Breves considerações acerca do parágrafo único do artigo 741 do C.P.C, com redação dada pela M.P. n° 2180-35 e a possibilidade de existência de Coisa Julgada inconstitucional no ordenamento jurídico brasileiro

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Introdução:

O tema objeto do presente artigo
mostra-se de irretorquível importância na seara de estudo do Direito Processual
brasileiro, mormente quando constatado, a partir de um entendimento mais
apressado, que a redação dada pela Medida Provisória n° 2180-35, de 24 de
agosto de 2001, que acrescentou um parágrafo único ao artigo 741 do CPC, vai de
encontro a princípios e disposições constitucionais e legais pertinentes ao
instituto da coisa julgada material.

Em tempo anterior ao advento dessa
inovação legal produzida pelo Poder Executivo por meio do permissivo expresso
no artigo 62 da Constituição Brasileira de 1988, a demarcação da
matéria reservada aos Embargos à Execução de titulo judicial no processo civil [1]
era limitada apenas às precárias hipóteses previstas nos sete incisos do artigo
741 do CPC.

Porém, a contar da edição desta
Medida Provisória[2],
com a inserção de um parágrafo único ao artigo 741 do CPC o rol de alegações
admissíveis em sede de Embargos à Execução visando desconstituir sentença condenatória
judicial fora alargado. A coisa julgada derivada da sentença que deu origem ao
título executivo judicial, passa, agora, a ceder face à ulterior declaração –
pelo STF – de inconstitucionalidade da Lei ou ato normativo que dava
sustentação à decisão judicial exeqüenda.

Dispõe o novo artigo 741 do CPC, com
redação acrescentada pela Medida Provisória em comento que:

“Art. 741. Na execução fundada em
título judicial, os embargos só podem versar sobre:

I – falta ou nulidade de citação
no processo de conhecimento, se a ação lhe correu à revelia;

II – inexigibilidade do
título;

III – ilegitimidade das partes;

IV – cumulação indevida de
execuções;

V – excesso da execução, ou
nulidade desta até a penhora;

VI – Qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva
da obrigação, como pagamento, novação, compensação com execução aparelhada,
transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença;

VII – incompetência do juízo da
execução, bem como suspeição ou impedimento do juiz.

Parágrafo Único. Para efeito do
disposto no inciso II deste artigo, considera-se também inexigível o título
judicial fundado em lei ou ato normativo declarados inconstitucionais pelo
Supremo Tribunal Federal ou em aplicação ou interpretação tidas por
incompatíveis com a constituição federal”.

Como tudo quanto é novidade, tal
inovação legal vem provocando uma sensação de incômodo e inquietação no
universo jurídico brasileiro, principalmente tendo em vista que essa alteração
atinge conceitos até então equivocadamente arraigados no campo da ciência
processual pátria.

È o que veremos em linhas seguintes,
onde procuraremos demonstrar que, não obstante tal inovação traga inegável
prejuízo no âmbito sociológico – na medida em que seja apta a mitigar a
segurança jurídica necessária aos negócios firmados no seio da sociedade
brasileira – razões não existem, por outro lado, que nos permita questionar a
constitucionalidade do parágrafo único do artigo 741 do CPC, apesar de que,
vozes de renome já venham se levantando no sentido de taxar inconstitucional a
referida inovação legal.

1.0 – O caráter peremptório da
inovação legal advinda da medida provisória n° 2180-35 face o disposto no
artigo 2° da emenda constitucional n° 32/2002:

Com o fito de
limitar a insaciável gana do Poder Executivo de legislar em todos os campos do
Direito, por via de Medidas Provisórias, o Poder Constituinte Reformador
elaborou emenda à constituição, onde passou a regular o âmbito de validade e o
procedimento para a edição desse excepcional método normativo cunhado no artigo
62 da CF/88.

Ao lado de
importantes inovações, que limitaram a esfera de atuação do Poder Executivo na
elaboração legislativa, a retratada Emenda Constitucional – nascida sob a
efígie do triste episódio do atentado terrorista ao World Trade Center, nos E.U.A)
– trouxe camuflada em suas disposições finais, o teratológico artigo 2°, que
passou a dar ares de definitividade às MP’s editadas até a data de 11 de
setembro do ano de 2001 (data em que fora publicada a EC/32). Eis o inteiro
teor do mencionado dispositivo legal:

“Art. 2° – As
medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda
continuam em vigor até que a medida provisória ulterior as revogue
explicitamente ou até deliberação definitiva do Congresso Nacional.”

