Sumário: 1. Introdução – 2. Formas de extinção do crédito
do sujeito ativo da relação jurídica tributária – 3. Competência legislativa
para tratar da prescrição no custeio da
seguridade social – 4. A
prescrição como forma de extinção do crédito tributário – 4.1. A constituição definitiva do crédito
tributário como pressuposto para o termo inicial da prescrição – 5. Prescrição
do direito de ação do sujeito ativo da relação jurídica de custeio da
Seguridade social – 5.1. Prescrição qüinqüenal – 5.2. prescrição decenal – 5.3. prescrição trintenária – 6. suspensão e
interrupção da prescrição na relação
jurídica de custeio – 6.1. Interrupção do prazo prescricional – a) Citação pessoal
feita ao devedor – b) Protesto judicial –
c) Qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor – d) Qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que
importe reconhecimento do débito pelo devedor – 6.2. Suspensão do prazo
prescricional – 6.2.1. Diferenças entre suspensão do prazo prescricional e
suspensão da exigibilidade do crédito tributário – 6.2.2. suspensão da
prescrição e suspensão do processo executivo – 6.3. Prescrição
intercorrente – 7. Conclusões.
1. Introdução
A prescrição é uma das formas de extinção do
crédito de custeio da seguridade social. É o que se pretende demonstrar neste
trabalho.
No decorrer da exposição será fixado o ente
legislativo competente para legislar sobre a
prescrição, para determinar seus
termos iniciais e finais, além dos prazos das hipóteses prescricionais. Também
serão abordadas as disparidades jurisprudenciais e doutrinárias que cercam o
assunto, principalmente no que se refere às hipóteses de suspensão e
interrupção do tempo prescricional.
Em nenhum momento houve a pretensão de se esgotar
os argumentos sobre esta espécie prescricional, vez que tal figura jurídica
consta entre os temas mais debatidos pela doutrina. Nada obstante as idéias que
serão expostas, a matéria encontra-se plena de controvérsias.
2. Formas de extinção do crédito do sujeito ativo da
relação jurídica tributária
Para regular as condutas humanas, o direito lança
mão do mecanismo da relação, ou relação jurídica[1]. Segundo as
diretrizes traçadas pela teoria geral do direito, a relação jurídica é “um
vínculo abstrato segundo o qual, por força da imputação normativa, uma pessoa,
chamada de sujeito ativo, tem o direito subjetivo de exigir de outra, chamada
de sujeito passivo, o cumprimento de certa prestação”[2].
Este mecanismo fica bastante evidente quando
exemplificamos: supondo que o poder legislativo tenha instituído, através de
lei, uma contribuição social destinada à seguridade social, incidente, em
determinado tempo e espaço, sobre o faturamento de empresas prestadoras de serviços. A partir desta hipótese, toda
prestadora de serviços que tiver obtido faturamento deverá pagar ao órgão
segurador, em data fixada em lei, um percentual X deste faturamento a título de
contribuição social.
No momento em que ocorrer o fato na norma descrito,
bem como for obedecido o procedimento instrumental específico, nascerá um
vínculo abstrato entre a prestadora de serviços (sujeito passivo) e o órgão
segurador (sujeito ativo) por força da lei tributante. Este vínculo liga ambos
os sujeitos e cria um direito subjetivo para o sujeito ativo e um dever
jurídico para o sujeito passivo. É o vínculo que a doutrina chama de relação jurídica.
Entretanto, para que o órgão segurador possa
receber o montante que lhe é devido
existe um procedimento a ser seguido, este culmina com o lançamento
tributário, meio jurídico competente
para personalizar o crédito presente já
no nascimento da relação jurídica previdenciária de custeio[3].
Este dever jurídico de o sujeito passivo entregar aos cofres públicos um montante
determinado, nasce e morre. Seu nascimento é acertado durante o lançamento
tributário, enquanto sua morte ou extinção poderá ocorrer por intermédio de
várias formas, a principal delas é através do pagamento do valor fixado no
lançamento.
Afora essa hipótese, nos termos do art. 156, do
CTN, o sujeito ativo da relação de custeio também poderá ver extinto o seu
crédito pelos seguintes meios: compensação, transação, remissão, prescrição, decadência, conversão de
depósito em renda, pagamento antecipado e a homologação do lançamento nos
termos do disposto no artigo 150 e seus §§ 1º e 4º, consignação em pagamento,
nos termos do disposto no § 2º do artigo 164, decisão administrativa
irreformável, assim entendida a definitiva na órbita administrativa, que não
mais possa ser objeto de ação anulatória, e, decisão judicial passada em
julgado.
Para os fins do presente trabalho, apenas a
prescrição será analisada como forma de extinção do crédito de custeio.
3. Competência legislativa para tratar da prescrição no
custeio da seguridade social
A questão da competência legislativa para tratar da
prescrição passa pela análise do artigo 146, da CF/88. Dispõe o artigo citado:
“Art. 146. Cabe à lei complementar:
I – dispor sobre conflitos de competência, em
matéria tributária, entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios;
II – regular as limitações constitucionais ao poder
de tributar;
III – estabelecer normas gerais em matéria de
legislação tributária, especialmente sobre:
a) definição de tributos e de suas espécies, bem
como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos
fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e
decadência tributários;
c) adequado tratamento tributário ao ato
cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas”.
Esse dispositivo comporta interpretações divergentes: a
primeira considera a lei complementar superior às leis ordinárias criadas pelos
entes federativos, razão pela qual estes deverão obedecê-la; a segunda entende
caber à lei complementar apenas o constante dos incisos I e II acima citados, sendo aplicável o inciso III somente na
realização das hipóteses dispostas nos primeiros dois incisos. Segundo seus
defensores, este último entendimento
busca preservar o princípio federativo previsto no art. 1º, da Constituição, a
autonomia municipal (art. 30, da CF/88) e a isonomia entre os entes políticos.
A seguir serão apresentados posicionamentos doutrinários que se filiam a uma ou
outra corrente.
