Resumo: O presente trabalho consiste com referência e tão somente em apontamentos, estando destarte respaldado em nossa humilde tarefa e até mesmo digamos pretensiosa, diante a grandiosidade cultural de nosso homenageado Augusto Teixeira de Freitas, confesso ser missão árdua e longínqua de nossa capacidade, espiritual, humanística e intelectual em paradoxo aos já realizados, quiçá as exemplares certificações dos renomados juristas.
1. Introdução
O presente trabalho consiste com referência e tão somente em apontamentos, estando destarte respaldado em nossa humilde tarefa e até mesmo digamos pretensiosa, diante a grandiosidade cultural de nosso homenageado Augusto Teixeira de Freitas, confesso ser missão árdua e longínqua de nossa capacidade, espiritual, humanística e intelectual em paradoxo aos já realizados, quiçá as exemplares certificações dos renomados juristas.
Para o desenvolvimento deste estudo, efetuamos singelas pesquisas diante a lacuna impírica e até mesmo ao desinteresse e descaso nas informações, por parte de alguns órgãos, outros valorizando-as de tal forma, reconhecendo-as, com certeza os valores quanto à preservação da história.
Não sendo possível em alguns órgãos à retirada de compêndios para estudos mais profundos, nem mesmo a retirada de cópias reprográficas, com base na legislação.
E neste ato recordemos que consta na história que as primeiras duas universidades donde poderíamos encontrar elucidações, São Paulo e Pernambuco ocorreram incêndios inexplicáveis, eliminando assim arquivos e documentos.
Ademais, observamos que em comparação aos seus pares, não era nosso homenageado adepto a publicidades, fotos comemorativas ou solenes, ”ex vi” juristas famosos daquele século.
Parafraseando o autor Silvio Meira na interessante viajem biográfica de Augusto Teixeira de Freitas, vislumbramos que para investigar um novo e atualizado estudo científico com a amplitude merecida, seria necessário dote excepcional de cultura e acuidade.
Pedro Calmon já dissera que Teixeira de Freitas sempre mereceu muitas homenagens, mas faltaram bibliografias.
Podemos observar que somente os contemporâneos de Freitas e parcos em nossa atualidade é que poderiam servir de paradigma, quanto ao esmero na dedicação à pátria, humanista e a luta constante pela liberdade, o “incansável querer poder auxiliar com a nossa ciência jurídica com ética, base humanística para o mundo”, isto que devemos levar de exemplo, para qualquer educação em á qualquer país em todos ramos da ciência.” [1] (grifos nossos)
Prova disto é o reconhecimento de seus trabalhos científicos jurídicos em diversos Países da América quiçá pelo mundo, que transcorreremos.
Necessitamos nesta nova era de jovens talentosos como este ser grandioso, para recuperarmos os dispersos dados ainda existente, quem sabe com a existência de um futuro museu universal nos principais estados, concentrando todo trabalho realizado para uma possível preservação e base de ensino para compilação dos estudiosos.
Podemos informar que existem documentos preciosos em lugares tão distantes, como Argentina, São Paulo, Rio de Janeiro, Olinda, Belo Horizonte etc.. quiçá monumentos e tão raras fotos e publicações.
Não temos nenhuma pretensão em analisar perfunctoriamente as grandiosas obras do grande jurista homenageado ou bibliografias, queremos aqui tão somente contribuir para que não se faça morrer este espírito divino de luz, com a oferta de se fazer preservar alguns selecionados apontamentos passados e presente.
2. Suscinta da obra de Silvio Augusto de Bastos Meira (nome literário Silvio Meira) referente à biografia de Teixeira de Freitas
Quando iniciamos a pesquisa para nosso trabalho, primeiramente buscávamos nossas bases metodológicas com, fotos, documentos históricos, monumentos, haja visto tamanha é a grandeza cultural e devida ao nosso homenageado Teixeira de Freitas não só no mundo acadêmico, político, jurídico, como em outros ramos da ciência.
Iniciadas as pesquisas primeiramente São Paulo no histórico Largo de São Francisco, junto a biblioteca da USP, Universidade de São Paulo.
Ocorreu, que após restou tão somente um desapontamento profundo pela escassez de material, seguimos consultando, Ordem dos Advogados do Brasil do Rio de Janeiro, Belo Horizonte, São Paulo, com respaldo em nossas inscrições por estas secções, levando em conta a Fundação do Instituto no País.
Momento em que nossa angústia era tanta, por nada encontrar passando a ser então um verdadeiro desafio começamos a utilizar o atual meio eletrônico. Com mensagens a amigos de alguns estados em seguida uma viagem até a Biblioteca da Universidade do Museu Social Argentino, em Buenos Aires, berço instigador do pretenso trabalho.
Valendo até então parafrasear algumas palavras do famoso tango de Gardel. “mi Buenos Aires querido”, a partir daí, conseguimos perceber e dar conta da falta de bibliografias a respeito das grandes obras do nosso papa da ciência jurídica.
De acordo com as pesquisas, consta haver varias bibliografias na biblioteca do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Mas como discípulos continuamos, portanto outra alternativa não nos restou a não ser contentarmos com a obra de Silvio Meira, por suposto por não podermos desfrutar na integra do precioso “tempo” para pesquisarmos em mais bibliotecas, livrarias diga-se um costume nobre dos argentinos…
No inicio ao analisarmos a brilhante obra, de biografia verificamos que o autor percorre de prima facie, o curriculum personal científico demonstrando inquestionável capacidade para o mister, pretendido.
Verificamos que o autor no mundo das ciências jurídicas ocupou e teve seu destaque, onde faz questão de apontar uma vasta bibliografia, congressos, conferências, etc…, com certeza estava preocupado com a tamanha responsabilidade a que se propôs, realizar a biografia do ser mais importante em nosso ramo das ciências jurídicas.
Inicia assim a biografia analisando, local da história da família a infância estudantil de Freitas, bem como data de nascimento 19 de agosto de 1816, Vila de nossa Senhora do Rosário do Porto de Cachoeira, Recôncavo baiano onde nos relata a vida privilegiada que desfrutava com fartura e riqueza.
Era adepto a religião católica, a família a seguia por certo ser própria daquela época, onde os padres eram também educadores jesuítas.
Efetua até mesmo o autor um comentário, que não fora encontrado documentos escolares que informasse os estudos da infância, que a base da humanidade de Freitas e facilidade para os idiomas e outras ciências ocorrera da convivência e ensino destes então educadores “Padres” vindos de outros países.
Descreve o autor que a vinculação de Teixeira de Freitas com a Argentina, é o fato de então ter ocorrido na mesma época do nascimento, a Independência da República Argentina, libertando-se da Espanha, confirmado pelo congresso de Tucumã no dia 9 de julho.
Neste mesmo ano, Napoleão (o grande codificador é exilado) como prisioneiro da ilha de Santa Helena onde viria a falecer em 1821.
Relata a importância da pequena Vila onde por ali passaram portugueses e demais atraídos pelos cultivos de fumo, cana de açúcar, recebiam também de outros regiões ouro e gado, por estar referida região em meio do coração dos sertões.
Logo, após contribui Teixeira de Freitas de maneira espontânea para a elaboração de leis e para Constituição, códigos e elaboração do monumento jurídico redigido por Delmacio Vélez Sarfield.
O Brasil vivia momentos de transição com a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, 7 de janeiro de 1808, com a chegada de D. João e comitiva. Momento decisivo na história, criou-se a Academia Real Militar, Biblioteca Pública Real, Teatro D. João, Jardim Botânico, Imprensa Régia, Organização da Academia de Marinha, decretação de liberdade de indústria, Banco do Brasil, Real Junta de indústria e Comércio etc..
Relata a declaração da guerra, frente as tropas napoleônicas, onde Portugal integra com 470 soldados e o rendimento perante o governador.
Na Argentina surgem as contendas no Uruguai D. Jõao determina a invasão ao Uruguai integradas por brasileiros e lusitanos, em número aviltante, onde seguiram vitoriosos, surgindo a anexação de Província Cisplatina.
Em 1817 rebenta a revolução francesa e no norte de nosso país, Pernambuco.
A independência dos Estados Unidos, todos esses fatos são relatados amiúde, pelo autor, inclusive os personagens.
Descreve as crueldades da referida época, a revolução do Porto ocorrida em Portugal, e a influência dos personagens brasileiros e lusitanos.
Na pequena região onde nasceu Freitas preponderavam os portugueses, e sábios alemães, a região tornou-se então rica com belas obras, casarões de estilos europeus, a economia crescia com a exportação de fumo e demais produtos da região para vários países.
Os Freitas (nome tipicamente lusitano) possuíam raízes genealógica de Portugal, Teixeira de Freitas nasceu então em berço nobre, de família que ocupava naquela pequena região não só boa situação econômica como política, pois o pai chegou até o titulo de Barão de Itaparica.
Freitas, muito embora nascido em época conturbada a pequena cidade natal tinha grande importância econômica política no cenário brasileiro, com forte influencia naval, num Estado que sabedores somos das tristes histórias de pobreza.
Portanto pode então Teixeira de Freitas, desfrutar de bons ensinos estudou latim francês, música, tocava violão e estudioso das demais ciências.
Com apenas 16 anos ingressou na Universidade iniciando o 1̊ (primeiro) ano de Direto em Olinda.
Realizou provas para ingressar no 2º ano de Direito em São Paulo, com os professores, Pinto Cerqueira e Vicente Pires da Mota, sendo a avaliação destes mestres favorável ao gênio, não sendo aprovado pelos demais.
Existem relatos na biografia que fascinam, pois quase que mentalmente passamos a reproduzir as falas com sotaque baiano de sonância cantada e tranqüila, podemos imaginar um professor paulista efetuando suas chamadas com nomes tipicamente regionais na Universidade do Largo de São Francisco, estado de São Paulo.
A biografia descreve os típicos nomes do nordeste do país, um a um, contemporâneos de Freitas nas universidades.
Destarte informa que na turma de Teixeira de Freitas haviam nada mais e nada menos que 17 baianos, imaginemos e vivenciemos a época, e frise-se todos de apurada cultura, bastando tão somente analisar tais personagens.
Volta a cidade natal realiza seu casamento muito jovem com uma prima, perde o pai que estava apenas com 52 anos, o Barão de Itaparica, época em que já não tinha mais a mãe, logo após forma-se em direito numa turma de 55 alunos em Olinda fato curioso havia “um mineiro”, quatro cariocas, quinze pernambucanos, dezessete baianos, seis cearenses, dois alagoanos, um riograndenses do norte, cinco maranhenses. (grifo nosso)
Segundo relatos do autor a Academia era modesta e fortemente criticada, passou Freitas pela sabinada, foi processado e absolvido já morando no Rio de Janeiro, onde fundou o instituto dos advogados brasileiros, presidente deste órgão por 3 a 4 meses.
Foi contratado para elaborar a legislação pátria e consolidar a lei civil, onde o autor transcreve na íntegra referido documento, datado aos 15 de fevereiro de 1885, trabalho demasiado árduo, e diga-se a brasileira e portuguesa, analisar as leis sub-rogadas ou obsoletas.
Na biografia percebemos que o autor, transcorreu vários documentos na integrada no livro, contrato sentenças, pareceres e despachos e carreou fotos para ilustração.
Bem como analisou todos que conviveram de alguma forma com Teixeira de Freitas, colegas de Universidade, fluentes políticos e parentes. Donde podemos concluir que a vida de Freitas era extremamente dedicada aos estudos que era seu trabalho e a família.
Não podemos silenciar, pois após leitura e analise sucinta da respeitável e nobre biografia, devemos indagar-nos – como? Como? assim nos prostramos.
Tratava-se verdadeiramente de um ser muito iluminado, pois conforme relato dos fatos, de Spencer Vampré, Silvio e Bevilaqua, a vida de Freitas era inusitada.
Nasceu pouco antes das revoluções, desenvolve o pensamento humanista, tem comportamentos humildes, consegue a proeza de dedicar arduamente aos estudos e ainda ter 10 filhos, ainda carregava a dor de conviver com a ausência de três de seus filhos que morreram na infância.
Oferece seus préstimos científicos com tanta humildade sem valorá-los pecuniaramente. É processado, incompreendido, por certo pela alta sapiência, e não devemos esquecer que o geniozinho infantil com 6 anos traduzia textos em latim, logo não compreendemos o ocorrido na época acadêmica, ocorrida em São Paulo se sente muito injustiçado, donde volta a Olinda para terminar os estudos. Morre humilde quase que no ostracismo, na cidade de Niterói no Estado do Rio de Janeiro, no dia 12 de dezembro de 1883.
Destarte este trabalho embasara nossa homenagem a Teixeira de Freitas, que jamais atingiria a grandeza espiritual, humanística e intelectual, deste verdadeiro gênio.
Nossas horas dedicadas foram com total sinceridade verdadeira emoção e lisura, quisera termos a juventude para seguir, e dedicar-nos a todas as obras realizadas por Freitas,sairiam por certo em tomos e mais tomos.
Espero, porém sigam os jovens, que se embriaguem desta fonte, que enriquece e enobrece nossa alma, nenhum de nossos pares poderão esse patrimônio nos quitar a não ser a nossa própria morte.
“Pois é preciso que de muitas coisas sejam inquidores os homens amantes da sabedoria” (Heráclito de Éfeso, Fragmento, Clemente de Alexandria,Tapeçarias,V14) [2]
“O trabalho nu obceca e mecaniza; a Obra possui e, no meio de dúvida tão Radical que vale por uma incerteza invertida, Embriaga o criador” (Guérin, O que é uma obra,1975, p.33-34) [3]
3. Apanhados da obra de Teixeira de Freitas e o Direito Latino-Americano
3.1. A importância de Teixeira de Freitas no Direito Latino-Americano
Teixeira de Freitas é certamente, com Vélez Sarsfield e Andrés Bello, membro do triunvirato dos mais importantes juristas sul-americanos do século XIX, que maior influência exerceram no direito do nosso continente, na sua época.
Analisaremos rapidamente a vida e obra de Teixeira de Freitas, para nos determos, em seguida, nos seguintes aspectos:
a) a sua metodologia,
b) a originalidade de sua obra,
c) a unificação do direito privado,
d) a sua influência sobre o direito contemporâneo, e
e) a aproximação do direito entre os nossos dois países.
Nascido em 1816, formado em direito em 1837 e falecido em 1883, Augusto Teixeira de Freitas marcou o direito civil brasileiro do mesmo modo que Ruy Barbosa renovou, ou até criou, o nosso direito constitucional. Advogado, magistrado e professor de direito romano, é o autor da Consolidação das Leis Civis de 1858 e do Esboço de Código Civil, publicado parceladamente em 1860 e 1865.
3.2. A Consolidação das Leis Civis
A Consolidação abrange uma introdução de 187 páginas, considerada pela doutrina como um dos trabalhos mais rigorosos e profundos do direito privado brasileiro (PEIXOTO, 1939, p. 6).
Contém 1.333 artigos e numerosas notas, algumas muito extensas, que lhe dão uma extraordinária consistência e constituem verdadeira obra didática.
Uma comissão de três membros aprovou o texto da Consolidação, só lamentando que não tratasse da escravidão, mas louvou “a clareza e fidelidade do texto” esclarecendo que o autor prestava “um serviço importante ao foro”.
Acrescentou-se que ficava, assim, superada a incerteza dominante no direito da época, ensejadora do arbítrio que se tentava justificar pelas lacunas da lei e pela ambigüidade dos textos legislativos então vigentes.
A Consolidação vigorou no Brasil, como diploma legal, até 1º.1.1917, quando entrou em vigor o nosso Código Civil de 1916, substituído, em janeiro de 2003, pelo Código Civil de 2002.
Em meados do século XIX, a legislação brasileira era realmente caótica, vigorando as Ordenações Filipinas de 1603, cuja vigência foi mantida por ocasião da independência, assim como numerosas leis extravagantes e a Lei da Boa Razão, além de usos e costumes cuja aplicação era reconhecida pelos tribunais.
As Ordenações ainda faziam referência ao direito romano e canônico que, em muitas matérias, as complementavam e tinham mais de dois séculos e meio de vida, tendo sido concebidas em relação ao Portugal do século XVIII, muito diferente do Brasil de duzentos anos depois.
Acresce que, com a Independência, proclamada em 1822, e a Constituição Imperial, outorgada em 1824, numerosas disposições das Ordenações Filipinas se tornaram obsoletas ou contrárias à ordem pública, criando um clima de confusão completa.
Por outro lado, poucas eram, na primeira metade do século XIX, as obras doutrinárias nacionais relevantes, sendo os autores citados pelos tribunais os juristas portugueses que tinham comentado as Ordenações Filipinas num contexto e numa época totalmente diferentes.
A primeira qualidade da Consolidação foi a de colocar em ordem sistemática, de modo claro e inequívoco, as normas aplicáveis ao direito civil em todo o território nacional, excluindo tão-somente as normas de direito internacional privado e de direito intertemporal, ou seja, os conflitos de lei no espaço e no tempo.
A originalidade da Consolidação, que iríamos reencontrar no Esboço, decorre em grande parte do seu planejamento científico e do seu modo de tratar os diversos assuntos, reagindo no particular, em parte, contra o plano adotado pelo Código de Napoleão, que, na época, se aplicava, com pequenas modificações, na maioria dos países latino-americanos.
Retomando e desenvolvendo as idéias de autores que inspiraram o Código austríaco de 1811, Teixeira de Freitas baseou-se na divisão entre direitos absolutos e direitos relativos, ou seja, entre os direitos reais e pessoais.
Considerava Teixeira de Freitas que os direitos da personalidade, embora absolutos, deviam ter a sua proteção fora do direito privado, ou seja, no direito público, como se entendia na época.
Essa distinção já se encontrava em vários outros autores da época, como Ortolan, mas coube a Teixeira de Freitas aplicá-la pela primeira vez no campo legislativo, na América Latina, fazendo a distinção entre a parte geral e a parte especial da Consolidação, e antecipando-se, assim, em quarenta anos, às soluções que iriam ser adotadas pelo BGB, que entrou em vigor em 1º.1.1900.
Na parte geral, trata das pessoas e das coisas, enquanto a parte especial contém dois livros: o primeiro referente aos direitos pessoais, abrangendo tanto o direito de família como o das obrigações; e o segundo sobre os direitos reais, incluindo também o direito das sucessões.
A Consolidação das Leis Civis chegou a ser divulgada em francês e comentada por Raul de LA GRASSERIE (1987), o que não costumava acontecer, naquela época, com leis brasileiras.
3.3. O Esboço
O plano da Consolidação foi, grosso modo, mantido, com algumas alterações, no Esboço de Teixeira de Freitas, assim como nos dois Códigos Civis brasileiros de 1916 e 2002.
No Esboço foi, todavia, ampliada a parte geral para incluir os fatos jurídicos e, na parte especial, desmembraram-se o direito de família e o das sucessões para considerá-los como livros independentes.
Essa ordem não é, aliás, muito diferente da do Código Argentino de 1869, com os seus 4 livros (pessoas, direitos pessoais, direitos reais, disposições comuns a ambos), e do próprio BGB (parte geral – pessoas, bens e atos e fatos jurídicos, e especial – direitos pessoais, direitos reais, família e sucessões).
Aprovada a Consolidação, Teixeira de Freitas foi contratado, em 1958, para elaborar um anteprojeto de Código Civil.
Passa, pois, a trabalhar no seu Esboço, que apresenta, de 1860 a 1865, em três partes, sob a forma de anteprojeto com 4.908 artigos.
Faltaram uma parte final dos direitos reais e o regime dos direitos das sucessões, tendo deixado de ser impressas mais algumas centenas de artigos, de tal modo que o Esboço completo deveria ter cerca de 5.300 artigos, tornando-se um dos mais longos do mundo.
A primeira parte, que é geral, contém 866 artigos e trata das pessoas e coisas, mas também dos atos e fatos jurídicos.
Na parte especial, encontramos dois livros: o primeiro referente ao regime dos direitos pessoais e de família e o segundo aos direitos reais.
Trata-se, especialmente na primeira parte, de uma obra didática e científica, que se explica pela falta de bibliografia jurídica nacional na época.
Há nela, como na Consolidação, grande preocupação com a exatidão e com o uso de uma terminologia científica, assim como com o exame detalhado da doutrina e da legislação estrangeiras.
Embora relativamente incompleto, com relação a uma parte do regime das servidões, hipotecas, penhor e anticreses, o Esboço constitui, certamente, um dos mais importantes diplomas legais latino-americanos do século XIX, tanto do ponto de vista legislativo como do doutrinário.
Posteriormente, em 1867, Teixeira de Freitas propõe ao governo a unificação do direito civil e comercial, querendo transformar o seu Esboço num verdadeiro Código de Direito Privado.
Já se disse que a obra de Teixeira Freitas é a pedra angular do direito brasileiro e da doutrina do nosso país.
René DAVID (1949, p. 256) comparou Teixeira de Freitas a Acursio, Bartolo, Domat e Pothier, Bracton e Blackstone, cuja autoridade foi tal que implantaram novas diretrizes e quadros ao direito do seu país, constituindo um verdadeiro divisor de águas entre o direito anterior e posterior aos seus trabalhos.
Depois de uma legislação caótica – e até de um enorme vazio legislativo –, coube a Teixeira de Freitas construir o que Clóvis BEVILÁQUA (1906, p. 23) denominou “um edifício de grandes proporções e de extraordinária solidez esculpido no rochedo dos bons princípios péla mão vigorosa de um artista superior”.
E acrescentou:
“Mas se o Esboço não poude ser transformado em lei, entrou para o acervo da jurisprudência pátria como a sua producção mais valiosa, pela riqueza, segurança e originalidade das idéias” (BEVILÁQUA, 1906, p. 23).
A sua obra teve a maior importância, tanto no campo legislativo quanto no científico, e caracteriza-se pela sua reação construtiva aos Códigos anteriores e pela sua originalidade.
Constitui, no continente sul-americano, a primeira crítica construtiva ao Código Civil Francês, considerando que o mesmo merecia ser completado e aperfeiçoado, numa época na qual ele ainda era adotado quase integralmente em muitos países da Europa e da América Latina.
Assim, entre outros exemplos, nele podemos encontrar as seguintes inovações:
a) trata das pessoas jurídicas;
b) diverge do conceito de propriedade imobiliária do Código francês, que Teixeira de Freitas considerava estar em desacordo com a estrutura econômica existente nos meados do século XIX;
c) defende o universalismo do direito, enquanto a legislação francesa demonstrava uma certa desconfiança em relação aos estrangeiros;
d) considera a tradição essencial para a transferência da propriedade, que, no seu entender, não pode decorrer do simples contrato, devendo ser protegida a boa-fé dos terceiros e a aparência.
Sintetizando o trabalho realizado por Teixeira de Freitas, René DAVID (1949, p. 273) escreveu que:
“Teixeira de Freitas est sans doute dans le monde entier, le premier qui ait soumis le Code Napoléon à une critique constructive, et reposant sur des préoccupations véritablement scientifiques, ses prédécesseurs s’étant bornés à détruire ou ayant été inspirés avant tout par des considérations d’ordre politique. Sa critique est constructive car, s’il note les défauts du Code Napoléon, ce n’est pas pour faire l’apologie d’une réaction condamnée à l’avance: c’est pour s’ingénier à y remédier, en proposant des solutions nouvelles, et, dans cette partie de sa tâche, il faut reconnaître et louer l’ esprit réaliste de Teixeira de Freitas, lequel a commencé sa carrière, il ne faut pas l’oublier, en réalisant la tâche immense, éminement pratique, de la Consolidation, fondée sur une connaissance parfaite de l’ histoire et de la réalité brésiliennes”.
Para o direito comparado e o direito latino-americano, a sua obra rompe com a adesão irrestrita ao Código francês para discutir, na América Latina, as idéias do pensamento jurídico alemão, o mais moderno da época, e dar relevância às tradições locais.
Assim, seu trabalho pode ser comparado ao realizado por Savigny na Alemanha, embora sem a mesma emocionalidade. Há, aliás, entre ambos, uma certa semelhança pelas idéias novas que estão trazendo, casando a teoria tradicional do direito romano com a realidade histórica social e econômica dos seus respectivos países (RAMALHETE, 1980; p. 20; WALD, 1950, p. 25).
3.4. A Originalidade do Direito Latino-Americano
Na realidade, coube tanto a Teixeira de Freitas como a Andrés Bello, a Vélez Sarsfield e a Eduardo Acevedo, respectivamente, no Brasil, no Chile e na Argentina, conciliar as tradições locais com as lições do direito comparado e as necessidades específicas dos seus países, ensejando a criação de leis e projetos que, na palavra do Professor SALERNO (1998, p. 132), responderam a uma nova concepção do direito[4].
Nela já se enfatiza a importância da dignidade humana, que as Constituições só garantiriam cerca de um século depois e que reflete os ideais das novas nações independentes da América.
Assim, podemos vislumbrar, com as obras desses juristas, o início da originalidade do direito latino-americano, decorrente tanto de sua modernidade como da influência norte-americana no direito constitucional.
O nosso sistema jurídico continuou, pois, a pertencer à família do direito francês, mas adotou algumas tradições locais e várias técnicas e fórmulas mais vinculadas ao direito alemão e italiano, além de outras, especialmente na área constitucional, que se inspiram no direito anglo-americano.
Essa originalidade do direito latino-americano não tem sido percebida pela maioria dos comparatistas europeus, que, sem reconhecer as peculiaridades do direito latino-americano, limitaram-se a enquadrá-lo na família do direito francês ou no sistema romanista [5].
Ressalta-se, todavia, a posição de autores como René David, que viveu no Brasil algum tempo, no fim da década de 40, e assinala a evolução construtiva que ocorreu em nosso direito, e Phanor J. Eder, que foi um profundo conhecedor do direito latino-americano.
Afirmou o eminente professor francês que, durante muito tempo, no século XIX, imperou o racionalismo, de acordo com o qual era possível transpor para a América Latina, mediante simples tradução, os códigos europeus e a constituição norte-americana, pensando-se resolver, assim, todos os problemas locais.
Essa tentativa de transplante jurídico baseou-se mais na razão do que na tradição, mas pretendeu aplicar o direito europeu em países que ainda não tinham alcançado o mesmo grau de desenvolvimento. Assim, a maioria dos códigos inspirados pela legislação francesa da época representou, em geral, o ideal de uma elite: um direito que se esperava ver adotado e adaptado progressivamente a todo o país, em virtude do progresso cultural e econômico (DAVID, 1950, p. 267).
Haveria, até, um certo “quixotismo” em defender os conceitos e a escala de valores da Europa em países que tinham, na época, uma formação e um nível de civilização totalmente diferentes (DAVID, 1956, p. 18).
Foi, todavia, com o trabalho pioneiro de mestres como Teixeira de Freitas, ainda no século XIX, mas de um modo mais geral a partir do século XX, que se formou, na América Latina, um direito próprio, menos teórico e mais adaptado à realidade local, passando a constituir um verdadeiro subsistema próprio na família romano-germânica.
É ainda René David que explica que, do mesmo modo que se distingue o direito alemão do francês, cabe dar uma posição própria ao direito latino-americano, cuja originalidade reconhece, embora a ela não se tenha referido a maioria dos comparatistas europeus [6].
Essa originalidade, que foi defendida por DAVID (1956, p. 16-17), mas também por Clóvis BEVILÁQUA (1897) e MARTINEZ PAZ (1934), decorre tanto das tradições locais e da convivência com o direito norte-americano – no plano constitucional – como das construções jurisprudenciais e doutrinárias que corresponderam a necessidades peculiares econômicas, sociais ou políticas.
Cabe, pois, salientar que a originalidade da legislação na América Latina se iniciou com Teixeira de Freitas e permitiu a elaboração de leis e códigos cada vez mais adaptados ao nosso meio ambiente, às nossas tradições e, por outro lado, em certos caso, até mais adiantados do que os seus antigos modelos do Velho Mundo.
Conclui René DAVID (1950, p. 267) que:
“Les droits des pays latins d’Amérique, faits pour s’appliquer dans un milieu différent du milieu américain, se distinguent des droits de l’Europe continentale et constituent, au sein du groupe du droit français, une catégorie originale, dont les traits spécifiques apparaissent de plus en plus clairement au fur et à mesure que le divorce s’atténue entre des textes jadis théoriques et les réalités de la vie”.
Por sua vez, Phanor J. EDER (1950, p. 142-143), já há meio século, louva a originalidade do direito latino-americano afirmando que:
“And I am convinced that, the Mother Country and the British Dominions apart, it is in Latin America and no longer in Europe that we shall find the best source and stimulus for new currents of revivifying ideas. The Spanish language will be better known, and easier for our youth, than the other languages of Europe. The scepter of Legal Science has crossed the Atlantic. Latin-American law, like our own, is eclectic. Its atmosphere is progressive, not decadent. It draws its inspiration from the same ideals of human freedom and dignity as ours”.
Aliás, há no particular uma evolução construtiva no direito comparado, não só no sentido de redescobrir as peculiaridades da América Latina, mas também no de admitir uma maior flexibilidade no enquadramento das famílias dos sistemas jurídicos.
Admite-se, pois, que, como no direito de família nacional, tenhamos agora, no campo do direito comparado, além das famílias tradicionais, “as famílias mistas, desintegradas e recompostas, as monoparentais etc” (FLAUSS-DIEM, 2002, p. 203).
Considerando-se as influências que exerceram, em nossos países, sucessiva ou simultaneamente, de um lado, os diversos direitos do continente europeu – o francês, o alemão e o italiano, além do espanhol e do português – e, de outro, o norte-americano, poderemos afirmar que, já agora, pertencemos a ambas as famílias.
Somos, pois, o fruto do casamento do direito dos sistemas europeus com a influência do direito anglo-saxão, sendo que a autonomia e a originalidade das nossas legislações são devidas, em grande parte, aos grandes juristas do século XIX, como Teixeira de Freitas e Vélez Sarsfield, no direito privado, e Juan Bautista Alberdi e Ruy Barbosa no direito público.
3.5. A Modernidade de Teixeira de Freitas
A modernidade de Teixeira de Freitas se faz sentir também na importância que dá às relações econômicas e na sua tese da unificação do direito privado.
Já na sua Introdução à Consolidação, Teixeira de FREITAS (1865, p. 137) escreve:
“A civilização moderna, que tanto se distingue por seus admiráveis progressos na carreira dos melhoramentos materiais, alimenta-se com a livre circulação dos capitais, reclama imperiosamente o movimento constante de toda a sorte de valores. E quais os fenômenos que manifestam-se na realização desse destino providencial?”
“As transações distribuem os instrumentos da produção por todos os ramos de atividade, os capitais aproximam-se a todas as necessidades, para que tenham uma direção mais fecunda; e o poderoso motor dessa rotação contínua é o crédito. Com seu impulso, os capitais fixos transformam-se em capitais rolantes, e o comércio e indústria reproduzem quotidianamente suas forças.”
“Crédito pessoal, crédito real, são as duas potências paralelas às duas grandes classes de direito, que constituem toda a riqueza nacional”.
É interessante salientar que, contrariamente aos escritores europeus que só viam no direito civil o direito dos bens imobiliários e da agricultura, enquanto o comercial tratava dos móveis, do comércio e da indústria, Teixeira de Freitas teve a intuição de dar forma jurídica à mobilização do solo pelo crédito. Previu, assim, a existência do direito bancário, quiçá dos fundos imobili-ários e da securitização, que surgiriam no Brasil no fim do século XX, desenvolvendose no início do século XXI.
3.6. A Unificação do Direito Privado
Por outro lado, uma vez terminado o seu Esboço, Teixeira de Freitas sustenta, com ampla argumentação, que está superada a dicotomia entre o Código Civil e o Código Comercial. E defende, em 1867, a elaboração de um verdadeiro Código Geral de Direito Privado.
Na carta que então encaminha ao Ministro da Justiça, Teixeira de Freitas salienta a necessidade de se restaurar a unidade do direito privado.
Esclarece que:
“Não há tipo para essa arbitrária separação de leis a que deu-se o nome de Direito Comercial ou Código Comercial; pois que todos os actos da vida jurídica, exceptuados os benéficos, podendo ser comerciais ou não comerciais, isto é, tanto podem ter por fim o lucro pecuniário, como outra satisfação da existência. Não há mesmo alguma razão para tal selecção de leis; pois que, em todo o decurso dos trabalhos de um Código Civil, aparecem raros casos em que seja de mister distinguir o fim comercial, por motivo da diversidade nos efeitos jurídicos” (CARVALHO, 1985, p. 40).
Assim, tudo que não for possível incluir na parte geral que se refira ao direito comercial deve completar o direito das obrigações nos seus lugares próprios, ou seja:
“… os contratos em geral, o mandato, a compra e venda, a troca, a locação, o mútuo, a fiança, a hipoteca, o penhor, o depósito, as sociedades, os pagamentos, a novação, a compensação, a prescrição e os seguros, voltarão a seus respectivos grémios no Código Civil, onde as inscrições são as mesmas. O mandato completar-se-á com as disposições sobre correctores, agentes de leilões e comissários. A locação de serviços com as relativas a feitores, guarda-livros, caixeiros, comissários de transportes, capitães de navios, pilotos, contramestres e gente da tripulação. O depósito com as concernentes a trapicheiros e administradores de armazéns. A troca com o contrato de câmbio e as letras de câmbio. A locação de bens com os fretamentos. O mútuo com as contascorrentes, letras de terra, notas promissórias e empréstimos a risco. A indemnização do dano completar-se-á com as avarias” (CARVALHO, 1985, p. 41).
Ora, é somente no fim do século XIX que, com alguma timidez, assistimos à unificação do regime legal do direito das obrigações no resto do mundo, inicialmente na Suíça e, posteriormente, em outros países.
Finalmente, somente nos meados do século XX é que se consolida na Europa a unidade do direito privado no Código Civil italiano, cujo modelo foi adotado, em parte, no Código Civil Brasileiro de 2002 e no Projeto argentino de 1998.
Aliás, o excelente Projeto argentino do Código Civil de 1998 reconheceu o papel de Teixeira de Freitas, no tocante à unificação do direito, ao afirmar:
“En la región, Augusto Teixeira de Freitas propició la unificación al aludir a ‘esa calamitosa duplicación de leyes civiles’ y a la inexistencia de ‘razon alguna que exija un Código de Comercio’”. [7]
Também o Código Brasileiro de 2002 faz referências a Teixeira de Freitas.
Efetivamente na Exposição de Motivos do Código Civil Brasileiro de 2002, o professor Miguel Reale salienta que:
“Na realidade, o que se realizou, no âmbito do Código Civil, foi a unidade do Direito de Obrigações, de conformidade com a linha de pensamento prevalecente na Ciência Jurídica pátria, desde Teixeira de Freitas e Inglez de Sousa até os já referidos Anteprojetos de Código das Obrigações de 1941 e 1964.”