Deste modo,
havendo sido a Medida Provisória n° 2180-35, que inseriu o parágrafo único no
artigo 741 do CPC editada em 24 de agosto de 2001, por via do disposto no
artigo 2° da EC/32, passou a ter vigência ilimitada no tempo, vigorando
peremptoriamente, até que haja nova deliberação do Poder Executivo ou do
Congresso Nacional sobre a matéria.

2.0 –
O instituto da coisa julgada e sua pretensão de estabilização das relações
sociais:

Uma das aspirações ordinárias do
Direito, como conjunto de normas que buscam regular a vida em sociedade e
atingir o escopo do bem estar social, sempre fora a de garantir aos cidadãos um
máximo de estabilidade nas relações travadas entre si, de moldes a alcançar um
estado ideal de plena paz social.

O conflito de interesses, por outro
lado, é – e sempre será – da essência da própria vida em sociedade.

Justamente com o escopo de
solucionar esses conflitos de interesses entre seus cidadãos, sem descurar do
fim precípuo do direito de atingir a pacificação social, é que os ordenamentos
jurídicos modernos primaram por dotar, na medida do possível, as decisões de
seus órgãos jurisdicionais de um caráter de imutabilidade, capaz de propiciar a
necessária estabilidade das relações intersubjetivas no seio da sociedade.

Com certeza, devido à finalidade da função
jurisdicional do Estado – que é regular o caso concreto posto à sua apreciação,
restariam incertas e inseguras as relações sociais – com a possibilidade de
perpetuação dos litígios – se as decisões judiciais não fossem capazes de
adquirir ares de definitividade, ainda que relativa. Esta é a razão pela qual a
lei criou o instituto da Coisa Julgada.

A demarcação conceitual da coisa
julgada, sempre foi objeto de estudo por grande parte dos processualistas
modernos, principalmente no que tange à eterna celeuma referente à sua real
natureza jurídica – qualidade ou efeitos da sentença judicial – tema este que,
dado os objetivos específicos do presente artigo, não será aqui tratado,
remetendo-se, desde já, os interessados aos manuais e ensaios específicos que bem
retratam a questão.

Abstraídos, portanto, questiúnculos acerca da efetiva
natureza jurídica do instituto da Coisa Julgada, passamos a buscar – na
doutrina – sua conceituação, ponto importante para o deslinde do estudo ora
proposto.

De início, temos
por bem consignar que a Coisa Julgada pode ser vista sob duas modalidades: a
coisa julgada formal e a coisa julgada material. A primeira sempre se
empregando para o processo que foi extinto sem análise do mérito enquanto que a
segunda, sobretudo, referente aos casos em que houve julgamento do mérito da
questão posta em juízo.

Ocorre, entretanto, que para os peculiares anseios deste
estudo, importante se faz analisar apenas o instituto da Coisa Julgada
material, essa a única modalidade capaz de possibilitar ao credor o acesso às
vias do procedimento executório por título judicial, que é o ponto que nos
interessa no exame das inovações trazidas pela nova abrangência do artigo 741
do CPC.

Partimos, então, de um conceito simples e conciso
formulado por Eduardo Couture, para quem a coisa julgada seria tida como a
autoridade e a eficácia de uma sentença judicial, quando não mais exista contra
esta, meios de impugnação que permitam modificá-la.

Decerto, o Magistrado ou Órgão Judicial, quando da
prolatação da sentença de mérito, logra formular, em verdade, uma norma
jurídica concreta, a qual deve disciplinar dada situação litigiosa trazida à
sua apreciação. Uma vez sendo a decisão judicial espécie de “lei” aplicável ao
caso concreto, e tendo em vista os anseios basilares da segurança jurídica,
torna-se inarredável que se assegure a esta tutela jurisdicional certa
estabilidade, que a permita regular com ares de definitividade o conteúdo da
“norma” de cunho particular formulada na sentença. Tal estabilidade somente
logrou ser atingida a partir da instituição do fenômeno da Coisa Julgada,
criação doutrinária que remonte aos à séculos atrás, havendo sido trazida para
o ordenamento jurídico nacional por intermédio do Direito Lusitano, fonte maior
de nosso Sistema Jurídico.