Para uma grande parte da
doutrina o art. 146 possui as seguintes funções: dispor sobre conflitos de
competência entre as entidades tributantes; regular as limitações
constitucionais ao poder de tributar e estabelecer normas gerais em matéria
tributária. Tendo esta última função o dever de uniformizar a regulamentação
dos principais institutos tributários para aplicação em todo o território
nacional e obrigar todos os entes tributantes.
A lei complementar que
veicula normas gerais tributárias possui um campo de atuação, atribuído pela
Constituição, distinto das demais normas ordinárias dos entes tributantes,
devendo ser seguida pelos legisladores tributários por ter caráter nacional,
por força do art. 146, III, da CF/88. A
lei nacional não se confunde com a lei federal, criada pela União em sua
condição de ente tributante autônomo. A lei nacional é criada pela União
Federal, através do Congresso Nacional, todavia, neste momento aquela estará
vestida com as roupas de ente global e não como pessoa tributante. E, nas
palavras da Professora MARIA DO ROSÁRIO ESTEVES, a nova pessoa (o Estado Federal), criada pela reunião das diversas
pessoas federadas, tem atribuições, competências e finalidades próprias,
distintas dos entes que a compõem, sejam eles a União ou os Estados-membros[4].
LUCIANO AMARO entende que
as normas gerais padronizam o
regramento básico da obrigação tributária, vicissitudes, extinção,
conferindo-se, dessa forma, uniformidade ao sistema tributário nacional[5].
SACHA CALMON NAVARRO COELHO completa, lecionando: “as
normas gerais de direito tributário veiculadas pelas normas complementares são
eficazes em todo o território nacional, acompanhando o âmbito de validade
espacial destas, e se endereçam aos legisladores
das três ordens de governo da Federação, em verdade, seus destinatários”[6].
Por fim, EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI, ao tratar sobre a
necessidade ou não de a prescrição ser regulamentada por lei complementar
recorda que a justificativa da Emenda 938 ao projeto da constituição de 1946,
proposta por ALIOMAR BALEEIRO, procurou evidenciar “na expressão ‘normas
gerais’ uma forma de vencer a resistência política à idéia de ‘atribuir à União
competência para legislar sobre direito tributário, amplamente e sem a
limitação contida no conceito de normas gerais, desde que esta legislação
tivesse a feição de uma lei nacional de preceitos endereçados ao legislador
ordinário dos três poderes tributantes: União, Estados e Municípios”[7].
Nesse sentido, as
decisões abaixo:
“TRIBUTÁRIO. IMPORTAÇÄO. Decadência e prescriçäo.
Princípio da reserva absoluta da Lei Complementar . (…) As hipóteses de
prescrição e decadência, em matéria tributária, são da reserva absoluta de lei
complementar (CF, art. 146, inc. III, alínea b, e CTN, art. 141), não se
admitindo interferência, nessa área, pelo legislador ordinário. Apelação
desprovida. Sentença confirmada, em sua conclusão”. [8]
“TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. REGÊNCIA PELAS NORMAS DO
CTN CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 146, III, B. CTN, ART. 174, CAPUT E PARÁGRAFO
ÚNICO E ART. 155, PARÁGRAFO ÚNICO. I. A
prescrição tributária, em consonância
com o disposto no art. 146, III, b da Constituição Federal, constitui matéria
reservada à lei complementar.(…)”[9].
Todavia, para PAULO DE
BARROS CARVALHO[10], se entendido em sua
literalidade o art. 146 sacode o
sistema, pois atribui à lei complementar toda a matéria tributária. Em vista
disso, buscando respeitar os princípios federativos e da autonomia municipal, o
autor fixa o conteúdo da expressão normas
gerais de direito tributário, afirmando que dispõem sobre: a)conflitos de
competência entre as entidades tributantes; b) regulam as limitações constitucionais
ao poder de tributar. E exemplifica: o legislador complementar, pode, pelo art.
146, III, a, definir tributos e suas
espécies? Sim, desde que disponha sobre conflito de competência. É possível,
ainda, que mexa na base de cálculo e nos contribuintes de um dado imposto? Sim,
se assim fizer para dispor sobre conflitos de competência, e assim por diante.
Segundo a interpretação de PAULO DE BARROS CARVALHO, as
normas gerais de direito tributário, previstas no art. 146, poderão tratar de
prescrição somente quando houver conflito de competência entre as entidades
tributantes e para regular as limitações constitucionais ao poder de tributar.
Tirante estas hipóteses a prescrição deverá ser regulada pela lei ordinária dos
entes tributantes.
No mesmo sentido, a lição de ROQUE ANTONIO CARRAZZA: “a
lei complementar em exame só poderá veicular normas gerais em matéria
tributária, as quais disporão sobre conflitos de competência, em matéria
tributária, ou regularão as limitações
constitucionais ao poder de tributar”[11].
EURICO MARCOS DINIZ DE SANTI, entretanto, argumenta que,
com o sentido dado por BALEEIRO, a fonte da qual derivou a “expressão normas gerais em matéria de legislação
tributária, não arranha o pacto federativo, como querem aqueles que levam
em consideração apenas os incisos I e II do art. 146. Pelo contrário, funciona
como expediente demarcador desse pacto, evitando eventuais conflitos
interpretativos entre as pessoas políticas, garante o postulado da isonomia
entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios”[12].
Particularmente, alinhamo-nos aos argumentos
alinhavados pelos que entendem aplicável à prescrição o CTN, por sua condição
de lei complementar.
4. A prescrição como
forma de extinção do crédito tributário
A prescrição tributária não é diferente daquela
prevista inadequadamente no direito civil. Consideramos a localização desta
última inadequada porque seu objeto é regulado por norma jurídica de natureza
processual civil e não pelo direito material, como faz supor a presença da
mesma na legislação civil. Esta observação tem importância apenas no plano
didático, já que no plano científico não possui qualquer relevância.
De forma muito concisa e na esteira da melhor
doutrina, entendemos a prescrição como: a perda do direito de ação judicial
pela inércia de seu titular em determinado espaço de tempo.
A prescrição está elencada como mecanismo extintivo
de crédito tributário[13],
definitivamente constituído.