“Restrito o plano unificador à matéria obrigacional e seus corolários imediatos, não havia que cuidar, como não se cuidou, de normas gerais sobre a vigência das leis e sua eficácia no espaço e no tempo, tanto no Direito Interno como no Direito Internacional, matéria esta objeto da chamada Lei de Introdução ao Código Civil, mas que, consoante ensinamento inesquecível de Teixeira de Freitas, melhor corresponde a uma Lei Geral, na qual se contenham os dispositivos do Direito Internacional Privado, o que tudo demonstra que não nos tentou veleidade de traçar um ‘Código de Direito Privado’.”
“Deve-se, com efeito, recordar que, mais de quatro décadas antes do Código Civil alemão de 1900, o mais genial de nossos jurisconsultos, Teixeira de Freitas, já firmara a tese de uma Parte Geral como elemento básico da sistemática do Direito privado. Obedece a esse critério a Consolidação das Leis Civis, de autoria daquele ínclito jurista, consoante texto aprovado pelo Governo Imperial de 1858. Não abandonam essa orientação as edições seguintes da Consolidação, as de 1865 e 1875, figurando, com roupagens científico-doutrinárias do mais alto alcance, no malogrado Esboço de Código Civil, ponto culminante na Dogmática Jurídica nacional” (BRASIL, 2002, p. 32-34).
3.7. Influência exercida sobre os Códigos Modernos
Não há, pois, dúvida que, escrevendo há mais de século e meio, Teixeira de Freitas foi um jurista que teve, ao mesmo tempo, a coragem de romper com as tendências dominantes na sua época e a ousadia de começar a construir o direito do futuro.
As suas idéias de transparência em relação aos direitos reais que deveriam decorrer de explicitação formal na lei, de acordo com a teoria do numerus clausus, aliás também adotado pelo direito argentino, revelam uma das preocupações do direito contemporâneo quanto à segurança jurídica.
Do mesmo modo, Teixeira de Freitas defendeu a possibilidade de mutação do regime de bens a requerimento da mulher, diante da insolvência do marido (art. 1403 do Esboço), que sustentamos há longo tempo (WALD, 1961, p. 50) e que acabou sendo consagrada no Código Civil brasileiro de 2002 (art. 1639, § 2º), depois de constar em numerosas outras legislações, que abandonaram o caráter absoluto da imutabilidade do regime matrimonial de bens.
Do mesmo modo, admitiu que a arbitragem não necessitaria de homologação judicial, o que, no direito brasileiro, só acabou acontecendo com a promulgação da Lei nº 9.307 de 23.09.1996.
Assim, reconhece-se nele, na expressão de Lafayette, “um mestre pela audácia do pensamento” ou, como afirma Orlando GOMES (1986, p. 147):
“O certo é que se adiantou ao seu tempo, pagou pela audácia de ter sido original e autêntico ao passar à frente do seu tempo, e, por isso, não foi esquecido. Nem será”.
É, pois, o fundador, na América Latina, da dogmática jurídica que começou a se desenvolver na Alemanha, com a escola histórica liderada por Savigny, em reação à escola francesa da exegese. Esta última, no início com Bugnet, limitava-se a comentar o Código de Napoleão, em vez de expor o direito civil vigente, abrangendo aspectos que não estavam no texto da lei então em vigor.
Aliás, existem paradoxos nas relações entre Teixeira de Freitas e Savigny.
Efetivamente, o autor brasileiro cita Savigny e o acompanha quando se pretende conciliar a tradição romana com o direito moderno, mantendo as idéias construtivas do direito antigo e abandonando o que nele há de obsoleto.
Mas Teixeira de Freitas, embora considere que a codificação não deva ser arbitrária, considera-a útil e necessária, enquanto, ao contrário, Savigny se rebelava contra a estratificação do direito, em nome do espírito popular, Voksgeist, que queria fazer prevalecer sobre a vontade do legislador.
O mesmo aparente paradoxo de entusiasmo e crítica se pode assinalar apreciando as numerosas citações que Teixeira de Freitas faz do Código de Napoleão e dos autores franceses que procederam a sua elaboração, embora muitas vezes discorde das soluções do direito gaulês.
Essa reação se explica por três motivos. Em primeiro lugar, embora reconhecendo a grande contribuição que o Código de Napoleão deu à codificação moderna, Teixeira de Freitas se insurgia contra o resquício de colonialismo que eventualmente poderia representar.
Não obstante Napoleão reconhecesse que, mais do que as suas vitórias militares, o Código seria o seu legado para o mundo[8], o jurista brasileiro se rebelava contra um diploma legal que considerava excelente e pioneiro, mas que reconhecia ter sido imposto pelo Imperador pela força das armas, não só à maioria dos países da Europa, mas também indiretamente a várias nações latino-americanas.
Por outro lado, considerando as particularidades do contexto brasileiro, entendia o autor da Consolidação que era preciso adaptar a lei às condições do meio-ambiente, recorrendo para tanto, em muitos casos, ao direito romano e aos trabalhos dos juristas que antecederam o Código de Napoleão. Essa prioridade que Teixeira de Freitas e Vélez Sarsfield deram à realidade local se explica tanto pela sua formação intelectual[9] como pelo conhecimento que tinham do que Tullio ASCARELLI (1969) veio a chamar de as premissas implícitas de um determinado sistema jurídico[10].
Finalmente, decorrido meio século da sua promulgação, o Código de Napoleão já tinha envelhecido na época em que foi elaborada a Consolidação e alguns dos seus aspectos já estavam sendo corrigidos, na própria França, não havendo motivo para manter no Brasil soluções que se tinham tornado obsoletas (VILLARD, 1986, p. 1).
Chegamos agora ao ponto que mais nos interessa, ou seja, a influência do trabalho de Teixeira de Freitas nos códigos civis argentino e brasileiro.
Em primeiro lugar, não há dúvida que a Consolidação e o Esboço exerceram importante influência sobre o Código Civil argentino sancionado pela Lei nº 340, de 25.9.1869, que entrou em vigor em 1º.1.1871. Na realidade, Vélez Sarsfield teve conhecimento dos trabalhos de Teixeira de Freitas, tendo com ele se correspondido e considerando-o como um luminar do direito. Reconhece a importância da influência que sobre ele exerceram os grandes juristas estrangeiros e cita, além de Freitas, Savigny, Rau e outros[11].
Na sua excelente biografia de Teixeira de Freitas, o Professor Silvio MEIRA cita vários trabalhos que tentaram quantificar o número de artigos do Código Argentino que se inspiraram no Esboço, concluindo que chegaram a mais de mil, contra 300 inspirados no Código Chileno e no projeto Espanhol, e, conforme os autores, algumas centenas, podendo alcançar até 1000, reproduzindo textos da doutrina francesa e do Código de Napoleão[12].
No Código Civil Brasileiro de 1916, fez-se o mesmo trabalho, localizando-se cerca de 500 artigos inspirados no antigo direito português, 400 decorrentes dos projetos anteriores liderados por Teixeira de Freitas, cerca de duzentos oriundos do Código Napoleão e uma centena do BGB[13].
Por outro lado, é preciso reconhecer que, na realidade, a própria obra de Freitas não deixa de revelar as suas fontes romanas, ibéricas e doutrinárias francesas e germânicas, de modo que estamos no mundo do direito comparado, com relevantes analogias entre as fontes do Código Argentino de 1869 e o Brasileiro de 1916.
3.8. O Direito Obrigacional do Mercosul
O que há de importante é a aproximação entre a ciência jurídica e o direito legislado dos dois países, Brasil e Argentina, com influências recíprocas, que se fizeram sentir nos meados do século XIX, preparando o desenvolvimento de uma união econômica, que só se realizaria mais de cem anos depois com o Mercosul.
Atualmente, no início do terceiro milênio, também estamos encontrando as mesmas soluções, na Argentina, no Projeto de Código Civil elaborado em 1998, pela Comissão nomeada pelo Decreto 685/95, e, no Brasil, no Código Civil de 2002, tendo ambos, em parte, se inspirado nas lições de Teixeira de Freitas quanto à unificação e à metodologia. O Projeto argentino, elaborado pelos Professores Hector Alegría, Atilio Anibal Alterini, Jorge Horacio Alterini e outros, tem seis partes, pois a primeira delas corresponde à nossa Lei de Introdução, mas, em relação às demais, há uma completa simetria com o nosso Código Civil.
E talvez, hoje, a nossa legislação possa até estar à frente de algumas das normas européias.
Assim, em recente colóquio, sobre a nova crise do contrato, o Professor JESTAZ (2003) admitiu que gostaria que se pudesse sonhar, na França, com uma revisão da parte do direito das obrigações do Código Napoleão, na qual se incluísse uma concepção comutativa do contrato[14]. Ora, este Código, com o qual os franceses ainda sonham, já existe.
É o Projeto Argentino de 1998, com os seus 2.532 artigos, é o Código brasileiro de 2002, com os seus 2.045 artigos, ambos alinhados numa nova concepção do direito, na qual sempre deve prevalecer a boa-fé e se reconhece a função não só econômica, mas também social do contrato.
Assim, reencontramos-nos, brasileiros e argentinos, com a mesma visão moderna e original do direito, como há mais de século e meio atrás.
Como diz o Professor Marcelo Urbano SALERNO (1998, p. 119), parafraseando Roque Saenz Peña, “em matéria civil, entre a Argentina e o Brasil, tudo nos une, nada nos separa”.
E talvez a melhor e a mais eficiente das homenagens que poderíamos prestar a Teixeira de Freitas e a Vélez Sarsfield, presentes hoje entre nós, pela sua imortalidade subjetiva, consistiria, não só em reverenciar a sua memória, mas em planejar o futuro, de acordo com o espírito do trabalho que ambos realizaram.
4. Parecer quanto ao Vocabulário e Esboço de Teixeira de Freitas
O presente ensaio aborda a vida e a obra de Teixeira de Freitas, mais precisamente a sua monumental obra (mais do que a própria Consolidação) que é o Esboço. Essa denominação foi dada por Teixeira de Freitas ao projeto por ele elaborado para o Código Civil brasileiro. Esboço que, na proclamação de Clovis Bevilacqua entrou para o acervo da jurisprudência pátria como a sua contribuição mais valiosa, pela riqueza, segurança e originalidade das idéias.
O Esboço se foi publicando em tomos ou fascículos. Nada menos do que 3.702 artigos chegaram a ser publicados e, quando a obra foi interrompida, mais 1.314 já se encontravam no prelo, além de mais duzentos que, em manuscritos, estavam quase concluídos sobre os jura in re aliena direitos reais em coisa alheia. Teixeira de Freitas só não chegou a elaborar o livro referente aos direitos em geral, mais precisamente o referente a sucessões, concurso de credores e prescrição.
De suas idéias originais, ao menos sob a óptica do direito positivo brasileiro, tem-se, entre outras, a unificação do direito privado e a referente à classificação das matérias do Código, como, aliás, claramente expôs na citada introdução à Consolidação: «Os direitos civis são direitos pessoais ou direitos reais, havendo, contudo, institutos de natureza comum, que envolvem direitos reais e pessoais, como a herança, o concurso de credores e a prescrição».
Muitos dispositivos do Esboço, observe-se, por outro lado, subsistem no Código Civil de 1916. Todavia, o mais impressionante é a sua influência em outros países latino-americanos como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai. O Código argentino não só reproduziu seus inúmeros artigos como seguiu-lhe a orientação geral. No Código Civil do Uruguai é considerável a sua influência e, no do Paraguai quando da adoção (como lei sua) do código argentino.
4.1. A Filosofia Jurídica e Humanística de Teixeira de Freitas
Teixeira de Freitas não foi, e nem tampouco se reconhecia como filósofo do Direito. Invocava para si o justo título de romanista e civilista, em coro com José da Silva Lisboa, o Visconde de Cairú, ao dizer da Roma americana «não podeis fazer-me maior honra do que chamando-me de romanista».
Há poucas, porém boas biografias sobre Teixeira de Freitas, as mais antigas são as de Sá Vianna e Spencer Vampré, as mais modernas são de Haroldo Valladão, e do ponto de vista historiográfico, a mais completa é a do romanista paraense Sílvio de Bastos Meira (Teixeira de Freitas – O Jurisconsulto do Império, 1979, Rio de Janeiro, Liv. e Editora José Olympio [Coleção Documentos Brasileiros, vol. 185]), obra de referência obrigatória para o Freitismo, cujo nome está a reclamar até hoje a edição das suas obras completas!
Savigny o inspirara, a quem Teixeira de Freitas simplesmente chamava de “o jurisconsulto”, ainda que o mestre da Escola Histórica privilegiasse o direito costumeiro e a Volksgeist (fenômeno da Kulturkampf do século XIX, cujo expoente maior é Goethe, ao lado do seu correlato Hegel).
A correlação com a Escola Histórica, que sob certos aspectos foi aprofundada por Hegel, dá-se em razão do “naturalismo contingente” ou o que mais tarde Rodolfo Stammler veio a chamar de «direito natural de conteúdo variável», o conjunto de princípios normativos e orientadores de regras jurídicas espaço-temporais em função do evolver histórico das instituições.
A vinculação de Teixeira de Freitas ao autor do System des heutingen römischen Rechts (Sistema de Direito romano hodierno) pode ser inferida não só pela explícita adesão do autor às idéias do defensor do historicismo na Alemanha (contra Thibaut) como também pelo seu realismo histórico-social expresso no Esboço.
A aporia da oposição de Savigny contra a codificação contrasta com a de Freitas, uma vez que caracterizou-se pela oposição às doutrinas jusnaturalistas dos séculos XVII e XVIII, em que afirmavam a existência de um direito natural universalmente válido, cuja essência e fundamento estariam na própria natureza do homem, daí derivando uma série de direitos subjetivos e inatos, os quais não poderiam ser desconhecidos ou conspurcados por qualquer poder. Rompendo com as concepções teológicas medievais acerca do Direito e do Estado, buscano exprimir, sob o aspecto ideológico, a luta progressiva da burguesia em ascensão, e do ponto de vista religioso, a consolidação do cisma reformista, que já não podia basear-se na fé para a consecução de um direito comum, mas sim num sistema que se baseasse na natureza e na razão humana.
O jus naturale assim concebido visava o aniquilamento do direito feudal, bem como à criação de novas relações sociais e de uma organização política adaptada aos seus interesses da classe burguesa. O direito positivo ou histórico não poderia servir de ponto de apoio às aspirações referidas, pois representava a ordem existente, o poder do Estado feudal. Daí a necessidade de uma ideologia diferente, que se consubstanciou na teoria do direito natural racional que justificasse a nova fé e o capitalismo.
Cumpre, à guisa de ilustração, relacionar os pontos comuns a todas as Escolas do direito que se viram influenciadas pelo jusnaturalismo clássico: 1.°) O Direito teria como fundamento, contrariamente às concepções teológicas feudais, não uma lei divina ou a vontade de Deus, mas sim a própria natureza do homem, podendo ser descoberto pela razão; 2.°) O homem teria vivido, primitivamente, em um estado de natureza, uma Idade de ouro como a dos antigos estóicos segundo alguns ou um estado de luta segundo outros, passando depois, através de um pacto ou contrato social, para o estado civil, quando então transferira à sociedade uma parte dos seus direitos, para que ela, em troca, defendesse a sua vida e propriedades; 3.°) Derivando o direito da própria natureza do homem, possuiria este direitos naturais, originários e inalienáveis, os quais não poderiam ser ignorados ou diminuídos por qualquer poder, já que eram anteriores a toda sociedade; 4.°) Podendo o direito natural ser conhecido por meio da razão, estaria o legislador capacitado a elaborar sistemas jurídicos perfeitos, devendo ser, portanto, estimulada a atividade legislativa.
A idéia de que o fundamento último do direito natural seria a própria natureza do homem racional dava a todas as doutrinas do jusnaturalismo clássico um sentido anti-histórico, pois as relações jurídicas, bem como o Estado, eram consideradas fenômenos eternos e imutáveis, independentes da evolução histórica. O individualismo estava igualmente implícito nessas teorias, pois tomavam elas como ponto de partida o homem isolado, fora da existência da sociedade. Variavam ainda as diferentes doutrinas no tocante à garantia última de aplicação do direito natural.
Nos Estados Unidos foi James Wilson o representante mais destacado da filosofia jusnaturalista, partilhando das suas idéias vários dos autores da Constituição de 1787. Na França, em seguida aos enciclopedistas e demais ideólogos da Revolução Francesa, a teoria jurídico-natural e do contratualismo alcançou a sua culminância e, também, o seu sentido mais radical, com a figura de Jean Jacques Rousseau. Suas idéias exerceram notável influência sobre Immanuel Kant, o grande representante do racionalismo alemão. A escola clássica do direito Natural teve, entre outras conseqüências importantes, tais como o movimento em favor das atividades legislativas, a criação dos instrumentos jurídicos que permitiram a superação das restrições feudais, a humanização do Direito Penal e de seus processos, aquela de haver estabelecido os direitos e liberdades fundamentais da pessoa humana, consubstanciados na Déclaration des droits de l’homme et du citoyen de 1789.
A falácia da escola jusnaturalista clássica, que buscava os fundamentos éticos do direito de uma sociedade secularizada pluralista numa razão comum parte do falso pressuposto de um conceito de natureza em que ela mesma e a razão são entrosadas de tal modo que a própria natureza se torna racional, essa visão as natureza perdeu a sua razão de ser com o advento da teoria da evolução. A natureza em si não é mais vista como racional, ainda que exista nela um comportamento racional.
Mais tarde a própria escola-histórica, pela mão de Giambattista Vico, combatente dos pressupostos racionais da escola clássica do Direito Natural, homem que afirmava existir uma Providência ou inteligência imanente do mundo, que criara as leis da História. Contemporaneamente a Vico, Montesquieu procurava ressaltar a influência da tradição, ao lado dos fatores geográficos, na história de cada povo. E o mesmo fizeram os pré-românticos alemães Justus Mõser e Johann Gottfried Herder. Porém, os verdadeiros inspiradores da Escola Histórica foram os escritores adversários da Revolução Francesa, como Burke, Joseph de Maistre, Gabriel de Bonald, Adam Müller, von Haller, Vincenzo Cuoco e outros, os quais repeliam as doutrinas jusnaturalistas, sustentando serem o direito e as instituições políticas fruto da história e da tradição de cada povo e não o resultado de princípios racionais. Como iniciador da escola deve ser mencionado o nome de Gustav Hugo, professor em Göttingen. Foi, porém, com Friedrich Karl von Savigny e seu discípulo e sucessor na cátedra em Berlim, Georg Friedrich Puchta, que o historicismo jurídico não apenas ganhou realce como formulou de maneira sistemática os seus postulados básicos, assim resumidos: 1º) O direito surge da consciência nacional ou espírito do povo, isto é, das convicções próprias da comunidade, mantidas pela tradição; 2º) O direito evolui espontaneamente, tal como a linguagem, não podendo ser imposto em nome de princípios racionais e abstratos; 3º) O costume é a principal fonte do Direito, cabendo ao legislador ser o intérprete das regras consuetudinárias, transformando-as em leis.
Aos nomes acima referidos podem ser acrescentados os de outros juristas alemães do século XIX, como Johann Friedrich Göschen e Kari Friedrich Eichhorn, bem assim os de historiadores e eruditos, como Barthold Niebuhr e Jakob Ludwig Karl Grimm. Cabe, também, mencionar o historicismo jurídico de caráter religioso, do qual foram as expressões maiores Friedrich Julius Stahl entre os protestantes e George Philips entre os católicos, orientação que assumiu aspecto extremadamente conservador, identificando-se em muitos pontos com a dos escritores contra-revolucionários da Restauração.
Neste breve perfil da escola histórica, vê-se que a vinculação de Teixeira de Freitas não se coadunava plenamente com ela, ademais do Krausismo que lhe permeia toda a obra de Direito Positivo (vide a Introdução ao Esboço), há mesmo que se considerar a renovação da romanística pela mão do pandectismo alemão, e Freitas mostrou-se um metódico e sistemático estudioso do direito civil em muito semelhante, mas originalmente diferente.
O Pandectismo repelia as teorias jusnaturalistas, bem como qualquer noção absoluta ou abstrata da idéia do direito, considerava este como um corpo de normas positivas a serem estabelecidas com base no sistema “científico” do direito romano, apresentava pontos de identidade com a escola francesa da exegese, desenvolvida na mesma época. Entretanto, ao passo que os juristas franceses tomavam como ponto de partida a lei positiva, consubstanciada nos códigos promulgados sob Napoleão, os pandectistas, ante a inexistência na Alemanha de uma legislação semelhante, procuravam, inspirando-se nos estudos romanísticos da escola histórica do direito, construir um sistema dogmático de normas, usando como modelo as instituições romanas.
No que tange ao ideal de codificação, a influência maior que certamente inspirou o espírito de Freitas na preparação do seu ciclópico Esboço foi a da escola exegética, surgida na França, durante o século XIX, durante o período de Napoleão. A codificação napoleônica abrangera não apenas o famoso Código Civil dos franceses, promulgado em 1804, mas também o Código de Processo Civil (1806), o Código de Comércio (1807), o Código de Instrução Criminal (1808) e o Código Penal (1810), tendo por objetivo a unidade legislativa de toda a França, objetivo esse que o Brasil também almejava.
O Code Civil, bem como os demais códigos e leis que se lhe seguiram, constituíam o fundamento normativo da nova ordem estabelecida pela revolução burguesa de 1789. A elaboração do Código Civil fora mesmo um dos primeiros objetivos da Revolução, tendo sido ordenada pela Constituição de 1791. Como conseqüência do seu apego à letra da lei e à sua interpretação, ou, para complementar a tarefa exegética, à pesquisa da vontade ou intenção do legislador, negava a Escola da Exegese qualquer valor aos costumes jurídicos e à atividade criadora da jurisprudência. Apesar da forçada imobilidade a que submeteu o direito francês, divorciando-o da realidade social, perdurou durante grande parte do século XIX e sua influência se faz sentir ainda hoje. Dos seus principais representantes podem, entre outros ser mencionados os nomes do alemão Karl Salomon Zachariae, Jean Charles Demolombe, Raymond Troplong, François Launenty Victor Napoléon Marcadé, Charles Antoine Aubry, Charles Rau e Gabriel Baudry-Lacantinerie, notadamente os três últimos, autores de famosos tratados sobre o direito civil francês.
A identidade de Freitas com a escola histórica dá-se pela ignorância das causas fundamentais do direito em detrimento das convicções morais do Volksgeist. Vislumbra-se na sua concepção do direito a confluência das idéias hauridas na obra de Savigny, como nos do praxismo português, baseado na subsunção do caso à lei, a par da experiência jurídica popular, isto é, a latere das suas peculiares circunstâncias históricas e sociais, em vez do “espírito do povo”, prefere ele aludir, mais concretamente, ao liame que une o direito positivo «ao gênio particular dos diferentes povos», segundo «o estado mais ou menos avançado da civilização, e sobretudo a forma de organização política e social» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952).
O sentir social de Teixeira de Freitas parece haver sido influenciado pelo Krausismo, muito em voga na Alemanha na segunda metade do século XIX, ideologicamente vinculado às revoluções liberais daquele tempo, cujos expoentes são Ahrens na Bélgica e “Los dos Ríos” (Julian e Giner) na Espanha. Para Friedrich Krause, o idealismo do direito natural estava condicionado à realidade social, numa espécie de panenteísmo em que combinavam as filosofias de Kant, Fichte, Schelling e Hegel com o jusnaturalismo pandectista de então. Para o filósofo de Heildelberg a lei natural e a idéia do justo preexistentes a priori no homem individual, realizam-se a posteriori no homem social.
A socialidade do direito de raiz jusnaturalista, contraposta à subjetividade transcendental Kantiana, realça a consciência da função social do direito dos adeptos do panenteísmo ao filósofo de Königsberg, autor da forma a priori e universal do comportamento humano.
Para Freitas, o valor fundante do ordenamento jurídico é a pessoa humana, na diretriz da filosofia Krausista, mormente dos Krausistas espanhóis, ou seja, como um ente ao mesmo tempo individual e social, consoante a aspiração de Krause de superar “o individualismo” de Kant, ao conceber o homem integrado nas suas relações sociais, basta lembrar a sua ojeriza à escravidão e a sua preocupação com a situação dos estrangeiros.
O homem em Teixeira de Freitas é o Absoluto participado horizontalmente, já que o homem se define e se realiza culturalmente em sociedade e verticalmente, quando esgotada a sua contingente finitude, busca a permanência no valor absoluto definitivo (eterno) de Deus, valendo-me aqui de uma interpretação teocêntrica do homem como ser teomorfo, em que o valor absoluto horizontal e vertical realizam o homem integral.
A pessoa humana é o ponto fulcral da filosofia do direito de Teixeira de Freitas, e será desta concepção que ele construirá, num mimetismo germânico, a divisão entre direitos reais e pessoais como absolutos e relativos, a serem comentados mais adiante. O humanismo de Freitas aproxima-se do culturalismo realeano, da dimensão integral do homem de per si e da sua dimensão social do ser-para-o-outro.
O aparente Kantismo de Freitas em seu jusnaturalismo apriorístico não esgota o seu pensamento social, convencido estava de que uma lei legitimava-se na legalidade, quando expressava, de maneira inequívoca, as mais altas aspirações do homem na caminhada do ser (sein) para o dever-ser (sollen).
A sólida formação humanística e jurídica de Teixeira de Freitas, não o enganava em relação à complexidade do fenômeno humano, tomado aqui pela sua perspectiva social e jusculturalista, a abranger variegados fenômenos v.g. naturais, culturais, sociais, políticos e econômicos, informadores desta perspectiva social, e portanto do fato social, bem como da perspectiva jurídica desta sociedade, e portanto, do fato jurídico, em que ambos, fato social e fato jurídico, por interagirem plenamente nas relações humanas, são capazes de construir o sistema jurídico, heterônomo e autopoiético, de modo a legitimar o modelo paradigmático (e hermenêutico) do direito por ela plasmado, o que pode explicar a determinação de Teixeira de Freitas para o Código Geral, capaz de todo o direito privado, entretanto, ele não houvera atinado para a hermeticidade do modelo privatístico do séc. XIX, totalmente fechado, que o levou a escrever mais de 4.000 artigos!
Pois é dessa consciência do fato social que Teixeira de Freitas, em oposição à legislação brasileira vigente desde 1850 do princípio da lei do nacional, o jus sanguinis tradicional nos países do velho continente, interessados em manter seus filhos ligados à pátria, através dos seus costumes e da aplicação do seu direito.
O Esboço consagrava o princípio da lei do domicílio, a lex domicilii et solis, universalista, congregadora de todas as raças e todos os povos, a civitas augencens do velho Pompônio, a civitas amplianda, o amor ao estrangeiro e sua incorporação no seio da sociedade na qual ele escolheu para viver, ao revés do Brasil, a lei do domicílio foi logo adotada na Argentina e em outros países do continente, entre nós, somente com o advento da nova lei de introdução ao código civil de 1942, por circunstãncias temporais (os cidadãos dos países do Eixo eram parcela expressiva da imigração brasileira) é que consagrou-se definitivamente em nosso sistema o princípio do domicílio.
Vale dizer que o ilustre codificador argentino Dalmácio Véiez Sarsfield, autor do projeto do Código Civil Argentino, seguiu, em boa parte, as diretrizes do Esboço em relação ao domicílio, já que o seu art. 53 corresponde ao art. 32 do Esboço, aliás, elogiada por Carlos Cossio na sua Teoria Egologica del Derecho (1964, pág. 405) como possuidora de um conteúdo jurídico a priori, fundado direitamente na intuição da liberdade de conduta, além dos famosos dispositivos relativos à pessoa natural e jurídica. A demonstrar a sua dissonância com Savigny no que se refere à natureza das pessoas jurídicas, não adota a Teoria da Ficção, mas as pessoas de existência ideal, vale dizer, entidades ou entes jurídicos distintos das «pessoas de existência visível», ou seja, todos os «entes que apresentarem característicos da humanidade», preferiu o seu Vocabulário em vez de exercícios imaginativos, os «entes de existência ideal», antecipam, a bem de ver, a «teoria dos objetos», o que lhe valeu os encômios de Vélez Sarsfield, nas suas notas integrantes dos artigos 31 e 55 do Código Civil portenho (as notas ao Código são legalmente parte integrante do mesmo), em epístola datada de 20 de junho de 1866 dizia ele «toda a dedicação da minha vida encerra-se no Projeto e não há consideração que eu anteponha à verdade»[15]
A visão institucional do Estado foi sempre a de resgatar o sentido social das instituições políticas, v.g. o passo em que comenta o projeto de Código Civil dos Países Baixos- «o sistema inteiro de um Código depende muitas vezes de uma só disposição» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952), e «Cada relação de direito tem a sua sede própria, seu lugar de existência» (Código Civil Esboço – introdução, Rio de janeiro, Ministério da Justiça, 1952) e a sua irresignação contra aqueles que não levavam em conta o Estado, «imbuídos nos princípios de um falso Direito Natural».
4.2. Teixeira de Freitas Lexicógrafo – O estilema do Vocabulário e o Esboço
O Vocabulário, mais até do que o Esboço, é a obra que melhor retrata a carga semântica das palavras, quando sintaticamente ordenadas por Teixeira no posterior Esboço, é nele que vamos nos dar conta do estilema[16] da autor pela expressividade com que conceituava os sintagmas, aliada à abonação, sempre clássica e por vezes curiosa, com que arrematava os verbetes.
Eis alguns exemplos que colacionamos:
Ano é o lugar cronológico do escoamento do tempo, como ânus é o da repetida passagem dos nossos escoamentos grossos.
Ano exprime os 365 graus dos círculos, salvos os sobejos sucessivamente corrigidos.
Esta soma de graus (gera os) foi preferida, por ser divisível em muitas partes alíquotas, isto é, sem ficar fração.
Em verdade, sua metade vem a ser 180 graus, seu terço 120, seu quarto 90, seu quinto 72, seu sexto 60, seu oitavo 45, seu nono 40, e seu décimo 56.
Note-se bem, com muita atenção, que não tem sétimo com partes alíquotas; e daí a criação do Cap. I do Génesis em 6 dias, compostos de tardes e manhãs, e portanto começando à meia-noite.
SETE – 7 – pois, é a unidade do SENHOR DEUS (sé tem), de que ele começou a consertar; fazendo a primitiva Páscoa, e obrigando assim o Deus Diabo a parar ou descansar.
Dia é o espaço de tempo, pelo qual se medem as semanas, os meses, e os anos, do tempo imóvel do calendário; tendo este entre nós a denominação vulgar de folhinha, que herdamos de Portugal, uma das muitas indicações do futuro destino da língua portuguesa neste Império do Brasil. Eis a tal respeito o conteúdo dos nossos dois lexicógrafos nos dicionários, que tomamos por base do nosso Vocabulário.
Dignidades são distinções, merecimentos, qualidades honoríficas, que enobrecem os estados dos homens, quando bem merecidas; porquanto as distinções públicas não se instituirão para os homens como tais, mas só para recompensa de seus méritos verdadeiros. Infelizmente acontece quase sempre o contrário!
Dinheiro é a coisa única do mundo, que representa todas as outras, que são suscetíveis de valor pecuniário: e daí o provérbio falso pela sua generalidade: quem dinheiro tiver, fará o que quiser.
Só DEUS pelo direito — um só Deus verdadeiro — a tudo representa diretamente, ou indiretamente, a começar da Santíssima Trindade.
Pelo seu fim de representação comum, são importantíssimos os efeitos jurídicos da invenção do dinheiro manifestando-se em quase todos os assuntos.
Direito, se Deus a tudo representa subjetivamente, o representa objetivamente, pois que o mundo só pode existir juridicamente; e, ao contrário, só a Misericórdia Divina nos pode salvar. Direito tem duas significações notáveis; uma de faculdade concedida a cada um de nós para exigirmos o necessário a nossa coexistência.
Eqüidade, não há palavra de que mais se use, e todavia nenhum escritor satisfaz sobre o seu verdadeiro sentido.
Segundo a Doutrina do Dic. de Pereira e Sousa:
“Eqüidade, no sentido primitivo e verdadeiro, é o mesmo que justiça (não concordo), são palavras sinónimas’, entendendo-se por ambas a disposição de ânimo constante, e eficaz, de tratar qualquer ente, como ele é; e de contribuirmos, quanto está em nós, sem prejudicar-nos, nem prejudicarmos a outros, para o fazermos perfeito e feliz.”
“Alguns moralistas confundem a eqüidade com a caridade, dizendo querela consiste em não exigir com rigor o que nos é devido, e em relaxar voluntariamente alguma parte dos nossos direitos reais.”
“Às vezes a lei positiva se opõe à eqüidade natural, mas isto provém do defeito da lei, que não pode prever e acautelar todos os casos; sendo certo que uma lei justa em um caso pode vir a ser injusta em outro, o que é uma conseqüência dos limites do espírito humano.”
“Neste sentido é que os jurisconsultos se servem da palavra eqüidade, para aporem à ideia da palavra lei, querendo significar que a justiça se exerce antes, não segundo o rigor da lei, mas com moderação e modificação racionável.”
“A eqüidade, que vulgarmente se chama eqüidade de Bârtolo, e que teve lugar na sucessão dos prazos vitalícios, e no direito da renovação deles, não foi inventada por Bârtolo; mas estabelecida em direito natural, que não consente que alguém tire lucro da perda alheia — Lei de 9 de setembro de 1770, § 9.”
De acordo com a Doutrina do Dic. de Ferreira Borges:
“Esta palavra tem em jurisprudência duas significações. Na primeira significação, pode tornar-se por aquele ponto de exatidão que determina a decisão de um juiz, quando quer seguir as regras estritas, a que é obrigado.”
“Na segunda significação, vem de que a justiça é exercida, não segundo as regras da lei, mas moderada e adoçada razoavelmente.”
“A lei sem eqüidade é nada. Os que não vêem o que é justo ou injusto senão através da lei, nunca se entendem tão bem, como os que o vêem pêlos olhos da eqüidade.”
“O estudo dos princípios da eqüidade é o estudo por excelência do magistrado, e do jurisconsulto; e neste estudo bebam as luzes da sabedoria, que devem caracterizá-los.”
“Em nenhum ramo de jurisprudência brilha mais a eqüidade que nas leis comerciais, desde as primeiras, que nos deixou a Antiguidade. Quem bem as estudar, e combinar os princípios dessas determinações, e sua sanção, achará que merecem o nome de eqüidade escrita. Todas as ordenanças comerciais, que se apartam do rigor do direito civil, não são senão a moderação e mitigação razoável deste outro direito.”
“Daí vem que não há máxima comercial que não tenha por base a suma eqüidade; e aconselhará e julgará mal, em discussões do comércio, quem não olhar para a lei pêlos olhos da eqüidade”.
Na Doutrina do “Repertório de Jurisprudência“, de Merlin:
“É bem certo, que aqueles que fazem profundo estudo do direito e da eqüidade têm noções mais finas, mais delicadas, do justo e do injusto. Pode-se mesmo dizer que a lei seria inútil aos homens, se cada indivíduo tivesse, no coração, o amor da eqüidade, se cada cidadão se pudesse instruir por si mesmo em seus deveres. Ora, neste sentido, a eqüidade faria tudo sem a lei.”
