Resumo: O presente estudo visa analisar a possibilidade de execução de um título executivo extrajudicial, a certidão de dívida ativa tributária, em sede de cartório, objetivando uma maior celeridade no processamento de tal título. Iremos verificar a constitucionalidade desta possibilidade, ante a legislação vigente e também os benefícios e efeitos deste tanto para a Fazenda como para o contribuinte devedor.
Palavras-chave: Certidão de dívida ativa; título executivo extrajudicial; protesto; direito tributário.
Abstract: This study aims to analyze the possibility of running an extrajudicial enforcement , the tax outstanding debt certificate in headquarters office, aiming at a greater speed in the processing of such title. We will check the constitutionality of this possibility , before the current legislation and also the benefits and effects of both the Treasury and to the debtor taxpayer.
Keywords: active debt certificate; extrajudicial execution; protest; tax law.
Sumário: Introdução; 2. Breves considerações sobre dívida ativa; 3. O crédito não pago e seu processamento; 3.1. A certidão de dívida ativa como um título executivo extrajudicial; 4. A constitucionalidade questionada do protesto em cartório; 4.1. A eficiência e celeridade; 5. Os efeitos para o contribuinte devedor; 6. Os benefícios do protesto para a fazenda.
INTRODUÇÃO
O presente artigo visa analisar a viabilidade jurídica do protesto da certidão de dívida ativa em cartório como sendo um mecanismo favorável ao descarregamento do sistema judiciário e sendo um modo eficiente para a Fazenda cobrar seus créditos inadimplentes.
O debate sobre este tema mostra-se de grande relevância jurídica, uma vez que, diante da falta de legislação que regulamente o protesto da certidão de divida ativa em cartório, temos uma divergência na doutrina a respeito de sua viabilidade.
Ao analisarmos mais cuidadosamente o tema, podemos esclarecer os diferentes posicionamentos da doutrina, analisando a constitucionalidade ou não dessa modalidade de protesto, visto que não possui legislação que a regulamente, mas por outro lado, também não há vedação legal.
Ao final desta análise procuramos esclarecer a viabilidade jurídica do protesto no cartório e se essa inovação poderia ajudar na redução do número de demandas judiciais de execução, já que a taxa de inadimplência é alta em nosso país e a execução judicial é um meio de cobrança oneroso e demorado.
O assunto tratado é de suma importância na atual situação econômica e política do Brasil, visto que com a alta da inflação e constante aumento dos produtos e serviços necessários, assim como de alguns tributos e impostos, verifica-se a possibilidade de cada vez mais o número de pessoas em débitos, não só com a Fazenda, mas também além desta, crescer, e assim teríamos um aumento de demandas judiciais de execução.
Ocorre que na maioria dos casos, a execução fiscal mostra-se ineficiente, pois de que adianta executar alguém se esta pessoa não tem como pagar, nem bens penhoráveis? E a partir deste pensamento o legislador inovou trazendo a questão do protesto do título de certidão ativa em cartórios, que iremos analisar cuidadosamente, a luz dos princípios constitucionais e seus efeitos para ambas as partes envolvidas.
A metodologia a ser aplicada neste estudo é bibliográfica, pois baseada em livros, artigos da internet, periódicos e consultas a legislação vigente.
Para que o objetivo deste estudo seja alcançado, o tema será desenvolvido em seis itens. Inicialmente será conceituada a dívida ativa. Analisaremos desde a concepção de um crédito não pago até o processamento desse título e suas especificidades. Iremos averiguar sua constitucionalidade diante os princípios constitucionais da eficiência e da celeridade. Observaremos os efeitos deste tipo de cobrança para o contribuinte devedor. Analisaremos também a questão da alta taxa de inadimplência e como o protesto em cartório poderia ajudar no alívio do sistema judiciário. Por fim veremos os benefícios dessa modalidade para a Fazenda.
2 – BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE DÍVIDA ATIVA.
Neste presente artigo iremos tratar especificamente sobre a dívida ativa tributária, aquela que quem tem capacidade e legitimidade para cobrar é a Fazenda Pública, pois nosso foco principal é a possibilidade deste crédito ser executado por vias cartorárias ou se deve respeitar única e exclusivamente o processamento expresso na lei número 6.830, de 22 de setembro de 1980[1], a execução fiscal.
Para o professor Anderson Madeira: “Podemos entender como dívida ativa tributária o título executivo extrajudicial da Fazenda Pública representativo de débito fiscal (tributo ou multa) vencido e não pago por parte do sujeito passivo”[2].