A coisa julgada exteriorizaria, assim, em sua origem, uma
decisão peremptória, insusceptível de alteração futura, dotada de um caráter de
intangibilidade absoluta. Tanto é assim que, no florescer do instituto em
análise, difundiu-se o conhecido adágio, de origem latina, mas devidamente
traduzido para o nosso vernáculo, que dizia que “a coisa julgada tem o
condão de tornar o preto branco e o quadrado redondo”.

Acontece, porém, que essa concepção absoluta, intangível
da coisa julgada não mais se faz presente hoje em dia, porquanto venha sendo
objeto de um fenômeno crescente de relativização por parte da doutrina,
capitaneada pelo argucioso Cândido Rangel Dinamarco[3],
partindo de uma interpretação sistemática e de uma ponderação dos princípios
cardeais que regem o Sistema Jurídico Nacional.

É o que veremos mais adiante, no item 3.0 da presente
obra.

3.0 –
A coisa julgada no ordenamento jurídico brasileiro:

No ordenamento jurídico brasileiro,
o fundamento normativo da coisa julgada encontra-se na previsto no corpo da
Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5°, inciso XXXVI e nos artigos 467,
468 e 471 do CPC, dentre outros dispositivos legais.

Diz o artigo 5°, inciso XXXVI da
CF/88 que :

“XXXVI – A lei não
prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;”
(grifo nosso)

Em sede infraconstitucional, o
legislador ordinário estatuiu, no corpo do artigo 467 do CPC o seguinte:

“Art. 467 – Denomina-se coisa
julgada material a eficácia que torna imutável e indiscutível a sentença, não
mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário
.”

Já no artigo 468 do Código de Ritos
brasileiro, restou consignado que:

 “Art. 468 – A sentença que julgar total ou
parcialmente a lide tem força de lei nos limites da lide e das questões
decididas”

Por derradeiro, demonstrando que o
próprio legislador ordinário admitiu a relativização da coisa julgada, passível
de ceder em hipóteses determinadas, restou estatuído no inciso II do artigo 471
do CPC que:

 “Art. 471 – Nenhum juiz decidirá novamente a
as questões já decididas, relativas à mesma lide, salvo:

I – se, tratando da relação
jurídica continuativa, sobreveio modificação no estado de fato ou de direito;
caso em que poderá a parte pedir a revisão do que foi estatuído na sentença;

II – nos demais casos
prescritos em lei.
(grifo nosso)

Vê-se, portanto, que o ordenamento
jurídico nacional reservou considerável espaço para disciplinar o alcance e o
objeto do instituto da Coisa Julgada, havendo dispositivos expressos a tratar
da matéria.

Nada obstante tal regramento legal
específico é de se ressaltar, conforme já feito alhures, que existem autores de
renome que ainda fazem uma leitura ultrapassada e equivocada desses
dispositivos legais, na ávida busca de tentar justificar uma pretensa
intangibilidade absoluta do instituto da coisa julgada em nosso ordenamento
jurídico positivo.

Deveras, não se pode negar que o
ideal último do Direito, em si mesmo, é obter a paz social. Não se pode negar
que essa paz social será alcançada – sim – a partir de um mínimo de segurança jurídica
nas relações sociais. Porém, o que não se permite é que, na insaturável busca
dessa segurança jurídica e da conseqüente estabilização das relações
intersubjetivas, venha-se criar considerações equivocadas acerca dos reais
limites inerentes à coisa julgada material no ordenamento brasileiro,
considerações essas que vão de encontro ao próprio conjunto normativo-objetivo
cunhado em nosso país.

4.0 – A intangibilidade da coisa
julgada e a tendência moderna da relativização da coisa julgada:

Como dissemos acima, autores
existem, ainda, que pregam o caráter absoluto, intangível da coisa julgada, não
admitindo seja a mesma limitada ou restringida sequer pelo legislador
constituinte, por tratar-se, idealmente, de princípio constitucional,
verdadeira pedra angular do sistema jurídico pátrio.

Nada mais equivocado.

È bem verdade, como já dissemos
alhures, que há algum tempo atrás, em época remota, havia o entendimento
sufragado de que a coisa julgada, de tão absoluta que era, tinha o condão de “tornar
o preto branco e o quadrado redondo
”.