“Mas, o que vem a ser a eqüidade na opinião da maior parte dos homens? Ê muitas vezes (atenção!) alguma coisa de tão arbitrário, que o justo para um é o injusto para outro; a eqüidade, entretanto, como a verdade, só é uma. Não é pois exato dizer que aeqüidade é tudo sem a lei, visto que sem esta ficaria obscuríssi-ma; assim como também, o que sem a eqüidade ficaria sendo a lei?”
“Hoje os juizes não podem mais suprir as penas que a lei não pronuncia, nem agravá-las, ou mitigá-las (o mesmo pelo nosso direito segundo o art. 33 do Cód. Crim.)”
“Em matérias civis (atenção!), em que a lei é clara, e precisa para certos casos, seria ferir a própria eqüidade fugir da lei, a pretexto de temperar, ou melhorar suas disposições com uma eqüidade maior, etc.”.
Só achamos generalidades nas proposições dos nossos dois primeiros lexicógrafos, algumas sem exatidão, e portanto não aceitáveis até certo ponto; mas, no Repertório de Merlin, tais proposições mostram-se até opostas entre si, sem deixarem alguma noção segura.
Se a eqüidade fosse o mesmo que a justiça, exprimindo palavras sinônimas, como diz Pereira e Sousa por imitação de Merlin, a nossa Constituição política não mandaria em seu art. 179, XVIII, organizar quanto antes um CÓDIGO CIVIL E CRIMINAL, fundado nas sólidas bases da JUSTIÇA E EQÜIDADE. Logo, aí temos idéias distintas. E, quanto à eqüidade ser temperamento ou moderação de justiça, vemos esta censura do Dic. de Moraes no Ensaio de sinônimos, de Frei Francisco de S. Luiz.[17]
A boa razão, pela qual o § 9.° da Lei de 18 de agosto de 1769 autoriza a julgar, pode ser a razão absoluta da eqüidade; e daí não se segue também, que autoriza a julgar contra as disposições das nossas leis positivas. Ao contrário, proíbe que assim se julgue, e até contra os usos legitimamente aprovados; e só autoriza a boa razão relativamente ao direito romano, quando o direito pátrio for omisso sobre os casos ocorrentes.
A JUSTIÇA é um sentimento do coração humano, é uma virtude, é (como sabiamente ensina o direito romano) uma constante e perpétua vontade de dar a cada um o que é seu; mas conforme à lei aplicável, qualquer que seja esta. A eqüidade pode referir-se ao tempo de uma lei futura, que pode cada um desde já imitar, se o direito atual não lho proíbe.
O achaque da Presente Existência é atribuir-se-lhe um sistema imutável, com esquecimento do Pecado Original, sob cujos males, e nas garras da Morte, irmos imperfeitamente vivendo. Tal estado carece do bem em todas as suas manifestações possíveis, e portanto não tem justiça. A Presente Existência tem por fim, para que DEUS seja realidade, trocar uma existência imperfeita e defeituosa por outra final, que seja perfeita em todas as aspirações morais. Nosso futuro destino, portanto, é a Existência Uni’ versai, o Universo, o Céu na Terra; e tal será o último estado da justiça, em que as leis, que são as letras do nosso A, B, C, em equação com ela, representarão um novo Deus a final.
A esse último estado antecederá o da eqüidade, obra do homem justo, como precursor da existência universal, obra que alguns teólogos da filosofia escolástica (veja-se o Vocabulário de Bluteau) têm chamado CIÊNCIA MÉDIA.
Homem, na interpretação das leis, deve-se entender homem e sua mulher, como um só ente, salvo quando expressamente forem considerados um ente separado.
A Ord., Liv. 1.°, Tít. 31, § 1.°, e a do Tít. 84, § 3.°, declara o marido e sua mulher como um só corpo; e o doutíssimo Savigny cada um deles, como entes por metade.
Se, na doutrina cristã, o celibato dos santos se reputa estado mais perfeito que o do matrimónio, percebe-se nisto, hoje, uma necessidade provisória por motivo da Futura Ressurreição da Carne, prometida no final do Símbolo dos Apóstolos, em modelo microscópico de uma sociedade perfeita.
A tal respeito o Dic. de Pereira e Sousa apenas limitou-se a estas considerações[18]
Jurisconsulto (Pereira e Sousa) é o que sabe as leis, as interpreta, aplica o direito aos casos; e responde às espécies, a que as leis são aplicáveis.
Jurisconsulto (Ferreira Borges) é o versado na ciência das leis, que faz profissão do direito, e de aconselhar.
Os antigos davam a seus jurisconsultos os nomes de sábios e filósofos, porque a filosofia encerra os princípios das leis e seu objeto é impedir a violação das leis.
Os jurisconsultos romanos eram o que chamamos hoje advogados consultantes, isto é, aqueles que, pelo progresso das idades, e pelo mérito científico, chegavam ao emprego das consultas, com a denominação de advocati conciliam, diferentes dos júris-peritos.
Basta, para ser autor em jurisprudência, fazer um livro sobre leis, bem longe porém de que lhe confira ele a qualificação de jurisconsulto. Que é pois, o jurisconsulto senão o homem raro, dotado de uma razão forte, de uma sagacidade pouco comum.
Jurisprudência (direito romano) é a notícia das coisas divinas e humanas, ciência do justo e injusto.
Igualdade quer dizer semelhança de circunstâncias.
A igualdade natural é a base de todos os deveres sociais, sendo, como diz Sêneca, o fundamento da eqüidade.
Os homens são iguais entre si, pois a natureza humana é a mesma em todos; tendo todos a mesma razão, as mesmas faculdades e um só e único fim.
São naturalmente independentes uns dos outros, posto que dependam igualmente de DEUS, e das leis naturais. Têm o mesmo tronco ou origem, seus corpos são compostos da mesma matéria; ricos e pobres, nascem, crescem, instruem-se, conservam-se da mesma maneira, morrem enfim e seus corpos igualmente se corrompem e se reduzem a pó. São sensíveis estas verdades a todos, porém não se segue delas, que deva reinar entre os homens uma igualdade de fato, mas só a igualdade de direito, que não permite fazer a outrem o que não queremos que se nos faça a nós; e que deve dispor-nos a fazer em favor dos outros as mesmas coisas que queremos que eles façam a favor nosso.
Esta igualdade consiste somente no direito, que todos os homens têm igualmente à sociedade e à felicidade, de sorte que todo o homem tem direito a que os mais o tratem como homem, que não se lhe faça alguma injúria, e que não se quebrante a seu respeito a lei natural.
O estado de solidão, de independência e de igualdade absoluta, é inteiramente incompatível com as precisões dos homens.
É necessário que eles vivam em sociedade para serem felizes, e não podem nela viver sem graus de relação, e de dependência entre si.
Estes graus de dependência foram estabelecidos por utilidade comum dos que servem e dos que mandam.
Todos devem contribuir para o bem público, os superiores por via de autoridade e de inspeção, e os inferiores por via de respeito e de submissão.
Os diversos graus de subordinação dependem necessariamente de um Poder Supremo que governa a todos os cidadãos.
Império (Dic. de Moraes) vêm a ser os direitos de que goza o Imperante, ou Soberano.
Distingue-se em império mero, mero império e império misto.
Império mero é o poderio absoluto do soberano sobre seus vassalos, com direito de os punir, tirando a honra, a vida, e os bens.
Mero império é a jurisdição que o soberano dá aos magistrados para julgar as controvérsias, e impor a pena de morte, confiscação de bens, etc.
Império misto é o poder de julgar causas cíveis, e de impor penas pecuniárias; e, entre as aflitivas corporais, a prisão, e outras, que não sejam de sangue — Ord. Afonsina, Liv. 2.°, Tít. 63 „ § 2.°.Império.
Esta distinção é importantíssima, indicando que o IMPÉRIO exprime um só homem, só a educar-se na escola do mundo até que sua instrução obtenha certo grau, que o DIVINO REDENTOR o julgue digno de ser escolhido para Paracleto, para Evo; e assim o confirmam nossos costumes, e a decomposição da palavra.
Alguns conceitos expendidos por Teixeira de Freitas naquela que seria a sua última obra o Vocabulário Jurídico, foram escolhidos tendo em conta a originalidade das abonações ou a sua importância para a fixação dos sentimentos jurídicos do autor[19], valeu-se, designadamente da doutrina do Diccionário de Pereira e Sousa, como o seu conceito de eqüidade… [20]
Tinha Freitas a noção exata de que o direito está a serviço de um ideal e este ideal é o ideal de justiça, que lhe foi tão caro e que lhe faltaram tantas vezes. Porém sem desacreditar deste ideal, pode ter desanimado diversas vezes, e possivelmente desanimou, frente ao que os seus inimigos, invejosos da sua competência e capacidade de trabalho, lhe aprontaram até o final do vida, mesmo o causídico de Mecejana, José de Alencar, morto aos 48 anos, não desistiu de perseguir um velho Jurista, já sem saúde, porém já exalando o odor de imortalidade que a sua genuína obra deixaria, odor este que incomodava a muitos.
4.3. Teixeira de Freitas – Jurista de la América del Atlântico
Preliminarmente mister se faz citar que Teixeira de Freitas foi um renomado jurista, teve reconhecimento na América Latina e fora dela, foi o jurista do Atlântico, ao lado de Andrés Bello, jurista do Pacífico.
Cabe ainda elucidar que o Código Civil, previsto na Constituição brasileira de 1824 (art. 179, XVIII), como se sabe, demorou muito a ser aprovado, até porque não é nada fácil a feitura de um código disciplinador dos direitos e obrigações de ordem privada concernentes às pessoas, aos bens e às suas relações. Assim, até à entrada em vigor da obra de gênio de Clovis Beviláqua vigiram as Ordenações Filipinas, mais precisamente o seu Livro Quarto.
Evidentemente que as citadas Ordenações, que entraram em vigor em 1603, resistiram até o Século XX com muitas renovações, como a Lei da Boa Razão (1769), ao tempo de Pombal (como sabido, a lei em destaque dispôs sobre a observância das glosas do Chanceler da Casa de Suplicação de Lisboa, sobre a interpretação das leis tanto pela citada Casa quanto pelas Relações, bem como sobre a aplicação do direito subsidiário, em particular o Romano, e dos estilos e costumes) e a Consolidação das Leis Civis (Aviso de 24 de dezembro de 1858), monumental obra de Augusto Teixeira de Freitas.
Consabido que, de par com as Ordenações em destaque, numerosíssimas leis avulsas se foram acumulando e era preciso ordená-las sistematicamente, inclusive atualizando o Código Filipino. Essa enorme tarefa coube a Teixeira de Freitas, que, no prazo de três anos, consolidou, em 1.333 artigos, acompanhados de preciosas anotações e precedidas de uma introdução (simplesmente extraordinária), toda a legislação civil no direito brasileiro.
Com a promulgação do primeiro Código Civil português em 1867, as Ordenações Filipinas perduraram apenas no Brasil. Esclareça-se, de outra parte, que Teixeira de Freitas excluiu da Consolidação qualquer disposição referente à escravidão. Nada de estranhável para um jurista do seu porte, de sua sensibilidade e coerência, até porque para ele «a liberdade é o homem. A liberdade em política jamais teria o nome de direito se os povos se houvessem reunido das instituições opressivas; e na vida civil não teria correlativo, se não fora o abuso da escravidão».
Obra, contudo, a merecer adjetivação de monumental (mais do que a própria Consolidação) é o Esboço, como Teixeira de Freitas denominou o projeto por ele elaborado para o Código Civil brasileiro. Esboço que, na proclamação de Clovis «‘entrou para o acervo da jurisprudência pátria como a sua contribuição mais valiosa, pela riqueza, segurança e originalidade das idéias».
A unificação do direito privado e a referente à classificação das matérias do Código, exposta na citada introdução à Consolidação: «Os direitos civis são direitos pessoais ou direitos reais, havendo, contudo, institutos de natureza comum, que envolvem direitos reais e pessoais, como a herança, o concurso de credores e a prescrição». À crítica de não se tratarem de idéias efetivamente originais, tenha-se a observação do jurista argentino Martinez Paz (que escreveu uma biografia de Teixeira de Freitas e traduziu para o castelhano a introdução da Consolidação) que, após lembrar que o notável jurista não pretendia que sua classificação fosse absolutamente original, «sin dejar de ser antiguo, infundió a sus pensamientos un grave sentido de modernidad».
Muitos dispositivos do Esboço, observe-se, por outro lado, subsistem no Código Civil de 1916, e por conseguinte no atual de 2002. Todavia, o mais impressionante, por exemplo, é a sua influência em outros países latino-americanos como a Argentina, o Uruguai e o Paraguai.
O Código argentino não só reproduziu inúmeros artigos do Esboço como seguiu-lhe a orientação geral. Em carta dirigida ao notável civilista argentino Velez Sarfield, registra Teixeira de Freitas: «Vi que compreendeu perfeitamente o meu sistema; e nada mais grato para mim do que essa espontânea uniformidade de idéias, que assim fortalece a verdade da síntese que ousei formular».
No Código Civil do Uruguai é considerável a influência do Esboço e, no do Paraguai, quando adotou (como lei sua) o código argentino, têm evidência própria as diretivas do texto e das idéias de Teixeira de Freitas. Recordem-se das tentativas (após o Esboço) de codificação de que se encarregaram Nabuco de Araújo (apenas iniciada) e de Felício dos Santos, que resultaram infrutíferas ou, ao menos, sem resultado que se poderia designar prático.
Com a proclamação da República, acentuou-se a atividade legislativa em matéria de Direito Civil (casamento civil, Registro Torrens, normas relativas a sucessões e a títulos ao portador, por exemplo) e foi retomada a elaboração de projeto de Código Civil, inicialmente a cargo de Coelho Rodrigues e, após, com êxito, do extraordinário Clovis Beviláqua, e hodiernamente com os trabalhos multipessoais da Comissão revisora e elaboradora do Código Civil de 2002.
Foi o Código Civil de 1916, ao tempo de sua sanção, a mais independente das codificações americanas no particular, se bem que, à vista desarmada, revele as influências recebidas do Código de Napoleão, do Código Civil português e do BGB.
Jurista do Atlântico Sul, ao lado do Norteamericano, de Joseph Story, 1779/1845, o jurista do Hemisfério Norte e do Chileno-venezuelano, de Andrés Bello, 1781/1865, o Jurista do Oceano Pacífico e dos Andes. Não faria Freitas o Código Civil do Brasil, mas veio a ser o codificador latino-americano. Após a elogiosa aprovação em 1858 por notável comissão de juristas da Consolidação, o Governo Imperial, em 1859, encarregou Teixeira de Freitas de fazer o Projeto do Código Civil.
O “Cujácio brasileiro”, expressão cunhada pelo senador Cândido Mendes, apresentou, de 1860 a 1865, em diversos fascículos, depois reunidos em 2 tomos, o seu Projeto, com o modesto título, «Código Civil – Esboço – por A. Teixeira de Freitas», aparecendo em 1860 com um Título Preliminar, Do Lugar e do Tempo, e a Parte Geral, Livro Primeiro Dos Elementos dos Direitos, Das Pessoas, Das Coisas, Dos Fatos; em 1861 sai a Parte Especial, Dos Direitos — Livro Segundo, Dos Direitos Pessoais, Secção I, Dos Direitos Pessoais em Geral e mais outro. Secção II, Dos Direitos Pessoais nas Relações de Família. Afinal em 1864 e 1865 aparece a outra secção do Livro Segundo, a de n° III, Dos Direitos Pessoais nas Relações Civis, e do Livro III, Direitos Reais, as Secções, Direitos Reais em Geral, Sobre Coisas Próprias, Sobre Coisas Alheias, que foi até Servidões sem se completar. No todo publicara 4.908 artigos, tendo ainda muitos outros em manuscritos, 200 e tantos, e em aperfeiçoamento a parte final; herança, concurso de credores e prescrição. E era o mesmo Esboço acompanhado de notas, que constituíam um comentário histórico, doutrinário e filosófico dos respectivos artigos.
O próprio Teixeira de Freitas, de uma intransigente probidade científica sempre num constante anseio de perfeição, veio a se convencer em 1866, que devia mudar todo o plano da obra, e, em vez de um Código Civil fazer um Código Geral, dominando a legislação inteira, com definições, regras sobre a publicação, interpretação e aplicação das leis, e a Parte Geral do Esboço pessoas, coisas e fatos e um Código Civil, unificando o direito civil e comercial, com a divisão que vinha da Consolidação. E disse ao Governo que se este estava «satisfeito com os trabalhos» o autor estava «mal contente», não queria transformar um Ensaio que, «lealmente publicara sob o título de Esboço, num Projeto de Código e por isto repudiava a sua obra e só aceitaria continuar com o novo plano. Admitida essa idéia pelo Conselho de Estado em 1868 como «coisa nova… uma invenção que pode dar glória a seu autor e ao pais», foi, todavia, repudiada pelo Governo que afinal em 1872 rescindiu o contrato com Teixeira de Freitas, após insistir para que ele volvesse ao seu plano anterior.
Mas o «Esboço» chegara às mãos do insigne jurista argentino, Dalmacio Veiez Sarsfield que trabalhava desde 1864 para «redactar el proyecto dei Código Civil de Ia República Argentina» e estava em dúvida sobre «el método que debia observar en la composición de Ia obra». Noticiando-o diz o seu biógrafo, Abel Chaneton[21]
No “Projeto de Código Civil para Ia República Argentina”, Livro Primeiro, 1865, se via carta de Vélez Sarsfield ao Ministro da Justiça, de 21 de julho daquele ano, declarando, textualmente, que se servira: «sobre todo del proyecto del Código Civil que esta trabajando para el Brasil el Senor Freitas, del cual ha tomado muchísimos artículos», e, ainda: «yo he seguido el método tan discutido por el sábio jurisconsulto brasileño en su extensa y doctíssima introducción a Ia recopilación de Ias leyes del Brasil». Tomara, ainda, notas de Freitas, incluídas na edição oficial do Código.
Em carta datada de 11 de outubro de 1865, escreve Vélez a Teixeira dizendo que tomara o Esboço para seu guia na organização do Projeto, e acrescenta ele que iria provocar do povo e do governo argentino a manifestação em honra de Freitas, respondendo ele em 22 de novembro seguinte considera aquela carta «Uma das mais estimáveis recompensas que possam merecer meus trabalhos de Codificação Civil», aditando: «Vi que compreendeu perfeitamente meu sistema; e nada mais grato para mim do que essa espontânea uniformidade de idéias…» terminando pela oferta «do meu retrato, como franco sinal do apreço em que tenho sua respeitável pessoa». (Cartas de Freitas publicadas em Revista de Derecho, Historia y Letras, de Buenos Aires, vol. 68/527 e segs.).
Martinez Paz após haver comparado, colocando-os paralelamente, os planos do Esboço e do Código Civil Argentino, mostrou que «a Ia más simples inspección se advierte de Ia profunda analogia existente» e conclui nestes termos: «Si Ia influencia del pensamiento de Freitas sobre el espíritu y el método del Código Civil Argentino resulta evidente, no menos notória y decisiva aparece en Io que se refiere a Ia técnica particular, a Ias soluciones legales, a los textos mísmos de Ias disposiciones».
Tão profunda a influência de Freitas no Código Civil Argentino que o seu Esboço, que no Brasil jamais teve até 1952 uma edição conjunta, existindo apenas, esparsos, os fascículos sucessivamente aparecidos, foi, na Argentina, publicado completo, em duas edições. A primeira, «Código Civil – Proyecto por A. T. de Freitas, traducido al castellano por Arturo Pons, Buenos Aires, Imprenta El Hogar y Ia Escuela, 1900, en três tomos», com um prólogo de Luís V. Varella, onde se lê: «preparo el sábio jurisconsulto Doctor A. T. de Freitas, sin duda alguna, uno de los monumentos más ímperecederos que Ia intelectualidad sudamericana ha levantado a Ia ciencia jurídica moderna», que era a «Base adoptada por nuestro ilustre codificador ai preparar su propio trabajo» e se conclui: «Bastaria esta sola circunstancia para hacer comprender cuan importante es, en el estúdio de nuestra legislación de fondo, el conocimiento de Ia obra de Freitas. E n ella se encuentra, no solo el texto de los artículos que adopto el legislador argentino como princípios dei derecho próprio, sino también su explicación, su comentário y hasta sus concordâncias, puestos en Ias copiosas notas con que Freitas apoya cada una de Ias disposiciones que proyecta» (Op. cit., I, IV e V). A segunda edição, com o seguinte título: «A. T. de Freitas, Código Civil, Obra fundamental dei Código Civil Argentino, traducción castellana. Tomos I y II, Buenos Aires, 1909, A. Garcia Santos y J. Roldán».
Há que se notar que o Dr. Juan António Bíbloni autor de um Projeto de Reforma do Código Civil, escreveu Abel Cháneton: «Sabia a Freitas de memória:..». E quando Alberdí, confessando que não conhecia os trabalhos de Freitas, criticava a Vélez Sarsfield por não ter seguido o Código Civil Francês e seus autores. Porchat ou Portalis, Vélez respondeu-lhe: «jo después de un serio estudo de los trabajos dei senor Freitas los estime solo comparables con los de Savigny».
Martinez Paz conclui sobre Freitas: «Después de su muerte, una memória Ilena de veneración conserva su nombre, y su fama ha ido acrescentándose, a tal punto que sin hesitación puede afirmarse que ocupa hoy el puesto más saliente en Ia historia del pensamiento jurídico americano; otros habrá de acción más universal, más humana, que se hayan agitado y participado más intensamente de Ias preocupaciones de su tiempo, que hayan contribuído más eficazmente a Ia solución de los problemas nacionales, pero ninguno, sin excepción, ha alcanzado como jurista Ias alturas escaladas por Freitas; con él comienza en América Ia línea original de Ia dogmática jurídica, sin que pueda afirmarse que sus continuadores hayan tenido el poder de comunicarles un mayor esplendor».
No que tange ao Uruguai o Projeto de autoria do Dr. Tristán Navais, que ele enviou a Freitas e este agradeceu e elogiou, foi examinado por uma Comissão Revisora, da qual Navais também fez parte e que declarou ter que confessar haver se servido entre os antecedentes para seus trabalhos do «Proyecto del senor Freitas (inconcluso aún), el trabajo más notable de codificación por su extensión y por el estudio y meditación que revela». Na obra citada em 1910 pelo Dr. Ricardo Narvaja, «Fuentes, Notas y Concordâncias dei Código Civil de Ia República Oriental del Uruguay», se publica a carta de Freitas com a nota «el Savigny americano».
Quanto ao Paraguai, que adotou o Código Civil argentino, a obra de Freitas é de trato, citação e elogio diuturno dos seus principais juristas, Cecílio Baez, De Gasperi, Raul Sapena Pastor, a propósito, disse dele o eminente De Gasperi em carta aberta aos estudantes que «Teixeira de Freitas es el único jurista americano que puede alternar en Ia história con Savigny y los padres de Ia codificación germana».
Não somente a América Latina, mas também na região influenciada por Andrés Bello, em que domina o Código Civil do Chile, na região do Pacífico e dos Andes, pois o importantíssimo tratado do notável jurista equatoriano, Dr. Luís Borja, «Estúdios sobre el Código Chileno, 8 tomos», tem contínuas referências aos trabalhos de Freitas. E até na América Central chegou a influência do nosso insigne patrício, uma vez que o Código Civil de Nicarágua, de 1904, reproduziu nos seus artigos VII e VIII os artigos 6° e 7° do Esboço, copiados através dos artigos 13 e 14 do Código Civil Argentino.
Teixeira de Freitas escreveu, em carta de 20 de setembro de 1867, que se encontra na íntegra no Livro de Sá Víanna, págs. 169 a 187 a sua opinião de que era incompleto um Código Civil, e propôs dois Códigos, um Geral, e um Civil, mas lato sensu.
«O Código Geral «dominará a legislação inteira», abrangendo «matérias superiores a todos os ramos da legislação», «sobre as leis em geral, sua publicação e aplicação», «regras da interpretação», «providências sobre computação de prazos» e terá o Livro 1°, das Causas Jurídicas com 3 Seções, Das Pessoas, Dos Bens e Dos Fatos, e o Livro 2°, Dos Efeitos Jurídicos. Tal Código «das leis civis tira todas as disposições elementares sobre pessoas, bens e fatos; das leis do processo, ou qualquer outras, separa as disposições que regulam as provas; do atual Código do Comércio removerá o que conserne a estas mesmas matérias e do Código Penal apartará toda a teoria e nomenclatura dos delitos, como parte integrante da teoria dos atos ilícitos».
A novel teoria sobre a elaboração de um Código ou de uma Lei Geral, acima dos Códigos Civil, Penal, Processual, etc., com a matéria das próprias leis, sua vigência, interpretação, com as normas de direito internacional privado e de direito intertemporal, era, então, audaciosíssima, e, é todavia, a mais coerente com o sistema do direito brasileiro.
Encontramos as repercussões dessa idéia nas Leis e Regras Gerais Horei (Japão) de 1898, na Lei sobre Fontes do Direito do Estado do Vaticano de 1929, e, ainda em parte, no Código Civil Italiano de 1949, são exemplos daquele justo ideal de Freitas de um Código Geral. O comparatista francês René David ao participar dos trabalhos de revisão do Código Civil Francês constatou o fato[22]
Atente-se, ainda, no sistema de distribuição das matérias, para o caráter francamente precursor da inovação de Freitas, iniciada na Consolidação e completada no Esboço, do estabelecimento duma Parte Geral no Código, para as Pessoas, Bens e Fatos, que Raoul de La Grasserie salientou já em 1897[23]
No «Tratado de Ias Obligaciones en el Derecho Civil Paraguayo y Argentino», 3 vols., 1945-1946, do jurista paraguaio De Gasperi, em diversos capítulos referentes à «Teoria de los Hechos y Actos Jurídicos», Capts. XI, XIV, XVI, XXV, XXXIII, etc., rende uma justa «homenage de justicia histórica ai talento esclarecido dei sábio jurista que fué Teixeira de Freitas” vol. I, § 396, págs. 346/9, c/ § 391 e págs. 335 e 167[24]
Um Título Preliminar abria o Esboço e os seus títulos subseqüentes, consolidando na Parte Especial, cada instituto do direito privado de per si. A saber. E.g. «Título Preliminar — Do Lugar e do Tempo — Art. 1° — As leis deste Código não serão aplicadas fora de seus limites locais, e nem com efeito retroativo. Art. 2° — Os limites locais de sua aplicação serão neles designados. Os limites de sua aplicação quanto ao tempo serão designados em uma lei especial transitória, as disposições sobre esses limites locais estão disseminadas no Código inteiro, pela necessidade de aproximá-las a cada uma das matérias».
Nos artigos 3° a 7°, sobre o lugar de aplicação da norma, a lei do domicílio é consagrada, assim como a alegação e prova da lei estrangeira, a ordem pública, o favor negotti, etc., e, na Parte Especial, ao lado de cada matéria, p. ex., da capacidade, da forma dos atos, dos impedimentos de casamento, etc., as regras pertinentes para a solução dos conflitos de leis, como princípios gerais para a parte especial do Esboço.
Compatível com as idéias de justiça que sustentava, e que resultava, diretamente, do repúdio, por ele feito, da revelha teoria dos estatutos, pessoais, reais e mistos, que considerava “craveira artificial”, sem “a menor importância”, de «só valor histórico», e de sua rejeição da doutrina gaulesa da reciprocidade, «apresento um projeto de Código onde o legislador marca os limites locais da aplicação das leis, sem lhe importar a recriprocidade e o que se fez, ou faz ou se fará em países estrangeiros», como já disse o grande Haroldo Valladão, de quem nos valemos das referências aqui expendidas, o sistema da reciprocidade em direito internacional é egoísta e anti-cristão.
Na obra La codificación Civil en Iberoamerica-siglos XIX y X – Editorial Jurídica de Chile, muito embora o ilustrado autor, colega romanista, incorra em manifesta erronia quanto ao § 60 do capítulo X – Los esfuerzos por la codificación del Derecho Civil en el Brasil hasta 1893, quando diz, verbis– «……El território que recibiría el nome de Brasil fue descubierto por algunos navegantes españoles (sic) y después redescubierto, en 1500, por Pedro Alvares Cabral….”». A bem de ver, reconhece o autor santiaguense a importância de Teixeira de Freitas em vários passos da sua obra e termina por demonstrar em um quadro sinóptico de nº 10, que uma das fontes da codificação moderna do direito civil latino americano está no corpus de Teixeira de Freitas.
QUADRO SINÓPTICO-X
LA INFLUENCIA DEL ESBOÇO DE AUGUSTO TEIXEIRA DE FREITAS
5.A influência de Teixeira de Freitas no Brasil e no Mundo
Como neste ano estamos entrando em um novo milênio e completando 500 anos de existência para o mundo ocidental ‘civilizado’, esse texto ressaltará uma das nossas maiores glórias nacionais da qual nos orgulhamos pela sua profunda produção científica na área do direito brasileiro que é a figura do célebre advogado e jurista baiano Augusto Teixeira de Freitas nascido em 1816. O autor teve como obras a Consolidação das Leis Civis e o famoso Esboço de Freitas, que influenciaram o direito civil mundial, não só pela sua técnica utilizada, mas também pela sua produção doutrinária nelas expressadas.
Embora os juristas e legisladores brasileiros, na época, não terem dado a importância merecida ao esboço de Freitas, até mesmo porque este fora apresentado em fascículos e, por isso, encontrar-se disperso na época, a obra chegou às mãos do grande jurista argentino, Velez Sarsfield, que trabalhava, desde 1864, no projeto de redação do Código Civil Argentino e estava em dúvida quanto ao método que utilizaria na sua confecção. Como se houvesse uma solidariedade Sul-Americana, Sarsfield adotou, como base do seu projeto codificador, o esboço de Freitas sendo seguido por outras nações Latino-Americanas como o Paraguai e, em parte, o Uruguai. Essa posição adotada pelo codificador Argentino foi alvo de duras críticas baseadas na concepções de Montesquieu que afirmava que as condições físicas que vivem um povo influenciam na formação do seu direito ao ponto de que seria muito raro que o direito de uma nação servisse para outra. Entretanto, esse respeitável nome da história não levou em conta o início do processo de intercomunicação acentuada entre as nações, hoje conhecida como a já gasta palavra Globalização. Um fato que demonstra que o nosso grande filósofo se equivocara é o alastramento, com algumas modificações, do direito romano por toda Europa após a queda do império romano e a sua influência até hoje em nosso direito. Portanto, a sujeição do meio geográfico se exerce até certo limite concorrendo outros fatores significativos para a formação do direito, ainda mais o direito civil que é fruto de séculos da existência humana. Mas ,logo, a imprensa representada pelos notáveis periódicos La Nacion e La Tribuna ficou solidário com o codificador[25] .
Agora, apresentaremos a obra de Freitas como uma reação ao Código de Napoleão e a uma tendência de sua adoção indiscriminada por países tanto europeus quanto Sul-Americanos. Freitas, assim como fizera com as Institutiones de Justiniano e o seu Digesto, criticou o Código de Napoleão por achar este sem uma orientação metodológica e, mesmo assim, usado como guia para várias nações. Portanto, a Consolidação e o Esboço, pelo seu método e doutrina, foram suficientes para apontá-los ao mundo como uma nova vertente do Direito, contrapondo-se ao Código de Napoleão, vale lembrar que este influenciou os códigos Sul-Americanos, Europeus (incluindo a própria Alemanha) e Asiáticos.
Podemos dizer que as duas grandes famílias que influenciaram o processo de codificação foram a francesa com o código de Napoleão de 1804 e a Alemã com o Bürgeliche Gezetzbuch de 1896 o qual, como já havia afirmado René David, Freitas antecedera de ” quarante ans le Code Civil allemand (BGB) auquel on attribue en général le merite de cette innovation” através da sua técnica da divisão do Código em uma parte geral e outra especial. Isso mostra o vanguardismo de Freitas não só em relação ao Código Alemão, mas também ao direito mundial como daremos mais exemplos no discorrer do texto .
Voltando para América, a sua obra se fez sentir ainda no Código Civil Paraguai, (pois este era muito parecido com o Argentino) um pouco no Código Civil Uruguaio, já que este recebera influência do Chileno eleborado por Andrés Bello que, por sua vez, fora influenciado pelo francês. Vale lembrar que o Código Civil Chileno fora muito criticado “por não possuir uma palavra sobre analfabetos, como se o Chile de 1855 não abrigasse imensa massa populacional de tais categorias”[26].
Freitas almejava em seu projeto de Código Civil a incorporação do direito comercial no direito civil antecipando-se a Vivante que propusera essa tese em 1892 sendo mais adiante concretizada na aprovação do Código Civil Italiano de 1942 que ab-rogou o Código de Comércio de 1882 e o Civil de 1865. Para irmos mais longe, o Código Civil chinês, ao contrário de japonês que sofrera influência do francês, se filia ao Código Civil brasileiro de 1916 (Clóvis Beviláquia) e ao alemão de 1896 e, através deles, lembra o plano de Teixeira de Freitas, ao apresentar um livro I de Princípios Gerais subdividindo-os em capítulos e, apesar de Civil, estão presentes preceitos de direito Comercial.
Além da influência na técnica utilizada para separação das disciplinas e a sua sistematização, ela se faz presente também na doutrina por ele utilizada que tiveram inúmeras fontes como a tradição lusitana, representada especialmente pelas ordenações; o direito romano, o qual assimilara no curso em Olinda, com particularidade para o Digesto e as Institutiones; a doutrina Alemã com realce em Savigny e outros tais como Jhering, Mackeldey; a doutrina francesa, especialmente em Cujacio, Porthier, Ortolan, Demolombe, Dalloz; a doutrina portuguesa com Joaquim José Caetano Pereira, José Homem Correa Teles, Joaquim Couveia Pinto; a obra de pensadores como Bacon, Bentham, Leibnitz; as codificações de Prússia (1794), da Luisiana, da Sardenha, do Chile, da Aústria, da Espanha e dos Cantões da suíça e outras. Vindo estas fontes presentes com mais ou menos intensidade em sua obra, não sendo, porém, uniforme.
Toda essa bagagem cultura que Freitas detinha serviu de base também para que elabora-se um caldo de substância doutrinal que vamos citar apenas alguns exemplos.