Diz o art. 156, do CTN:
“Art. 156. Extinguem o crédito tributário;
V – a prescrição (…)”;
O critério material da hipótese prescricional é a
inércia absoluta do sujeito ativo da relação jurídica de custeio por
determinado período previsto em lei. O comportamento humano, no caso, é manter-se inerte durante o tempo legalmente
fixado. Todavia, a prescrição somente ocorrerá se, cumulativamente à
inércia do titular do direito, ocorrer o
exaurimento integral do tempo fixado na lei.
Segundo o art. 174, do CTN, a prescrição
configura-se do seguinte modo:
“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário
prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição definitiva”.
Da análise do artigo acima decorre o seguinte:
nascida uma relação jurídica tributária (ou de custeio da Seguridade Social) e
sendo exigível o crédito tributário ínsito a esta relação, o sujeito passivo
deverá entregar ao sujeito ativo o valor devido. Acaso assim não proceda
nascerá um conflito jurídico entre as partes, vez que uma terá direito ao
recebimento do valor do tributo e a outra não quererá entregar-lhe o montante devido.
A resistência do sujeito passivo em efetuar o
pagamento proveniente da relação jurídica tributária é o critério material da
hipótese processual que garante ao
sujeito ativo o direito de pedir ao Poder Judiciário uma providência
jurisdicional para obrigar o devedor a entregar-lhe seu crédito.
No momento em que acontecer a resistência do
devedor, surgirá o chamado interesse processual do credor, autorizando-o a
propor a competente ação de execução do crédito tributário que possui (CPC,
art. 3.º).
Ressalte-se, porém, que “a ação para cobrança do
crédito tributário pressupõe a incidência da regra matriz da exigibilidade do crédito tributário. E esta supõe
em sua hipótese o lançamento e o termo
final do prazo de pagamento, qualificado pelo inadimplemento do sujeito
passivo”[14].
Somente quando satisfeitos esses requisitos é que
se há de falar em direito da ação do credor tributário, ainda que não seja pela
via executiva, pois, para isto exige-se aquele título extrajudicial
consubstanciado no ato administrativo de inscrição da dívida ativa[15].
Cumpridos os requisitos, no momento em que o
sujeito ativo da relação jurídica tributária possuir o direito de ação contra o
sujeito passivo, será iniciada a contagem do prazo previsto na lei
prescricional. Nas situações em que for aplicável o art. 174, CTN, por exemplo,
este será o termo inicial do prazo de 5 anos ali disposto.
Importante reafirmar: não é o exaurimento do tempo
de 5 anos, contados a partir da exigibilidade do crédito tributário, que faz
incidir a norma prevista no art. 174, mas, a inércia do sujeito ativo da
relação tributária durante todo este período.
Então,“o fato prescricional só se consolidadará
quando completada a extensão temporal de suporte fáctico previsto na regra. Em
verdade, o fato da norma jurídica de prescrição só pode ser considerado como
fato jurídico no termo final do prazo juridicamente qualificado, antes disso
não há fato jurídico, mas tão apenas
fluxo de tempo e conduta”[16].
Numa palavra: só haverá fato prescricional se o
crédito tributário for exigível e o titular deste manter-se inerte durante o
decurso de tempo fixado na lei.
4.1. A constituição
definitiva do crédito tributário como pressuposto para o termo inicial da
prescrição
Para que seja iniciada a contagem do prazo
prescricional é necessário que o crédito
tributário esteja constituído definitivamente, é o que dispõe o art. 174, supra
citado.
A doutrina e jurisprudência divergem acerca da
interpretação deste artigo de lei. ALBERTO XAVIER entende que, no contexto do
art. 174, do CTN, lançamento definitivo “não
é o lançamento imutável na órbita administrativa, mas o lançamento que conclui
o respectivo procedimento administrativo e foi regularmente notificado”[17].
Corroborando este entendimento, segue a
jurisprudência da 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça:
“TRIBUTÁRIO – CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO – MARCO
INICIAL DA PRESCRIÇÃO – NECESSIDADE DE LEI COMPLEMENTAR – A constituição
definitiva do crédito tributário ocorre com o lançamento regularmente
notificado ao sujeito passivo. O Código Tributário Nacional, que é lei
complementar, se sobrepõe à Lei nº 6.380/80, que é lei ordinária. Recurso
improvido”.[18]
Por outro lado, HUGO DE BRITO MACHADO, com base na
jurisprudência do STF e do antigo TFR, entende que ocorrerá o lançamento definitivo quando não for
possível nenhuma espécie de recurso administrativo, ou seja, quando a Fazenda
Pública tiver ação para fazer a cobrança[19].
Nessa divergência, adotamos a orientação do
professor XAVIER, entendendo que estará definitivamente constituído o crédito
tributário no momento em que o sujeito passivo da relação tributária for
notificado.
5. Prescrição
do direito de ação do sujeito ativo da relação jurídica de custeio da
seguridade social
A prescrição prevista no art. 156, V, do CTN,
possui natureza processual, assim como a constante no Código Civil, entretanto,
sua versão tributária não se identifica totalmente com a prevista na legislação
civil.
A diferença entre a prescrição tributária e a
prescrição civil está em que, a ocorrência da primeira, além do direito de
ação, extingue o crédito tributário representativo da relação jurídica
material, enquanto que na segunda, o direito de ação extingue-se, mas não atinge
a obrigação material subjacente, que permanece como obrigação natural. A
obrigação natural é aquela que não conta com a proteção jurisdicional, mas, se
o devedor quiser quitá-la poderá fazê-lo; enquanto a obrigação natural, se for paga, não poderá ser repetida pelo
devedor.
Diverso é o que ocorre com o crédito tributário
que, segundo o CTN, extingue-se definitivamente com a ocorrência da prescrição.
Neste caso, mesmo que queira, o devedor tributário não poderá efetuar o
pagamento, pois já não mais existe crédito a ser quitado.