Ocorre, porém, que essa corrente de
pensamento foi, aos poucos, sendo substituída por uma nova leitura acerca do
instituto da coisa julgada material. Como já mencionado, o jurista Cândido
Rangel Dinamarco [4],
por exemplo, defende, em seus escritos, a necessidade de se relativizar a coisa
julgada de modo que já não mais deveria prevalecer aquela leitura clássica, que
a tinha como algo absoluto, imutável e de cumprimento inarredável.

É certo que não se pode olvidar da
importância e do respeito que merece o instituto da coisa julgada em nosso
ordenamento jurídico. Por outro lado não se pode, a pretexto de avalizar tal
respeito a esse instituto, emprestar-lhe uma relevância exacerbada, tapando-se
os olhos para o sistema jurídico brasileiro como um todo.

Assim é que, encontramos em inúmeros
dispositivos legais infraconstitucionais exemplos de institutos e/ou
procedimentos que vão de encontro ao caráter de definitividade absoluta da
sentença judicial transitada em julgado. É o caso do instituto da Ação
Rescisória, prevista no artigo 485 do CPC, bem como da Ação de Revisão ou
Modificação do Julgado, nos termos do artigo 471 do CPC. Por via do primeiro, a
sentença judicial transitada em julgado pode ser rescindida, no prazo fatal de
dois anos, nas hipóteses e situações especificadas na lei. Já pela Ação de
Revisão, a sentença definitiva poderá ser modificada, a qualquer tempo, se
tratando de relação jurídica continuativa, sobrevier modificação no estado de
fato ou de direito.

Cumpre-nos não olvidar, quanto à
esses peculiares institutos, que mitigam a eficácia absoluta da sentença de
mérito judicial, que poucos são os autores que questionam sua
constitucionalidade, taxando-os incompatíveis com a ordem constitucional
brasileira. Ao revés, ambos os institutos já se encontram enraizados em nosso
sistema jurídico.

Por que, então, questionar a
constitucionalidade do parágrafo único inserido pela Medida Provisória n°
2180-35 ? Não seria ela apenas mais uma hipótese de relativização da coisa
julgada material prevista pelo legislador ordinário, a exemplo da Ação
Rescisória e da própria Ação de Revisão?

É evidente que sim.

Outrossim, o relativismo da coisa
julgada se apresenta já com o próprio texto constitucional de 1988, quando
afirma em seu art. 5º, inciso XXXVI, que “a lei não prejudicará o
direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. (grifos
nossos)

Ora, a partir de uma interpretação
gramatical e lógica do referido dispositivo normativo, podemos concluir que o
constituinte originário quis tão somente vedar que o legislador
infraconstitucional edite leis capazes de eliminar o direito adquirido, o ato
jurídico ou – o que para nós interessa – a coisa julgada.

Quer isso dizer que o legislador
infraconstitucional, ao elaborar uma norma legal, esbarrará na expressa
garantia da coisa julgada material formada a partir de uma sentença meritória. Ou
seja, essa ulterior norma heterônoma não pode pretender desconstituir o julgado
proferido pelo Magistrado no caso concreto, sob pena de estar invadindo a
esfera de competência atribuída ao Poder Judiciário, fazendo tabula rasa do
princípio constitucional da Separação dos Poderes (artigo 2° da CF/88).

Vislumbra-se, destarte, a garantia
expressa no artigo 5°, inciso XXXVI da CF/88 como uma garantia no sentido de
que o Poder Judiciário ao decidir um conflito de interesses posto à sua
cognição, deve ter sua decisão respeitada, inclusive pelo Poder Legislativo, de
moldes a se exprimir a independência e a separação dos Poderes, esse sim,
corolário inafastável do próprio Estado Democrático de Direito Brasileiro.

Esse o entendimento que se extrai da
interpretação do sistema constitucional brasileiro como um todo, entendimento
este aduzido pelo mestre José Afonso da Silva[5],

“A proteção constitucional da
coisa julgada não impede, contudo, que a lei preordene regras para a sua
rescisão mediante atividade jurisdicional. Dizendo que a lei não prejudicará
a coisa julgada, quer-se tutelar esta contra atuação direta do legislador,
contra ataque direto da lei. A lei não pode desfazer (rescindir ou anular ou
tornar ineficaz) a coisa julgada. Mas pode prever licitamente, como o fez o
art. 485 do Código de Processo Civil, sua rescindibilidade por meio de ação
rescisória”.