A sua originalidade apresentou-se em um dos pontos básicos da capacidade que é a distinção, por ele feita, entre a capacidade de direito e da fato, não feita por Savigny e somente desenvolvida por von Bar na Alemanha em 1860 e na França com Dreyfus em 1904. [27]
Agora, nos reportaremos ao instituto do domicílio, pois este ponto, politicamente falando, foi o de maior relevo no seu Esboço. O art. 4° versa sobre os efeitos do lugar determinado, a legislação civil aplicável, a jurisdição e a competência das autoridades judiciais do Império. Relativamente às pessoas, o lugar aparece como residência ou domicílio, sendo este a certeza do lugar em que as pessoas existem, a sede jurídica da pessoa. E este ainda ele o subdivide em voluntário (de acordo com a aplicabilidade, pode ser geral ou especial) e legal ou necessário, distinguindo o domicílio de origem que é onde a pessoa nasceu. A importância se dá na medida em que o que importa é o domicílio, a sede jurídica da pessoa e, não, a sua nacionalidade regulando-se pela lei brasileira a capacidade de fato mesmo se tratando de atos praticados em país estrangeiros, ou de bens existentes em país estrangeiro. Essa opção pela troca de nacionalidade pelo domicílio teve um profundo contexto político, visto que constava na constituição imperial do país recém independente a autonomia da ordem jurídica privada refletido no instituto do domicílio.
Foram nessas circunstâncias que surgiram as obras de Freitas em que se destaca o método utilizado no que concerne a exposição ordenada e coerente do sistema de direito positivo, mas também na técnica utilizada para solução de problemas decorrentes da aplicação do direito.
Na colonização brasileira, conjugou-se uma série de fatores como os aspectos econômicos e políticos, abundância de terras férteis implicando uma estrutura de características agrária, latifundiária, monocultura, escravocrata na técnica de exploração econômica, híbrida de índios, negros e brancos. A família era patriarcal e, no direito, a supremacia da ordem privada no sistema de organização social, de base rural.
Portanto, podemos perceber que os valores dominantes em uma cultura são, também, os determinantes das normas de seu ordenamento jurídico. Esse raciocínio segue a teoria tridimensional do direito sendo este visto como uma relação de fato-valor-norma[28] revelando de uma maneira dinâmica a importância dos valores na confecção das normas, sendo estas influenciadas por fatores de ordem política, econômica, psicológica, histórica e cultural. Portanto, falar de direito civil brasileiro é falar-se em cultura brasileira. E a avaliação da extensão da obra de Freitas é compreender essa cultura, na qual o direito tem particular importância. [29]
6. A Influência de Augusto Teixeira de Freitas no Direito de Países Estrangeiros[30]
Augusto Teixeira de Freitas é, no campo do Direito, personagem ímpar. A sua atuação, como jurista, se fez sentir em vários países americanos e, até mesmo, em países europeus.
O gênio jurídico de Freitas é reconhecido por todos. Na América do Sul, Freitas é considerado mestre insuperável.
A vocação de Teixeira de Freitas para o estudo e a compreensão do Direito é singular e surpreendente. Freitas nasceu em Cachoeiras, na Bahia, em 19 de agosto de 1816, e faleceu em Niterói, em 12 de dezembro de 1883.
Foram seus pais: Antônio Teixeira de Freitas Barbosa e Felicidade de Santa Rosa de Lima Teixeira, barão e baronesa de ltaparica.
Com dezesseis anos, ingressou na Faculdade de Direito de Olinda, em Pernambuco, cinco anos após a sua fundação. Tive oportunidade de conhecer o lugar em que funcionava a Faculdade, ou seja, o Mosteiro de São Bento. Fiquei perplexo ao ver o local acanhado, sem nenhum conforto, em que as aulas da recém-fundada Faculdade eram ministradas. Como poderia ter saído formado dali, possivelmente com um número diminuto de alunos e com um corpo docente de pessoas não habituadas com o trato de assunto tão grandioso – o Direito –, o maior gênio jurídico das três Américas? Realmente é quase inexplicável que alguém pudesse alcançar tão grande discernimento a respeito de uma ciência sem ter para estudá-la as condições mínimas necessárias!
Quando Teixeira de Freitas começou os seus estudos sobre matéria jurídica, o Brasil não possuía qualquer ambiente jurídico próprio. As Faculdades de São Paulo e de Olinda, criadas ao mesmo tempo, tinham, apenas, cinco anos de existência; as nossas leis civis, todas elas, eram calcadas na legislação portuguesa, principalmente nas Ordenações do Reino; os livros sobre assunto jurídico, de autores nacionais, praticamente não existiam; os tribunais locais julgavam à maneira dos tribunais portugueses; a troca de idéias entre os estudiosos era a mais limitada que se possa imaginar.
Pois bem, apesar de todas essas deficiências, Freitas, com a sua inexcedível vocação jurídica, conseguiu aprimorar os seus conhecimentos, projetando-se, quase que imediatamente após a conclusão do seu curso, como jurista exímio.
No museu do Instituto dos Advogados Brasileiros, encontra-se o diploma de Augusto Teixeira de Freitas, obtido em 1837, como disse, na Faculdade de Direito de Olinda. O diploma se acha em perfeitas condições de conservação. Nenhum sinal de deteriorização pelo tempo. É uma peça rara. No meu entender, é o mais importante objeto do museu do IAB.
Depois de se tornar advogado de fama e de ter sido presidente do Instituto dos Advogados Brasileiros, de que foi um dos fundadores, elaborou a sua mais importante obra, ou seja, a Consolidação das Leis Civis, conseqüência do contrato que celebrou com o governo imperial, em 15 de fevereiro de 1855. Logo após, publicou os Aditamentos à Consolidação, que é um complemento da sua grandiosa obra.
Animados pelo êxito obtido com a Consolidação das Leis Civis, o imperador D. Pedro II e o seu ministro da Justiça, José Tomás Nabuco de Araújo, pensaram em dotar o Império de um Código Civil e por isso firmaram, em 10 de janeiro de 1859, um contrato com Augusto Teixeira de Freitas, no qual o grande civilista se obrigava a entregar o trabalho concluído até o dia 31 de dezembro de 1862.
O gênio jurídico de Freitas permitiu-lhe apresentar o que ele mesmo classificou de um Esboço do Código Civil. Nesse trabalho, incluiu Freitas toda a legislação civil, inclusive a parte regulada pelo Código Comercial.
Com a inclusão da parte referente ao Código Comercial, o Esboço era composto de 4.908 artigos. A obra de Freitas sofreu muitas contestações. O autor foi alvo de críticas e atingido por agravos de tal ordem, que, somados ao cansaço com os inúmeros estudos para a realização do trabalho, lhe turvaram a lucidez, tornando-o insano mentalmente.
Somente decorridos cinqüenta e cinco anos após as tentativas dos eminentíssimos juristas Nabuco de Araújo, Felício dos Santos e Coelho Rodrigues, conseguiu Clóvis Beviláqua ver aprovado, pelo Legislativo e pelo Executivo, o seu projeto do Código Civil Brasileiro no qual, diferentemente do que tinha sido feito por Augusto Teixeira de Freitas em seu Esboço, não foi incluída a parte referente ao Código Comercial. O Esboço, no entanto, somado à obra gigantesca da Consolidação, era trabalho de gênio.
Com os seus estudos e trabalhos jurídicos, Freitas passou a ser reconhecido em toda a América. A Argentina, o Paraguai, o Uruguai, e seus próprios juristas confessam, usaram a obra de Freitas para servir de base à elaboração dos seus Códigos. Outras nações serviram-se das produções de Freitas na preparação dos Códigos reguladores da vida civil de cada uma. Os Códigos posteriores à obra de Freitas, como os da Alemanha, Suíça, Rússia e Itália, sofreram a sua influência[31].
A admiração por Teixeira de Freitas no Brasil e nas Américas é imensa. Há um momento em que se consegue o clímax do culto a Freitas no Brasil. Foi em sessão realizada no Instituto dos Advogados Brasileiros, sob a presidência de Rui Barbosa, em homenagem ao Centenário de Freitas e em que foi orador oficial Clóvis Beviláqua. Imagine-se o esplendor da solenidade: homenageava-se Augusto Teixeira de Freitas, presidia à sessão Rui Barbosa e era orador oficial da solenidade Clóvis Beviláqua. Que magnificência! Que majestade! Que pujança! Que vulto intelectual!
Naquela ocasião, disse Rui Barbosa, na Presidência do Instituto dos Advogados Brasileiros, da Cadeira de Montezuma: “Para falar sobre o maior civilista morto, concedo a palavra ao maior civilista vivo.”
Ressalte-se a grandeza de Rui. Após ter polemizado com Clóvis Beviláqua de forma determinada, inclusive tendo escrito a célebre Réplica, reconhecendo o seu grande valor de jurista, proclama, da curul presidencial da Casa de Montezuma, ser Clóvis o maior civilista brasileiro vivo[32].
No exterior, a admiração pelo gênio jurídico de Freitas não é menor do que aqui, no Brasil. Quando presidi o Instituto dos Advogados Brasileiros, era comum receber delegações de juristas estrangeiros e, em muitas ocasiões, estas delegações vinham da Argentina. Em palestra com os argentinos, propositadamente, deixava para o final os comentários sobre Augusto Teixeira de Freitas. Assim, mal pronunciava o nome da maior cerebração jurídica das Américas, ouvia dos argentinos a exclamação: “Oh! Don Freitas!” É como os argentinos se referem ao eminentíssimo jurisconsulto.
Passavam, então, a tecer sobre a personalidade do jurista as maiores referências, revelando a influência do grande brasileiro no estudo do Direito da Argentina. Isso ocorreu comigo, como disse, quando Presidente do IAB. Acontece que lá mesmo, na Argentina, a glória de Freitas é reconhecida sem reservas.
O professor Guilherme L. Allende, catedrático de Direito Civil da Universidade de Buenos Aires, falando sobre o gênio de Freitas, disse:
“[…] lá, a longínqua e altíssima Belém, mais próximas e mais terrenas, Yapeyu, Amboy… Cachoeira pode dizer a orgulhosas cidades americanas: Não tenho tuas universidades, mas, em compensação, aqui nasceu Freitas, que vale – quem sabe – por muitas universidades. E elas inclinam a fronte. E como deixar de incliná-la, se o seu nome representa o gênio jurídico em toda a sua magnitude e esplendor? Tanto assim que se, ao invés de no século XIX, houvesse nascido nos primórdios da nossa era, e os homens do Lácio tivessem conhecido seu pensamento, da lei de Citas não teriam constado cinco nomes, senão seis. A orgulhosa e altiva Europa, a quem tanto devemos, deve, porém, olhar mais para a América Latina; deve aprender, por exemplo, que desde a queda do Império Romano, apesar dos séculos transcorridos, ela não produziu um gênio jurídico maior que Freitas, e que, para igualá-lo, precisou misturar sangue alemão e francês em solo alemão…” (Placa inaugurada na cidade de Cachoeira, Bahia, em 27 de novembro de 1977, no Fórum, antiga casa de Teixeira de Freitas).
A admiração pelo gênio jurídico de Freitas, quando se relembra que foi ele produto quase que exclusivamente do seu próprio esforço, tendo recebido muito pouca ajuda do meio e de mestres locais, cresce dia a dia. Freitas foi um estudioso com imensa intuição jurídica. A sua intuição, no que se refere aos assuntos jurídicos, tinha qualquer coisa de singular e imensurável.
Não quero deixar de transcrever a opinião do eminente e saudoso professor Haroldo Valladão a respeito de Augusto Teixeira de Freitas:
“Pois bem, o genial Freitas concebeu um sistema original e profundo de Direito Internacional Privado, que corporificou no seu maravilhoso Esboço podendo vangloriar-se de ter produzido o primeiro projeto orgânico e com base científica de legislação sobre conflitos de leis, quer nas Américas, quer no Mundo”[33].
Na opinião, portanto, de Haroldo Valladão, Freitas foi pioneiro em matéria de Direito Internacional Privado, em todo o mundo. É de se ressaltar que Valladão era um internacionalista respeitado e admirado em todos os países.
Conclui-se, em conseqüência, que Augusto Teixeira de Freitas exerceu, no estudo do Direito em todo o mundo, notável e grande influência.
7. Alguns Apanhados de Walter de Souza Barbeiro sobre Teixeira de Freitas
“Resultantes de trabalhos apresentados pelo autor em seu curso de Especialização, realizados na Academia de Direito do Largo São Francisco.”
Guilherme Braga da Cruz, professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em excelente estudo sobre a Formação Histórica do moderno Direito Privado Português e Brasileiro, publicado na Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, vol. L de 1955, após fazer retrospecto do direito anterior e comum a ambas as nações, afirma que “a desorientação doutrinal e filosófica resultante da penetração das idéias liberais foi, no Brasil acentuadamente menor que em Portugal. E a conseqüência mais saliente que daí resultou foi ter-se feito sentir no Brasil, muito menos que entre nós, a febre de inovações precipitadas, oferecendo-nos, ainda hoje, a nação brasileira um sistema jurídico-privado muito mais próximo da velha tradição portuguesa, muito mais liberto de influências estrangeiras, que o próprio sistema jurídico vigente em Portugal! “A mais expressiva vitória desta corrente conservadora, vitória cujos reflexos jamais se apagariam, na posterior evolução do direito privado brasileiro – foi a publicação da famosa Consolidação das Leis Civis, da autoria de Teixeira de Freitas, que a aprovação oficial, dada em 1958, elevaria quase ao nível dum verdadeiro código” “O Caráter conservador… obedecia, antes de mais nada, às próprias instruções dadas pelo governo brasileiro” “ mas o conservantismo da ordem governamental vinha ao encontro da maneira de pensar de Teixeira de Freitas.”
E aponta como exemplo as críticas de Teixeira de Freitas à Lei pombalina de 18 de agosto de 1769 alcunhadas “da Boa Razão”, que, segundo este jurisconsulto, havia dado “largas ao arbítrio”, ultrapassado “mesmo as raias dos casos omissos”, “ a tal ponto que menos se conhece e estuda nosso direito pelas leis, que o constituem, do que pelos praxistas, que o invadiram”.
Mostra, a seguir o professor lusitano questões em divergiram o Direito português brasileiro, citando, como exemplos, a insuficiência do simples acordo das vontades para produzir a transferência dos direitos reais”, que o Brasil manteve e Portugal desprezou para aceitar o Código de Napoleão e a “restitutio in integrum”, que só veio acabar com o Código Civil de 1916.
Poderíamos acrescentar os demais exemplos que indica, mas preferimos abster-nos, pois nos basta sua idéia, firmada nos trechos acima transcritos. Deveremos, de início, para melhor situarmos a discussão, esclarecer o que seja o Historicismo, e para isso, reverentemente pedimos emprestadas a João Arruda, saudoso e ilustre professor desta Faculdade, a clareza e a concisão necessárias à compreensão deste assunto, embora o mestre se demonstre pouco simpático aos fundamentos filosóficos da querela que envolveu Thibaut e Savigny, frisando que “muito pouco” se poderia “aproveitar da História… muito poucas verdades úteis tiram da História da Filosofia e… com muitas restrições é que devemos aceitar essa doutrina dos otimistas, relativamente à História, como sendo ciência” (Filosofia do Direito, 1º vol., 3ª Ed. Da FDUSP, 1942)
“A escola histórica… nasceu da cultura das ciências jurídicas e políticas; foi no exame do Direito Romano, foi no estudo dos princípios políticos que nasceu a escola histórica.” Queria “Thibaut, da escola racionalista”, a codificação, criando-se uma lei nova, formada exclusivamente pela fantasia do legislador”, mas observa Savigny que “as instituições políticas jurídicas de um povo são resultado de uma força interna, de sua atividade natural: nós não podemos determinar que um povo tenha tais ou tais instituições políticas; e, do mesmo modo, as instituições jurídicas não devem ser impostas: elas são resultados das forças naturais, da atividade do povo” “O jurisconsulto, como membro do povo, representa o que se acha na consciência popular, que também se manifestou nos costumes populares; como homem de saber, o juris-consulto classifica esses costumes, e estabelece regras e princípios.” “O jurisconsulto representa a consciência popular, por fazer parte do povo e… também estabelece regras ou princípios, que ordenam, ou antes, que coordenam os preceitos jurídicos exteriorizados nos costumes”. “O Código há-de ter necessariamente duas partes: há-de manter o direito anterior, que parecer ao codificador convir ser observado, e há-de tratar de introduzir alguns melhoramentos segundo as idéias do codificador.” “Os direitos do homem formam-se dependentes das circunstâncias, e deixaram, portanto de ser filhos do arbítrio do legislador.” “A escola histórica, pois torna o homem um ente social, não procura o homem como sendo animal, mas como sendo membro de uma sociedade regida sempre por princípios.” “Presta a maior atenção a influencia do clima do clima, às paixões, aos sucessos históricos e até às influências telúricas.
O Direito é um produto da consciência nacional, do espírito comum e está sujeito a uma evolução.”
Savigny fundou esta escola destinada, intransigentemente, a combater o racionalismo, a fazer desaparecer da ciência jurídica esta figura do homem ideal.
Aproveitamos as palavras de João Arruda porque, adversário da Escola Histórica, após analisá-las com a argúcia e o cuidado de quem arma um castelo de cartas, peça por peça, para depois destruí-lo com apenas um sopro, o Eminente Mestre salienta, como paradigma negatório dos ditames dessa corrente doutrinaria, Teixeira de Freitas, que, em contraposição à naturalidade da evolução do Direito, “modificou completamente a evolução das idéias jurídicas no povo brasileiro.”
Como se vê, Teixeira de Freitas, segundo Braga da Cruz, é autêntico historicista, mantenedor de “um sistema jurídico-privado muito mais próximo da velha tradição portuguesa”, ao passo que João Arruda, usando do seu nome com um pendão no combate ao historicismo, o considera exatamente o oposto, “modificou completamente as idéias jurídicas no povo brasileiro”.
Entretanto, embora a tradição representada pelas Ordenações Flipinas, que foram elaboradas em 1603 e vigoraram, no Brasil até 31 de dezembro de 1916, tivesse resistido, como acentua Pontes de Miranda, “três mudanças radicais políticas: a de 1940,e a de 1882 e a de 1899”, (fontes da Evolução do Direito Civil, Rio de Janeiro, 1928, pág. 65 a 66), este mesmo jurista não esquece que Teixeira de Freitas “fez avançar, de muitos anos, o direito civil, e não raro lá está no Esboço, de 1860, o que só mais tarde aparecerá no código Civil Argentino, no Uruguaio, Alemão no Suíço.” E afirma que breve estatística poderá dizer-nos que foi, ainda em 1900-1915, Teixeira de Freitas o codificador de 1860”, “quem mais criou no código” E acrescenta que, das inovações do código relativamente ao direito anterior, 189 pertenciam já a Teixeira de Freitas no Esboço, considerando ainda, relativamente ao Código Alemão, que “só este código é ainda hoje pelo rigor técnico, superior ao Esboço brasileiro de 1860”.
Revendo e meditando “as tradições da Ciência e com livre espírito” procurando “essa unidade superior que concentra as verdades isoladas penetra as mais recônditas relações”, para usarmos as próprias expressões (Consolidação das Leis Civis, 3ª Ed. Mais aumentada, Rio de Janeiro, 1976, págs. XXXVI a XXXVII) é nos grato, como documento que define seu autor na mais ampla tomada de posição transcrever-lhe estas palavras memoráveis, escritas com o fulgor de letras de ouro, nas primeiras páginas da Introdução à sua monumental Consolidação das Leis Civis:
“Cumpre advertir, que não há um só lugar do nosso texto, onde se trate de escravos. Temos é verdade a escravidão entre nós; mas se esse mal é uma exceção que lamentamos; condenado a extinguir-se em época mais remota; façamos também uma exceção um capitulo avulso, na reforma das nossas leis civis; não podem servir para posterioridade: fique o estado de liberdade sem o seu correlativo odioso. As leis concernentes à escravidão (que não são muitas) serão, pois classificadas à parte, e formarão nosso Código Negro.”
Em nota ao art. 262 pág. 201 manifesta-se identicamente; e no Esboço, em comentário ao Art. 21, diz concisa e incisivamente:
“Sabe-se que neste Projeto prescindo da escravidão dos negros, reservada para um projeto especial de lei; mas não se creia que terei de considerar os escravos como coisas. Por muitas que sejam as restrições ainda lhes fica aptidão para adquirirem direitos; e tanto basta para que sejam pessoas”
Nessa atitude aparece, clara e indeturpável, a colocação do problema sob ângulos da axiologia, particularmente quando esse gesto do jurisconsulto maior de nossas letras jurídicas, equacionando dessa forma a questão, se postava como adverso a uma ordem vigente sob a complacência de forças econômicas diretamente interessadas no elemento escravo, que entrava “em o número de pessoas incapazes a ponto de se reputarem coisas, e não pessoas”. (Cons., nota 33 ao Art. 28) estando por isso classificado entre os bens que, na sua transmissão devem pagar a sisa. (Nota 118 ao art. 593). Como se infere, os escravos estavam obviamente integrados na sociedade colonial (politicamente falando) como fator econômico indispensável, recebendo até, como chancela, o beneplácito da Igreja, pois as Ordens religiosas os possuíam, havendo a Lei 1764, de 28 de junho de 1870, Art. 18 mandado que fossem convertidos” em Apólices da Dívida Pública Interna”. (Nota 47 ao art. 69).
Eram duas axiologias que se defrontavam e se opunham, na bipolaridade do valor que busca dinâmica do processo axiológico a sua realização fática. Entretanto, embora estipulasse o Contrato de 15 de fevereiro de 1855, que a Consolidação consistisse (Nota 2 da pág. XXXI) em coligir e classificar a legislação pátria, e tal sorte se compreenda que a comissão, encarregada de revê-la em seu Relatório tenha achado “sensível a omissão que houve… a respeito das disposições concernentes às escravidão; por quanto, posto deva ela constituir, por motivos políticos e de ordem pública, uma lei especial contudo convinha saber-se o estado defetivo da legislação a este respeito”, o contratado ante a “omissão lamentada pela Comissão” (nota 2 da pág. XIX) se prepõe a suprir a “ censurada lacuna” (Pág. XXXVIII), mas, faz questão de o frisar, “ não nas disposições do texto, que ficam intactas, mas em casa uma de suas notas explicativas. Observe-se que o repugnava tanto a referencia aos escravos que somente na terceira edição da Consolidação, e apenas em notas, colige as disposições legais sobre essas matéria.
Não se prendia a instituições passadas e superadas. Embora o Código do Comércio, em seu art. 157, falasse da “morte” civil, imitando o art. 818 do Código Comercial Português que copiara do art. 2003 do Código Civil Francês (Pág. XXXIII, texto da introdução nota 6) Teixeira de Freitas condena “ a odiosa instituição da morte civil do Código Francês”, (Nota ao Art. 5º ,nº 2 pág.9 do Esboço) consistente na privação dos direitos civis, que conforme o Relatório da comissão incumbida de rever a Consolidação das Leis Civis, “ ele pressupõe que se não dá em caso algum, nem como conseqüência da privação dos direitos políticos nem por efeito por condenações judiciais (cons. pág. XXI) Comentando o Art. 39 em que declara não terem, quanto à aquisição de direitos e ao exercício dos atos das vida civil influencia “quaisquer disposições do Código Penal, ou de outras leis, sobre perda privação ou suspensão de direitos” diz que assim procedera no “intuito especial de excluir para sempre toda a idéia da monstruosa instituição da morte civil, de que infelizmente falara o código do Comercio, Art. 157 nº 3, para perturbar o espírito de nossa mocidade estudiosa”e outrossim “para que não se lembrem de alguma morte civil, que seja efeito da pena de banimento indicada no Art. 50 do Código Penal” pois “se o banido não pode habitar no Império, pode aí exercer atos da vida civil por intermédio de mandatários. Pode-se proibir que disponha do que é seu? A proibição fora um confisco de bens” Nada mais extravagante do que reputar-se os falidos como civilmente mortos, inventando-se por contraste uma ressurreição civil, como se vê no Alvará de 13 de novembro de 1746, para aqueles que se reabilitam”. (Coment. Ao Art. 42 pág. 48). E mais adiante. A realidade da vida aí está; seus fatos ninguém nega: e por onipotência legislativa declara-se morto um ente humano que vive e também se o faz ressuscitar! Qual será a utilidade destas vãs ficções?”
Como acima exposto se depreende, embora fosse dever, por determinação governamental, de o consolidador “examinar, coligir e classificar as leis”, fazia-o entretanto, comparando “ as leis novas com as antigas” aquilatando do alcance de umas e outras, como acentua o professor Braga da Cruz, mas assim agia a fim de “conhecer a substância viva” da Legislação. E nestas palavras finais esta contida enorme sugestão de “laborioso processo” (cons. pág XXXVI) como o chama que envolve crítica, escolha, eleição de princípios toda uma gama axiológica presidindo “o alcance” e “ as conseqüências” de leis novas e antigas, para num colário em que bem se intui a necessária relação fática-axiologica das normas, se conhecer a “substância via” que é a alma do ordenamento jurídico. Nos vocábulos “substância via”, num sentido maior que o simplesmente gramatical, compreende-se a essência de um direito atualizado na existência mesma do homem, homem é experiência que é valorização; e daí concluirmos que subentende mais que simples tradição mais que mera repetição de fatos que, muitas vezes hão perdido o caráter de juridicidade. Eis porque Teixeira de Freitas considerava “veneração supersticiosa” a daqueles que achavam “fosse possível dar força de lei a proposições cientificas” (pág. XL), criticando o excesso dos colaboradores das Ordenações que se estribaram no Direito Romano “e mesmo geralmente o autorizaram” (Pág. XXXII). Assim, em a nota 105 ao parágrafo 6º do Art. 586 concorda com Observação de Rebouças, que achava poder o “comprador libertar o escravo, legado”, quando a legislação romana proibia dizendo que “a citada legislação romana sacrificou a liberdade do rigor lógico”.
Melhor não tentaríamos esta parte de nosso trabalho se esqueceremos estas proposições em que se vê o direito em toda a sua plenitude:
“Logo que o gênero humano desaparecesse, ficando reduzido a um só homem, o direito de propriedade, e todos mais direitos, ficariam sem razão de existência (consolidação, pá. XLIII). O direito quer a vida real: quer a possibilidade de relações do individuo inteligente livre com entes, tem a mesma natureza, e o mesmo destino. O delito deixaria de ser causa imediata da obrigação um direito violado” (Cons. pág.XLIII e a Nova Apostila à censura do Sr. Alberto de Morais Carvalho sobre o projeto do Código Civil Português rio de Janeiro, 1859, pág. 46). Meditando, pois o seu foi um trabalho puro de meditação, veremos com maior compreensão o que quer significar quando fala que “todos direito pertence as pessoas, todo direito é – poder efetuado” (Cons. pág. XLVI) ou quando diz esta frase sempre atual: “Se a violação não fosse possível a lei seria inútil” (Pág. CLXV).
Meditando sobre o último período que escrevemos, ressalta que, a par do seu rigor axiológico, embora acorrentado a uma legislação de antigualhas a que era obrigado a se ter, outra qualidade há, na obra de Teixeira de Freitas, que exprime na adequação da norma aos fatos. Aliás, esta preocupação é como uma inalterável linha de continuidade do seu pensamento concretizados nos dois maiores monumentos do direito pátrio: a consolidação das Leis Civis e o Esboço do Projeto de Código Civil: assim, naquela, ao responder a uma critica de Rebouças, diz em nota 36 ao art. 981 que “esta censura é justa até certo ponto”, porém feita à legislação existente, que não podem fazer testamento, deixa de coligir, vendo-a executada todos os dias” (Pág. 585); neste, quando deixa de referir-se aos hereges a apostatas e aos condenados à pena última ou à morte civil, lastimando “que as Obras de Coelho da Rocha, e de Liz Teixeira propaguem semelhante doutrina” (Esboço nota 6 ao parágrafo 5º do art. 993 pág.596-7).
E é precisamente nos exemplos trazidos pelo professor Braga da Cruz, a compra e venda e a restituição que vamos encontrar cabalmente demonstrada a atualidade da norma de Teixeira de Freitas, integrada na realidade de que é parte intrínseca, ao provar que o ajuste de vontades apenas gera direitos pessoais, só se efetivando o direito real quando se opera a tradição, a entrega em A nova apostila, na qual examinando detidamente o método codificador português, analisa e explica a divisão dos direitos em reais e pessoais a pseudo – diferença homem e pessoa e entre direitos civis e políticos, a capacidade civil, e finalmente, a venda obrigacional e real, dizendo, a respeito desta, com aquela ironia que nos lembra Analote France ou Eça de Queiroz que, para que seu belo ideal tivesse realidade, fora preciso contar a religiosa observância do pontual cumprimento dos contratos, como está prédica do art. 795; mas é loucura esperar, que o evangelho do projeto venha regenerar a espécie humana. E demais se os homens não são o que são, mas o que devem ser, e se com isto se conta, bem, inútil é legislar e fazer códigos”.
Embora paladino intransigente da metodologia, sem o qual nada se conseguirá numa codificação repugnam-lhe as esteriotipações de direitos ideais as lucubrações fantasiosas do Direito Natural, as juridicidades puramente lógicas “a inutilidade de toda a dialética” pois toda a especulação metafísica , do que não resulte um bem pratico não tem para nós valor algum” e ao contrario, “ as leis sociais, que como todos os fatos podem ser observados” e a organização viva do direito” deve refletir-se nos códigos com a realidade mesma do homem e dos seus atos, de vez que “ a vida real não existe para os sistemas, e pelo contrario os sistemas devem ser feitos para a vida real” (Esboço, coment. Ao at. 256 pág. 30).
Não no fanatismo racionalista extremado, mas sim entre os homens considerados em sua vida jurídica e nas relações e fatos que constituem e manifestam” , não em “teses tão brilhantes na frase como desmentidas na execução” mentida pelos fatos (Esboço coment. Ao art. 26), mas na própria essência do homem deve o codificador buscar os elementos do direito, pois “as leis são feitas para o homem e não o homem para as leis. O homem é ente inteligente e livre e não tabula rasa em que o legislador constrói codificações arbitrárias. A obra nós a temos e apenas se a modifica tanto quanto é preciso para o bem comum”.
Do confronto entre fato e valor, que páginas acima fizemos, prepondera a diretriz de racionalização e, que se realiza a constante fático-axiológica pois sendo o Direito experiência do homem “ a idéia do bem e do mal é inseparável” do entendimento humano”, e a legislação que representa a idéia do bem e do mal interferindo nas “ ações, ordenando e proibindo, e permitindo, é mais alta manifestação do entendimento humano em sua procura de menor imperfeição. Entretanto quando é compelido a delimitar o âmbito “do bem e do mal” as indagações de Teixeira de Freitas não visam apenas aos interesses individuais mas principalmente ao resguardo da coletividade. Assim quando relativamente à “restitutio” justificando o art. 43 em que é negado ao incapazes, cuja a utilidade não compensa os males que causa à sociedade.”
Como coroamento da obra de Teixeira de Freitas, resta-nos aludir à norma em si, o que sintetizaremos na metodologia que empregou no esboço, no qual “a ordem adotada para a distribuição das matérias” é sem dúvida “uma das mais significativas originalidades” como diz Clovis Beviláquia (Código Civil Comentado, rio de Janeiro, 1944, 1º vol. Pág. 14).
Não poderíamos, ainda esquecer a concepção que sustentava a respeito da unificação do Direito Privado e que tanta e atualíssima celeuma causa, e, mais ainda, a sua idéia de englobar num Código Geral as disposições de todos os ramos do Direito, inclusive o Público, como uma propedêutica às codificações especiais, – deixando entrever a intuição da totalidade do ordenamento jurídico.
De quanto acima referimos, seja-nos lícito concluir que Teixeira de Freitas, o maior jurisconsulto do cenário jurídico brasileiro e português, ao invés dum “nimiamente romanista” que apenas houvesse transfundido a caudal do direito antigo foi um criador – ao invés dum historicista preso à evolução natural do direito, foi um inovador; e, deixando-nos um legado glorioso que era grande demais para ser encerrado na territorialidade pátria, por isso ultrapassando-a e indo fecundar a messe jurídica de outras gentes, marcou em nosso pensamento uma diretriz de que, por mais que o queiram não podem se afastar os juristas que lhe seguiram o caminho luminoso.
São Paulo, 29/11/1961
8. Teixeira de Freitas na História do Direito
Em 1845, preenche o quadro advocatício do Conselho de Estado, e aos 15 de fevereiro de 1855, o Governo imperial confere-lhe a incumbência de elaborar a compilação sistematizada das leis civis.
Afim de que se avalie da imane amplitude desse empreendimento, impede retrospeccionarmos as fontes de nossa norma coativa, que se estende no tempo e no espaço, na história lusa. O direito português, nos seus primórdios assessorado pelos acréscimos dos glosadores, apresenta-se nos como uma miscelância do legitimo romano e canônico, aquele em particular no que se refere as pendências obrigacionais e contratuais especifico em litígios que envolvessem debates de crença religiosa; embora a península Ibérica padecesse sucessivas metamorfoses políticas em conseqüência das sucessivas dominações romana, sueva vândala e visigótica e árabe, perdurou mais ou menos o mesmo acanhado panorama jurídico. Em 1139, aparecem os forais, como se designavam as cartas reais que beneficiavam os súditos com privilégios e juridicidades. Afonso II em 1211 publicou organizadas com a cooperação das cortes, as primitivas leis gerais. A seguir, adiciona-se ao acervo do incipiente direito, mandada verter para o vernáculo por D. Diniz, a Lei das Sete Partidas, de Afonso X, rei de Castela. Em 1446, reinando Afonso V, surgiram, como primeira coletânea legal européia, após a Idade Média, as Ordenações Afonsinas. Em 1521 e 1603, divulgaram-se, respectivamente, as Ordenações Manuelinas e Filipinas. Finalmente, Cabral na controvertida efeméride de nosso descobrimento, trazidos no bojo de suas naus, pespegou-nos os textos lusitanos, prevaleceriam entre nós além de nossa Independência, malgrado em desuso já estivessem no país de origem… Assim, como as exceções oriundas das circunstâncias subsistia em nossa terra uma legislorréia que se enraizava no Corpus Júris Civilis e no Direito Canônico, este somente tendo perdido a sua autonomia em 1830 quando o tornou Código Criminal do império cabível às causas unicamente de cunho religioso.