Interpretando o autor, podemos observar que não só a falta de pagamento de origem tributária leva à dívida ativa, mas também a inadimplência, por parte do sujeito passivo, de outros créditos, tais como multas de trânsito, dívidas trabalhistas, etc. O sujeito ativo dessa relação jurídica será sempre a Fazenda Pública (municipal, estadual ou da União), pois somente ela tem a legitimidade para cobrar um crédito tributário. (MADEIRA, 2014)
Para tentar amenizar os efeitos da inadimplência tributária da população e de empresas, a Corregedoria Nacional de Justiça possui um programa de renegociação de dívidas, onde o contribuinte devedor pode optar por descontos ou parcelamentos com condições diferenciadas. No Distrito Federal, por exemplo, o governo calcula a dívida ativa, o total a receber dos contribuintes, em 16 bilhões de reais, que são relativos a 340 mil ações fiscais de execução em trâmite na justiça local.[3]
3 – O CRÉDITO NÃO PAGO E SEU PROCESSAMENTO.
A partir do momento em que ocorre um fato gerador que enseje uma cobrança fiscal, nasce uma obrigação tributária: a de pagar um crédito, após o surgimento da obrigação tributária dá-se o lançamento desse crédito tributário e quando este crédito não é pago, o Fisco tem até cinco anos para cobrá-lo do contribuinte, caso em que, não o fazendo, este crédito incorrerá em prescrição e não mais poderá ser executado.
Porém quando não ocorre a prescrição do título, caso em que este não mais poderá ser cobrado pelo Fisco, o contribuinte tem duas opções a partir do momento do lançamento do crédito tributário: pagar ou não pagar. Quando ele paga, extingue-se a obrigação tributária e então ele quita sua dívida com o Fisco. Quando ele não paga, a Fazenda então transforma esse crédito tributário, administrativamente, em um título de dívida ativa, que posteriormente dará origem a uma certidão de dívida ativa, conforme o artigo 5° da Constituição Federal, inciso XXXIV, alínea “b”, que garante constitucionalmente o direito à obtenção de certidões.[4]
Antes da edição da medida provisória 577 de 2012, que deu origem à lei 12.767⁄12 [5], que incluiu o parágrafo único do artigo 1° da lei 9.492⁄97 [6], os títulos de dívida ativa possuíam um meio próprio e exclusivo de serem cobrados: a execução fiscal. A execução fiscal, regulamentada pela lei 6.830⁄90 [7], é o meio próprio da Fazenda Pública, federal, estadual, municipal ou distrital, de cobrar seus créditos.
A execução fiscal é um procedimento especial, pelo qual a Fazenda busca a satisfação de seus créditos, através do Poder Judiciário. O processo se inicia com a existência de um título executivo extrajudicial: a certidão de dívida ativa.
Ocorre que, grande parte das execuções fiscais, entendendo-se àquelas de valores menores, acabam sendo um meio pouco eficiente de cobrança para o Fisco, sendo pela morosidade do Judiciário, ou pelo alto custo processual, e por vezes o processo acaba sem resultado satisfatório, pois não raramente, quando o processo passa para a fase de penhora, o executado não possui bens penhoráveis.
O Instituto de Pesquisas Econômicas (IPEA) junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), realizou uma pesquisa, a qual fora apresentada em 29 de setembro de 2011 no I Encontro de Pesquisa Empírica em Direito, na Universidade de São Paulo (USP), em Ribeirão Preto, onde ficou constatado que o custo médio de um processo de execução fiscal é de R$ 4.300,00 (quatro mil e trezentos reais) e que esse tipo de processo demora em média mais de oito anos para ser concluso, porém o tempo que a Justiça efetivamente gasta com um desses processos é de pouco mais de dez horas.[8]
A partir da edição da medida provisória 577 em dezembro de 2012, surgiu a possibilidade de protestar a certidão de dívida ativa em cartório, objetivando dar maior celeridade ao processamento de cobrança de um crédito tributário e de diminuir custas com os processos de execução. Essa inovação, posteriormente foi regulamentada pela portaria número 17 da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, de 11 de janeiro de 2013.[9]
O protesto é definido pela própria legislação brasileira, sob a égide do artigo primeiro da lei 9.492⁄97 que nos diz: “Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida”.[10]
3.1- A certidão de dívida ativa como um título executivo extrajudicial
Os títulos executivos extrajudiciais são aqueles capazes de ensejar uma execução, e não oriundos de sentença transitada em julgado. Temos como exemplos de títulos executivos extrajudiciais, contratos de aluguel, cheques, duplicatas, letras de câmbio, notas promissórias, certidão de dívida ativa, dentre muitos outros.
