“A assinatura tal qual hoje se reconhece pode ser conceituada
como sendo o ato físico por meio do qual alguém coloca em um suporte físico a
sua marca ou sinal, sendo personalíssima”
Introdução
Desde que a Internet se tornou um meio
interativo capaz de realizar transações comerciais, ser meio eficaz de acordos,
via de comunicação entre pessoas civis e jurídicas, que a questão da segurança
sempre esteve como elemento garantidor do sucesso dessas
atividades e, em função deste elemento, ressurgiram os modos de cifrar
as mensagens, de forma que apenas o remetente e o receptor possam ter acesso ao
teor dos documentos envolvidos através de um meio técnico absolutamente pessoal
para o sucesso dessas relações.
Juntamente com essas relações vieram as
conseqüências naturais e a necessidade de dar eficácia e validade jurídica aos
contatos virtuais de modo que possam ser equiparados aos documentos que
hoje conhecemos e que estão ligados a um meio material tangível.
Historicamente nossos
doutrinadores tem definido o documento como algo material, uma res, uma representação exterior do fato que se quer
provar e, sempre conhecemos a prova documental como a maior das provas, pois
consistente da representação fática do acontecido. Na esteira desses
pensamentos, ao ligarmos indelevelmente o fato jurídico à matéria como uma
coisa tangível, teríamos dificuldades em conceituar o documento
eletrônico, pois este é intangível e etéreo, e muito longe se encontra do
conceito de “coisa” como matéria.
Assim, foi preciso que se pensasse em
algo para que o registro do fato ocorrido na web
pudesse ser equiparado ao documento formal e a lei vem em nosso socorro fazer a
devida equiparação e assim permitir que o fato social, já definitivamente
consagrado, possa ser aceito como uma norma pacificadora dos conflitos por
acaso existentes neste ambiente novo, que é a Internet.
Assinatura Digital
Como dissemos acima, a segurança,
que hoje é a maior preocupação de todos aqueles que negociam pelos meios
eletrônicos. A credibilidade desses documentos está ligada essencialmente à sua
originalidade e à certeza de que ele não foi alterado de alguma maneira pelos
caminhos que percorreram até chegar ao destinatário. Os fatores de risco podem
advir por fatores internos ou externos, sendo que os internos podem acontecer
por erro humano ou mesmo falha técnica. O fator externo, e aí está o risco
maior, consiste na atuação fraudulenta de estranhos que pode alcançar meios
para adentrar no programa enviado e desviar o objetivo do mesmo, em prejuízo das parte envolvidas no negócio.
Então, fomos buscar na Criptologia que
é a ciência que estuda a maneira mais segura e secreta para a realização das
comunicações virtuais, a solução mais imediata. É composta de Criptografia e Criptoanálise que representam a criação de uma senha e a
chave para decifrá-la.
As técnicas de assinatura feitas por
meio da Criptografia consistem numa mistura de dados ininteligíveis onde é
necessário o uso de duas chaves, a pública e a privada, para que ele possa se
tornar legível. É como se fosse um cofre forte que somente para quem tem o seu
segredo é acessível.
Essa assinatura é formada por uma série
de letras, números e símbolos e é feita em duas etapas. Primeiramente o autor,
através de um software que contém um algoritmo próprio, realiza uma operação e
fez um tipo de resumo dos dados do documento que quer enviar, também chamado de
função hash. Após essa operação ele usa a
chave privada que vai encriptar este resumo e o
resultado desse processo é a assinatura digital.
É por isso que a assinatura eletrônica,
diferentemente da assinatura real, se modifica a cada arquivo transformado em documento e o seu
autor não poderá repeti-la como faz com as assinaturas apostas nos documentos
reais.
A pessoa encarregada de fornecer os
pares de chaves é a Autoridade Certificante e é
uma entidade independente e legalmente habilitada para exercer as funções de
distribuidor das chaves e pode ser consultado à
qualquer tempo certificando que determinada pessoa é a titular da assinatura
digital , da chave pública e da correspectiva chave
privada.
Isto quer dizer que quem vai fornecer a
forma de alguém assinar um documento digital é outra pessoa e não poderá ser
criada pelo próprio usuário.
Portanto este tipo de rubrica difere da
assinatura que conhecemos em quase todos os aspectos porque, a assinatura tal qual hoje se
reconhece pode ser conceituada como sendo o ato físico por meio do qual alguém
coloca em um suporte físico a sua marca ou sinal. A marca é personalíssima e
tem eficácia e validade jurídica, podendo ser levada ao tabelião para que este
faça o seu reconhecimento por semelhança, já que pode ser conservada em
arquivos e periciada por meios grafológicos.