Portanto, consoante o exigia a Constituição do Império, era radicalmente imprescindível atualizar as Ordenações, Leis e Decretos promanados dos reis d’além-mar jurisdicionantes, e o decorrentemente disposto, que ora corroborava ora invalidava esse aranhol normativo, ou, como acertadamente o alcunhou Clóvis Beviláquia, “emaranhado cipoal, que mais servia para desenvolver o espírito de chicana do que para resguardar a possibilidade jurídica”…
Essa tarefa cometida a Teixeira de Freitas. Para aquilatá-la em termos hodiernos, basta que compulsemos recente edição de nosso código civil; desaparecemos, no apêndice, com uma legisferação esparsa, em grande cópia, que o modifica; isto manifesta sobejamente a impossibilidade de um código efetivar com inteireza o seu objetivo; daí se imaginará quão caótica seria legislação coeva de Teixeira de Freitas, quando, sem a redução codificatória, havia, apenas Ordenações Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções Uso e Costumes, além das Instruções, Avisos Portarias, Regulamentos, Regimentos, Provisões etc., numa desordem e antinomia, ora primando pela inópia de adequação, ora salientando-se pelo excesso de zelo, que fariam terror ao mais desassombrado dos codificadores…
“Parecer
Imaginemos quantos Freitas necessitaríamos intuir somos tão incapazes frente ao calabouço axiológico hermenêutico jurídico quiçá humanístico, como universalizar o paradigma do bom e do justo. [34]
Era uma empreitada gigantesca para tempera de um homem só, e Teixeira de Freitas dedicou-se a ela sozinho da contribuição alheia, mas acompanhado de sua exponencial lucidez, pois como em sua lauda de renuncia ao Instituto dos Advogados Brasileiros, com acrimônia verberara, as sociedades e comissões científicas são as instituições de mero luxo, senão um hábil invento da insuficiência e ociosidade que permite e pequeninos zangões sorver o mel fabricado por abelhas trabalhadoras.”
Assim, ao término do triênio, concretizou em 1333 artigos requintados pelas anotações e predestinados por magistral estudo introdutório, todos os preceitos civis vigentes, com exclusão apenas de ilusão à escravatura, que ostensivamente elidiu. Já nesta primeira introdução Teixeira de Freitas dava a primeira mostra de seu gênio criador, antecipado com a idéia de tratar na parte geral, os elementos dos direitos (pessoas e coisas) nos albores deste século. Clóvis Beviláquia encomiou-lhe a “feliz novidade, com que enriqueceu a técnica jurídica”. Era verdadeiramente o discípulo de Savigny que ombreava com o mestre!
A Comissão, encarregada da jurisprudência da Consolidação, aprovou-a, prodigalizando-lhe louvores, e consequentemente em 1959 aceitava Teixeira de Freitas, do Ministro da justiça, o mister de preparar em menos de três anos que já em 1860, titulado de “ Esboço”, começou a ser publicado imprimindo-se nesses anos, os dois fascículos iniciais com 866 artigos; os seguintes até o artigo 1829, estamparam também em 1861, data da extinção do prazo que foi prorrogado até junho de 1864. Em 1868 e 1865, constantes de três fascículos, editaram-se os artigos 1830 a 4908, permanecendo inéditos os restantes. Foram 4908 minuciosos artigos, cuja prolixidade obstaria, a todo transe a ignorância mais teimosa na interpretação e aplicação. . .
Em 1865, sob a égide do Imperador, instala-se a Comissão Revisora, que no entanto, ou por menosprezo ou por incapacidade, se desleixa do incumbido, numa eterna protelação. Desgostoso, Teixeira de Freitas envia em 20 de novembro de 1866 a Martim Francisco então Ministro da Justiça, missiva em que considerado que sua operosidade nada valesse ou que não compensasse as mensalidades que havia recebido nos três primeiros anos de contrato reconhecia o dever de retribuí-las, oferecendo, como penhor os seus bens.
Entretanto, não era somente o ingeneroso apreço que lhe haviam votado ao ingente esforço, ao árduo labor que impediria Teixeira de Freitas de levá-lo a cabo; suas diretrizes intelectuais se incompatibilizavam, inconciliavelmente, com as do governo; numa originalíssima ideação unificadora do Direito Privado (embora conservando o rótulo de Direito Civil) , rebelava-se à coexistência paralela e autônoma de um código civil e outro comercial. Pugnava por que houvesse, sim um código geral, de disposições fundamentais que abrangessem todos os ramos do Direito, englobado no civil o comercial, pois exemplificativamente nos contratos em geral, no mandado na locação de serviços etc. enquadra-se-iam quase todas as determinações de comércio.
Em 1929, Bolaffio asseveraria que “o direito Comercial, a par do Civil, será por isso mesmo inevitavelmente absorvido por um direito privado uniforme e aperfeiçoado das obrigações”. Carvalho Mendonça afirmaria que “não é possível ser comercialista sem conhecer a fundo o Direito Civil”. Ou, como aventaria Carlos Carvalho “o espírito é um só; os corpos continuam a ser dois.”
Eduz-se, melhor dissensão de Teixeira de Freitas ante o discrepante insulamento da matéria comercial num conteúdo apartado pelo fato de promulgada pela lei nº 556 de 25 de junho de 1850, quando concatenada não encontrado ainda coligida a civil em que se apoiasse, ter-se visto, assim, impelida a incluir substância da alçada desta, particularmente no tangia às obrigações e contratos, ao mandato, à troca, à locação, hipoteca, penhor, fiança, ao deposito ao pagamento à novação, à compensação etc., no que o Código Comercial, ao invés de exarar incompetentemente definições de direitos e obrigações, cumpria reportar-se ao Civil.
Eis porque, exacerbadamente, advertiria Teixeira de Freitas: A inércia das legislações jurídicas, formou lentamente um grande depósito de usos, costumes e doutrina que passaram a ser leis de exceção com seus tribunais e doutrina que passaram a ser leis de exceção com seus tribunais de jurisdição restrita e improrrogável. Eis a história do Direito Comercial.”
Não admitia o mestre, como o não apadrinhariam mestres outros de igual saber jurídico, que o ato de comercio fosse diverso do ato civil: poderiam ter peculiaridades próprias que, entretanto não emprestavam àquele uma categoria independente deste. Assim embora fosse o Direito Comercial mais penetrado do Direito publico como perfeitamente se depreende da intervenção do Estado em terreno comercial; mais rápido e menos formalista; capaz de exprimir um caráter profissional por ser que um estatuto do comerciante; menos nacional e mais internacional do que o Civil, isto apenas lhe ressaltava características insuficientes para erigi-lo em ramo distinto, pois não havia discriminação ou obrigações civis; nem haveria razão para um estatuto do comerciante com não havia para outros de médicos, advogados, cirurgiões-dentistas, infensos a ilações lógicas derivava tão só de acidentes históricos, assim que o Direito Romano não diferia Civil de Comercial, que somente eclodiu na idade média, com as corporações dos mercadores, incrementando-se de futuro, com os descobrimentos e o progresso da navegação, numa emancipação discutível.
Contudo, o parecer de Teixeira de Freitas, posto que chancelado pela Seção de justiça do conselho de Estado, não foi acatado pelo Ministro da Justiça, José de Alencar em 1869, que julgou “ frutos muito prematuros” o plano ousado do preclaro legista e o Esboço do Código Civil que não chegara a ser terminado, “ embora, com trabalhos científicos revelem as altas faculdades do autor e sua opulenta literatura jurídica recomendando num excusador desagravo que se tomasse por base a consolidação para com alguns desenvolvimentos necessários, confeccionar-se um Projeto Código Civil. E, em 1872, Duarte de Azevedo o seguinte Ministro da Justiça , recusa definitivamente a proposta de Teixeira de Freitas, declarando rescindido o ajuste de 1859.
Mas, a convicção de Teixeira de Freitas angariou simpatizante e paladinos da estirpe de Carvalho de Mendonça de Almeida, Carvalho Santos, Coelho Rodrigues, Inglez de Souza, Carlos do Carvalho, Sá Viana, Brasílio Machado, Otávio Marques, etc., e o 1º Congresso Jurídico Brasileiro afiançou-a quase que por unanimidade.
Teixeira de Freitas, o excelso jurista de boa-fé libertado de contingências acomodatícias dum deprimente legulismo, foi um inovador: inovara na metodização da Consolidação e do Esboço; inovara no frustrado ensaio de unitarista suscitando a controvérsia em que Carvalho Mendonça, assinalaria “o árduo problema inicial no estudo do Direito Comercial”; inovara ainda no patrocínio da integração do Direito Criminal no âmbito do Direito Privado, como se fundamentou em a nota ao art. 289 do Esboço; inovara principalmente no intuito de humanização da justiça talqualmente se intuito à larga em suas obras máxima, que são as patenteia à larga em suas obras máximas, que são as duas vigas-mestras da arquitetura de nosso Direito!
Todavia embora o repúdio ao Código de Teixeira de Freitas pelo desinteresse do arbítrio estatal estribasse na premente urgência de uma codificação e uma inconfundível avareza do erário público, transcorreu como uma irrisão, quase meio século pelas mãos de outro mestre, Clóvis Beviláquia, o Código Civil Brasileiro contivesse na derradeira de suas estipulações Artigo 1807 a revogação das Ordenações, Alvarás, Leis, Decretos, Resoluções, Usos e Costumes que compreendiam o nosso obsoleto patrimônio jurídico.
Teixeira de Freitas, malgrado e desabono pátrio, teve o seu mérito preconizado em toda a América do Sul, subsistindo dispositivos do Esboço em códigos de vários países hispano-americanos. O Código Argentino através de Vélez Sarsfield, que comparou os trabalhos do nosso maior do nosso maior jurisconsulto aos Savigny filiou-se a orientação geral do Esboço e reproduziu-lhe muito que dispunha; o Código Uruguaio também lhe resistiu ao influxo; identicamente o Paraguaio translado guarani do Argentino… E o Código Alemão com sua parte geral em que estudam as relações de direito, e a parte geral em que se estudam as relações de direito, e a parte especial em que se estabelecem as regras do Direito Privado propriamente ditas; e a Suíça com um código de obrigações, contíguo ao Civil onde são tratadas obrigações tanto civis quanto comerciais; e a Itália, consagrando num livro do Código Civil todos contato civis e mais a uniformização de todas as relações tidas como civis e comerciais; – não figurarão como inconteste e consagradora paridade com o método insigne juristécnico patrício, não serão uma apoteótica evidência de que era um precursor da verdade jurídica?
Sim, a influência de Teixeira de Freitas é de tal monta que, se alongarmos o olhar sobre nossa história, o veremos com a pureza cintilante do Amor e pujança irretorquível da verdade perdurar desde 1858 até o presente dias, com uma atualidade que não está sujeita nem ao Espaço nem ao tempo. Exemplificando, gostaríamos de, ao encerrarmos esta despretensiosa dissertação, convidar o leitor para um rápido passeio, sob a inspiração do deus Cronos, através do nosso direito e do de alguns povos:
1850 – “Art. 3º – As leis e usos comerciais, dos países estrangeiros regularão: § 1º – As questões sobre o estado e idade dos estrangeiros residentes no Império, quanto à capacidade para contratar, não sendo os mesmo estrangeiros comerciantes matriculados na forma do Art. 4º do Código Comercial” (Teixeira de Freitas, Aditamentos ao Código do Comércio , Rio de Janeiro, 1879, 2º vol. Pág. 1308).
1858 – “Art. 408 – As questões sobre o estado, e a idade de estrangeiros residentes no Império quanto à capacidade para contratar, serão também reguladas pelas leis, e usos, dos paises estrangeiros” (Teixeira de Freitas, Consolidação das Leis Civis, Rio de Janeiro, 1876, 3ª ed. Mais aumentada, pág.280 e notas até à pág. 283)
1860 – “Art. 26 – A Capacidade ou incapacidade, quanto a pessoas domiciliadas em qualquer seção do território do Brasil, ou sejam nacionais ou estrangeiras, serão julgadas pela lei deste Código, ainda que se trate de atos praticados em país estrangeiro.
Art. 27 – A capacidade ou incapacidade, quanto a pessoas domiciliadas fora do Brasil, ou sejam estrangeiras ou nacionais, serão julgadas pelas leis do seu respectivo domicilio, ainda que se trate de atos praticados no Império, ou de bens existentes no Império.” (Teixeira de Freitas, Esboço do Projeto de Código Civil, Ed. Do Ministério da justiça e Negócios Interiores, 1952, págs. 29 e notas até 32)
1865 – “Art. 6º – O Estado e a capacidade das pessoas e as relações de família, são reguladas pela lei da nação a que elas pertencem.” (Código Civil do Reino da Itália, cit. em A codificação do Direito Internacional Privado, de Rodrigo Otávio pág. 60).
1867 – “Art. 24º – Os portugueses que viajam ou residem em pais estrangeiro, conservam-se sujeitos às leis portuguesas concernentes à sua capacidade civil, ao seu estado e a sua propriedade imobiliária situada no reino, enquanto aos atos que houverem de produzir nele os seus efeitos: a forma dos atos será, todavia, regida pela lei do país, onde forem celebrados salvo casos em que lei expressamente ordenar o contrário. Art. 27º – O estado e a capacidade civil dos estrangeiros são regulados pela lei do seu pais.” (Código Civil Português, Anotado por Dias Ferreira, Lisboa, 1870, 1º vol. Págs 49 e 58)
1868 – “Art. 4º – Los orientales, residentes ó domiciliados em pais estranjero, permanerán sujetos a lãs leyes de la República: 1º – Em lo relativo al estado de lãs personas y a su capacidad para ejecutar actos que hayan de tener efecto em la República, 2º – Em lãs obligaciones y derechos que nascen de lãs relaciones de família; pero solo respcto de sus cónyuges y parientes orientales. Art. 5º – Los bienes raíces situados em la República exclusivamente regidos por lãs leyes orientales, aunque sus dueños sean estranjeros y no residan em el país. Esta disposición se extiende a los bienes muebles que tienem uma situación permanete em la Republica” (Código Civil de La República Oriental del Uruguay, 1925, pág. 1)
1969 – “Art. 7º – La capacidad ó incapacidade de lãs personas comiciliadas fuera del terrotorio de la República, será juzgada por lãs leys de su respctivo domicilio, aun cuando se trate de actos ejecutados ó de bienes existentes em la República. Art. 6º – La capcidad ó incapacidad de lãs personas comiciliadas em el território de la República, sean nacionales ó estranjeras será juzgada por lãs leyes de este Código, aun cuando se trate de astos ejecutados ó de bienes existentes em pais estranjeiro.” (Código Civil de la República Argentina s/ data, pág. 2)
– Art. 35 – O estado e capacidades civil das pessoas são reguladas pelas leis da nação, à qual elas pertencem, como se especificará no Código Civil.” (Projeto do Código civil de Nabuco de Araújo Editora Livraria Magalhães, são Paulo, 1912 pág. 19)
1881 – “Art.18 – O estado a capacidade civil dos estrangeiros, domiciliados residentes no Brasil, são regulados pelas leis da nação a que pertencerem. Art. 19 – estado e a capacidade civil dos brasileiros, domiciliados ou residentes em pais estrangeiro, são regulados pelas leis brasileiras, quanto aos atos que no Brasil tiverem de produzir os seus efeitos” (Projeto do Código Civil Brasileiro e comentário de Joaquim Felício dos Santos, Rio de Janeiro, 1884, tomo I, pág.28)
1889 – “Art. 1º – A capacidade das pessoas é regida pela lei de seu domicilio.” (Tratado de Direito civil Internacional, assinado entre as Republicas Argentinas, da Bolívia, do Paraguai, Peru e Uruguai; o Brasil não assinou, porque adotava lei da nacionalidade – In Princípios de Direito Comercial Internacional, do Bertho Condé, são Paulo, 1938, pág. 398)
1893 – “Art.13 O estado e a capacidade das pessoas assim como os seus direitos de família, são regidos pela lei nacional das mesmas pessoas.” (Projeto do Código Civil de Coelho Rodrigues, Rio de Janeiro, 1987, pág.4)
1896 – “Art. 7 – A capacidade de negócio de uma pessoa será regulada pela lei do Estado ao qual a pessoa pertence.” (Código Civil alemão, Lei de Introdução, trad. Do Prefessor Souza Diniz, rio de Janeiro, 1960, pág. 354/7)
1899 – “Art. 25 – O estado e a capacidade civil dos estrangeiros residentes no Brasil são regulados pelas leis da nação a que pertencerem § 1º – prevalecerão as disposições estrangeiras do direito civil ainda que outra seja a disposição de direito nacional privado correspondente à regra acima estabelecida, § 2º – serão porém fixadas de acordo com a lei territorial a natureza e qualificação da relação de direito § 3º – em todo o caso nenhuma disposição prevalecerá contra as leis rigorosamente obrigatórias fundadas em motivos de ordem pública, as proibitivas e as da moral.” (Direito Civil Brasileiro Recopilado ou Nova Consolidação das Leis Civis de Carlos de Carvalho, Rio de Janeiro, 1899, pág. 11).
1900 – “Art. 22 – A lei nacional da pessoa rege a sua capacidade e os seus direitos de família.” ( Projeto de Código Civil de Clóvis Beliváqua, Lei de Introdução do Código Civil Brasileiro – Trabalhos da Comissão Especial da Câmara dos Deputados – Rio de Janeiro, 1902, pág. 159 do 1º vol.)
1901 – – Art. 8º – A lei nacional da pessoa rege o seu estado e capacidade civil; e bem assim o estado civil da mulher casada e dos filhos, sem prejuízo de sua nacionalidade, enquanto perdurar o poder marital e pátrio; rege as relações pessoais dos cônjuges e o regime dos bens do casamento.” (Emenda substitutiva ao Título Preliminar apresentada pelo Sr. Andrade Figueira aos 4 de outubro in op. Cit, pág. 27 do vol. 4º)
– “Art. 20 – A lei nacional da pessoa rege o seu estado e capacidade” (Título Preliminar do Projeto Revisto, in op. Cit., pág. 164 do vol. 1º)
-“Art. 9º – A lei nacional da pessoa rege: o seu estado e capacidade civil, as relações pessoais dos cônjuges, e o regime dos bens do casamento.” (substitutivo ao Título Preliminar, apresentado por Azevedo Marques aos 14 de outubro in op. Cit, pág 122 do vol. 4º)
1902 – “Art. 8º – A lei nacional da pessoa rege o seu estado e capacidade civil as relações pessoais dos cônjuges, e o regime dos bens no casamento. § Único. Os filhos durante a menoridade, e a mulher casada, enquanto durar a sociedade conjugal, seguirão o estado civil do pai e do marido.” (Projeto adotado pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados, op. Cit., pág. 44 do vol. VIII)
1910 – “Art. 10 – O estado pessoal é regulado pelas leis da nacionalidade do individuo. Art. 8 – O estado pessoal do individuo é constituído pelas qualificações que revestem de caráter determinado em certas situações como o de marido, o de filho. Art. 9º – A noção de estado pessoal compreende a capacidade de exerce-lo, a menoridade e a maioridade, a condição de marido e mulher casada, a filiação, o pátrio poder, a adoção a emancipação a tutela e a curatela.” (Projeto de Código de Direito internacional Privado, de Lafaiete Rodrigues Pereira, apresentado à Quarta Confêrencia Panamericana, reunida em Buenos Aires em 12 julho de 1910, in Princípios de Direito Comercial Internacional, de Bertho Conde, São Paulo 1938, pág. 420)
1916 – “Art. 8º A lei nacional de pessoa determina a capacidade civil, os direitos de família as relações pessoais dos cônjuges, e o regime dos bens no casamento, sendo lícito quanto a este a opção pela lei brasileira.” (Código Civil dos Estados Unidos do Brasil, comentado por Clóvis Beviláquia, 1º vol. Pág 119 rio de Janeiro, 1944)
1928 – “Art.27 – A capacidade das pessoas individuais rege-se pela sua lei pessoal, salvo as restrições fixadas para o seu local.” (Código de Direito Internacional Privado (Bustamante), assinado em fevereiro de 1928 em Havana pelo Brasil In. Op. Cit de Bertho Conde, pág 446)
1942 – “Art. 7º – A lei do pais em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome a capacidade e os direitos de família.” Decr. 4657, de 4 de setembro de 1942, in op. Cit de Clóvis Beviláqua, 1º vol., pág. 118)
– “Art. 17 – O estado e a capacidade das pessoas e as relações de família são reguladas pelas leis do Estado a que elas pertencem” (Código Civil Italiano, disposições sobre as Leis em Geral, trás. Do Professor Souza Diniz Rio de Janeiro, 1961 pág. 32. Como se observa, o Art. 17 repete o 6º de 1865)
Após o que acima perlustramos verifica o leitor que, a começar de 1850, com o Regulamento Nº 737, e, acompanhando-o, a Consolidação das Leis Civis, de Teixeira de Freitas, ressalvando-se que este, obediente às instruções governamentais, apenas coligira e classificadora o Regulamento de 1850, o malogrado projeto de Nabuco de Araújo os projetos de Felício dos Santos e Coelho Rodrigues, a Nova Consolidação das Leis Civis de Carlos Carvalho, o projeto de Clóvis Beviláqua e seus acidentados trâmites na Câmara dos Deputados e no Senado, até sua aprovação em 1916, o projeto de Código de Direito Internacionmal Privado, de Lafaiete, e, com a assinatura do Código de Bustamante, adotamos ao lado da Itália, Portugal e Alemanha, a lei da nacionalidade. Mas o pensamento genial do bacharel do beco da Cancela (discurso de Pedro Calmon in R. Forense, vol. XCVII, fasc. 488, pág 531), que houvera transposto as fronteiras da indiferença pátria pequenas demais para oprimirem um dia após haver-se transformado no direito de outras gentes, retorna das sombras do Passado e, em 1942, aceitamos a lei do domicilio, que defendera em 1860 e a Argentina, Uruguai e Paraguai abebrados no Esboço, haviam perfilhado.
Valhamo-nos de uma frase de Fidelino de Figueiredo sobre Eça de Quirós e afirmemos que o nosso Direito se divide em dois períodos: antes e depois de Teixeira de Freitas.
Assim com Cinquenta e tantos anos de Ciência devotada ao Direito, sequiosa de “um amor de perfeição, que só a consciência pode recompensar”, supérstite desse esquecimento a que, descuidadamente, relegamos os compatriotas que engrandecem a nossa pequenez, imortalizou-se nas páginas da História a personalidade fulgurante de Teixeira de Freitas, que Lafaiete chamou de “Mestre” e Rui Barbosa reputou “o maior jurisconsulta do tempo”.
E aí esta a sua obra: o Esboço do Projeto de Código Civil, que chega até nós, no carinhoso e magoado dizer de Levi Carneiro, simplesmente como “documento duma tentativa malograda, que se não pode recordar sem surpresa e emoção.”
Eis que, hoje, nos ocorreu relembrar esta biografia ideal, aspirando a que revivendo-nos na sua serenidade não olvidemos, na força do Direito, a sagrada condição humana, para que, irresponsáveis autoclastas, não nos nulifiquemos um dia imprevistamente esmagados pelo brutal direito da Força!
São Paulo, 30/11/1961
9. Teixeira de Freitas e o Direito Civil Comparado
Há, nos conceitos de Teixeira de Freitas, pontos culminantes, que envaideceriam o mais excelso jurista das mais belas paginas do saber humano.
A unificação do direito, em que fatalmente se alicerçará a humanidade nos seus clamorosos destinos de um objetivo só!
A Grande classificação dos direitos em reais e pessoais, magistralmente exposta na Consolidação das Leis Civis e esmiuçada em confronto com toda a doutrina antiga e da época, salientando-se o labor profíquo de extensa pesquisa e critica desassombrada, prodigalizando, destarte, aos nossos olhos admirados, o inesquecível espetáculo da espiritualidade, aprisionada na investigação diuturna e explodindo na firmeza de suas convicções, ou melhor, na convicção de sua própria firmeza! O antelóquio do código, estabelecendo-lhe uma Parte Geral como lógica e salutar propedêutica de princípios inerentes aos mais diversos institutos (Consolidação das Leis Civis, Terceira edição mais aumentada, Rio de Janeiro, Garnier, 1876, Arts.1 a 75; Esboço do Código Civil, Ministério da Justiça e Negócios Interiores, 1952, Arts.1 a 866); a capacidade subordinada á lei do domicilio (Esboço, Arts.26 e 27); a aquisição de direitos reais sobre imóveis, seja pôr atos inter-vivos seja pôr atos judiciais (Arts.3.735 e 3.742 do Esboço), condicionada a transcrição do título no registro competente, pondo-se assim, em conflito com o Código Francês, monumento intangível e paradigma de inúmeras legislações, que acolhia a venda real e não puramente obrigacional; o repúdio claro a figurações obsoletas e sem a mínima juridicidade, como a morte civil e a escravidão, pôr sinal esposadas pelo Código Napoleônico, embora se arrogasse a qualidade de depositário das liberdades humanas; e aqui e acolá, num e noutro artigo, quando o Mestre se manifesta doutrinariamente, ressalta o soberbo intelecto que via o direito em sua vivência, na qual resplandencia o fato jurídico em busca de sua própria solução, não caindo, certamente, pôr isso mesmo, no perigo de organizar um código envelhecido!
Se passearmos a vista na paisagem histórica em que começam a se codificar os direitos da América Latina, anotaremos que, á exceção do Brasil , executados identicamente a Argentina, o Paraguai e o Uruguai, que se não furtaram a influência de Teixeira de Freitas, todos os demais se filiaram ao sistema do direito francês, adotando o Código de Napoleão, seja pôr dependência ideológica, seja pôr efeito de submissão aos exércitos do pequeno corso. Havia, aliás, uma compreensível receptividade ás idéias contidas no monumento napoleônico, consentâneas com as aspirações dos povos americanos, colônias sequiosas de liberdades exuberantes no código que importavam e que lhes haviam sido tolhidas pela férrea ordenação emanada das metrópoles. Talvez essa a razão de sobreporem-se-lhes ao próprio direito, que era uma continuação do direito metropolitano, os princípios gritantes da revolução jurídica com que a França empolgava o pensamento universal! O que o Conquistador não conseguiria com as armas, obteria comodamente com o código pomposo a que pospunha as pompas de seu nome!
Este é um momento histórico, que convém ser analisado. Portugal está muito próximo da França, tão próximo que o monarca português, aterrorizado pelo espectro da invasão francesa, chegara a debandar, acompanhado pelo terror dos áulicos prestimosos, largando as rédeas do reino a mãos menos emotivas e exilando-se voluntariamente no Brasil. De Paris, o eterno centro cultural da Europa, irradiavam as novas idéias, lentamente laboradas no dilúco da Revolução, quebrando a harmonia do regime econômico estruturado na evolução milenar do Poder: em Paris, em suas bibliotecas e seus cafés, Marx apanhava a semente da idéia que iria alvoroçar as idéias de tanta gente; Paris era a delicia dos conspiradores, das falas á socapa; Paris simbolizava a Revolução na Arte e na Ciência. Portugal não permaneceria indene a tais contágios e, talvez pôr essa osmose normal a proximidade de certos corpos, ao concretizar em letra as normas jurídicas que regeriam seu povo, o senhor Antônio Luís de Seabra, pediria emprestada a Portalis a pena com que redigiria o Projeto do Código Civil Português. Numa concomitância, talvez decorrente dessa mesma proximidade, o outro fragmento da Península Ibérica seguia o exemplo português, copiando-lhe o padrão. Ora, situado nesse momento histórico, abstraído obviamente o aspecto caricato com que o esboçamos, quando o pensamento reinol se divorciava das origens para acorrer ás alvíssaras do novo pensamento francês, cristalizado-o em suas normas de conduta codificadas; quando, também, ao impacto dos novos ideais , povos europeus e sul-americanos, num tropismo todo histórico para os movimentos libertários, se adatavam á nova e tentadora sistemática jurídica, em que pontificavam juristas de nomeada encomiástica, Teixeira de Freitas, seguindo as pegadas de Savigny, o seu Mestre querido, ao qual em muitas ocasiões pode o discípulo ser equiparado, marca em alto-relevo, as lindes dessa antítese colossal da história do direito que são o normativismo em sua mais extremada acepção e a historicidade da norma jurídica. Teixeira de Freitas não simboliza, na conjuntura que apontamos, apenas um capítulo da história do direito; simboliza, também e talvez como uma das melhores facetas de sua genialidade, a própria história do direito civil comparado. Na verdade, se compulsarmos a Consolidação das leis Civis, fruto da reflexão e da experiência, pois à extraordinária vocação do autor para o silêncio da meditação doutrinaria aliava-se, com complementando-a, a sua extraordinária vocação para os fragores da lida forense,- é, no processo maravilhoso de sua genética, uma lição, ao vivo, de direito civil comparado. È um labor grandioso de síntese, particularmente se se rememorem as Ordenações Filipinas e a legisferácia que, sob o rótulo de decretos, regulamentos, portarias, avisos, alvarás, etc., criavam, no desequilibro das relações jurídicas, a instabilidade social e econômica. Sintetizar num organismo lógico, sob a sistemática de uma classificação cientifica, toda uma legislação desuniforme, que se acumulara durante mais de dois séculos e meio, supérflua às vezes e conflitante quase sempre, ordenando-a cientificamente em 1333 artigos, é obra suficiente para atrair o respeito ao seu autor, porque é tarefa somente levada a cabo pôr cérebros privilegiados! É porem, mais no exame dos princípios que constituem as 192 páginas da Introdução, peça de rara qualidade, a que Savigny, pôr certo, não se recusaria emprestar seu nome consagrado; é, porém, na leitura demorada das anotações que acompanham cada artigo, com a riqueza das remissões a dispositivos do direito anterior ou de outros países; e mais, na visão do panorama que deflui das discussões doutrinárias suscitadas pelos comentários feitos a cada artigo, que se vislumbra, no fogo da controvérsia, a profundidade do conhecimento do codificador, em cujo patrimônio cultural se encontravam os nomes dos juristas e das obras que constituem esse acervo magnífico da cultura humana, que é a história do direito!
Como acentua René David, Teixeira de Freitas foi o único que, em terras sul-americanas, se esquivou à vassalagem a que se submeterem os que adotaram o sistema jurídico francês. Repugnando-lhe uma legislação importada, timbrava o Mestre, ocasiões sem conto, ressalvadas as limitações de método, em frisar o seu repudio àqueles direitos que se contém em códigos: “O direito quer a vida real: quer a possibilidade de relações individuo inteligente e livre com entes que têm a mesma natureza, e o mesmo destino” (Consolidação, pág. XLIII). E mostrava-se particularmente avesso a uma sistemática como a do código de 1804 em que ora se endeusavam os direitos pessoais, fazendo-os ultrapassarem o caráter de simples obrigações para se externarem como direitos reais ora se amesquinhavam liberdades humanas, apadrinhando execravelmente a morte civil e a escravidão. Nem Vélez Sarsfield, que se abastecera e na seara do Esboço, escapara ao contágio do Code: chancelara também a permissão por dividas e a morte civil, que o nosso Teixeira de Freitas desde a Consolidação abolira peremptoriamente com a pecha de “disposições vergonhosas que não podem servir para posteridade” (consolidação, pág. XXXVII). Isto detona que o nosso jurista era movido por um objetivo em que se mesclavam, dinamizadas as liberdades individuais e as exigências sociais. Pois se o homem é um ser social, como em inúmeros trechos de seus comentários consigna , é mister a preservação, outrossim de liberdades, e “a liberdade é o homem” (Esboço, pág. XXXI). É entretanto no instituto da compra e venda que sobressai a diferença entre o Esboço e o legislador francês, e de tal maneira se opõem e repelem compelidos a estuda-las a par um do outro. Louvamo-nos nesse intuito em palavras do próprio Teixeira de Freitas, que considerando o contrato de compra e venda como puramente obrigacional, ao contrário do Code que o perfilhara com apto por si só a transmitir direitos reais escreveu sobre este assunto em achega veemente ao autor do Projeto do Código Civil Português, um opúsculo interessantíssimo, em que se não sabe o que mais admirar se as digressões do jurista ou as subtilezas de sua ironia!
O jurista luso, conubiado com o individualismo liberal da Revolução liberal da Revolução de 1799, instaurara em Portugal como faceta última da prodigalidade interpretativa da lei pombalina o postulado da simples venda com eficácia real. Teixeira de Freitas lamenta que ilustra legista se tenha arredado da longeva origem e assinala com a precisão da evidencia, o etinerário da tradição como necessidade inelidivel para transferência da coisa: radica-a entre “os Romanos que quase se pode dizer que não legislaram imitando e que tratarem do direito com intuição viva” (nova apostila à censura do senhor Alberto Moraes Carvalho sobre o projeto do Código Civil Português, Rio de Janeiro Tipografia Universal de Lemmert, 1859 página 189) donde passa Códigos Manuelino (livro 4º titulo 42) e aos códigos Manuelino (Livro 4º, Titulo 28)e filipino (livro 4º Titilo 7º) até Alvará de 4 de Setembro de 1810 (op. Cit. págs 192/193) indica a seguir o cinveniente da novidade analisando-lhe os resultados particularmente em hipóteses de venda a mais de um comprador o que geraria enormes complicações com o desequilíbrio e a desconfiança sintomatológica que se não coadunaria com a movimentação desembaraçada da propriedade que requer a estabilidade e a garantia seu transito de um proprietário a outro, e ironicamente prevê futuro nada agradável para o código e seu autor supondo que, “ para que o seu belo ideal tivesse realidade fora preciso contar com a religiosa observância do pontual cumprimento dos contratos como está nas predica do Artigo 795; mas é loucura esperar que o evangelho do projeto venha regenerar a espécie humana. E demais se os homens não são o que são mas o que devem ser, e se com isto se conta, bem inútil é legislar e fazer códigos” (págs. 204/205); voltando à inspeção fria dos fatos argumenta com o insucesso do próprio código francês apontando que este que repelira a tradição como meio de transmissão do domínio logo atentara no deslize e se penitenciaria tanto que a exigira para os moveis praticamente extendendo em 1885 aos imóveis, ao aderir ao regime da transcrição volvendo ao Direito Romano repara que os sinais exteriores que caracterizam a transmissão e aquisição da propriedade se fundamentam em razões práticas de um povo que legislara para as sua contingências sendo o seu direito um experimento vivo em que resoluções equivalem ao mais alto teor de eqüidade , decorrendo daí certamente que a simbologia imprescindível á transmissão não era singelo ritual não era formalidade supérflua pois, “ se não houverem essas manifestações externas da transmissão e aquisição de propriedade, se a lei as não houver taxativamente designado, se basta adquiri-la, independentemente da aquisição efetiva verdadeira, queremos dizer, da posse real ou livre possibilidade de a ter; e sendo a má-fé ao fácil, e infelizmente tão comum entre os homens; qual a providencia. Para evitar essas fraudes para infundir confiança nas relações da vida, para prevenir tantos conflitos?; e o Mestre após rebater essa vontade onipotente que vinha de Grócio e pretendia dar ao mero contrato um querer que o tornava tão soberano que transformava o só direito pessoal em real, demonstra serem irreais “ essas suposições falazes, que se têm perpetuado à mercê do som das palavras, mas que não acham luar em qualquer espírito que distingue e firma idéias sem lhe importar a roupagem dos vocábulos” (pág. 13) e terminando ele, que, na Consolidação das Leis Civis, estatuiria no Artigo 908 e em nota 511, a imprescindibilidade da tradição para a aquisição de domínio conclui categoricamente que “ entre simples contrato embora perfeito e acabado, que nos confere direitos para haver uma coisa sua transmissão e sua material aquisição vai uma distância imensa e tão grande como do ter ao não ter” (páginas 187)… Teixeira de Freitas sabia distinguir, no confinamento o do bem individual em seu excesso de privatismo todo natural como um imperativo catalisador “elemento social, elemento jurídico por excelência, sem o qual a propriedade tal qual é não pode ser respeitada, ou antes não existe” (páginas 185/187)
Cremos haver, em nossas despretensiosas conjecturas, através da reconstituição da controvérsia em que formulou as diretivas de seu pensamento jurídico mostrado que Teixeira de Freitas não pode simplesmente ser estudado como louvável biografia engastada no cenário brasileiro, como um eco desse vendaval que foi o historiscismo: ao contrario, su figura se torna pálida incógnita se não entrosada com a realidade de direitos de nacionalidades outras como argentina uruguaia, paraguaia e demais países sul-americanos, pois como acima intentamos patentear, a legislação civil circunvizinha gravita em redor de uma referencia comum que atualmente indague de genealogia de algum dispositivo, depara com a celebração de Teixeira de Freitas, que nem os rigores dos tempos nem as ingratidões do homem e conseguem riscar das páginas mais luzentes dos fastos do nosso direito. Porque aclaradas por sua luminosa inteligência!