Estão elencados na nossa legislação no artigo 784 do Código de Processo Civil, porém esse rol não é taxativo, como versa seu próprio inciso VIII: “todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva”.[11]
Os títulos extrajudiciais presumem certeza, liquidez e exigibilidade, o que faz com que dispensem a necessidade de se ingressar com uma ação de conhecimento comum para apurar se o autor realmente tem ou não direito. O possuidor de um título executivo extrajudicial tem então o direito de propor no judiciário uma ação de execução, desde que o título esteja vencido ou não adimplido.[12]
É justamente por essa presunção de certeza, liquidez e exigibilidade que a doutrina diverge sobre a possibilidade do protesto de certidão de dívida ativa em cartório. Parte da doutrina e jurisprudência[13] defende que este procedimento é completamente desnecessário e inútil diante do efeito de prova pré-constituída que a dívida regularmente inscrita possui, nos termos do artigo 204 do Código Tributário Nacional[14]. Questionam também sua constitucionalidade ante a falta de previsão legal expressa.
Por outro lado, como uma via de mão dupla, há posicionamentos doutrinários e jurisprudenciais[15] a favor do protesto de certidão de dívida ativa em cartório justamente pelo mesmo motivo: a falta de previsão legal expressa. Ora, a lei não regulamenta, mas também não proíbe. Argumentam além disso, alguns princípios jurídicos, como o da celeridade e eficiência processual.
Como podemos ver, existem posicionamentos diferentes dentro do próprio Superior Tribunal de Justiça a respeito da possibilidade ou não do protesto de CDA em cartório.
A certidão de dívida ativa como um título executivo extrajudicial, diferencia-se dos demais títulos dessa categoria por ser constituída unilateralmente, ou seja, a Fazenda mesmo emite e cobra esse título. O que não necessariamente enseja em sua inconstitucionalidade, porque, via de regra, o contribuinte devedor tem direito de defesa através de processo administrativo.[16]
4- A CONSTITUCIONALIDADE QUESTIONADA DO PROTESTO EM CARTÓRIO
Definitivamente esse é um ponto polêmico acerca das discussões sobre a possibilidade de se protestar uma certidão de dívida ativa em cartório. Desde a edição da medida provisória número 577[17], o próprio Superior Tribunal de Justiça mudou sua posição algumas vezes a respeito do tema, julgando de forma divergente.
Com o surgimento da medida provisória número 577, deu-se origem à lei federal 12.767/2012, e esta lei alterou o parágrafo primeiro do artigo 1 ° da lei 9.492/1997, dando assim, autorização expressa no rol de títulos passivos de protesto em cartório ao protesto de certidão de dívida ativa, em dezembro de 2012.
O artigo 25 da lei 12.767/2012 regulamentou expressamente o protesto de certidão de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas, como título sujeito a protesto em cartórios.
Ocorre que, mesmo com a expressa previsão legal, o debate acerca do tema não se pacificou, e a inconstitucionalidade ainda era questionada. Um dos argumentos diz respeito ao fato de que a lei 12.767/2012, que fora fruto de conversão da medida provisória 577⁄2012 juntamente com a medida provisória 579⁄2012, tinha por objetivo versar sobre a extinção das concessões de serviço público de energia elétrica, a prestação temporária de serviços nesta área e a intervenção para adequação do serviço público de energia elétrica.
Em 06 de junho de 2014, a Confederação Nacional das Indústrias, ingressou perante o STF uma ação direta de inconstitucionalidade[18] sobre o protesto de certidão de dívida ativa em cartórios. A entidade sindical de grau superior questiona o parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 9.492, de 10 de setembro de 1997, acrescentado pelo artigo 25 da Lei nº 12.767, de 27 de dezembro de 2012.
A nossa Constituição Federal de 1988, em seu artigo 103[19], elenca os legitimados a propor ação direta de inconstitucionalidade, e dentre eles, está as Confederações Nacionais. Vale ressaltar que para entendimento do Supremo Tribunal Federal, essa legitimidade é dividida em universais e especiais. Os legitimados universais são aqueles entes que possuem legitimidade ampla, ou seja, podem questionar a respeito de qualquer matéria, já os especiais classificam-se como os entes que possuem legitimidade vinculada à pertinência temática, ou seja, precisam de um nexo de causalidade entre a norma questionada e os interesses jurídicos que defendem.