O Projeto de Lei
Está no Congresso Nacional o projeto de
lei que equipara a assinatura digital àquela formalmente aposta em um suporte
físico para que as relações on line
possam ter a mesma eficácia dos documentos. Estamos de acordo de que a lei vai alavancar o comércio eletrônico e outras transações
virtuais com o aumento da segurança e a certeza que em caso de querela
judicial, a prova do negócio será feita, sem maiores problemas.
Ocorre que conforme discorremos acima,
esta assinatura digital que se apresenta de forma cifrada não é a mesma
assinatura que temos conhecimento, já que não guarda com esta as
necessárias semelhanças capazes de equipará-las.
Primeiro porque se formos analisar o conceito de assinatura, veremos que a que se faz por meios
digitais não é um ato pessoal do assinante, eis que ela é fornecida por outrem;
a duas porque ela não se repete a cada mensagem e portanto não poderá se
arquivada tal qual foi efetivada no ato do seu envio; prosseguindo, ela não
está ligada a um meio físico capaz de poder ser submetida a um processo de
reconhecimento por semelhança ou periciada por meios grafológicos e por fim não apresenta a marca pessoal de
quem está firmando o documento, eis que está representada por uma série de
letras, números e símbolos embaralhados de forma ininteligíveis. Para
complementar diríamos que a Assinatura Digital é transferível, bastando
que o seu proprietário a ceda a alguém e a Assinatura formal é
intransferível por estar ela indelevelmente ligada ao seu autor.
Por estes motivos é que afirmamos que a
Assinatura Digital não tem a mesma natureza da Assinatura formal, essa que
conhecemos e usamos no dia a dia. Podemos dar o nome que quisermos e este
termo, Assinatura Digital, que foi traduzido do inglês Digital Signature porque o sistema que a cifrou por meio
da criptografia foi criado em terra americanas.
Porém a verdade é que não se trata de um sinal personalíssimo capaz de
identificar o seu autor.
Suponhamos que alguém possua um par de
chaves criptografadas para usar em seus negócios e
sendo estas de sua propriedade as empreste para que alguém use. O negócio está feito
e a prova do empréstimo será uma questão de outra prova a ser feita em juízo. Mas cabe
a pergunta: como alguém pode ceder a outra pessoa a sua assinatura, a sua
marca, o seu sinal pessoal? O direito civil apenas admite a representação por
meio da procuração pública ou privada e a assinatura, que é representativa da
vontade, pode ser substituída pela firma do procurador, mas este não pode
assinar como o seu representado o faria. Aí está a diferença e por isso
dissemos que elas não são a mesma coisa.
A questão da Autoridade
Certificadora
Diz o artigo 236 da Constituição
Federal que : “ Os serviços notariais e de registro
são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público” e a Lei de
Registros Públicos dá aos Notários a atribuição exclusiva para o reconhecimento
de firmas.
Entendemos que a firma que a lei se
refere é a assinatura que pode ser arquivada nos Cartórios e comprovada por
meios grafológicos e não uma simbologia que não
possui as características de uma marca pessoal aposta em um documento físico.
Mesmo que a doutrina estrangeira tenha
dado o nome de Digital Signature, em direito
vale o fundo sobre a forma, isto é, é a natureza jurídica e a essência do
instituto que vão determinar a que ramo ela pertence e não a roupagem que veste.
Sem levarmos em consideração o fato de que os mestres em direito e os juristas não tem formação acadêmica
em matemática ou análise de sistemas, o que ocorre é que não haverá
inconstitucionalidade alguma em uma lei que não conceda aos tabeliães os ciber cartórios, por tudo o que foi exposto e porque
qualquer argumento neste sentido cairia por terra pela divergência dos objetos
do pedido. Se os notários argumentam que as suas funções
detém a exclusividade legal para o reconhecimento de firmas, evidentemente
que o seu pedido seria deferido por qualquer magistrado, se por acaso aquele
emaranhado de símbolos fosse na verdade uma assinatura, um sinal personalíssimo
de alguém. Mas como não é, pois se trata de uma simbologia criada apenas para
assegurar uma negociação e dar validade jurídica ao ato, não há como equiparar
os dados encriptados a assinatura formal.
Assinatura é ato pessoal, físico e
intransferível. Dado codificado digital é uma seqüência de bits,
representativos de um fato, registrados em um programa de computador.
Informações Sobre o Autor
Ângela Bittencourt Brasil
Promotora de Justiça no Rio de Janeiro/RJ