Sobre o assunto, Hugo
de Brito Machado alerta: “Se a prescrição atingisse apenas a ação
para cobrança, mas não o próprio crédito tributário, a Fazenda Pública, embora
sem ação para cobrar seus créditos depois de cinco anos de definitivamente
constituídos, poderia recusar o fornecimento de certidões negativas aos
respectivos sujeitos passivos. Mas como a prescrição extingue o crédito
tributário, tal recusa obviamente não se justifica”.[20]
Nada obstante isso, pedimos a atenção para um outro
ponto fundamental na discussão da prescrição das contribuições destinadas à
Seguridade Social: a lei aplicável à matéria. Qual das normas prescricionais
existentes é a adequada para incidirsobre o crédito proveniente da relação
jurídica de custeio?
A doutrina e a jurisprudência se dividem ao
responder esta indagação. Alguns
entendem que a lei aplicável às contribuições sociais destinadas à Seguridade
Social é o Código Tributário Nacional; outros defendem a aplicação da Lei n.
8.212/91; uma terceira linha argumenta sobre a vigência e aplicação do art. 144, da Lei nº 3.807/60 à espécie.
Esse conflito de normas é aparente, mas sua solução
é muito importante, haja vista que a primeira prescreve como tempo
prescricional o exaurimento integral de 5 anos, a segunda fixa o prazo
prescricional em 10 anos e a terceira em
30 anos. Na seqüência serão tecidos alguns comentários sobre cada uma dessas
leis e os prazos que estabelecem,
ressaltamos, porém, que consideramos mais adequada a aplicação do Código Tributário
Nacional à matéria.
5.1. Prescrição
qüinqüenal
A prescrição regulada pelo Código Tributário
Nacional concede o prazo de 5 anos para que o sujeito ativo da relação jurídica
de custeio mantenha-se inerte. Na lição de PAULO DE BARROS CARVALHO, “com o lançamento
eficaz, quer dizer, adequadamente notificado ao sujeito passivo, abre-se à
Fazenda Pública o prazo de cinco anos para que ingresse em juízo com a ação de
cobrança (ação de execução). Fluindo esse período de tempo sem que o titular do
direito subjetivo deduza sua pretensão pelo instrumento processual próprio,
dar-se-á o fato jurídico da prescrição. A contagem do prazo tem como ponto de
partida a data da constituição definitiva
do crédito, expressão que o legislador utiliza para referir-se ao ato de
lançamento regularmente comunicado (pela notificação) ao devedor.”[21].
Em seus comentários, o professor PAULO DE BARROS
não está se referindo especificamente às contribuições sociais destinadas à
Seguridade Social. Todavia, em vista da
natureza tributária das referidas contribuições sociais, o comentário citado é
pertinente também a estas.
Novamente, citamos o Código:
“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito
tributário prescreve em 5 (cinco) anos, contados da data da sua constituição
definitiva”.
Se após constituído o crédito tributário
definitivamente, o devedor não efetuar o pagamento no prazo máximo de 30 dias
(se outro prazo não foi estabelecido), então, surgirá o direito de ação ao
credor tributário.
Surgido o direito de ação ao credor, se este permanecer
inerte durante o período de 5 anos, ocorrerá a prescrição, ou seja, haverá a
perda deste direito de ação.
5.2. prescrição
decenal
Por outro lado, vige a Lei nº 8.212/91 que criou a
organização da Seguridade Social e instituiu o plano de custeio. Esta lei, em
seu artigo 46, dispõe especialmente sobre a prescrição no custeio, in verbis:
“Art. 46. O direito de cobrar os créditos da
Seguridade Social, constituídos na forma do artigo anterior, prescreve em 10
(dez) anos”.
O Decreto Regulamentar n.º 3.048/99, em seu art.
349, praticamente repete o dispositivo da lei regulamentada. In verbis:
“Art. 349. O direito da seguridade social de cobrar seus
créditos, constituídos na forma do artigo anterior, prescreve em dez anos”.
Apesar de ser uma lei especial, tratou de matéria
que, segundo o art. 146, III, da CF/88, deveria ser regulada por intermédio de
lei complementar. Em vista disso, parte da doutrina entende que é clara a
contrariedade entre esta lei ordinária e o Texto Maior.
No mesmo sentido, ao comentar a prescrição, sob o
ponto de vista da Lei n.º 8.212/91, posiciona-se EURICO DE SANTI: “Por não se
tratar de lei complementar, entendemos que os dispositivos desta Lei afrontam
expressamente a Carta Magna, apresentando-se incompatíveis com os requisitos constitucionais
para produção dessa categoria de normas jurídicas, devendo, destarte, ser
submetidos ao respectivo controle de constitucionalidade para cumprir o
disposto no Texto Supremo”[22].
Também adotou esse entendimento o Ministro CARLOS
VELLOSO no R.E. 138284-8/CE[23]:
“A questão da prescrição e da decadência entretanto parece-me pacificada. É que
tais institutos são próprios da Lei Complementar de normas gerais (art. 146,
III, b). Quer dizer os prazos de prescrição e de decadência inscritos na Lei
Complementar de normas gerais (CTN) são aplicáveis, agora, por expressa
previsão constitucional, às contribuições parafiscais (CF artigos 146, III, b,
e art. 149).”
Em sentido contrário, parte da doutrina entende que
esta lei é plenamente constitucional, uma vez que cada ente tributante tem
competência para criar, por intermédio de lei ordinária, seus tributos e o modo
através do qual eles serão extintos, ficando para a lei complementar a matéria
prevista no art. 146, II e III no caso específico do inciso I do mesmo
dispositivo constitucional.
5.3. prescrição
trintenária
Um terceiro entendimento, este seguido por poucos,
sobre o tempo prescricional aplicável às contribuições sociais destinadas à
Seguridade Social, defende a vigência e aplicabilidade do art. 144 da Lei n.º
3.807/60, por força do art. 2º, 9º, da Lei n.º 6.830/80.
O art. 2º, §9º, da Lei n.º 6830/80 (LEF),
prescreve: o prazo para a cobrança das
contribuições previdenciárias continua a ser o estabelecido no artigo 144 da
Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960.
O texto do art. 144, da Lei nº 3.807/60 (LOPS),
assim dispõe:
“Art.144. O direito de receber ou cobrar as
importâncias que lhes sejam devidas, prescreverá, para as instituições de
previdência social, em trinta anos”.