Outrossim, não se pode olvidar que
apesar de o instituto da coisa julgada material estar calcado na segurança,
estabilidade e na certeza jurídica, não poderá prevalecer quando em conflito
com uma norma constitucional violada por força do princípio maior da
legalidade, hipótese de que trata o novo parágrafo único do artigo 741 do CPC.
Nesse caso os “princípios” que fundamentam a coisa julgada não são suficientes
para mantê-la de forma definitiva, porque a lei maior é que restou violada,
comprometendo assim o berço do próprio sistema jurídico. É o que nos ensina o
eminente Professor e Juiz Federal Paulo Roberto De Oliveira Lima[6],
quando conclui que “na quebra de braço entre a coisa julgada, de um lado, e
a legalidade e a isonomia, do outro lado, a primeira cede o passo às segundas”.

5.0 – O parágrafo único do artigo 741
do CPC e a possibilidade da desconstituição da Coisa Julgada via Ação de
Embargos à Execução.

Como já salientado, até antes da
inovação legal produzida pela inserção do parágrafo único ao artigo 741 do CPC,
o rol das hipóteses possíveis de serem alegadas pelo devedor em Embargos à
Execução era restrito a: a) falta ou nulidade de citação no processo de
conhecimento, se a ação lhe correu à revelia; b) inexigibilidade do
título; c) ilegitimidade das partes; d) cumulação indevida de execuções; d) excesso
da execução, ou nulidade desta até a penhora; e) qualquer causa impeditiva,
modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação
com execução aparelhada, transação ou prescrição, desde que supervenientes à
sentença; f) incompetência do juízo da execução, bem como suspeição ou
impedimento do juiz.

Com a inserção do parágrafo único ao
artigo 741, o legislador ordinário passou a entender como compreendido dentro
da hipótese firmada no inciso II do referido dispositivo legal – inexigibilidade
do título judicial – o vício de inconstitucionalidade superveniente da lei que
dava sustentação ao julgado objeto do processo executório.

É incontroverso que o título
executivo judicial, para poder encetar o procedimento executório precisa ser
dotado, dentre outras, da característica de exigibilidade, sem a qual restará
cerrada para o credor as portas daquela via juris- satisfativa. Essa
exigibilidade, que antes, se dava pela necessidade de estar vencido o débito
executado, passa agora a ser taxativamente afastada na hipótese prevista no
parágrafo único do artigo 741.

Isso porque, conforme nos ensina o
mestre Humberto Theodoro Júnior [7],
“a sentença que afronta a Constituição contamina-se de nulidade absoluta”,

não sendo capaz, portanto, de gerar nenhum efeito jurídico, sequer quando
embalada pelo subseqüente instituto da res judicata.

Cândido Rangel Dinamarco, precursor
e grande defensor da tese da “Relativização da Coisa Julgada” – em uma opinião
extremista – advoga inclusive que a sentença judicial fundada em lei
inconstitucional sequer seria capaz de atingir o status de coisa julgada
material, eis que “a irrecorribilidade de uma sentença não apaga a
inconstitucionalidade daqueles resultados substanciais, política e socialmente
ilegítimos que a Constituição repudia”.[8]

O sempre citado Humberto Theodoro
Júnior, por sua vez, na esteira do entendimento até aqui esposado, remata no
sentido de que “no Estado Democrático de Direito, não apenas a lei, mas
todos os atos do poder devem adequar-se aos padrões da ordem constitucional, de
sorte que a inconstitucionalidade pode acontecer também no âmbito dos
provimentos jurisdicionais”.[9]

Portanto, declarada a
inconstitucionalidade superveniente da lei que serviu de fundamento à
determinada sentença de mérito transitada em julgado, tal ato jurisdicional
pretérito torna-se nulo ipso iuris, sendo sua ineficácia insanável,
argüível a qualquer tempo e em qualquer processo, inclusive na ação incidental
de Embargos à Execução, vez que “assim como a lei inconstitucional é
irremediavelmente nula, também a sentença formalmente transitada em julgado não
tem força para se manter, quando prolatada contra a vontade soberana da
Constituição”[10]
.

