tribunal de exceção e ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente, e condiciona todas as esferas administrativas, Federal, Estaduais e Municipais, a prover estrutura jurídica e funcional aptas para que a lide tributária possa ser conhecida por julgador ou tribunal administrativo competente, pré-constituído pela lei, ou seja, constituído de acordo com as regras vigentes e válidas antes da formalização da lide tributária;[32] e da Ampla Competência Decisória, na qual toda a matéria de defesa produzida pelo contribuinte deve ser conhecida e apreciada pelo órgão da administração encarregado do julgamento do conflito fiscal, apreciando matéria formal ou material, de direito ou de fato, questões preliminares ou de mérito. Em se recusando a administração em apreciar quaisquer elementos fáticos ou jurídicos que estejam contidos na impugnação formulada haverá restrição do direito a ampla defesa, a macular o processo administrativo fiscal.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


Está com um problema jurídico e precisa de uma solução rápida? Clique aqui e fale agora mesmo conosco pelo WhatsApp!

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, o processo administrativo tributário é elevado ao status de garantia fundamental. Do nascimento da norma decorrem princípios constitucionais, dentre eles o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório.   Destes, decorrem tantas outras garantias como os princípios do procedimento administrativo e do processo administrativo tributário.


Partindo da premissa de que o lançamento tributário apresenta vícios formais ou materiais, ou que o fato gerador da obrigação lançada não se conforma às disposições expressas da lei ou se funda em disposição inconstitucional, sem embasamento legal, resta evidenciada a motivação para ensejar o processo administrativo. Mas, muitas vezes, o lançamento apresenta-se inquestionável e, ainda assim, o contribuinte lança mão do processo administrativo, impugnando-o perante o órgão competente, com o único objetivo de adiar ou não pagar o que é devido a Fazenda Pública.


É indiscutível que o processo administrativo tributário é um instrumento valioso de solução de conflitos, de forma mais célere e menos dispendiosa, tanto para o contribuinte como para o próprio fisco, e tem por escopo a justiça fiscal.


Entretanto, a justiça administrativa não vem sendo alcançada como se espera, seja porque falta independência funcional dos julgadores que, quer queria ou não, normalmente seguem uma orientação do ente tributante, que os impede de livre apreciar o conflito; quer seja pela morosidade no julgamento, em flagrante prejuízo à administração pública; quer seja, porque considerando que o nosso sistema adota a teoria dualista, que implica em processos autônomos nas esferas administrativas e judiciais, ao cabo do processo administrativo, permanecendo incólume o lançamento, o contribuinte se utilizará das vias judiciais, repetindo todo o processo.


Por outro lado os municípios não se vêem pressionados a mudanças de paradigma, já que os próprios contribuintes desconhecem a natureza dos tributos que recolhem, seus fatos geradores, sua composição e suas formas de impugnação.


 


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Notas:

[1] XAVIER, Alberto. Princípios do Processo Administrativo e Judicial Tributário. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p.13.

[2] FISCHER, Octavio Campo (org.); GRIESBACH, Fabrício. O Processo Administrativo Tributário como Garantia Fundamental: Inconstitucionalidade do Recurso Hierárquico. São Paulo: [S.ed.], 2004. p. 89.

[3] MEDAUAR, Odete. A Processualidade no Direito Administrativo. S Paulo: [S.ed.], 1993. p. 37.

[4] Para James Marins, o Devido Processo Legal, Ampla Defesa e Contraditório são conceitos autônomos e não manifestações de um somente. Para o autor, a divisão ocorre de maneira mais objetiva: os conceitos são Princípios e estão contidos no grupo de princípios atinentes ao Processo Administrativo Tributário. (MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro. São Paulo: Dialética, 2001.)

[5] XAVIER, op. cit., p. 3.

[6] MEDAUAR, op. cit., p. 39.

[7] BRASIL. Constituição de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.

[8] Marins, James. Direito Processual Tributário Brasileiro. São Paulo: Dialética, 2001, p. 186-7.

[9] BRASIL. Constituição de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988.

[10] XAVIER, op. cit., p. 5.

[11] MANCHETE, Pedro. A Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo. Lisboa: [S.ed.], 1996, p. 147-8.

[12] XAVIER, op.cit., p. 16.

[13] XAVIER, op.cit., p. 16.

[14] MARINS, op. cit., p. 188.

[15] BRASIL. Constituição de 1988. Brasília: Senado Federal, 1988. Art. 5°, inc.LV.

[16] MOREIRA, Egon Bockmann. Processo Administrativo: Princípios Constitucionais e a Lei 9.784/1999. 2. ed. São Paulo: [S.ed], 2003. p. 93.

[17] Em palestra sobre Teoria Geral do Processo Administrativo Tributário, ministrada na Universidade do Vale do Rio dos Sinos, 2006.

[18] Ibidem.

[19]. MARINS, op. cit., p. 188.

[20] XAVIER, Alberto. A Execução fiscal nos tributos de Lançamento por Homologação. Revista Dialética de Direito Tributário, [S.l.], n. 25, julho de 2005.

[21] MARINS, op.cit., p. 178.

[22] Estes artigos do Código Tributário Nacional esmiúçam a atividade da fiscalização e os poderes a ela concernentes. Já os limites destes, estão elencados na Magna Carta, Artigo 5°.

[23] MARINS, op. cit., p. 180.

[24] MELLO, op. cit., p. 246.

[25] ATALIBA, Geraldo. Princípios Constitucionais do Processo e o Procedimento em Matéria Tributária. Revista dos Tribunais, São Paulo, n. 46, p. 118

[26] MARINS, op. cit., p. 184.

[27] BRASIL. Lei 9.784/1999. BRASIL. Brasília: Senado Federal, 1988.

[28] MELLO, Celso A. Bandeira. Curso de Direito Administrativo. 9.ed. São Paulo: Malheiros, 1998.

[29] MARINS, op. cit., p. 190.

[30] MELLO, op. cit., p. 246.

[31] FEITOSA, Celso Alves. Proc. Administrativo Fiscal. 3.v. São Paulo: Dialética, 1998, p. 40.

[32] MARINS, op. cit., p. 194.


Informações Sobre o Autor

Jeanine Cristiane Benkenstein Pinsent

Advogada, Especialista em Gestão Tributária pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS, Mestranda em Políticas Públicas de Inclusão Social pela Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC, Conselheira da Junta de Recursos Fiscais do município de Novo Hamburgo/RS, integrante do Grupo de Estudos sobre Políticas Públicas e Gestão Local da Universidade de Santa Cruz do Sul – UNISC.


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