6. Suspensão e interrupção da prescrição na relação jurídica de custeio
Demonstrada nossa posição quanto a competência
constitucional para regulamentar o instituto da prescrição incidente sobre os
créditos destinados à Seguridade Social, bem como a legislação que consideramos
aplicável à espécie, passamos à análise de outros pontos igualmente relevantes.
Um deles é que, assim como na prescrição civil, a
prescrição tributária também poder ser “interrompida” ou “suspensa”.
6.1. Interrupção
do prazo prescricional
Apesar de ser voz
corrente a expressão interrupção ou supensão da prescrição, na verdade, isso
não ocorre. A prescrição não se interrompe ou se suspende. O que resta
interrompido ou suspenso é o tempo e não a prescrição.
Por exemplo, se para
ocorrer o fato prescricional for necessário o decurso de 5 anos, ou 1825 dias,
de inércia do titular do direito de ação, somente no dia de n.º 1826 terá
ocorrido a prescrição. Este é o critério temporal da hipótese prescricional. O
critério material caracteriza-se pela inércia do titular do direito de ação.
O dia de n.º 800 ou qualquer outro durante o
interregno mencionado são momentos compositivos do tempo que levará à prescrição. Esta não ocorrerá
dia a dia, mas apenas após o término de todos os dias mencionados.
O que ocorrerá no dia de
n.º 800, em caso de atividade do titular,
será a interrupção do tempo e não da prescrição. Novo termo inicial
passará a ser contado a partir do dia seguinte à atividade do credor
tributário, mediante a incidência da norma prescricional de reinicio. E, assim,
sucessivamente.
Orientando o nosso entendimento está a
lição escorreita do Prof. PAULO DE BARROS CARVALHO, que exorta: “A prescrição,
como fato jurídico que é, não se interrompe nem se suspende. Aquilo que se
interrompe é o intervalo de tempo que, associado à inércia do titular da ação,
determina o surgimento do fato prescricional”[24].
E continua o referido mestre: “As
causas previstas no parágrafo único do art. 173[25],
uma vez ocorridas, têm a força de interromper o fluxo temporal que termina com
a prescrição. Interrompido o curso do tempo, cessa a contagem, começando tudo
novamente, isto é, computando-se mais cinco anos”[26].
É por ser retomada nova contagem que a interrupção
do prazo beneficia todos os sujeitos solidários, salvo disposição em contrário,
conforme dispõe o art.125, III, do CTN.[27]
Nada obstante o entendimento exposto, seguiremos a
terminologia adotada pela lei tributária, ao dispor no artigo 174 do CTN,
parágrafo único, quatro causas de interrupção
da prescrição. Estas causas são as seguintes:
1. citação
pessoal feita ao devedor;
2. protesto
judicial;
3. qualquer
ato judicial que constitua em mora o devedor;
4. e
qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do
débito pelo devedor.
a) Citação pessoal feita ao
devedor
O art. 8º, §2º, da Lei de Execuções Fiscais,
prescreve uma causa interruptiva da prescrição tributária. In verbis:
“Art. 8º. O executado será citado para, no prazo de 5 (cinco)
dias, pagar a dívida com os juros e multa de mora e encargos indicados na
Certidão de Dívida Ativa, ou garantir a execução (…).
§ 2º. O despacho
do juiz, que ordenará a citação,
interrompe a prescrição”.(grifo nosso)
Há um conflito aparente de normas entre o parágrafo
transcrito e o disposto no art. 174, par. único, I, do CTN. O primeiro prescreve
que o despacho será a causa
interruptiva, enquanto segundo fixa a citação
como o fato jurídico causador da cisão do tempo cujo decurso resultará na
perda do direito de ação.
O conflito entre as normas é aparente porque nos
termos do art. 146, da CF/88, caberá à lei complementar regular a prescrição.
Deste modo, e utilizando-nos do critério hierárquico para solucionar o conflito
das normas, deverá ser aplicado ao caso o art. 174, parágrafo único, I, do CTN.
Nesse sentido, citamos um trecho de recente decisão:
“TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL.
CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INTERRUPÇÃO COM A CITAÇÃO. CTN,
ART. 174, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO CONFIGURAÇÃO
NO CASO DE PARALISAÇÃO DO PROCESSO DECORRER DOS MECANISMOS DA JUSTIÇA E DE
ENTRAVES CRIADOS PELO EXECUTADO. I. (…) II. Nos termos do art. 174, parágrafo
único, I do CTN, é a efetiva citação que interrompe a prescrição tributária
(…)”.[28].
E, ainda:
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS AO
EXECUTIVO FISCAL. PRAZO DECADENCIAL E PRESCRICIONAL. INAPLICABILIDADE DO ART.
2, PARÁGRAFO 3, E DO ART. 8, PARÁGRAFO 2, AMBOS DA LEI N. 6.830/80, FACE À SUA
NÃO RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA..1. (…) 4. O art. 8, parágrafo
2.º, da Lein.º. 6.830/80, não foi recepcionado pela vigente Constituição
Federal, na medida em que, disciplinado matéria alusiva à prescrição
tributária, não o fez por lei complementar, mas por lei ordinária, afrontando,
ainda, o que dispõe o art. 174, I do CTN, veiculado por lei hierarquicamente
superior, ou seja, por lei complementar.(…)”.[29]
Do exposto, entendemos que a citação é
o instrumento jurídico hábil para fazer interromper o tempo prescricional.
B) Protesto judicial
O protesto judicial é uma medida acautelatória
promovida pelo credor tributário para prevenir direitos ou resguardar
responsabilidades [30].
Sua função como causa interruptiva da prescrição
tributária ocorre no momento da citação da parte requerida. Esta peculiaridade
é evidenciada na decisão abaixo:
“PRESCRIÇÃO – AÇÃO DE RESSARCIMENTO DE CRÉDITOS
FISCAIS – DL 491/69 – PRESCRIÇÃO DO INCENTIVO E SUA INTER-RUPÇÃO DO INCENTIVO E
SUA INTERRUPÇÃO PELO PROTESTO – CORREÇÃO PARCIAL – CONVERSÃO CAMBIAL –
CONVERSÃO DO INCENTIVO EM DINHEIRO – (…) Em face do nosso direito, a interrupção
da prescrição por efeito do protesto
judicial, conta-se da data da intimação da parte requerida (CC, art. 171,
II). (…)”.[31] (
(grifo nosso)
No mesmo sentido:
“PROTESTO JUDICIAL – INTERRUPÇÃO DA PRESCRIÇÃO – Se
a ação é precedida de protesto judicial, a prescrição se interrompe na data da
citação deste (CC, art. 172)”.[32]
C) Qualquer ato judicial que
constitua em mora o devedor
A aplicação do art. 174, par. único,
III, do CTN, ocorre através de um ato judicial, seja interpelação, notificação,
intimação judicial ou mesma uma ação judicial.