Apreciando o código Civil de 1916, e buscando-lhe a etiologia institucional, Pontes de Miranda realça a ponderável contribuição institucional, Pontes de Miranda realça a ponderável contribuição de Teixeira de Freitas e consta a, em sua minuciosa analisa, que “em tudo que se alterou, foi esboço a fonte principal” (pág. 119). Indubitavelmente, apesar de ter sofrido a rejeição do Governo Brasileiro, as linhas cardeais que pautaram o pensamento do excelso jurista refletiram-se, com solidez de sua idéias, na cultura jurídica dos que o seguiram no malogrado empreendimento: assim Nabuco de Araújo, Felício dos Santos, Coelho Rodrigues, Inglez de Souza, Clóvis Beviláqua. E como se lhe não bastara ao grande mérito uma gloridificação apenas doméstica, eis que sua ideação se expande, avassalando a cultura de povos estrangeiros, na definitiva consagração do gênio que universaliza. Não é, por isso, de se estranhar o arrebatamento de Pontes Miranda quando em seu precioso volume sobre as “Fontes de Evolução do Direito Brasileiro”, que é na verdade um panegírico de Teixeira de Freitas, lhe registra o nome de 202 vezes o Esboço, 24 vezes a Consolidação das Leis Civis e 2 vezes os Aditamentos à mesma, o que soma entre citações diretas e indiretas, um total de 491; nem quando, após traçar um quadro do que foi a influencia do intelecto freiteano na América do Sul, termina com estas palavras em que há, velada, ferina alusão aos Cujácios indígenas: “ A América do sul, podemos dizer, tem praticamente um direito: o que surge trazido pela tradição ou elaborado pelo gênio legislativo de Freitas, nos quase cinco milheiros de artigos do Esboço. Todas as leis civis posteriormente votadas pelos povos sul-americanos por vezes manifestam ser tiradas dele, ou direta ou indiretamente (através do Código Civil Argentino, uruguaio ou da doutrina dos três países) por ele influenciadas” (pág. 503)
As codificações, no acertado entendimento de Pontes Miranda, “politicamente são sinais de força consciente em si mesa” (pág.61). Com rigor de quem extrai conclusões verdadeiras de premissas, podemos com o mesmo acerto dizer que, se a proclamação de 1822 às margens do riacho Ipiranga, exprime a nossa independência administrativa e econômica, a obra jurídica de Teixeira de Freitas, mais do que arcabouço de um código perfeito é uma afirmação de nossa independência cultural, e esta, é por certo a sua maior glória porque é a nacionalidade que sente o despertar da própria soberania! Cultuando, pois, a memória de Teixeira de Freitas, não estaremos também, reverenciando em sua grande, a grandeza da pátria que, como ele o fora outrora, é hoje uma convulsão em trajetória para a realização de seus destinos!
Eis ao termo de nossa jornada: encetamo-la com os olhos plenos de coragem e de esperança; mas a missão a que nos propusermos certamente foi superior à nossa força, e ao neófito, que pretendeu retratar o mais alto expoente de nossa literatura jurídica, apenas uma certeza o anima ao chegar ao fim do frustrado cometimento: a ter exposto com o mais caloroso entusiasmo, a admiração que, como único predicado de sua tarefa, lhe pôde dedicar. E, se permitindo nos fora, encerraríamos nossa dedicar. E se, permitido nos fora, encerraríamos nossa acanhada dissertação com estas palavras de Teixeira de Freitas: “Se deste trabalho não redundar algum bem, se o desconhecerem ou recusarem, a intenção ao menos magnífica, e nós ficamos satisfeitos. Eis a recompensa, que ninguém nos pode dar, e tirar” (p´g; 214 nova Apostila)
São Paulo 1/12/1962
10. Teixeira de Freitas: O Homem e o Estado
Teixeira de Freitas, “o grandíssimo civilista brasileiro”, como elegeu com seu prestigio e insuspeição, o insigne comercialista mediterrâneo Túlio Ascarelli, desempenhou na história de nosso povo um papel preponderante: distingumo-lo pletórico bletórico beletrista jurídico admiramo-lo como requestado jurisconsulto, a que apelavam causídico, juizes e órgãos públicos, estimamo-lo como patrono buscadissimo pelos litigantes e reverenciando pelos colegas e magistrado e, finalmente ufanamo-nos de seu triunfal cometimento como consolidador e codificador de nossas normas civis em que patenteou a mais refinada erudição acerca dos institutos jurídicos versados em nossa legislação na doutrina e lei estrangeiras; entretanto há em sua luminosa existência fases que se conservam na obscuridade, em singular incógnito: sua infância, seu currículo acadêmico, seu ensaios advocatícios, e como assinala Hermes Lima, sua vida social, através da qual melhor se aprendera do homem e, através do homem mulher se aquilatara do seu inigualável empreendimento; há outro aspecto que também ainda não preocupou os seus biógrafos: as suas tendência políticas; não temos noticia de estudo algum que as retrate entrosadas na realidade pátria. Eis o que nos: alguns reparos ao que de político supomos pudesse ter havido em Teixeira de Freitas, simples ilações de um apaixonado ledor de seus livros, até que outro de maior cardeal que nós, se abalance a delinear o perfil ideológico “grandíssimo civilista brasileira.”
Inicialmente, rogamos vênia para realçar, no caráter de Teixeira de Freitas a tônica inalterável que é a robustez das convicções, a integridade moral, e a intransigência com que sentiu a faculdades de preservá-las e acreditá-las apanágio de todos. Já na Academia de São Paulo em 1 de agosto de 1835, quando declarava suspeitos os lentes que o argüiriam recorrendo ao Ministério do Império que, obviamente lhe não deferia o desabusado petitório, revela o desassombro com que encarava homens e coisas. Ao depois, ao esboço de Projeto do Código Civil, abandona-o em meio á feitura inutilizando suas fadigas mentais e físicas por se lhe não afigurarem compatíveis as clausulações do governo, que queria os códigos civil e comercial separados e a sua reação inovadora que almejava o unitarismo do Direito Privado: e é ponderável a dramaticidade deste gesto, em que Clóvis Beliváqua via “a heróica abnegação de um estóico ao que ele julgava a verdade cientifica”. E assim em toda sua obra que, ignorado o homem em si e nas conexões com os seus semelhantes, é unicamente o que nos resta, culmina sempre com um diapasão por que deveram afinar-se todos os seus atos, uma grande efusão de independência temperada pela austera serenidade do sábio que descobre nos erros que lhe são indigitados, a origem de nova pesquisa e o conforto de novas conclusões Teixeira de Freitas, particularmente na consolidação das Leis Civis em que sua genialidade se acendrou ao máximo, retifica sua genialidade se acendrou ao máximo, retifica suas formulações e quando correspondendo às censuras de Rebouças, o único que teve ônus e a honra de criticá-lo: o Mestre não se pejava de tachar de erros os seus raros deslizes a acolhia as corrigendas, endossando-se nelas críticas… Porque, se eram heris as sua convicções, a sua integridade moral o não impedira de refazê-las, pois aos que admoestassem eram pertinentes as regalias de, também terem convicções firmes…
Com intelecto de tal parte e uma conduta espiritual assim irreprochável, deveria por certo deixar espiritual assim irreprochável, deveria por certo deixar, em tudo quanto sua poderosa mente construísse, o selo da comoção e da paternidade; – e na verdade a vida de Teixeira de Feitas foi timbrada pelo signo da Revolução, embora o indiquem os historiadores de nosso Direito como modelo vivo do fenômeno em sua gênese evolutiva de naturalidade lenta, como é crida a genética jurídica sob o microscópio historicista: nada mais inexato: em Teixeira de Freitas há um vulcão de raciocínios entre os quais eclodem com entusiasmos de sabor do inusitado as concepções jurígenas, labaredas e o que o intercalam no panorama cultural como lídimo e primevo dos inovadores. Mesmo na consolidação das Leis Civis, malgrado Orlando Gomes a responsabilize pela persistência entre nós, até 1917 do anacronismo das ordenações caducas, Teixeira de Freitas, erigindo esse colossal monumento, não foi tão somente um compilador: mais que isso , foi a sua empresa, pois coligindo, classificando assumia posição critica , negando ou afirmando o que implica necessariamente critérios e, consequentemente, referibilidades axiológicas.
Nascidas na predestinada Cachoeira onde, em 1832 efemeramente se proclamara a Independência da Bahia e, em 14 de março de 1847, nasceria Castro Alves o poeta dos Escravos devera estar determinado nas tramas da fatalidade que o revolucionário teórico receberia em meio aos braseiros e sangues das barricadas, nas pia purificadora de Revolução, o batismo indelével de suas futuras indagações!
Acedei, pois, que nos conduzimos nas asas diligentes da imaginação, às paginas da História onde maquinada deflagrada e liderada pelo médico Francisco Sabino Alves da Rocha Vieira, esse torturado pelos preceitos liberais, almagamados em Voltaire, Montesquieu, Tocqueville e Rousseau, separatista e republicano ardoroso que trazia-nos com a inflexibilidade dum estigma hereditário, o determinismo doentio das conspirações, começou a 7 de novembro de 1837, e terminou tragicamente ao 15 de março de 1838, a insurreição baiana que se chamou Sabinada. Os sediciosos que eram em numero aproximado de 250 assenhorearam-se da Capital sem disparo de um tiro, pois o exercito e a policia aderiram ao movimento. Desguarnecido o seu arbítrio o presidente da província refugiou-se no brigue “três de maio” que se fez ao largo, protegido pela artilharia naval” Para os revolucionários a primeira etapa da partida estava ganha. Agora era dar forma à vitória, organiza-la e consolida-la. E para que não faltasse um traço vivo da soberania popular a rebelião, dirigiam-se à Câmara municipal que era a mais alta expressão de vontade do povo. Desde a colônia que as Câmaras sempre haviam representado a força da opinião publica contra o absolutismo. Eram elas que representavam á Coroa contra autoridades desmandadas. Nelas estava o centro de resistência brasileira. E pelas 11 horas os sinos do Paço Municipal repicaram, chamando os vereadores”. “E a Câmara, interpretando o sentimento geral, proclamou a independência e a republica. Por uma aclamação da Bahia ficava inteira permanentemente desligada do governo denominado Central do Rio de Janeiro e considerada Estado livre e independente.” ”Fora um golpe branco. Fizera-se sem ódio, e não se registrou sequer uma vingança pessoal dos vereadores”. Mas, enquanto os inssurretos se embriagavam com os louros fáceis numa alegria conseqüente à pugna incruenta e sem lágrimas. O governo preparava a reação, ganhando com o tempo a organização de que precisava após a derrota inicial”: vieram auxilio da Corte e das Províncias, que constrangiam a rebelião por terra e mar, cortando aos sitiados o acesso às localidades próximas, privando-os sitiados o acesso as localidades próximas, privando-os assim do gênero alimentício que delas pudessem provir. Não nos demoraremos na descrição das angustias do cerco: após várias sortidas inúteis, repetidas e novamente inúteis para rompê-lo, pois o arrojo da quimera não conseguia suprir a inexperiência das armas, os rebeldes apresentaram-se para afrontar o ataque final, comandado pelo general Callado que, que intetaria derrotá-los no prazo de um só dia, mas encontraria o “inimigo com uma resistência sem igual”. No dia 13 de fevereiro de 1838, após três meses de isolamento e terrificante expectativa, os revoltosos e os canhões governamentais travaram o definitivo diálogo de fogo. Dentro em pouco, ante a arremetida longamente premeditada e estrategicamente calculada pelos oficiais e à risca executada pelas fileiras imperiais disciplinadas, cujo o avanço, treinado em táticas bélicas, eram um métodos e inflexível, esmagando os rebelados num abraço ensangüentado e chamejante “a posição dos revolucionários era insustentável“. Tudo era ocupado quase nenhum era o chão em que tropegavam os pés. Mas “nem por isso estavam dispostos e render-se. Muitos batiam –se obstinademente” “Hora em hora, porém tornavam-se pior a situação dos revoltosos” tiroteando espalhados aos magotes desnorteados numa estratégia rudimentar cedendo” sempre as investidas das forças imperiais” A Sabinada agonizava num braseiro infernal.” “ Os contendores batiam-se movidos pelo ódio, cheios de rancor. A investida das forças legais era brutal. Nada poupava nada perdoava. Enfurecidos pela bravura com que se batia o adversário os soldados do império assemelhavam-se a uma horda de bárbaros lançada sobre a cidade. A passagem de cada pelotão assinala-se por atos de crueldade. Nas grandes fogueira das casas incendiadas lançavam pessoas vivas, indefesos prisioneiros. Dos chefes rebeldes a nenhum, dos que caíram prisioneiros no ardor do embate, foi lhe poupada a vida.” No inesperado desastre, restava-lhes apenas “aguardarem o fim da tragédia que se desenrolava aos seus olhos e na qual eram as vítimas, já quase indefesas.” “Era impossível resistir por mais tempo. A ninguém, na posição em que encontravam os rebeldes nessa manhã 15 de março, seria dado pensar noutro alvitre, senão no da rendição.” O maior contingente de seu precário exército, se não tombara em batalha, debandara, asilando-se nas residências vazias, que se transformavam na última trincheira nas ruas ocupadas pelos legalistas. “Apenas um pequeno número ainda lutava sem objetivo determinado. Mas, mesmo assim, perdidas as esperanças, os revolucionários ainda combatiam.” Depois do último reduto, a Fortaleza de São Pedro, em que os intrépidos remanescentes resistiam não mais defendendo um ideal, mas a própria vida. Depois, a bandeira branca de rendição incondicional e “diante dos vencedores desfilaram os vencidos, 610 prisioneiros, remanescentes duma jornada heróica e que depunham as armas inda quentes da luta. Estava finda a Sabinada. A paz descia sobre a Bahia. Estava salvo o Império. A República Baiana fora afogada em sangue.”
Debuxamos este quadro de heroicidades e catástrofes, em ligeiras pinceladas, embebido o pincel na paleta de Luís Vianna Filho, o seu incomparável intérprete, porque na transitória vigência da República Baiana de 1837, Teixeira de Freitas, nomeado pelos revoltosos, foi o Juiz da Revolução, ingloriamente processado e absolvido. Parece-nos que, dada a sua altivez intelectual, que sempre demonstrou, vista a ilibação que sempre lhe timbrou as atitudes, o exercício desse alto cargo, à margem da ordem política estatuída, exprime um abandono de princípios, uma profissão de fé em direitos coartados. Essa, na verdade, foi a constante de suas proposições, a despeito de que abominasse e satirizasse o liberalismo inconseqüente e contraditório dos ditames vazados no Código napoleônico, tal qual em copiosos trechos de seus escritos, com a acridade ferina do polemista, ferreteou. Mas o que revela é que, entendidas as divergências de escolas jurídicas, Teixeira de Freitas trazia gravados profundamente no subconsciente de suas assertivas os direitos do homem coincidentemente sempre em cotejo com os atribuídos ao cidadão. É o que se depreende em a NOVA APOSTILA, ao escalpelar o Projeto de Código Civil Português, e na Introdução à sua Consolidação das Leis Civis, quando destrincha percuciente e exaustivamente os direitos Público e Privado, civis políticos, demarcando a esfera pública e privada, e principalmente, estabelecendo a intangibilidade das prerrogativas civis, propugnando a alforria das disposições particulares em face de instituições obsoletas, como escravidão, a morte civil, etc. Jamais devera a liberdade sacrificar-se ao rigor lógico. É evidente que punha acentuadas restrições à livre autonomia das vontades, pois se admita intangível a liberdade, declarando-a taxativamente como “pensamento dominante” no Esboço, concebia-a, no entanto, condicionada à realidade social, do homem em relação com outros homens, ligados pela inteligência e pela alta destinação que devia prover aos propósitos de seu comportamento.
Aquele que “modificou completamente a evolução das idéias jurídicas no povo brasileiro”, e modestamente se intitulava, no frontispício de suas publicações, como “um advogado da Corte do Rio de Janeiro”, batizadas as suas opiniões no borralho sangrento da taquicrônica República Baiana, deveria, por certo, guardar nos refolhos da sensibilidade a memória triste do óbito desse sonho estrangulado na incipiência. E, se analisarmos a sua realização jurídica, sem nenhum esforço veremos brotar de seus parágrafos, como um eco de 1837, o repúdio ao absolutismo, seja sob que vestimenta se custodiar. O que mais importante nos semelha, porém, é que Teixeira de Freitas, se embora não empunhando o mosquete, entrara no rol dos antagonistas do Império, ao menos por compartilhar-lhes das idéias, oprimido idealismo, outra Revolução fez, no silêncio de seu gabinete, sem troar dos morteiros, sem o fumo dos canhões, sem o amento dos feridos; a sua Revolução que envolveu o país inteiro, corporificando-o numa só estrutura homogeneizando a brasilidade num só espírito, foi a do Direito, prodigalizando aos compatrícios frutiferamente, se reuniam para criar: o Projeto do Código Civil, a que antepusera, com uma impropriedade somente compreensível pela modéstia, o vocábulo Esboço e a Consolidação das Leis Civis, que qualificava de codificação provisória, malgrado significasse, de 1858 a 1917, o único facho de luz a aclarar o emaranhado das lides forenses. Diz Pontes de Miranda, com brilhantismo literário que condensa em tudo quanto escreve, que, “na exposição das regras que constituem um Código, todo povo, escolhendo-as, como que se escolhe a si mesmo.” Realmente, a unidade política de povo está estreitamente ligada à sua unidade civil, uma como que catalisadora da outra: assim vemos no exemplo da Suíça, aunando os cantões sob o pendão do Código Federal, e da Alemanha, para qual THIBAUT desejava a codificação como processo de aplanar as arestas da heterogeneidade jurídica, que ocasionava, mais do que uma autonomia, a quase soberania de Estados dentro de Estados. Na verdade, se “as codificações, – como assevera Pontes de Miranda – politicamente, são sinais de força consciente de si mesma”, o Brasil caminhou os primeiros passos pela mão de Teixeira de Freitas “E, – como dizia – que maior bem se pode fazer a um povo, quando se lhe dá leis perfeitas e justas?” Há, entretanto, na seara cultural do bacharel de Cachoeira, a par de sua contribuição para unidade nacional, a grande contribuição para redenção do homem como simples componente na nação, que “é o ente inteligente e livre e não uma tabula rasa em que o legislador constrói codificações arbitrárias”; mais que o regionalismo da unidade política, vislumbramos em Teixeira de Freitas, quando alude à “grande obra da comunhão do Direito”, a unidade do homem em sua universalização: avaliado historicamente, o casuísmo primitivo, à medida que se desenvolvem as intercomunicações é englobado na generalização; os direito, salvo exceções sinônimas de peculiaridades regionais, são análogos para todos os homens de todas as plagas, condicionada a desigualdade apenas a graus de civilização e de ideologias; o individualismo, seja qual for o feitio sob que se rotule, cede o seu lugar à socialização, independentemente do nome que lhe queiram dar, é a chance derradeira do ser social, pois que se não compreende o direito do homem só, a unidade para a sobrevivência do Direito e do próprio homem! – mais que simplesmente o republicano de 1837, como deixam alguns entrever, foi Teixeira de Freitas o tutelado do homem contra o Estado, mais que simplesmente um libertador das instituições jurídicas, foi Teixeira de Freitas um cultor da intocabilidade da personalidade humana “A liberdade – dizia – é o homem. A liberdade em política jamais teria o nome de direito se os povos se houvessem remetido das instituições opressivas; e na vida civil não teria correlativo , se não fora o abuso da escravidão.” Era como se antevisse o que mais tarde nos aconteceria, quando o Estado, como diz Orlando Gomes, nos imporia “a troca da túnica do cidadão pela camisa do súdito”. Nunca, em verdade, se viu, como hodiernamente, a engrenagem estatal, como um polvo gigantesco, entender sobre relações jurídicas privadas os tentáculos avassaladores da publicização: imiscuindo-se nos trâmites econômicos, artificializando-lhes as leis e restringindo a iniciativa das atribuições individuais; invadindo o comércio e a indústria, disfarçando sob a pele de ovelha da legislação trabalhista; arremedando o trêfego e maldoso shylock shakespeareano na drasticidade por vezes bestial da arrecadação tributária; algemando homens e mulheres aos liames da família, às vezes bem, às vezes mal; metamorfoseando no direito administrativo as instituições civis, a que empresta a sua onipotência implacável; intrometendo-se, como híbrido membro, nas sociedades anônimas; constrangendo a contratos em que funciona como a única parte, ou melhor, como parte dotada de apetite voraz e insaciável; enfim, mantendo a coletividade abulicizada “sob regime de uma vigilância verdadeiramente policial” Carregamos às coisas, hoje, o estatismo, seja oriental, que através da hipertrofia do poder público, despersonaliza o indivíduo a ponto de transforma-lo “em mero autônomo, a servir de joguete ao mais desenfreado autoritarismo”.
Ao escrevermos estas palavras, recordando a Revolução de 1837, em que um pugilo de bravos exerceu o legítimo enquanto bafejado por um ideal, de revoltar-se, associamo-las à reminiscência de Teixeira de Freitas, para quem “todo homem e pessoa, ainda mesmo em um país de escravos”, recordando, também, o poderio inominável acumulado no fenômeno da estatização, em que, quando vacilam os sagrados direitos do homem, tudo se acaba amortalhado nas penumbras do pavor, o abantesma burocratizado, que detém o suborno do Ouro e o azorrague da Tortura, mutila com celeridade do raio os mais recônditos germes de ingênuo inconformismo.
E, nos dias que correm, quando se busca falazmente, no Direito, como realização de valores, a chancela do Estado moderno, numa reedição do Estado-poder de Maquiavel, – e nos atemoriza a todo instante a temeridade dos estadistas deslembrados da sagrada condição humana e vemos quase frustradas as esperanças no Futuro, apesar das lições dramáticas do Passado, consola-nos a certeza, sempre presente, mesmo nos momentos de maior desvario, de que “da morte de uns direitos resulta o nascimento de outros”, como ensina Teixeira de Freitas, com a sua sabedoria dos homens!
São Paulo, 30 de novembro de 1961
11. Apontamentos na Psicanálise
“Para nós, os estudos sobre a lei e o direito devem ser vistos na perspectiva das ciências sociais: Antropologia, Sociologia, História, Ciência Política e, por último, mas não menos significativa, a Psicanálise. Este artigo é um bom exemplo da obsolescência das fronteiras disciplinares tradicionais.
No que se refere à metodologia, nós trabalhamos buscando indícios, e impressões significantes do direito canônico; sinais, todavia, nem sempre visíveis da ideologia da Igreja Católica. Nós chamamos tomismo, para fazer referência ao pensamento de Santo Tomás de Aquino e à sua influência nos dias de hoje. Nós também buscamos por dados qualitativos concretos tanto no presente e no passado histórico (influência de longa duração), mas sem desprezar os dados quantitativos e sem estabelecer limites para a interpretação e análise.
Nosso ensaio foca a história das idéias jurídicas, vinculando poder e disciplina no interior da família, na transição para a modernidade. Nós estamos interessados nas ideologias jurídicas em Portugal, desde o século XVIII até a emancipação política do Brasil (1822) quando o Império no Brasil deliberou escrever fazer publicar os códigos criminal e civil. Estamos considerando as relações entre o iluminismo e o processo de circulação das idéias (Itália, França, Holanda, Alemanha) em conexão com a “ideologia do favor” e a escravidão.
No Código Civil (Direito de Família), por exemplo, o casamento civil é muito importante e não apenas no Brasil, mas em Portugal, Espanha e nos novos países independentes da América Latina. Nós estamos muito interessados na figura paterna também; o pai como símbolo do pátrio poder (paterfamilis), de acordo com a visão de Pierre Legendre, no sentido da idealização da figura paterna e não só no Código Civil, mas freqüentemente na dinâmica do cotidiano com reflexos em todas as relações sociais.
Discussões e debates sobre o novo código criminal (apesar da presença da escravidão) e sobre o novo código civil (onde o casamento considerado como contrato, no sentido do código napoleônico, era a questão chave) constituíam o foco onde a sociedade brasileira confrontava o desejo por mudanças sociais; nem tão radicais assim, aspirando a modernização, a formação de um Estado republicano que espelhasse a diversidade de sentidos da identidade nacional num período de intensa transformação econômico social e turbulência cultural.
O atraso na entrada em vigor do código civil no Brasil pode ser explicado em função das dificuldades encontradas pelos reformadores do campo jurídico em articular o ponto de vista dos direitos civis da pessoa, no sentido do individualismo moderno (onde o pensamento político de John Locke e a influência do código francês napoleônico são considerados como símbolos) com a questão do pátrio poder. No Brasil, o pátrio poder seguia vigorando nos moldes de uma concepção pré-moderna, fundada numa visão conservadora e clerical, que contemplava a idealização da figura paterna no interior da família.
A principal conseqüência era a autoridade incontestável e exclusivista da figura paterna idealizada, impondo-se no topo da hierarquia familiar e exigindo submissão e obediência. Uma tal figura de pai, amado e odiado, interroga o pensamento freudiano pelo muito que encerra sobre si tanto de narcisismo quanto de idealização, responsáveis, em última análise, por muito sofrimento, na busca compulsiva de não menos que o … paraíso.
A ausência da figura paterna devidamente internalizada redundou na ignorância simbólica da lei (tanto no sentido jurídico, quanto no sentido lacaniano da figura paterna).
O Código Civil Brasileiro foi escrito primeiramente pelo renomado jurista romanista Augusto Teixeira de Freitas. Ele escreveu 5000 páginas por solicitação do próprio Imperador D. Pedro II e depois deste rascunho Clovis Bevilacqua o concluiu com muitas observações de Rui Barbosa. O texto de Teixeira de Freitas atesta a influência de Von Savigny e de seu livro Traité du Droit Romain.
Para ele, o direito romano resume o direito no ocidente cristão e Von Savigny foi provavelmente o pensador mais românico e ocidental do direito.
Nascido na Renânia francesa, ele foi lido no idioma francês no Brasil e tinha um enfoque gaulês do direito germânico. O direito romano, o direito canônico, o civil germânico e o direito napoleônico eram vistos numa convergência particular em torno do debate acerca dos direitos humanos, iluminismo, do casamento civil (como contrato) versus o casamento como sacramento, de acordo com a lei canônica. Em função disto não há diferença, na visão de Teixeira de Freitas, entre nacionais e estrangeiros como no direito romano (para a concessão do divórcio), a despeito desta opinião ser contrária às deliberações do Congresso de Viena. Estabelecer diferenças entre nacionais e estrangeiros seria abrir a porta para o divórcio e a concepção laica e burguesa do casamento, onde portanto da visão da Igreja Católica Romana. Por causa desta posição e não somente por causa das mudanças introduzidas no texto de Teixeira de Freitas pelo jurista português Luis Antonio Seabra é que Freitas acabou por abandonar a redação do código civil brasileiro, escrevendo o libelo “Pedro quer ser Augusto”, contra o imperador. De acordo com Pierangelo Catalano, professor em “La Sapienza”, Universittà di Roma, o romanismo sempre esteve presente desde os primeiros momentos da independência na América Latina. Nos primórdios, Andrés Bello (Venezuela), pela “codificação do Pacífico”; Augusto Teixeira de Freitas (Brasil), pela “codificação do Atlântico Sul”; Vélez Sarsfield (Argentina), especialmente quando escreve sobre direito romano. Clovis Bevilacqua vai na mesma direção. Andrés Belo hoje diria:
“aqueles que vêem o direito românico como lei estrangeira, são eles mesmos estrangeiros na sua própria lei”. Esta afirmação acaba por contribuir para a exclusão das idéias jurídicas de corte liberal, ou liberal radical, ancoradas na Revolução francesa, confirmando, por seu turno, as influências do tomismo como ideologia corrente e vetor de hierarquia, favor, obediência, submissão dependência à figura paterna onipotente.”
Gisálio Cerqueira Filho
Código Civil e Cotidiano no Brasil
12. Indicações literárias
Já foi dito que melhor se compreende Teixeira de Freitas pela sua obra, não pelos fatos de sua vida. Porém, acredito que quatro episódios devem ser referidos, porque marcantes do seu feitio moral, certamente refletido na produção intelectual.
Em 1835, com 19 anos, cursando o quarto ano do Curso Jurídico no antigo Convento de São Francisco, em São Paulo, requereu fosse examinado por outros professores que não os titulares da segunda cadeira, o que lhe foi indeferido pelo Ministro do Império Joaquim Vieira da Silva e Souza. Com isso, abandonou o curso e retornou a Olinda, onde já cursara o primeiro ano, diplomando-se em 1837. A história da época não registra pedido igual, cujas razões não ficaram até hoje explicadas, e a reação do estudante mostra a firmeza da sua insatisfação.
Mais tarde, em 1857, empossado há poucos meses na Presidência do Instituto dos Advogados Brasileiros, nobre instituição que ajudara a fundar em 1843, Teixeira de Freitas emitiu parecer em consulta feita ao Instituto, sobre se eram livres os filhos de escrava que, em testamento, havia sido libertada, mas com a cláusula de servir a um herdeiro ou legatário, enquanto este vivesse. Fundado na interpretação de texto de Ulpiano, entendeu que eles seriam escravos, enquanto Caetano Alberto Soares, ex-presidente e também parecerista, respondera que os filhos seriam livres. A questão foi submetida a votos no Instituto e venceu a tese de Caetano Alberto. Inconformado com os debates, que se prolongaram por três sessões, e com o resultado desfavorável, Freitas enviou carta ao Instituto e renunciou à sua presidência, aproveitando para oferecer certa quantia (um conto de réis) para início de uma biblioteca, indicando como primeira necessidade a aquisição de exemplar do Corpus Juris Civilis. A renúncia foi aceita, mas a oferta recusada.
O Ministro Moreira Alves, romanista insigne, afirmou ser a solução correta, mesmo à luz dos mais recentes estudos de Schulz, Arangio-Ruiz e Donatuti, em face do direito justinianeu, que continuava sendo o direito subsidiário das Ordenações Filipinas aplicadas no Brasil[35]. Houve quem visse aí uma tendência ao ius strictum e ao legalismo[36], o que corrobora a crítica que lhe fez René David, de ser demasiadamente dogmático. Na carta que enviou ao Instituto, Freitas explicou: em questões de jurisprudência, não posso compreender que se desenvolvam paixões; não sei também que fruto se possa colher dos assaltos de uma primeira idéia, e arrebatamento do entusiasmo, em matéria de pura observação e raciocínio… As opiniões alheias devem ser respeitadas, mas a certeza não é o mesmo que a dúvida. Se me negares o brilho do sol, eu não direi que tendes uma opinião, direi que sois cegos. Devo lembrar ter sido ele convicto adversário da escravidão, tanto que não a mencionou na Consolidação e no Esboço, embora o regime fosse escravocrata. O incidente demonstra a sua intransigência com a rigorosa observância do sistema jurídico, ainda que a conclusão contrariasse os seus sentimentos.
Em ofício de 20 de setembro de 1867, Teixeira de Freitas submeteu ao Ministro da Justiça seu propósito de abandonar o Esboço do Código Civil, no qual trabalhava desde 1859, já adiantada a empresa com 3.702 artigos publicados, outros 1.314 prontos para publicar, e propôs a unificação do Direito Privado, com a elaboração de dois novos códigos: um Código Geral, com as leis que ensinam, para os homens de ciência, e um Código Civil, com as leis que mandam, para o povo. Isso significaria modificação profunda de tudo quanto se pensara àquele tempo sobre a legislação do Direito Privado. O Conselho de Estado, pela comissão formada por José Tomás Nabuco de Araújo, Francisco de Sales Torres Homem e o Visconde de Jequitinhonha (Francisco Gê Acaiaba Montezuma), aprovou o plano, “uma invenção, que pode dar glória ao autor e ao país”.
No Ministério da Justiça, porém, estava José de Alencar, que não aceitava o Esboço e, menos ainda, a nova proposta: Em minha humilde opinião, não só o engenhoso e vasto plano ultimamente delineado pelo bacharel Augusto Teixeira de Freitas, mas também o esboço anterior, são, como elementos legislativos, frutos muito prematuros, embora como trabalhos científicos revelem as altas faculdades do autor, e sua opulenta literatura jurídica. O Ministério deixou o assunto de lado até que, em 1872, sendo Ministro da Justiça Manuel Antonio Duarte de Azevedo, expediu-se ofício pelo qual era considerado rescindido o contrato com Teixeira de Freitas e ele exonerado das suas obrigações.
Esse terceiro fato (1867) revela a pureza de propósito do cientista, que não vacilou em sacrificar uma vida de estudos e rejeitar a obra que até ali construíra, mas que agora o descontentava; diante do impasse, assumiu o único comportamento por ele considerado compatível com a necessidade de manter-se fiel à sua convicção atual, a melhor para a ordem jurídica do país. Disse Freitas: Se engendrei tudo isso (o plano da Consolidação), se alterei minhas primeiras idéias, por que não poderei mais uma vez alterá-las, ou antes, requintá-las, no meu ardente amor pela conquista da verdade jurídica?… Não há tipo para essa arbitrária separação de leis, a que deu-se o nome de Direito Comercial ou Código Comercial; pois que todos os atos da vida jurídica, excetuados os benéficos, podem ser comerciais ou não-comerciais, isto é, tanto podem ter por fim o lucro pecuniário, com outra satisfação da existência… O meio de sair de tais embaraços, de sanar tantos inconvenientes, de reparar os erros do passado, de fixar os conhecimentos jurídicos, de estabelecer a unidade da legislação e de extremar os verdadeiros limites da codificação civil só o acharemos na composição de dois códigos cujas divisões capitais vêm a ser: CÓDIGO GERAL. Livro 1º – Das causas jurídicas. Seção 1ª – Das pessoas. Seção 2ª – Dos bens. Seção 3ª – Dos fatos. Livro 2º – Dos efeitos jurídicos. Código Civil. Livro 1º – Dos efeitos jurídicos. Livro 2o – Dos direitos pessoais. Livro 3º – Dos direitos reais.