Conclusão:

Conclui-se, portanto, que o
parágrafo único do artigo 741 do CPC, inserido pela M.P. 2180-35, de 24 de
agosto de 2001, encontra-se em perfeita sintonia com o ordenamento jurídico
pátrio, não havendo como taxá-lo viciado, seja em nível constitucional, por
meio da correta inteligência dos artigos 5°, inciso XXXVI c/c artigo 2° da
CF/88, seja em nível de legislação ordinária, porquanto já arraigado entre nós
o caráter relativo da coisa julgada material.

Outrossim, a sentença fundada em lei
posteriormente declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal é
maculada por vício insanável de nulidade absoluta, não podendo sobreviver no
ordenamento jurídico, podendo, pois, ser expurgada a qualquer momento,
inclusive após seu trânsito em julgado, quando da propositura da pertinente via
dos Embargos à Execução.

Nada obstante, como já salientado
alhures, resta aberto o espaço para eventuais discussões meta-jurídicas acerca
da efetiva eficácia social da nova norma em comento, haja vista que – não se
pode negar – tal inovação poderá, sim, provocar certa volatilidade e
insegurança nas relações jurídicas interpessoais.

 

Bibliografia:

CAMPOS, Ronaldo Cunha. “Limites
Objetivos da Coisa Julgada”. AIDE. 2ª Edição. Rio de Janeiro. 1.988.

DINAMARCO, Cândido Rangel.
“Relativizar a coisa julgada material” in Meio Jurídico, ano IV, n° 44, abril
de 2001.

HORTA, Raul Machado. “Estudos de
Direito Constitucional”. Del-Rey. Belo Horizonte. 1.995.

JÚNIOR, Humberto Theodoro. “Curso de
Jireito Processual Civil”. Volume 2. Forense. 32° edição. Rio de Janeiro, 2003.

LIEBMAN,
Enrico Tullio. “Eficácia e Autoridade
da Sentença e outros escritos sobre a coisa julgada”. Notas de Ada Pellegrini
Grinover. Forense. 3ª edição. Rio de Janeiro. 1.984.

LIMA, Paulo Roberto de Oliveira.
“Contribuição à Teoria da Coisa Julgada”. RT. São Paulo. 1.997.

OTERO, Paulo. “Ensaio Sobre o Caso
Julgado Inconstitucional”. Lex Edições Jurídicas. Lisboa. 1.993.

SANTOS,
Moacyr A. “Primeiras Linhas de Direito Processual Civil”, 3º.volume, Saraiva.
8ª.edição. São Paulo, 1985.

SILVA, José Afonso da. “Curso de
Direito Constitucional Positivo”. RT. 5ª Edição. 1.989.

SILVA, Ovídio A Baptista da.
“Sentença e Coisa Julgada”. Fabris. 2ª edição. Porto Alegre. 1.988.

ALVIM,
José Eduardo Carreira. Elementos de Teoria Geral do Processo Rio de Janeiro.
Forense, 2000.

SANTOS,
Ernane Fidélis dos. Manuel de Direito Processual Civil, volume 1.São Saraiva,
2002.

Notas:

[1] Cumpre-nos noticiar que a MP
2180-35 também acrescentou semelhante dispositivo no artigo 884, § 5° da
Consolidação das Leis Trabalhistas.

[2] A MP 2180-35 foi fruto de
repetidas reedições, as quais totalizaram mais de trinta e cinco, ao longo de
pouco mais de um ano, havendo a redação atual sido originária da MP 1984-17, de
04 de maio de 2000.

[3]
DINAMARCO, Cândido R. “Relativizar a coisa julgada material”. In Meio
Jurídico,
ano IV, n° 44, abril de 2001, pg. 23.

[4]
DINAMARCO, Cândido R. in Júris Síntese n° 33, Janeiro a Fevereiro de
2002.

[5] SILVA,
José Afonso, op. cit., p. 376.

[6] LIMA,
Paulo Roberto de O., In “Contribuição à Teoria da Coisa Julgada”.
RT. São Paulo, 1.997, pág. 106.

[7], JÚNIOR, Humberto Theodoro, op. cit.,.p.
274.

[8]
DINAMARCO, Cândido Rangel, op. cit., p.23.

[9] JÚNIOR,
Humberto Theodoro, op. cit., p.274.

[10] JÚNIOR, Humberto Theodoro, op.
cit.,
p.275

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Victor Hugo Cabral

 

advogado, Pós-graduado em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG).

 


 

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