D) Qualquer ato inequívoco,
ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do débito pelo devedor
Assim como nos casos descritos nas alíneas “a”, “b”
e “c”, na hipótese em tela pressupõe-se
que o crédito da Seguridade Social já esteja definitivamente constituído, o
termo inicial do prazo tenha ocorrido e não esteja suspenso por qualquer motivo
legal (art. 151, do CTN).
O art. 174, parágrafo único, IV, do CTN dispõe que
qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do
débito pelo devedor, será suficiente para fazer cindir o lapso temporal fixado
para a ocorrência da prescrição. Este ato poderá ser, por exemplo, um pedido de
parcelamento, o reconhecimento expresso etc.
6.2. Suspensão do prazo
prescricional
Além das causas interruptivas do decurso do tempo
prescricional, existem situações previstas em lei que, se ocorridas, suspendem
este tempo. Encontramos a orientação de que
uma delas é a prevista abstratamente no art. 2º, §3º, da LEF:
“Art. 2º. Constitui Dívida Ativa da Fazenda Pública
aquela definida como tributária ou não-tributária na Lei nº 4.320, de 17 de
março de 1964, (…).
§ 3º. A inscrição,
que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita
pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos
os efeitos de direito, por 180 (cento e oitenta) dias ou até a distribuição da
execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo”.(grifo nosso).
Do artigo citado decorre que, o ato de inscrição do
crédito tributário na dívida ativa provoca a suspensão do prazo prescricional
já iniciado quando da constituição definitiva do referido crédito. Esta
suspensão será pelo prazo de 180 dias a contar da realização do ato de
inscrição. Tal prazo será menor se antes de decorridos os 180 dias tiver
ocorrido a distribuição da execução fiscal.
Naturalmente, após distribuída a execução já não
mais ocorrerá a retomada do prazo prescricional existente antes da incidência do
art. 2º, §3º, uma vez que a hipótese, neste caso, será de interrupção
definitiva do prazo prescricional, se desta distribuição resultar a citação
válida do devedor tributário, de agora em diante chamado de executado.
Se adotada a tese de que a lei n.º 6.830/80 está
regulamentando indevidamente a matéria
prescricional, já que a lei adequada é a complementar (CTN), esta hipótese de
suspensão deixou de ser válida a partir da CF/88. Este posicionamento também
está expresso na ementa que segue:
“DIREITO PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS AO
EXECUTIVO FISCAL. PRAZO DECADENCIAL E PRESCRICIONAL. INAPLICABILIDADE DO ART.
2, PARÁ-GRAFO 3, E DO ART. 8, PARÁGRAFO 2, AMBOS DA LEI N. 6.830/80, FACE À SUA
NÃO RECEPÇÃO PELA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.(…)2. Não se cogita da suspensão
de que trata o art. 2º, parágrafo 3º, da Lei n.º 6.830/80, uma vez que tal
dispositivo legal não foi recepcionado pela vigente Constituição da República,
a qual, em seu art. 146, III, , “b”, dispõe caber a lei complementar
estabelecer normas gerais em matéria de
legislação tributária, especialmente,
sobre prescrição e decadência (…)”. [33]
6.2.1. Diferenças entre suspensão
do prazo prescricional e suspensão da exigibilidade do crédito tributário
O procedimento de suspensão do tempo prescricional
é diferente do de suspensão da exigibilidade do crédito tributário destinado à
Seguridade Social. Para que o primeiro seja suspenso é necessário que tenha um
termo inicial, ou seja, tenha tido um
início. Todavia, a suspensão do decurso do tempo prescricional não está ligada
necessariamente à suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Mesmo
porque, às vezes, esta última ocorre sem que a primeira tenha tido um termo
inicial.
PAULO DE BARROS CARVALHO esclarece essa situação
através de um exemplo: “Lavrado o ato de lançamento, o sujeito é notificado,
por exemplo, a recolher o débito dentro de trinta dias ou a impugná-lo no mesmo
espaço de tempo. É evidente que nesse intervalo a Fazenda ainda não está
investida na titularidade da ação de cobrança, não podendo, por via de
conseqüência, ser considerada inerte. Se o suposto devedor impugnar a
exigência, de acordo com as fórmulas do procedimento administrativo específico,
a exigibilidade ficará suspensa, mas o prazo de prescrição não terá sequer iniciado”[34].
E continua o mestre: “Surge a dúvida em outras
hipóteses, como a da moratória, do depósito do montante integral do crédito e
da concessão de medida liminar em mandado de segurança. Muitas vezes pode
coincidir que, à suspensão da exigibilidade do crédito, fique igualmente
suspenso o seguimento do prazo prescricional. A coincidência, entretanto, exige
que a suspensão da exigibilidade se dê em átimo subseqüente àquele em que o
sujeito ativo teve condições de acesso à ação judicial de cobrança”[35].
6.2.2. suspensão da prescrição e
suspensão do processo executivo
Igualmente, são realidades distintas a
suspensão do exaurimento do tempo prescricional e a suspensão do processo de
execução fiscal.
A Lei de Execuções Fiscais, em seu art. 40, assim
dispõe:
“Art. 40. O juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o
devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses
casos, não correrá o prazo de prescrição”.(grifo
nosso)
Do artigo acima transcrito constam duas hipóteses normativas,
ambas processuais; uma que se refere à suspensão do processo executivo e outra
que estabelece um prazo indeterminado (mas determinável) de suspensão do tempo prescricionial.