É uma pagina dolorosa, a mais dolorosa da história intelectual da jurisprudência brasileira, essa, em que o sábio jurista renega e despedaça todo o seu trabalho anterior, sacrificando-o, com heróica abnegação de um estóico, ao que ele julgava a verdade científica[37].
Comentando o acontecido, disse Pontes de Miranda: O Esboço de Teixeira de Freitas, que nos teria dado o melhor Código Civil do Século XIX, prestou-nos, não se transformando em Código Civil, o serviço de por-nos em dia com o que genialmente entrevia e permitiu-nos sorrir dos imitadores do Código Civil francês, enquanto Portugal, imitando-o, deixou que a sua história jurídica se fizesse mais nossa do que dele… Já Teixeira de Freitas percebera que a parte do direito concernente à eficácia (“dos efeitos civis”, dizia ele) havia de ser todo um livro, após as causas, as pessoas, os bens e os fatos jurídicos. Somente depois trataria – no plano do direito civil – dos direitos pessoais e dos direitos reais. O Código Comercial fundir-se-ia, unificando-se o direito privado. Foi isso o que ele propôs em ofício de 20 de setembro de 1867, antes do Código suíço das Obrigações, e a mediocridade circundante rejeitou (Tratado, Prefácio, v. 1, p. XXIII).
Sobre a proposta de 20 de setembro, observou o Prof. Orlando de Carvalho, titular de Coimbra: embora a idéia de um código propedêutico não tenha sido invenção de Freitas, constitui, mesmo assim, um contributo singularíssimo, pois ninguém, que saibamos, terá levado tão longe a conversão em jurídico do jurídico-científico; a mais da idéia desse Código Geral, há a proposta de uma absorção pura e simples da legislação mercantil pelo Código Civil[38].
Por fim, o quarto fato digno de nota. Em 1872, rescindido o contrato com Teixeira de Freitas, o Governo delegou a tarefa de organizar o projeto a José Tomás Nabuco de Araújo. O grande Nabuco trabalhou com afinco por cinco anos, utilizou como ponto de partida o Esboço, mas faleceu em 1878, após redigir apenas 118 artigos do Título Preliminar e 182 da Parte Geral. Sabe-se que Nabuco foi de Teixeira de Freitas, durante largos anos, o amigo, o admirador, o incentivador, seu consorte desde o começo da jornada. Como Nabuco falece sem deixar o Código, Teixeira de Freitas, já com a sua forte e orgulhosa inteligência alterada, desmoronada das alturas a que se elevara, tem um grande abalo moral, e, num impulso de gratidão e de solidariedade, oferece-se para pagar a dívida de Nabuco, recolhendo e animando os fragmentos da sua obra interrompida. De certo em toda a sua vida não terá Nabuco recebido mais funda impressão da nobreza instintiva do homem, do que essa generosidade que tocou a seus filhos agradecer[39].
A referência à doença se explica pela grave depressão que se abateu sobre o nosso jurista depois de recusado seu plano de reformular o sistema de Direito Privado. Por causa disso, a conselho médico, transferiu residência para Curitiba, onde morou por quase dez anos. A suspeita da fraqueza mental de Freitas foi reforçada, à época, com a publicação de dois de seus trabalhos, debitados à doença: Córtice Eucarístico e Pedro quer ser Augusto. Silvio Meira, porém, autor da mais completa biografia de Teixeira de Freitas, nega tenha a depressão atingido a faculdade mental do grande jurisconsulto, pois na verdade a primeira obra era apenas a tradução de poema de Vieira, escrito em latim; e a segunda seria uma crítica ao Imperador, embora exagerada, porque este teria atribuído a Seabra, autor do Código Civil de Portugal, o encargo de elaborar o projeto de Código Civil para o Brasil[40].
Logo após a Independência, a Lei de 20 de outubro de 1823 determinou vigorassem no Império do Brasil as Ordenações Filipinas, as Leis e Decretos de Portugal promulgados até 25 de abril de 1821, enquanto se não publicasse um novo Código. A Constituição de 1824 reconheceu “a necessidade de se organizar, o quanto antes, um Código Civil e um Criminal, fundado nas sólidas bases da Justiça e da Eqüidade”. Em 1830 e 1850 foram promulgados os Códigos Criminal e Comercial, respectivamente.
Para a legislação civil, entretanto, adotou-se o critério de aperfeiçoá-la em duas fases: na primeira, seria feito o levantamento e a consolidação de toda a legislação vigente até ali (“formar um novo corpo, mas de direito já vigente”); na segunda, com o auxílio do que fora feito, tratar-se-ia de elaborar o texto do novo Código Civil (“formar um corpo novo de direito novo”). Essa metodologia para os trabalhos de renovação legislativa foi estudada, em épocas muito próximas, no Chile e no Brasil; no país andino terminou sendo desde logo elaborado o projeto de Código Civil por Andrés Bello (1855), enquanto no Brasil, pelo menos enquanto atuou Teixeira de Freitas e, depois, Nabuco, seguiu-se à risca a metodologia. A bipartição do processo codificador em uma consolidação primeiro e uma codificação propriamente dita não é algo original ao Chile nem ao Brasil, pois se trata de uma operação global de antecedentes europeus. Mas imediatamente salta à vista que a exposição de uma teoria ou doutrina sobre aquela bipartição, isto é, a explícita e consciente manifestação da idéia de dividir o processo de renovação jurídica em duas etapas, uma meramente técnica e outra de fundo, foi nitidamente formulada primeiramente no Chile e depois no Brasil. Com efeito, não encontramos na literatura européia uma exposição similar à de Bello ou Teixeira, em que tão objetivamente se aponte a bipartiçã [41].
Em 15 de fevereiro de 1855 foi celebrado o contrato entre o Governo, representado pelo Ministro da Justiça, José Tomás Nabuco de Araújo, e o Bacharel Augusto Teixeira de Freitas, a quem foi concedido o prazo de cinco anos para coligir e classificar toda a legislação pátria, inclusive a de Portugal, anterior à Independência do Império, compreendendo-se na coleção e classificação as leis abrogadas ou obsoletas, com exceção das portuguesas; a classificação guardará as divisões de Direito Público ou Administrativo e Privado, assim como as subdivisões respectivas, e será feita por ordem cronológica; depois, Teixeira de Freitas consolidará toda a legislação civil pátria, com as mesmas condições da classificação. Consiste a consolidação em mostrar o último estado da legislação.
O próprio enunciado revela a magnitude e a dificuldade da obra a empreender; punha-se frente ao jurisconsulto os imensos e informes materiais que a legislação e a prática do direito ofereciam para que fosse separando, as partes mortas e caducas, pelo comparação de seus textos e interpretações, vitalizando os ramos vitais e ao aplicar na tarefa um espírito de sintética unificação, para fazer surgir um corpo orgânico daquele obscuro conjunto[42].
O material encontrado foi assim descrito pelo nosso autor: Nunca tivemos Código Civil, e se por tal reputássemos o corpo das Ordenações Filipinas, ou antes o 4ª Livro delas, que mais se dedicou aos contratos e sucessões, estaríamos ainda assim envolvidos na imensa teia de leis extravagantes, que se tem acumulado no decurso de mais de dois séculos e meio. Também não existe um só escritor, antigo ou moderno, que puramente se limitasse a coligir e ordenar o Direito Pátrio. Aquelas Ordenações, que são pobríssimas, reclamavam copioso suplemento. Seus colaboradores, ou pela escassez de luzes de que têm sido acusados, ou por fugirem a maior trabalho, reportaram-se muitas vezes ao Direito Romano, e mesmo geralmente o autorizaram, mandando até guardar as glosas de Accursio, e as opiniões de Bartolo e mais doutores. Essa fraqueza, que a Ord. L. 3o T. 64 igualmente estendera ao Direito Canônico; a famosa Lei de 18 de agosto de 1769, que deu largas ao arbítrio com o título de – boa razão; o outro subsídio dos – estilos e costumes; tudo concorreu para que os nossos juristas carregassem suas obras de materiais estranhos, ultrapassando mesmo as raias dos casos omissos. As cousas têm chegado a tal ponto que menos se conhece e estuda nosso direito pelas leis, que o constituem; do que pelos praxistas que as invadiram (Introdução, p. XXXII).
Freitas não chegou a entregar ao Governo o trabalho de classificação, embora estivessem adiantados seus esforços, interrompida a tarefa para dar preferência à consolidação civil, que era a intenção primordial do Governo, pois a classificação era idéia de segunda ordem, como explicou na Introdução (3ª ed., p. XXIX – XXXI).
Em 24 de dezembro de 1858, o Imperador aprovou a Consolidação das Leis Civis. Muito embora não tivesse sido submetido ao Parlamento, sendo discutível estivesse o Imperador autorizado a aprová-lo como texto legal, a verdade é que o diploma de Teixeira de Freitas passou a funcionar como tal, seja porque afinal fora aprovado pelo Governo Imperial, seja pela autoridade do seu organizador, seja pela facilidade que trouxe aos operadores do foro, agora dispensados de recorrer à legislação esparsa.
A Consolidação foi o verdadeiro Código Civil do Brasil durante mais de meio século (1858-1917). Assim a ele se referiu Clovis Bevilaqua: “o nosso primeiro Código Civil[43]. Começou (a Consolidação), em seguida, a desempenhar o papel de Código, disse Rodrigo Octavio[44]. A Consolidação (encomendada por seu pai), que até hoje nos serve de Código Civil, escreveu Joaquim Nabuco[45].
Ao apresentar a Consolidação, o autor inicialmente expôs na “Introdução”, com mais de duzentas páginas, as questões teóricas enfrentadas quanto ao método, seleção e classificação. A Consolidação propriamente dita reúne 1333 artigos, com notas explicativas.
A Introdução é, segundo a opinião unânime de todos aqueles que a estudaram, uma das páginas mais notáveis de Direito escritas na América Latina, capaz, por ela só, de fazer a fama de seu ator, como jurisconsulto, não somente pelo conhecimento da lei, mas como possuindo uma idéia construtiva das necessidades jurídicas da sociedade[46].
O autor começa por estabelecer os limites do Direito Civil, que toma na sua acepção mais estrita, excluindo as disposições processuais, de organização judiciária e o Direito Comercial, cuja autonomia não admitia (p. XXXIX). Observou, com a nitidez que a doutrina da época não percebera, que a distinção entre o Direito Civil e o Direito Penal está na natureza da sanção (p. LXII).
Explica por que deixou de referir a situação dos escravos: Cumpre advertir que não há um só lugar de nosso texto onde se trate de escravos. Temos, é verdade, a escravidão entre nós; mas, se esse mal é uma exceção, que lamentamos; condenado a extinguir-se em época mais ou menos remota; façamos também uma exceção, um capitulo avulso, na reforma de nossas leis civis; não as maculemos com disposições vergonhosas (p. XXXVII).
No estudo que faz do sistema de Direito Civil, evidencia familiaridade com o Direito Romano, com a ciência jurídica do seu tempo, sendo reiterados os elogios a Savigny, “o sábio”, e recolhe o ensino de filósofos, especialmente de Bentham e Leibnitz.
Para a classificação dos direitos, aceita de Leibnitz a idéia central de que não são as pessoas e as coisas que se devem distinguir, mas suas obrigações e seus direitos (p. XLIX), e por isso conclui que “na distinção dos direitos reais, e dos direitos pessoais repousa todo o sistema do Direito Civil (p. LXII). E logo adiante: “Observai atentamente as variadas manifestações desses direitos, estudai a natureza do homem e as suas necessidades; e não achareis outros caracteres mais importantes, d’onde possa resultar uma divisão ampla, dominante de todas as partes, senão os que distinguem os direitos absolutos e os direitos relativos (LXIII). E completa (p. LXVI): Os chamados direitos absolutos – liberdade, segurança e propriedade – entram na compreensão da legislação criminal, que os protege e assegura com a penalidade. Desses direitos, o de propriedade unicamente entra na legislação civil. É no direito de propriedade que havemos de achar os direitos reais.
Essa limitação de matéria civil hoje certamente não seria de acolher, pois os direitos da personalidade integram também o Direito Privado, mas o autor expressava idéia que correspondia ao desenvolvimento da ciência naquele tempo, reservando-os preferentemente para o âmbito das leis administrativas (p. CV). Mesmo assim, na sua genialidade, não deixou de consignar: quando resultar dano à segurança e à liberdade, cuja reparação é necessária, a legislação civil tem providenciado para a satisfação desse dano. Resulta, pois, que os direitos de personalidade entram na legislação civil, tanto quanto se faz preciso que entrem, segundo os princípios” (p. CV). Os princípios, hoje, estão mais estendidos, mas a regra é a mesma.
O direito real tem duas manifestações: uma necessária, e outra possível. Ou nós o exercemos sobre nossas próprias cousas – jus in re propria, – ou sobre coisas de outros – jus in re aliena (p. LXXIII); e nesse caso tem por objeto a propriedade limitada (p. LXXIV). Já os direitos pessoais pertencem em regra ao Direito Civil, e são relativos, em contraposição aos direitos absolutos, porque não recaem sobre todos (LXVIII).
Teixeira de Freitas distinguiu o direito da ação – jus persequendi – e este da sanção do direito (isto é, a conseqüência jurídica pela violação do direito), e disse que a todo direito corresponde uma ação e toda ação supõe um direito violado. Porém, advertiu com clareza: A forma da ação (isto é, ação de direito processual) pode existir sem a ação, e sem o direito. Ter um direito, ter uma ação, não é o mesmo que formar uma ação, porque a ação (processual) muitas vezes se propõe sem direito (material) (p. XCI).
A seguir, o autor explica como esses princípios inicialmente expostos foram aplicados na Consolidação, que tem uma Parte Geral, com dois títulos, “das pessoas e das coisas”, e uma Parte Especial, composta de dois livros, “dos direitos pessoais e dos direitos reais”.
Tem-se confundido a parte geral ou elementar do direito civil com a parte especial. Os direitos existem por causa das pessoas, e onde não há pessoas não pode haver questão de direitos. Deve-se tratar primeiro, e separadamente, dos dois elementos dos direitos, pessoas e coisas, já que a sua existência deve ser suposta para todos os direitos. Esta é a ordem de idéia, e se ela se desconhece, envolvendo-se em parte o direito efetivo com o direito possível, então cumpre logo tratar de todos os direitos, porque todos os direitos são das pessoas (p. CXLVI).
As pessoas são os entes capazes de ter e dever direitos, são singulares ou coletivas (p. CXXI); as coisas são tomadas em sentido físico e natural, e como bens, mas o nosso direito, com o seu misto de direito romano e direito francês, admitiu a inútil, e má, distinção das coisas corpóreas e incorpóreas (p. CXXII), categoria que o autor não manteve. A solução adotada por Teixeira de Freitas, que o induz a excluir as criações e as invenções da realidade ou dominialidade civil, foi criticada por Orlando de Carvalho, que refere manifestações posteriores de Freitas, revisando em parte a posição anterior[47].
Teixeira de Freitas menciona que autores incluem nessa Parte Geral uma terceira categoria, que são os fatos, os fatos jurídicos e os atos jurídicos; ao tempo da Consolidação, Teixeira de Freitas não aceitava essa distinção, o que somente veio a ocorrer mais tarde, quando da elaboração do Esboço (p. XXX e nota 204).
Também estuda a classificação que deve ser dada aos direitos de família, que ele incluiu entre os direitos pessoais. Se a essência das obrigações está em adstringir o ente passivo dos direitos, esses direitos são pessoais; se os direitos nas relações de família são pessoais, é precisamente porque ligam do mesmo modo, porém, com mais intensidade, o ente passivo dos direitos. A diferença entre uns e outros só consiste no grau de intensidade, na maior ou menor eficácia do vínculo (p. CXLVII).
A posse, reconhece ele, faz um papel muito interessante na cena das relações jurídicas e por isso examina as suas diferentes manifestações, que assim classifica: 1º. A posse, como modo de adquirir domínio na ocupação das coisas sem senhor; 2º. A posse como modo de adquirir domínio na tradição das coisas, quando feita pelo proprietário legítimo; 3o. A posse civilis possessio, como um dos elementos da prescrição aquisitiva (usucapio) na tradição feita por quem não é proprietário legítimo (traditio a non domino) – e constituindo a propriedade putativa, que é protegida pela ação publiciana; 4o. A posse, separada do domínio, e protegida pelos interditos ou ações possessórias. Nas três primeiras manifestações, a posse entra indubitavelmente na classe dos direitos reais, pois que pertence à teoria do domínio (p. CLVIII e CLIX). Já quanto à posse dos interditos, a posse isolada, “ainda que injusta, toma o caráter de direito. Essa posse permite o uso de interditos possessórios, que não são mais que ações derivadas de obrigações ex-delicto. Eis o motivo que levou-nos a tratar do esbulho juntamente com o dano, e na Seção 2ª do Livro 1o, que se inscreve – dos direitos pessoais nas relações civis (p. CLXI).
Teixeira de Freitas percebeu a importância do crédito como fator de desenvolvimento e de riqueza da nação: Crédito pessoal, crédito real, são as duas potências paralelas às duas grandes classes de direitos, que constituem toda a riqueza nacional. O primeiro funda-se na confiança pessoal: por isso mesmo que prescinde de uma garantia exterior, funciona ordinariamente com a propriedade móvel, que segue a pessoa, e presta-se à circulação rápida. O segundo, visto que só refere-se a objetos corpóreos, sem lhe impor a qualidade da pessoa, tem por objeto a propriedade imóvel (p. CLXXIII).
Para dar segurança ao crédito real, com a hipoteca do bem, indispensável seria a instituição de um sistema adequado de aquisição e transmissão da propriedade imóvel. Com essa premissa, analisa o modo de transferência da propriedade, distinguindo os dois planos: Há duas relações distintas, que não se devem confundir. A primeira entre o proprietário e o adquirente. A segunda entre o proprietário e terceiros, ou antes entre o ato da transmissão da propriedade e a sociedade inteira. A primeira relação é de direito pessoal, e de interesse privado; a segunda é de direito real, e de interesse público. O direito pessoal não ultrapassa os limites da obrigação, que o constitui; o direito real obriga a todos, e pode ser alegado contra todos… Pela natureza das coisas, …. o direito real deve manifestar-se por outros caracteres, por outros sinais, que não os do direito pessoal; e que esses sinais devem ser tão visíveis, tão públicos, quanto for possível. Não se concebe que a sociedade esteja obrigada a respeitar um direito, que não tem conhecido. Eis a razão filosófica do grande princípio da tradição, que a sabedoria dos romanos tem fixado, as legislações posteriores reconhecido, e que também passou para o nosso direito civil (p. CLXXXII-III). Para a transmissão da propriedade do bem imóvel são necessários os dois elementos: a relação pessoal, com o contrato; a relação real, com a tradição, mas esta só por si é insuficiente porque pressupõe o direito pessoal (p. CLXXXIV).
Discorre sobre o regime germânico de cadastro geral de imóveis e necessidade de transcrição do título – que elogia por proporcionar as mais sólidas garantias, – mas pondera as dificuldades que decorreriam de sua implantação no Brasil, país de tão grande extensão territorial, com domínio incerto e apenas presumido na maior parte dos casos (p. CCIV e CCX), temores que, depois se viu, eram injustificados.
É essa Consolidação, elaborada por um homem de gênio que a ela dedicou o melhor de seus esforços, e a aperfeiçoou enquanto teve forças, com seguidas reimpressões e aditamentos; é esse texto inovador – na medida em que pode sê-lo uma consolidação, – que pela primeira vez contemplou sistemática alemã, adotada nas obras dos pandectistas, da divisão do Código Civil em Parte Geral e em Parte Especial[48]; que foi estudado e elogiado por Raoul de La Grasserie[49]; é esse texto que se cuida agora de reimprimir, nessa elogiável iniciativa conjunta do Senado Federal e do Superior Tribunal de Justiça foi escolhida a 3ª edição, de 1876, a última revista pelo autor.
Sua importância atual reside no fato de que a Consolidação das Leis Civis, ao resgatar e ordenar a nossa herança jurídica, também desenhou a fisionomia da legislação civil que lhe seguiu, tanto no Código Civil de 1917 como no recente Código Civil de 2002.
14. Atualidades
Há mais de um século da morte de nosso homenageado, ou seja, 125 (cento e vinte e cinco) anos, é que podemos evidenciar o valor da grandeza científica, jurídica semeada por Augusto Teixeira de Freitas, donde ergue-se preitos de homenagens e gratidão, jamais através de obras tão profundas que aqui em nosso mundo terreno nos presenteou. E para tanto, passaremos a transcorrer algumas seleções.
“Nascido no dia 19/08/1816, em Cachoeira, Bahia, notável advogado e jurisconsulto do Império, dedicou-se como verdadeiro apóstolo e com acendrado amor à causa do Brasil, à elaboração da consolidação das leis civis e do esboço do Código Civil, obras que, traduzindo o fulgor de sua genialidade, repercutiram na Codificação Civil da Argentina, Paraguai, Uruguai, Alemanha, Itália, Suíça, Rússia e outras nações.
Em 1880, Niterói mereceu a glória de ter sido escolhida para o seu último domicílio, onde veio a falecer em 12/12/1883.
A Associação Teixeira de Freitas, constituída em 19/08/1996 pelos alunos do curso de Pós-Graduação em Direito Privado e que hoje congrega os ex-alunos desta augusta casa, evoca, através de seu presidente José Luis Nogueira e de seu diretor Prof. Nestor Porto de Oliveira Neto, a memória imperecível de seu Excelso Patrono, em consonância com os noventa e um anos desta Faculdade de Direito, que adotou em seus primórdios o patronímico do inolvidável jurisconsulto.
Como marco histórico, este bronze traz à recordação às várias gerações de alunos que por aqui passaram levando para a arena jurídica sólido acervo cultural.
Ergue-se um preito de gratidão à família Teixeira de Freitas na pessoa da inesquecível Sra. Cyrene Caldeira Teixeira de Freitas, pela valiosa e decidida participação, permitindo perenizar, neste pedestal, momento de significativo valor histórico.”
Niterói, 19 de Agosto de 2003
Busto localizado no Hall do Prédio Principal da Faculdade de Direito da UFF em Homenagem ao Jurisconsulto Augusto Teixeira de Freitas
19 de agosto Prosigue con éxito la campaña por la consagración de este día. Se han recibido ya numerosas e importantísimas adhesiones, principalmente de juristas del Brasil y de la Argentina. Se prevé la próxima presentación de proyectos legislativos en ambos países, oficializando esta fecha. | |
No dia 19 de agosto de 1816, na baiana Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira, nasceu Augusto Teixeira de Freitas. A biografia deste homem extraordinário foi encarada parcialmente por vários preclaros historiadores e juristas, mas sem dúvida a opera magna em tal sentido é até hoje o livro do grande humanista paraense Sílvio Meira, Teixeira de Freitas, o jurisconsulto do Império (Brasília, Cegraf, 1983, 2ª ed). Formado em Olinda, Freitas chegaria a ser, andando o tempo, o principal intelectual jurídico do reinado de Dom Pedro II. Autor da notória Consolidação das Leis Civis (1855-1858) seria, porém, seu projeto de Código Civil, elaborado na década seguinte, e conhecido como Esboço, sua maior contribuição à ciência do Direito. Embora com limitada influência na legislação brasileira posterior, o Esboço resultaria fundamental como fonte para o brilhante jurista argentino Dalmacio Vélez Sarsfield, na hora de redigir o Código Civil de sua pátria. E da Argentina o influxo de Freitas passaria ao Paraguai, ao adotar esse país o Código de Vélez Sarsfield. Mais indiretamente, pode-se achar a pegada da obra de Freitas na legislação civil uruguaia, assim como de todos os outros Estados latino-americanos sobre que incidira o Código argentino. Finalmente, aspectos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (San José de Costa Rica, 1969) lhe são tributários. Foram características de seu pensamento, entre outras, a defesa extrema da pessoa humana, desde a conceição (que ele considerava o inegável começo da existência jurídica), uma permanente oposição à escravidão (ele não duvidava que todo ente humano fosse pessoa, pelo só fato de pertencer a nossa espécie), o cultivo do Direito Romano (tendo sido grande leitor e crítico de Savigny, ao que analisou com uma agudeza não atingida pelos discípulos diretos daquele na Alemanha), e uma visão além de seu tempo (por exemplo, ao cogitar a idéia de um Código Geral para as bases do Direito Privado, rechaçada por seus contemporâneos, mas difundida com sucesso na centúria seguinte). Freitas foi um homem brilhante, honesto e comprometido com suas idéias. Tal vez por isso morreu na tristeza, pobre e quase esquecido, em sua singela chácara de Niterói, em 1883. Por sua obra, por sua pessoalidade e idéias, e pelo que sua influência tem significado para a comunidade do Direito latino-americano, é que um grupo aberto de juristas argentinos e brasileiros, nucleados ao redor da Universidad del Museo Social Argentino, temos decidido propor SE DECLARE O 19 DE AGOSTO, DIA DE SEU NASCIMENTO, O DIA DA INTEGRAÇÃO JURÍDICA LATINO-AMERICANA. Ricardo D. Rabinovich-Berkman |
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Integración Jurídica |
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“Vamos plantar esta linda semente por uma integração latino-americana salutar, para que gere bons frutos. Assim, é que sempre devemos trilhar nos princípios históricos, refazendo-os, preservando-os, homenageando a quem de Direito, “in casu”, el PaPa em Direito Civil Teixeira de Freitas. Só assim tentaremos buscar juristas primaveris, por certo conscientizados.” [50] Tânia Mota
“A integração jurídica latino-americana é sem dúvida um caminho já traçado e sem volta e, a idéia de sua comemoração em uma data comum e uma importane providência para a consolidação deste ideal. Justa é a homenagem ao Jurista Teixeira de Freitas na escolha do dia 19/8, o que somente refletir seus ideais que transcedem ao longo dos séculos, emprestand, a carga humanista que seu nome possui. Pela integração latino-americana. Pela justa homenagem a Teixeira de Freitas.” [51] Ely Chaves
“Adhiero a la conmemoración de 19/8 como de integración jurídica latinoamericana en homenaje a Teixeira de Freitas.” [52] Ricardo Köhler
“Sin lugar a dudas el fortalecimiento de nuestros valores sobre la persna humana y su igualdad y su respeto, se lo debemos a hombres como Freitas por eso me adhiero a la integración de nuestros pueblos en el derecho, para que podamos hacer cumplir en forma creciente estos principios sumamente importantes pero fuertemente rebajados.” [53] Jorge Luis Brego
“Teixeira de Freitas afirmou que a liberdade é um bem inestimável, porque mais vale com os seus perigos, que o serviço do imobilismo. Então, mobilizemo-nos na construção da integração.” [54] Jorge Tardim Prof. Da Universidade Cândido Mendes Rio de Janeiro – RJ
Ressaltamos que neste ensaio não poderíamos jamais cometer a indelicadeza de não mensurar com toda grandiosidade o nome do verdadeiro representante cultural de Texeira de Freitas, em nossa atualidade desde América latina a Europa, haja visto seus trabalhos para todos ramos da ciência, desde a Filosofia até a moderna Bioética, todos, trabalhos estes com fincas em memória a Teixeira de Freitas,poderíamos trancorrer inúmeros trabalhos científicos, palestras, pareceres etc….,quem sabe um dia seremos agraciados por uma monografia deste nosso mestre responsável por este encontro da historia do direito. Dr. Ricardo D. Rabinovich-Berkman.
15. Associação Teixeira de Freitas
O 7° aniversário da Associação Teixeira de Freitas por Uyára Schiefer
No último dia 18 de agosto, a Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense viveu um de seus dias de glória face às solenidades comemorativas do 7º aniversário da Associação Teixeira de Freitas, com a presença de inúmeras autoridades, universitárias, judiciárias consulares, políticas e classistas, além de expressiva participação de familiares de Teixeira de Freitas (aproximadamente 110 membros). No Salão Nobre discursaram, o Presidente da Associação, Dr. José Luiz Nogueira; o Jurista e Professor Dr. Jorge Loretti e o Magnífico Reitor da UFF, Prof. Cícero Mauro Fialho Rodrigues.
No Saguão de entrada da Faculdade foi inaugurado o Busto do “Maior Jurista das Américas” que, nos primórdios da referida Faculdade (1912), fora o seu patronímico.
Na oportunidade, lembrou o Presidente da Associação as palavras do biógrafo Silvio Meira: “o tempo é um julgador implacável”… “destrói glórias indevidas”… “arranca a coroa de louros, colocada em cabeças que não merecem”… “chama à realidade os equívocos da história”… “retira do sepulcro e das sombras os valores esquecidos ou marginalizados pela mediocridade de todas as épocas”… “o tempo, o grande juiz, começou a fazer justiça a Augusto Teixeira de Freitas”.
Em nome da família do homenageado, falou o Dr. Fernando Caldeira Teixeira de Freitas, enquanto o seu irmão, Dr. José Maria Caldeira Teixeira de Freitas, executou em seu saxofone um belíssimo número musical, de sua autoria. Coube a mais jovem da família, Ana Paula, a colocação de uma corbeille junto ao pedestal.
O Frei Luís Colossi encarregou-se de benzer a Bandeira do Instituto Ítalo Brasileiro e o Busto.
Foram agraciados com a medalha de Honra Teixeira de Freitas as seguintes personalidades: Prof. Cícero Mauro Fialho Rodrigues, Prof. Márcio Brandão Ribeiro, Prof. e Desembargador Luiz Roldão de Freitas Gomes, Dr. Jorge Loretti, Desembargador e prof. Sérgio Cavallieri Filho, Dr. Michel Saad, Dr. Renato Peixoto Garcia Justo, Dr. Orlando Diniz, Dr. José Augusto Guimarães, Dr. Índio do Brasil Cardoso e, em homenagem póstuma, a Sra. Cyrene Caldeira Teixeira de Freitas, cuja medalha foi recebida pelo seu neto, Dr. Luís Augusto Teixeira de Freitas, vindo de Portugal. Em nome dos agraciados discursou o Prof. Márcio Brandão, Diretor da Faculdade.
Abrilhantaram as solenidades o Coral Sinfônico da UFF, regido pelo Maestro Octacílio Lima e a Banda da Polícia Militar do Estado do Rio, sob a regência do Sargento Feitosa.
Durante o evento, por parte do Instituto Ítalo-Brasileiro, foi lançado o 6º número da “Revista Doutrinária”, com distribuição e circulação em 25 paises.
Por sua vez, a Editora Forense trouxe a lume o segundo volume de “Instituições de Direito Civil”, de Caio Mário da Silva Pereira, tendo como atualizador o Prof. Luiz Roldão de Freitas Gomes e como colaboradores a Dra. Júlia Sá Carvalho da Silva e o Dr. José Luiz Nogueira.
16. Monumento ao jurisconsulto Teixeira de Freitas
A estátua de Teixeira de Freitas foi inaugurada, no antigo Largo de São Domingos, no dia 7 de agosto de 1905 e, a 20 de março de 1910, foi trasladada para o local onde se encontra no Silogeu na entrada da Praça Paris. A estátua, considerada um dos melhores trabalhos de Rodolfo Bernardelli, sobre um pedestal de granito, e quatro lances com três metros de altura, em pé em bronze, com as mãos cruzadas e tendo um livro debaixo do braço. O bronze mede 2 metros e 30 centímetros.
Nascido no dia 19/08/1816, em Cachoeira, Bahia, notável advogado e jurisconsulto do Império, dedicou-se como verdadeiro apóstolo e com acendrado amor à causa do Brasil, à elaboração da consolidação das leis civis e do esboço do Código Civil, obras que traduzindo o fulgor de sua genialidade, repercutiram na Codificação Civil da Argentina, Paraguai, Uruguai, Alemanha, Itália, Suíça, Rússia e outras nações. O grande jurisconsulto brasileiro Augusto Teixeira de Freitas, desde 1855, por dois anos, executou a tarefa de organizar a caótica legislação cível brasileira; os resultados de seus esforços foi a Consolidação das Leis Civis, primeiro passo no rumo da elaboração do futuro Código Civil. Mais tarde, entre 1858 e 1864, Teixeira de Freitas preparou o “Esboço”, em dois fascículos, com 4.908 artigos. Desgostoso com críticas feitas a seu trabalho, Teixeira de Freitas desistiu de sua continuação. O “Esboço” inspirou o jurista Dalmácio Vélez Sársfield, autor do Código Civil argentino. Em setembro de 1913, os estudantes da Universidade de Buenos Aires, em viagem de estudos no Brasil, colocaram no granito uma placa de bronze com a figura da mulher simbolizando a justiça, com a mão estendida sobre a tabuada lei. Nela, lê-se a inscrição:
“Al gran maestro del derecho Teixeira de Freitas, los estudiantes de la Comission Universitária, em viaje de estúdio, de la Faculdad de Ciências Econômicas de Buenos Aires – Setembro 1913”
Em 1880, Niterói mereceu a glória de ter sido escolhida para o seu último domicílio, aonde veio a falecer em 12/12/1883.
Quadro de Augusto Teixeira de Freitas
Autor: Sólon Botelho, s.d.
Técnica: Óleo sobe tela
Dimensões: 1,19m x 1,46m
Biblioteca Mayor Universidad Nacional de Córdoba
Nesta biblioteca encontram-se documentos de Teixeira de Freitas:
Teixeira de Freitas Augusto, 1817-1883.
Cartas originales del codificador brasileño doctor Augusto Teixeira de Freitas, al codificador argentino doctor Dalmacio Vélez Sarsfield.
1865-68, 7 páginas. Manuscrito.
PROJETO DE LEI DO SENADO Nº , DE 2007[55]
Institui o Dia da Integração Jurídica Latino-Americana.
O CONGRESSO NACIONAL decreta:
Art. 1º Fica instituído o Dia da Integração Jurídica Latino-Americana, a ser comemorado anualmente no dia 19 de agosto.
Art. 2º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
JUSTIFICAÇÃO
Esta proposição visa a homenagear e preservar a memória do grande jurista e advogado Augusto Teixeira de Freitas. Baiano de Cachoeira, cidade distante a 61 quilômetros de Salvador, Teixeira de Freitas nasceu em 19 de agosto de 1816. Iniciou seus estudos jurídicos em Olinda e, depois, em São Paulo, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Ser err*tico, acabou por concluir a graduação em Olinda, onde se diplomou em 1837. Naquela época, Teixeira de Freitas tinha apenas 21 anos.
O célebre jurista baiano teve como obras a Consolidação das Leis Civis e o famoso Esboço de Código Civil (o conhecido Esboço de Freitas), que influenciaram o direito civil mundial, não só pela técnica utilizada, como também pela fecunda produção doutrinária nelas expressadas.
Em 15 de fevereiro de 1855, Teixeira de Freitas pactuou com o governo imperial, por meio do Ministro da Justiça, José Nabuco de Araújo, a elaboração da Consolidação das Leis Civis. Firmado o contrato, debruçou-se Teixeira de Freitas * ingente tarefa, somente encerrada em 4 de dezembro de 1858.