Se durante o processo de execução fiscal não forem
encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, então, o juiz deverá
decretar a suspensão do processo executivo, que teve início a partir da
propositura da ação executiva, pelo sujeito ativo da relação de custeio.
Se suspenso o processo executivo por ausência dos
referidos bens, então, o juiz deverá decretar a suspensão da prescrição
enquanto não forem encontrados os bens penhoráveis. As duas providências,
prescritas no art. 40, da LEF, não estão
facultadas ao juiz, mas, lhes são impostas.
Este entendimento, todavia, merece uma consideração
importante: se o tempo prescricional já foi interrompido com a citação válida,
é certo que, naquele momento instaurou-se a relação jurídica processual e foi
exercido o direito de ação pelo sujeito ativo da relação de custeio. O tempo de
inércia que se passou não possuirá mais relevância jurídica a partir de sua
interrupção, pois, não alcançou a integralidade do prazo legal.
Logo, não haverá como ser suspenso o referido tempo
como previsto no art. 40, acima citado, uma vez que aquele tempo, juridicamente
não mais existirá no momento da suspensão do processo executivo.
Sob este ponto de vista, dizer que a suspensão do
processo (resultado do exercício do direito de ação) é um pressuposto para a suspensão da prescrição é
desconcertante.
Esse desconcerto não existe, todavia, para aqueles
que admitem a possibilidade de prescrição intercorrente.
6.3. Prescrição intercorrente
A prescrição intercorrente é aquela que ocorre pela
paralisação injustificada, por 5 anos, do processo de execução.
Há divergências doutrinárias e jurisprudenciais,
quanto à possibilidade de ocorrência dessa espécie prescricional. De um lado,
há quem entenda ser de possível ocorrência; de outro lado, há quem discorde
deste posicionamento.
Admitindo a prescrição intercorrente, a decisão do
STJ relatada pelo Ministro José Delgado:
“Após o decurso de determinado tempo sem promoção
da parte interessada, deve-se estabilizar o conflito, pela via da prescrição,
impondo segurança jurídica aos litigantes” (STJ, REsp. 208345/PR).
Os que admitem a prescrição intercorrente alertam,
entretanto, que a paralisação ensejadora da prescrição deverá advir da inércia
ou desinteresse do exeqüente e não de eventual demora durante a prestação
jurisdicional ou obstáculo criado pelo executado.
Neste sentido, o decisum:
“TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL.
CONSTITUIÇÃO DEFINITIVA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO. INTERRUPÇÃO COM A CITAÇÃO. CTN,
ART. 174, CAPUT E PARÁGRAFO ÚNICO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. NÃO CONFIGURAÇÃO
NO CASO DE PARALISAÇÃO DO PROCESSO DECORRER DOS MECANISMOS DA JUSTIÇA E DE
ENTRAVES CRIADOS PELO EXECUTADO. (…). III. A prescrição intercorrente, embora admitida no contexto das
relações tributárias, não pode ser
reconhecida no caso de a paralisação do processo decorrer dos mecanismos da
justiça e de obstáculos criados pelo executado. (…)”[36].
(grifo nosso)
Ao contrário, EURICO DE SANTI entende que: “a
prescrição extingue o direito de ação, e não o processo executivo fiscal”[37].
Nessa mesma linha de entendimento, ANTÔNIO LUÍS CÂMARA LEAL
leciona: “Uma vez, pois, que a
interrupção da prescrição se dá pela citação para a demanda judicial, ou pela alegação do direito em juízo,
subordinando-o ao pronunciamento da sentença, a prescrição se torna impossível,
durante o processo, porque não mais se poderá atribuir ao titular a inércia e a
negligência, suas causas eficientes, e, por isso, enquanto dura a demanda, não
se inicia um novo prazo prescricional”[38].
7. Conclusões
1. O dever jurídico de entregar aos cofres do ente
segurador um montante determinado nasce pela incidência da lei de custeio,
sendo que este dever figura numa das pontas da chamada relação jurídica de custeio.
2. Este dever jurídico, da mesma forma que nasce,
também se extingue. Várias são as formas de sua extinção, uma delas é pela
prescrição.
3. A prescrição aplicável ao custeio da Seguridade
Social é regulada pelo CTN, na condição de lei complementar, pois, o artigo 146, da CF/88 assim dispõe. Esta
tomada de posição possui grande relevância, uma vez que a adoção de outro entendimento
gerará efeitos distintos quanto ao prazo (de 5, de 10 ou de 30 anos) em que o
crédito destinado à Seguridade Social.
4. A prescrição, que significa a perda do direito de
ação judicial pela inércia de seu titular em determinado espaço de tempo, está
elencada como mecanismo extintivo de crédito tributário definitivamente
constituído, ou seja, daquele cujo sujeito passivo da relação tributária tenha
sido notificado.. Todavia, somente ocorrerá se houver a inércia do sujeito
ativo da relação tributária durante o período integral dos 5 anos fixados no
art. 174, do CTN.
5. A prescrição não se interrompe ou se suspende. Na
verdade, o que resta interrompido ou suspenso é o tempo e não a
prescrição. Mas, adotada a terminologia
do artigo 174 do CTN, parágrafo único, quatro são as causas de interrupção da prescrição: citação pessoal feita ao devedor; protesto judicial; qualquer ato judicial que
constitua em mora o devedor e qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial,
que importe reconhecimento do débito pelo devedor.
6. Quanto às causas de suspensão da prescrição, uma
das apontadas pela doutrina é a prevista abstratamente no art. 2º, § 3º, da
LEF. Particularmente, não aceitamos esta causa suspensiva uma vez que não está
veiculada através de lei complementar, conforme requer o art. 146, da CF/88.
7. A Lei de Execuções Fiscais, em seu art. 40 dispõe
que o juiz suspenderá o curso da
execução, enquanto não for localizado o devedor, ou encontrados bens sobre os
quais possa recair a penhora e, nesses casos, não correrá o prazo de
prescrição. Todavia, se a prescrição já foi interrompida com a citação válida,
neste momento instaurou-se a relação jurídica processual e foi exercido o
direito de ação pelo sujeito ativo da relação tributária. Logo, não haverá como
ser suspensa a prescrição no caso do art. 40, pois ela não mais existirá no
momento da suspensão do processo executivo.
8. Quanto à possibilidade de existência da
prescrição intercorrente, entendemos-na impossível, porque não mais se poderá
atribuir ao titular do direito de ação a inércia e a negligência, causas
ensejadoras de prescrição. Enquanto perdurar a ação não é possível se iniciar
novo prazo prescricional.
Bibliografia:
AMARO,
Luciano. Direito tributário brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1997.
CÂMARA LEAL,
Antonio Luís da. Da prescrição e da decadência. Rio de Janeiro: Forense,1959.
CARVALHO,
Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 9ª ed., São Paulo: Saraiva, 1997.
_____________.Curso
de direito tributário, 12 ed., São Paulo: Saraiva, 1999.
DE SANTI,
Eurico Marcos Diniz. Decadência e prescrição no direito tributário. Tese de
doutorado defendida na pós graduação da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo em 2000.
_____________.
Lançamento tributário, São Paulo: Max Limonad, 1999.
ESTEVES,
Maria do Rosário. Normas gerais de direito tributário. São Paulo: Max Limonad,
1997.
MACHADO,
Hugo de Brito. Curso de direito tributário,11. ed., São Paulo: Malheiros,1996.
NAVARRO
COELHO, Sacha Calmon. Curso de direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro:
Forense, 1999.
XAVIER,
Alberto. Da lançamento, teoria geral do
ato, do procedimento e do processo tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1998..
Notas:
[1]
Todas as áreas do direito são instrumentalizadas através de relações jurídicas,
seja na área civil, penal, tributária, processual, previdenciária, etc.
Preenchida a hipótese legal descrita, incide o conseqüente normativo para
vincular as pessoas participantes em determinado contexto.
[2]
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de
Direito Tributário. 9. ed., São Paulo: Saraiva, 1997, p. 187.
[3]
Três são as espécies de lançamento previstas no CTN: 1. Lançamento por
declaração; 2. Lançamento por homologação; 3. Lançamento de ofício.
[4]
ESTEVES, Maria do Rosário. Normas gerais
de direito tributário. São Paulo: Max Limonad, 1997, p.71.
[5]
AMARO, Luciano. Direito tributário
brasileiro. São Paulo: Saraiva, 1997,
p. 161.
[6]
NAVARRO COELHO, Sacha Calmon. Curso de
direito tributário brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 109, 114-5.
[7]
DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência
e prescrição no direito tributário. Tese de doutorado defendida na pós
graduação da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 2000, p. 62.
[8]
TRF- 1.a R, 4.a T, Ap Civ 950102043-6-BA,publ. em 8-6-95.
[9]
STJ, 4ª Turma, AC 96.01.52706-0/MG. Publicação DJ 04/08 /2000 p..125. Cfr. RESP 171272/SP,..
[10]
CARVALHO, Curso de direito tributário. 9. ed., São Paulo: Saraiva, 1997, p.131.
[11]
Idem, ibidem, p. 554.
[12]
Idem, ibidem, p. 62.
[13]
Também utilizaremos a expressão crédito
tributário para referirmo-nos ao crédito do órgão da Seguridade Social, uma
vez que a Constituição Federal também atribuiu a ele natureza tributária.
[14]
DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Lançamento
tributário, São Paulo: Max Limonad, 1999, p. 231.
[15]
Idem, ibidem, p. 231.
[16]
Cf. ob. cit., p. 179.
[17]
XAVIER, Alberto. Do lançamento, teoria geral do ato, do procedimento e do processo
tributário. Rio de Janeiro: Forense, 1998, p. 93.
[18]STJ – REsp 193351 – SP – DJU
03.05.1999 – p. 105.
[19]
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito
tributário. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 1996, p. 147-8.
[20]
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de direito
tributário. 11. ed., p. 147.
[21]
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de
direito tributário. 12. ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 428.
[22]
DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência
e prescrição…, p. 68.
[23]
DJU-I de 28.8.92, p. 13456.
[24]
CARVALHO. Curso de direito tributário,
12. ed., p. 429.
[25] Na verdade o autor
pretendeu referir-se ao artigo 174, parágrafo único, in verbis:
Art. 174. A
ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos,
contados da data da sua constituição definitiva.
Parágrafo único.
A prescrição se interrompe:
I – pela citação
pessoal feita ao devedor;
II – pelo
protesto judicial;
III – por
qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
IV – por qualquer ato inequívoco ainda que
extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.
[26]
CARVALHO. Curso de direito tributário.
12. ed., p. 430.
[27] Art. 125. Salvo
disposição de lei em contrário, são os seguintes os efeitos da solidariedade:
…………………………………………………………………………………………………………………………………………..
III – a
interrupção da prescrição, em favor ou contra um dos obrigados, favorece ou
prejudica aos demais.
[28]
AC 1997.01.00.039763-6 /MG. Publicação DJ 04 /08 /2000 P.143
[29]TRF-3ª, AC 89.03.026465-7/SP, DJ
DATA:17/02/1998,
p.: 260.
[30]
CPC, art. 867. Todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a
conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo
formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e
requerer que do mesmo se intime a quem de direito.
[31] STJ – REsp 49.492-DF – 1ª T. – Rel.
Min. Demócrito Reinaldo – DJU 16.12.1996.
[32] STJ – REsp 108.866 – DF – 2ª T. –
Rel. Min. Ari Pargendler – DJU 07.04.1997.
[33] AC 89.03.026465-7/SP, TRF3
00042486. DJ DATA:17/02/1998, p.: 260.
[34]
CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de
direito tributário. 12. ed., p. 431.
[35]
Idem, ibidem, p.431.
[36]
AC 1997.01.00.039763-6 /MG. Publicação DJ 04 /08 /2000 p..143
[37]
DE SANTI, Eurico Marcos Diniz. Decadência
e prescrição…, p. 199.
[38]CÂMARA
LEAL, Antonio Luís da. Da prescrição e da decadência. Rio de Janeiro:
Forense,1959,p. 210.
Informações Sobre o Autor
Dâmares Ferreira
Advogada e professora universitária no Paraná; Mestre em Direito pela PUC/SP.