Contendo 1.333 artigos, a Consolidação das Leis Civis, que sistematizou em texto *nico as leis civis portuguesas e brasileiras que valiam no Brasil Imperial, converteu-se, segundo Spencer Vampr*, no padrão mais alevantado da história da nossa codificação, no mais belo edifício do nosso direito. Em torno dessa obra, evoluíram todas as idéias diretoras do pensamento jurídico nacional.
Submetida a Consolidação * comissão formada por Caetano Alberto Soares, Paulinho Soares de Sousa e Nabuco de Araújo, houve ampla aprova**o, sendo salientada no relatório, a profundidade do saber de Teixeira de Freitas, a erudi**o e didatismo que circunscrevia a Consolidação das Leis Civis. Até o imperador Dom Pedro II, que aprovou a Consolidação, concedeu posteriormente a Teixeira de Freitas o galard*o da comenda da Rosa.
Com o sucesso da Consolidação das Leis Civis, animou-se Nabuco de Araújo a não dar ao Brasil uma simples Consolidação, mas presente*-lo com um verdadeiro Código Civil. Novamente Teixeira de Freitas foi convidado para a herc*lea tarefa. Novo contrato foi pactuado entre o governo imperial e Teixeira de Freitas.
Ao projeto, Teixeira de Freitas deu o nome de Esboço de Código Civil. O autor, contudo, acreditava que seu excepcional trabalho não era digno de tanto e publicou suas conclusões com o título de Esboço.
Pronto o Esboço de Freitas, a Comissão Revisora composta por Paulino José Soares de Sousa, Nabuco, Ribas, Brás Henriques, Marcelino de Brito, *reas, Alberto Soares e Figueira de Mello, teve início incansável debate. Como era comum naquela época (meados do século XIX), a polêmica era acerba, resvalando pelo campo pessoal. A incontinência verbal e o duelar com as palavras eram de tal forma intensa, que já não mais era atacado o trabalho, mas o seu autor. A cada crítica, Teixeira de Freitas, que não media esforços em defender suas opiniões até às últimas conseqüências, tinha de elaborar trabalho escrito, defendendo o ponto de vista do Esboço. Esse trabalho fatigou seu corpo e oberou o espírito.
Inconcluso, o Esboço de Freitas continha 4.908 artigos. Em quatro meses de trabalho, tendo o próprio Teixeira de Freitas como integrante, a Comissão analisou apenas os quinze primeiros artigos. Os debates eram tão est*reis que Teixeira de Freitas queixou-se a Nabuco de Araújo, dizendo que, a prosseguir naquela marcha, nem em cem anos o trabalho seria concluído, e sequer o Esboço seria convertido em Código Civil.
Demonstrando nobreza de caráter, renunciou à tarefa no dia 20 de novembro de 1866, em carta dirigida ao Ministro da Justiça, Nabuco de Araújo. Propôs a devolução da quantia que havia recebido para a realização de tão ingente e frustrado esforço.
Embora os legisladores brasileiros da época não tenham convertido o Esboço de Freitas em projeto de lei, até mesmo porque este fora apresentado em fascículos e, por isso, encontrava-se disperso na época, a obra doutrinária chegou *s m*os do grande jurista argentino, V*lez S*rsfield, que trabalhava, desde 1864, no projeto de redação do Código Civil Argentino e estava em d*vida quanto ao método que utilizaria na sua elaboração.
Malogrado o Esboço enquanto projeto de Código Civil, a Argentina não perdeu tempo. Em 1869, o país vizinho recebeu seu Código Civil, elaborado pelo jurista V*lez S*rsfield que não negou que a sua codificação foi decalcada do Esboço de Teixeira de Freitas. Na verdade, a obra de Teixeira de Freitas era tão completa que o jurista argentino V*lez S*rsfield praticamente traduziu o Esboço de Freitas para o espanhol e apresentou essa tradução como Projeto de Código Civil Argentino, o qual foi aprovado e vigora na Argentina até hoje.
Como se houvesse uma solidariedade sul-americana, e a partir do C*digo Civil Argentino, o Esboço de Freitas foi seguido por outras nações Latino-Americanas como o Paraguai e, em parte, o Uruguai. Essa posi**o adotada pelo codificador Argentino foi, contudo, alvo de duras cr*ticas baseadas nas concep**es de Montesquieu, que afirmava que as condi**es f*sicas em que vivem um povo influenciam sobremaneira a forma**o do seu direito de modo que seria raro que o direito de uma na**o servisse a outra.
Ainda no que se refere * Am*rica Latina, o Esbo*o de Freitas se fez sentir no C*digo Civil do Paraguai, pois este era muito parecido com o Argentino, e um pouco no C*digo Civil Uruguaio, que j* tinha recebido influ*ncia do C*digo Civil Chileno, elaborado por Andr*s Bello que, por sua vez, fora influenciado pelo C*digo Civil Franc*s. Vale lembrar que o C*digo Civil Chileno fora muito criticado * *poca porque n*o possu*a uma palavra destinada aos analfabetos, como se o Chile, de 1855, n*o abrigasse imensa massa populacional iletrada.
Teixeira de Freitas almejava em seu Esbo*o de C*digo Civil, em fasc*culo de 1863, a incorpora**o do direito comercial no direito civil, o que se antecipou ao jurista italiano C*sar Vivante, que propusera a unifica**o do direito privado em 1892, sendo adiante concretizada na aprova**o do C*digo Civil Italiano de 1942, que revogou o C*digo de Com*rcio de 1882 e o C*digo Civil de 1865.
Justificando seu ponto de vista, Teixeira de Freitas dizia que n*o havia espa*o para a arbitr*ria separa**o das leis de direito civil e comercial, j* que todos os atos da vida jur*dica, como exce**o dos ben*ficos, podem ser comerciais ou n*o, ou seja, ter fim lucrativo ou n*o. No campo legislativo, a tese da unifica**o foi definitivamente consagrada no C*digo Su**o das Obriga**es, no C*digo Polon*s das Obriga**es, no C*digo Civil Italiano, no Projeto Franco-Italiano de C*digo das Obriga**es, assim como no Anteprojeto do C*digo das Obriga**es, elaborado entre n*s por Hanneman Guimar*es, Orozimbo Nonato e Filadelfo de Azevedo. Este, mais tarde, foi consagrado como o C*digo Civil Brasileiro de 2002, que adotou o pensamento de Teixeira de Freitas.
Al*m da influ*ncia na t*cnica utilizada para separa**o das disciplinas e a sua sistematiza**o, o Esbo*o de Freitas se faz presente tamb*m na doutrina por ele utilizada que se mostrou presente na divis*o do C*digo Civil duas partes: a Parte Geral e a Parte Especial.
Podemos dizer que as duas grandes fam*lias que influenciaram o processo de codifica**o realizado por Teixeira de Freitas foram a francesa, com o C*digo de Napole*o de 1804, e a Alem* de 1896. Como j* havia afirmado Ren* David, Freitas antecedera de ¿gquarenta anos o C*digo Civil Alem*o¿h, com sua t*cnica e da divis*o do C*digo Civil em uma parte geral e outra especial. Isso mostra o vanguardismo de Teixeira de Freitas n*o s* em rela**o ao C*digo Civil Alem*o, mas tamb*m ao direito mundial.
A classifica**o dos direitos em reais e pessoais, Teixeira de Freitas a depurou na Consolida**o das Leis Civis, tanto que mencionou na Introdu**o que o ponto mais sens*vel da cena judici*ria daquela *poca era essa divis*o. Tal fato n*o passou despercebido por Enrique Martinez Paz, para quem, a mais simples inspe**o mostra a profunda analogia existente entre o plano da distribui**o das mat*rias do Esbo*o e o adotado no C*digo Civil Argentino. A divis*o dos direitos em pessoais e reais tem para ambos o valor de um pensamento fundamental que preside o desenvolvimento total do sistema.
Se o C*digo Civil da Argentina *, quase em sua totalidade, o Esbo*o de Freitas, no Brasil, n*o chegou sequer ao Poder Legislativo. Infelizmente nosso pa*s ainda n*o * dado a cultivar a mem*ria dos seus filhos ilustres. Na Argentina, valoriza-se sobremaneira V*lez Sarsfield: um clube de futebol leva o seu nome, al*m de haver um bairro em Buenos Aires em sua homenagem, gestos que tornar*o imperec*veis * mem*ria daquele jurisconsulto. No Brasil, terra repleta de iconoclastas, Teixeira de Freitas jamais ter* o seu nome visto em todos os quadrantes, muito menos dando nome a associa**es expressivas da *ndole do brasileiro, tais como a de uma escola de samba ou de uma entidade futebol*stica. Talvez Teixeira de Freitas seja lembrado como o aluno med*ocre que foi quando estudou Direito na Academia do Largo do S*o Francisco ou, quem sabe, pela loucura que o acometeu no fim da vida. Sim. Teixeira de Freitas enlouqueceu, qui** pelo excesso de trabalho ou pela frustra**o de n*o ter conclu*do seu intento, que era o de ver seu Esbo*o regendo o direito privado brasileiro.
Lembra o jurista Washington de Barros Monteiro que, no in*cio, a loucura se instalou em Teixeira de Freitas, em forma de mania religiosa. Aos poucos, a doen*a se generalizou e dominou, por completo, as suas faculdades mentais. Como os grande pensadores contempor*neos Nietzsche, Maupassant, Donizetti e Nijinsky, Teixeira de Freitas morreu demente, em Niter*i, no dia 12 de dezembro de 1883.
* exatamente para preservar a mem*ria de Augusto Teixeira de Freitas que cremos poder contar com amplo apoio dos ilustres Pares para a aprova**o deste projeto de lei, com o que estaremos homenageando, no Pa*s, a mem*ria deste ilustre jurista.
Sala das Sess*es,
Senador VALDIR RAUPP
MAIS UMA INICIATIVA SURGIDA DAS AULAS DO DOUTORADO: O ‘DIA DA INTEGRAÇÃO JURÍDICA LATINO-AMERICANA’
Como muitos de vocês já sabem, neste agosto surgiu de nossas aulas a idéia de propor a declaração do ‘Dia da Integração Jurídica Latino-Americana’, escolhendo-se para tal data aquela do nascimento do maiúsculo jurisconsulto brasileiro Augusto Teixeira de Freitas, acontecido em 19 desse mês, no ano de 1816.
Foi assim como, com a preciosa ajuda de Marcelo Meirelles (Doutorando UMSA), não tardamos em criar o site http://www.jus-latino-americana.com.br , no qual pronto foram-se somando as adesões, incluso provenientes de pessoas alheias a nossa Universidade (embora, é verdade, essas predominassem). Hoje, são já muitas as assinaturas, e de grande valia, que se tem congregado em apoio da proposta. Porém, quem ainda não tinha escrito, está em tempo de fazê-lo. É coisa bem singela, e de muito proveito para o andamento da idéia!
Mas hoje a notícia chega de parte de outro amigo Doutorando UMSA, Alexandre Miguel. Ele conseguiu que um Senador Federal do Estado dele, apresentasse o Projeto de Lei do Senado N° 673, DE 2007. Eis o texto:
O Congresso Nacional decreta:
Art. 1° Fica instituído o Dia da Integração Jurídica Latino-Americana, a ser comemorado anualmente no dia 19 de agosto.
Art. 2° Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Transcrevo íntegra a Justificação: “Esta proposição visa a homenagear e preservar a memória do grande jurista e advogado Augusto Teixeira de Freitas. Baiano de Cachoeira, cidade distante a 61 quilômetros de Salvador, Teixeira de Freitas nasceu em 19 de agosto de 1816. Iniciou seus estudos jurídicos em Olinda e, depois, em São Paulo, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco. Ser errático, acabou por concluir a graduação em Olinda, onde se diplomou em 1837. Naquela época, Teixeira de Freitas tinha apenas 21 anos.
O célebre jurista baiano teve como obras a Consolidação das Leis Civis e o famoso Esboço de Código Civil (o conhecido Esboço de Freitas), que influenciaram o direito civil mundial, não só pela técnica utilizada, como também pela fecunda produção doutrinária nelas expressadas.
Em 15 de fevereiro de 1855, Teixeira de Freitas pactuou com o governo imperial, por meio do Ministro da Justiça, José Nabuco de Araújo, a elaboração da Consolidação das Leis Civis. Firmado o contrato, debruçou-se Teixeira de Freitas à ingente tarefa, somente encenada em 4 de dezembro de 1858.
Contendo 1.333 artigos, a Consolidação das Leis Civis, que sistematizou em texto único as leis civis portuguesas e brasileiras que valiam no Brasil Imperial, converteu-se, segundo Spencer Vampré, no padrão mais alevantado da história da nossa codificação, no mais belo edifício do nosso direito. Em torno dessa obra, evoluíram todas as idéias diretoras do pensamento jurídico nacional.
Submetida a Consolidação à comissão formada por Caetano Alberto Soares, Paulinho Soares de Sousa e Nabuco de Araújo, houve ampla aprovação, sendo salientada no relatório, a profundidade do saber de Teixeira de Freitas, a erudição e didatismo que circunscrevia a Consolidação das Leis Civis. Até o imperador Dom Pedro II, que aprovou a Consolidação, concedeu posteriormente a Teixeira de Freitas o galardão da comenda da Rosa.
Com o sucesso da Consolidação das Leis Civis, animou-se Nabuco de Araújo a não dar ao Brasil uma simples Consolidação, mas presenteá-lo com um verdadeiro Código Civil. Novamente Teixeira de Freitas foi convidado para a hercúlea tarefa. Novo contrato foi pactuado entre o governo imperial e Teixeira de Freitas.
Ao projeto, Teixeira de Freitas deu o nome de Esboço de Código Civil. O autor, contudo, acreditava que seu excepcional trabalho não era digno de tanto e publicou suas conclusões com o título de Esboço.
Pronto o Esboço de Freitas, a Comissão Revisora composta por Paulino José Soares de Sousa, Nabuco, Ribas, Brás Henriques, Marcelino de Brito, Áreas, Alberto Soares e Figueira de Mello, teve início incansável debate. Como era comum naquela época (meados do século XIX), a polêmica era acerba, resvalando pelo campo pessoal. A incontinência verbal e o duelar com as palavras eram de tal forma intensa, que já não mais era atacado o trabalho, mas o seu autor. A cada crítica, Teixeira de Freitas, que não media esforços em defender suas opiniões até às últimas conseqüências, tinha de elaborar trabalho escrito, defendendo o ponto de vista do Esboço. Esse trabalho fatigou seu corpo e oberou o espírito.
Inconcluso, o Esboço de Freitas continha 4.908 artigos. Em quatro meses de trabalho, tendo o próprio Teixeira de Freitas como integrante, a Comissão analisou apenas os quinze primeiros artigos. Os debates eram tão estéreis que Teixeira de Freitas queixou-se a Nabuco de Araújo, dizendo que, a prosseguir naquela marcha, nem em cem anos o trabalho seria concluído, e sequer o Esboço seria convertido em Código Civil.
Demonstrando nobreza de caráter, renunciou à tarefa no dia 20 de novembro de 1866, em carta dirigida ao Ministro da Justiça, Nabuco de Araújo. Propôs a devolução da quantia que havia recebido para a realização de tão ingente e frustrado esforço.
Embora os legisladores brasileiros da época não tenham convertido o “Esboço de Freitas” em projeto de lei, até mesmo porque este fora apresentado em fascículos e, por isso, encontrava-se disperso na época, a obra doutrinária chegou às mãos do grande jurista argentino, Vélez Sársfield, que trabalhava, desde 1864, no projeto de redação do Código Civil Argentino e estava em dúvida quanto ao método que utilizaria na sua elaboração.
Malogrado o Esboço enquanto projeto de Código Civil, a Argentina não perdeu tempo. Em 1869, o país vizinho recebeu seu Código Civil, elaborado pelo jurista Vélez Sársfield que não negou que a sua codificação foi decalcada do Esboço de Teixeira de Freitas. Na verdade, a obra de Teixeira de Freitas era tão completa que o jurista argentino Vélez Sarsfield praticamente traduziu o Esboço de Freitas para o espanhol e apresentou essa tradução como Projeto de Código Civil Argentino, o qual foi aprovado e vigora na Argentina até hoje [isso é certamente exagerado, embora Freitas seja a fonte principal do Código argentino, e sobre tudo tinha influído em matéria metodológica, poucos são os artigos que evidenciam a referida “tradução”, em nenhum caso verificada integralmente: predomina, em geral, a inspiração crítica (nota de RR-B)].
Como se houvesse uma solidariedade sul-americana, e a partir do Código Civil Argentino, o Esboço de Freitas foi seguido por outras nações Latino-Americanas como o Paraguai e, em parte, o Uruguai [Paraguai adotou íntegro o Código argentino (nota de RR-B)]. Essa posição adotada pelo codificador Argentino foi, contudo, alvo de duras críticas baseadas nas concepções de Montesquieu, que afirmava que as condições físicas em que vivem um povo influenciam sobremaneira a formação do seu direito de modo que seria raro que o direito de uma nação servisse a outra. [Em realidade, as críticas –fundamentalmente emanadas de Juan Bautista Alberdi, inimigo político de Vélez– apontaram mais aos aduzidos interesses imperialistas brasileiros (lembre-se o clima emergente da Guerra do Paraguai), e à escassa ou nula notoriedade internacional do ainda jovem jurista baiano, assim como ao pouco predicamento de que gozava no mundo então o direito do Brasil (nota de RR-B)].
Ainda no que se refere à América Latina, o Esboço de Freitas se fez sentir no Código Civil do Paraguai, pois este era muito parecido com o Argentino, e um pouco no Código Civil Uruguaio, que já tinha recebido influência do Código Civil Chileno, elaborado por Andrés Bello que, por sua vez, fora influenciado pelo Código Civil Francês. Vale lembrar que o Código Civil Chileno fora muito criticado à época porque não possuía uma palavra destinada aos analfabetos, como se o Chile, de 1855, não abrigasse imensa massa populacional iletrada. [O Código chileno é uma verdadeira obra de arte, que embora mostrasse influencia do francês (e Freitas também), é muito diferente, e constitui uma das melhores codificações do século XIX. Ele foi adotado com poucas modificações por Equador, e inspirou outros Códigos latino-americanos, entre eles, o argentino (nota de RR-B)].
Teixeira de Freitas almejava em seu Esboço de Código Civil, em fascículo de 1863, a incorporação do direito comercial no direito civil, o que se antecipou ao jurista italiano César Vivante, que propusera a unificação do direito privado em 1892, sendo adiante concretizada na aprovação do Código Civil Italiano de 1942, que revogou o Código de Comércio de 1882 e o Código Civil de 1865. [Tais idéias não aparecem no Esboço, senão em correspondências e trabalhos posteriores de Freitas, e vão a ser, justamente, a imediata razão do fracasso do projeto de Código Civil, assim ferido de morte pelo próprio autor (nota de RR-B)].
Justificando seu ponto de vista, Teixeira de Freitas dizia que não havia espaço para a arbitrária separação das leis de direito civil e comercial, já que todos os atos da vida jurídica, como exceção dos benéficos, podem ser comerciais ou não, ou seja, ter fim lucrativo ou não. No campo legislativo, a tese da unificação foi definitivamente consagrada no Código Suíço das Obrigações, no Código Polonês das Obrigações, no Código Civil Italiano, no Projeto Franco-Italiano de Código das Obrigações, assim como no Anteprojeto
do Código das Obrigações, elaborado entre nós por Hanneman Guimarães, Orozímbo Nonato e Filadelfo de Azevedo. Este, mais tarde, foi consagrado como o Código Civil Brasileiro de 2002, que adotou o pensamento de Teixeira de Freitas.
Além da influência na técnica utilizada para separação das disciplinas e a sua sistematização, o Esboço de Freitas se faz presente também na doutrina por ele utilizada que se mostrou presente na divisão do Código Civil em duas partes: a Parte Geral e a Parte Especial.
Podemos dizer que as duas grandes famílias que influenciaram o processo de codificação realizado por Teixeira de Freitas foram a francesa, com o Código de Napoleão de 1804, e a Alemã de 1896 [como pode observar-se pelas datas, trata-se da obra de von Savigny, que Freitas tinha lido, e não da escola posterior, que chega ao Código (BGB) de 1896 (nota de RR-B)]. Como já havia afirmado René David, Freitas antecedera de “quarenta anos o Código Civil Alemão”, com sua técnica e da divisão do Código Civil em uma parte geral e outra especial. Isso mostra o vanguardismo de Teixeira de Freitas não só em relação ao Código Civil Alemão, mas também ao direito mundial. [Certamente, tal idéia é savigniana, e não de Freitas, que porém tem o mérito de ter-la adotado (nota de RR-B)].
A classificação dos direitos em reais e pessoais, Teixeira de Freitas a depurou na Consolidação das Leis Civis, tanto que mencionou na introdução que o ponto mais sensível da cena judiciária daquela época era essa divisão. Tal fato não passou despercebido por Enrique Martinez Paz, para quem, a mais simples inspeção mostra a profunda analogia existente entre o plano da distribuição das matérias do esboço e o adotado no Código Civil Argentino. A divisão dos direitos em pessoais e reais tem para ambos o valor de um pensamento fundamental que preside o desenvolvimento total do sistema.
Se o Código Civil da Argentina é, quase em sua totalidade, o esboço de Freitas [gravíssima e notável exageração, talvez produto de nacionalismo, que encontra-se com a mera leitura de ambos os textos… (nota de RR-B)], no Brasil, não chegou sequer ao Poder Legislativo. Infelizmente nosso País ainda não é dado a cultivar a memória dos seus filhos ilustres. Na Argentina, valoriza-se sobremaneira Vélez Sarsfield: um clube de futebol leva o seu nome, além de haver um bairro em Buenos Aires em sua homenagem, gestos que tornarão imperecíveis à memória daquele jurisconsulto. No Brasil, terra repleta de iconoclastas, Teixeira de Freitas jamais terá o seu nome visto em todos os quadrantes, muito menos dando nome a associações expressivas da índole do brasileiro, tais como a de uma escola de samba ou de uma entidade futebolística. Talvez Teixeira de Freitas seja lembrado como o aluno medíocre que foi quando estudou Direito na Academia do Largo do São Francisco ou, quem sabe, pela loucura que o acometeu no fim da vida. Sim. Teixeira de Freitas enlouqueceu, quiçá pelo excesso de trabalho ou pela frustração de não ter concluído seu intento, que era o de ver seu esboço regendo o direito privado brasileiro.
Lembra o jurista Washington de Barros Monteiro que, no início, a loucura se instalou em Teixeira de Freitas, em forma de mania religiosa. Aos poucos, a doença se generalizou e dominou, por completo, as suas faculdades mentais. Como os grande pensadores contemporâneos Nietzsche, Maupassant, Donizetti e Nijinsky, Teixeira de Freitas morreu demente, em Niterói, no dia 12 de dezembro de 1883.
É exatamente para preservar a memória de Augusto Teixeira de Freitas que cremos poder contar com amplo apoio dos ilustres pares para a aprovação deste projeto de lei, com o que estaremos homenageando, no País, a memória deste ilustre jurista.
Sala das Sessões, 27 de novembro de 2007. Senador Valdir Raupp” (Novembro de 2007, DIÁRIO DO SENADO FEDERAL, quarta-feira 28, pp 41969-71).
O projeto foi encaminhado à Comissão de Educação do Senado. Por sua vez, o amigo Doutorando UMSA Airton Pedro Marin Filho, de Porto Velho, Rondônia, informa que ele conseguiu também que o Deputado Federal Eduardo Valverde, encaminhasse a proposta ao Plenário da Câmara que ele integra. Otimista, o Airton exclama: “Creio que alcançaremos nossos objetivos. Em janeiro comemoraremos, com certeza!” Eu só posso concordar, embora talvez seja um pouco mais tarde a comemoração… Mas o que muito se espera, maior prazer gera!
Nosso Doutorado, queridos amigos, assim deseja ser: não só sítio de cursos valiosos, e semente de teses que honrem aos seus autores e à Instituição. Também, centro cultural envolvido na tarefa magnífica da integração de nossos povos, e da região inteira. A vida acadêmica, nós acreditamos, não deve andar pelo mundo de olhos fechados à realidade, senão cumprir um papel de protagonista nas concretas mudanças sociais.
18. Exposição resgata importante momento histórico brasileiro
O saguão da Faculdade de Direito Milton Campos, em Belo Horizonte, foi palco, no final de março, de uma exposição que, nas palavras da diretora Lucia Massara, “merece nosso res-peito e estudo”. Trata-se da mostra “Consolidação das Leis Civis”, um conjunto de banners e livros que dão uma idéia mais clara sobre um dos trabalhos mais marcantes da história jurídica brasileira, além de recortes de jornais do século XVIII e XIX.
A abertura da exposição foi feita pelo seu curador, o professor de Direito Civil e dirigente do Centro de Estudos em Direito Privado, João Baptista Villela, na noite do dia 25 de março. Ao lado da diretora Lucia Massara e do professor Salomão de Araújo Cateb, Villela fez uma breve palestra para as dezenas de alunos presentes sobre o que foi a Consolidação das Leis Civis e o seu significado para o Brasil.
O curador fez um histórico desse documento, preparado em 1857 pelo jurista baiano Augusto Teixeira de Freitas. Villela informou que, no século XVII, o Brasil-Colônia, naturalmente, era amplamente influenciado pela metrópole, Portugal, onde havia uma grande incerteza quanto ao direito em vigor, já que diversos modelos competiam para serem hegemônicos na Europa: o Direito Romano, o Direito Canônico e o próprio Direito Nacional de Portugal. Como não se sabia exatamente quais as normas que estavam em vigor na metrópole, a colônia sofria do mesmo mal.
Após tornar o Brasil independente, em 1822, o Império fez vigorar as leis portuguesas, com exceção daquelas que entravam em conflito direto com as normas nacionais. Mas isso evitou que a situação continuasse caótica. “Leis não são feitas de uma hora para outra”, lembrou.
Para fugir dessa situação, o governo imperial convocou Teixeira de Freitas para colocar ordem na legislação brasileira: listar o que estava em vigor, o que não estava e explicar os motivos. Foi, segundo Villela, um trabalho hercúleo, mas que se tornou bem sucedido graças à genialidade do jurista, que inclusive o concluiu antes do prazo previsto.
Como exemplo da genialidade de Teixeira de Freitas, o professor Villela citou o tratamento dado por eles às normas que regulavam o regime de escravidão. Sem poderes para simplesmente revogá-las – seu papel era apenas o de organizar -, ele as segregou em um “Código Negro”, afirmando que aquelas normas estavam fadadas a desaparecer, o que ocorreria apenas 31 anos mais tarde, em 1888, com a Abolição da Escravatura.
18. Esboço
A Consolidação não chegava a ser o Código Civil Brasileiro, que só veio a nascer em 1916, quase um século após os códigos do Haiti e da Bolívia, por exemplo. Mas foi o primeiro esboço. Apesar disso, trazia em si a visão do passado. “A Consolidação não foi feita para se definir o Direito Moderno, e sim para verificar o que estava ou não em vigor naquela época”, afirmou Villela.
Ao finalizar sua exposição, o professor lembrou que no Brasil legisla-se muito sem se fazer a reflexão necessária, o que acaba gerando um sem-número de normas, tornando-se praticamente impossível para os juristas manterem-se atualizados e, conseqüentemente, zelarem pelo seu cumprimento. Ele exemplificou seu argumento com o Direito Tributário: segundo o professor Villela, desde 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal, até 2007, foram publicadas nada menos que 225.600 leis que tratam do assunto, entre federais, estaduais e municipais, o que significa 36 novas normas tributárias por dia.
O professor João Baptista Villela aproveitou sua visita à Faculdade de Direito Milton Campos e conheceu a Biblioteca da instituição, considerada uma das mais completas do Brasil no ramo jurídico. A exposição “Consolidação das Leis Civis” já passou por Brasília e ainda será apresentada em São Paulo e no Rio de Janeiro.
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça, ministra Ellen Gracie, juntamente com o vice-presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, reuniram-se na manhã desta quinta-feira (28) com o presidente do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Luiz Alberto Moreno.
O encontro teve como objetivo acertar detalhes de um programa de cooperação entre STF, CNJ e BID, com vistas a financiar projetos voltados para o Judiciário. O acordo surgiu a partir da carta de intenção entregue pela ministra Ellen Gracie na sede do Banco, em Washington, nos Estados Unidos, no ano passado, com proposta de aporte de recursos do BID. Inicialmente, três projetos serão contemplados com o apoio do programa de cooperação.
19. Projeto Teixeira de Freitas
Um dos projetos beneficiados consiste na parceria entre universidades de países do Mercosul para o intercâmbio de professores e estudantes de Direito, a fim de auxiliar no processo de integração do bloco. A idéia foi apresentada no Fórum de Cortes Supremas do Mercosul pelo ministro Gilmar Mendes e prevê que a supervisão do intercâmbio caberá às Cortes Supremas de cada país.
O projeto leva o nome do jurista brasileiro Teixeira de Freitas e poderá ter início ainda este ano, com a realização de seminário voltado a reitores de universidades do Mercosul.
Posteriormente, o programa de intercâmbio poderá ser ampliado para todos os países da América Latina, representando um esforço do Judiciário na integração do continente.
20. Varas especializadas
O segundo projeto proposto pelo CNJ visa ampliar a instalação de varas especializadas no combate à violência doméstica no país. O Conselho já editou orientação dirigida aos tribunais para a implantação dessas varas, no sentido da aplicação da Lei Maria da Penha, que coíbe a violência contra a mulher. A estrutura necessária para oferecer apoio e atendimento especializado a pessoas envolvidas em situação de violência doméstica deverá contar com o auxílio do BID. Assim, as varas especializadas poderão oferecer serviços de profissionais como psicólogos, assistentes sociais e abrigos para famílias que sofrem com a violência dentro de casa.
Conciliação
A ampliação do projeto de conciliação também faz parte da proposta de cooperação com o Banco. Milhares de acordos já foram formalizados no país nos moldes da conciliação, que busca diminuir o litígio na Justiça brasileira. Os financiamentos propiciarão maior destaque nas campanhas educativas e de conscientização das pessoas, para que optem por essa forma alternativa de solução de conflitos, sem necessidade de longas ações na Justiça.
Cooperação
Em troca do apoio do BID aos projetos, a ministra Ellen Gracie ofereceu a possibilidade de estabelecer cooperação jurídica, como a transferência de conhecimento quanto às boas práticas do Judiciário brasileiro. Exemplo disso é a tecnologia usada pela justiça eleitoral nas eleições. As urnas eletrônicas, assistência técnica e os procedimentos utilizados nas votações já vem sendo colocados à disposição de países que demonstraram interesse em adotar a metodologia.
Também poderá servir para outras nações o exemplo de penas alternativas aplicadas pela Justiça no Brasil para solucionar a crise no sistema carcerário. Além disso, o Judiciário brasileiro poderá ajudar na reestruturação do sistema judiciário do Haiti, de forma semelhante ao que ocorre quanto ao Timor Leste.
O projeto encontra-se em fase de detalhamento e conta com o estudo de técnicos do CNJ, do STF e do BID. A previsão para conclusão é ainda no primeiro semestre de 2008 e aprovação até o final do ano.
Conclusão
Devemos buscar a conscientização para preservação da história, como esta homenagem a fim de trazer algumas luzes à discussão, hoje travada no plano da ciência jurídica, haja visto a bio-ética.
Na esteira do que percorremos é oportuno relatar os brilhantes trabalhos com bibliografias fundamentadas à obra de Teixeira de Freitas até atualidade.
Na Argentina os exemplares trabalhos do nosso mestre Dr. Ricardo D. Rabinovich-Berkman, encontramos desde a história do direito até a nova ciência como Direito Civil, Bioética etc…além das referências visualizamos posições confirmando o idealismo, perpetuados nestas obras, o valor do nosso homenageado concluindo ser o Direito uma ciência dinâmica.
No que tange a evolução da ciência jurídica devemos “in casu” história do direito, perseverar o que aprendemos, para tanto, transcorreremos traduzido algumas citações do instigador torturador mestre com muito respeito e carinho nosso mentor de história suso mencionado.
….não creio que a História sirva como disciplina moral nem tão pouco que seja um meio de “evitar repetir os mesmos erros” porque, para que podamos cair em idêntico cair no esquecimento, devemos passar por idêntica rua, e os deveres do sucesso humano é tal que nunca se caminha duas vezes em um mesmo endereço (o bem, com a imagem do filósofo grego pré-socrático Heráclito, podemos banhar duas vezes no mesmo rio, porém jamais será a mesma água).
“Penso que a idéia mais aguda era a primeira, original, que expressa Heródoto. A História é uma ciência apaixonante que proporciona sem embargo, um saber abstrato. Sendo uma das disciplinas mais atraentes das que ao humano se oferece, pois aponta ao conhecimento que tem pulsado todas as civilizações e desde a aurora dos tempos, carece, não obstante, de uma aplicação prática. É em outras palavras, uma ciência por rigor do método, porém uma arte pelo hedonista (e não crematistico), de seus resultados. Servem para algo a sintonia de Bethoven aos concertos de Vivaldi? Nietzshe respondia com sua famosa frase: “sem a música a vida seria um erro”. E uma humanidade sem História? Seria simples e sinceramente inconcebível.” [56]
Deste trabalho verificamos na biografia do homenageado uma curiosidade que devemos registrar Augusto Teixeira de Freitas, tinha herança genealógica lusitana laços estreitos com os irmãos argentina e um colega mineiro, era poeta repentista de Serro, Minas Gerais, Antonio Augusto Quiroga, citado na obra de Spencer Vampré.moravam juntos em São Paulo.
Desse modo esperamos uma conscientização de todo os apontamentos sirva para uma reflexão a caminho de uma nova jornada rumo a univerlização de reconhecimento à história do Direito.
Pensamentos aos nobres sectários de Augusto Teixeira de Freitas
“Querer e poder estudar, é buscar incessantemente uma inquietude do pensar e verás que jamais e nada te conformarás, tão pouco a tudo saberás… É enfrentar qualquer desafio com ética humildade com a ciência tentar ao ser humano conscientizar…
Aguçar a sensibilidade com sentimentos puros ultrapassar a dor enaltecer os ensinamentos sem fronteiras com todo fervor e ardor…
O equilíbrio emocional necessita de uma salutar base cultural com o conhecimento agradarás o espiritual.”
Pedimos vênia aos transcritos em homenagem a Augusto Teixeira de Freitas em vários idiomas e não traduzidos, entendemos ser de fácil entendimento, ademais a “contrario sensu”, cairíamos contra as lições do exemplo “del papa de derecho civil”
Informações Sobre o Autor
Tania Mota de Oliveira
Doutora em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade del Museo Social Argentino (UMSA), doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade de Buenos Aires (UBA). Assessora Empresária, de Comércio Exterior e Eleitoral e escritora.