Neste sentido, a seguinte decisão do STF:
“EMENTA: Agravo regimental em ação direta de inconstitucionalidade. Confederação dos Servidores Públicos do Brasil e Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte. Ausência de pertinência temática. 1. Não há pertinência temática entre o objeto social da Confederação Nacional dos Servidores Públicos do Brasil, que se volta à defesa dos interesses dos servidores públicos civis, e os dispositivos impugnados, que versam sobre o regime de arrecadação denominado de "Simples Nacional". 2. Agravo regimental a que se nega provimento.” (ADI-AgR 3906/DF. Relator(a): Min. Menezes Direito. Julgamento: 07/08/2008)[20]
Diante disso, não há o que se falar sobre ilegitimidade do polo ativo, pois a requerente enquadra-se no rol dos legitimados do artigo 103, inciso IX da Constituição Federal de 1988, além de representar as sociedades empresárias industriais e os empresários, os quais possuem ou supostamente possuem débitos com o Fisco, e que portanto, são passíveis de discussão, assim comprovando-se o nexo de causalidade entre a norma a ser questionada e os interesses jurídicos defendidos por esta entidade.
Em sua petição inicial, a Confederação Nacional da Indústria alega a existência de vícios formais e materiais, pertinentes a inconstitucionalidade da norma impugnada. Como vício formal entende-se àquele que conflita com a competência e em desacordo com as normas constitucionais; e como vício material àquele cuja matéria conflita com temas já tratados constitucionalmente.
A requerente da ação direta de inconstitucionalidade defende como vício formal o fato de que a regulamentação do protesto de certidão de dívida ativa é matéria estranha àquela que deveria ser originalmente tratada na medida provisória 577, que se destinava a tratar sobre os serviços de energia elétrica, e que assim estaria violando o devido processo legislativo contido nos artigos 59 e 62 da Constituição Federal de 1988. Tutela também que o referido artigo 25 da lei 12.767/2012 atenta ao princípio da separação dos poderes (artigo 2° da Constituição Federal de 1988) pela falta de sintonia com o tema da medida provisória 577. Neste sentido, já se posicionou a Suprema Corte na Ação Direta de Inconstitucionalidade com Pedido De Cautelar 1.050-6, Santa Catarina – SC, Relator Ministro Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgado em 21.09.1994.[21]
No que tange ao vício material, a Confederação Nacional da Indústria argumenta que tal modalidade seria um “artifício extrajudicial para pressionar os devedores ou supostos devedores do Fisco a quitar os seus débitos, apesar de a Fazenda já dispor de meios judiciais especiais e próprios para esse fim”[22]. Assim, com o eventual protesto, a consequência para o devedor ou suposto devedor é o abalo de crédito, coagindo-o a pagar sua dívida, pois uma vez tornada pública sua impontualidade de pagamentos, seu nome passa a constar dos cadastros de proteção ao crédito, funcionando como elemento de pressão.
O principal objetivo do protesto constata-se na necessidade de um meio de prova de um ato jurídico, um contrato por exemplo, celebrado entre duas ou mais partes, credor(es) e devedor(es),constituindo um título oficial, público e solene que gere uma exigência do cumprimento de suas obrigações. (REQUIÃO,2008).[23]
Ainda no que tange o alegado vício material de inconstitucionalidade, defende a existência de um protesto genérico, o qual teria por objetivo única e exclusivamente dar publicidade à inadimplência do devedor de títulos de dívidas em geral, coagindo-o assim, a pagar seus débitos o mais rápido possível diante do empasse de crédito que lhe é imputado, funcionando assim como um mecanismo de pressão.
Alegando em matéria de inconstitucionalidade direta de sua utilização pelo Fisco, a Confederação traz como argumentos a presunção de liquidez e certeza que já possui o título de dívida ativa, conforme o artigo 204 do Código Tributário Nacional[24]. Para defender a inconstitucionalidade deste tipo de protesto, trás também o pressuposto de que este teria como única finalidade, a coação de cobrança, revelando assim um tipo de sanção política ao devedor. [25]
Por outro lado, defendendo a constitucionalidade do protesto de certidões de dívida ativa, vários doutrinadores e operadores de direito posicionam-se a favor dessa medida, considerando-a razoável, viável e justa, não sendo cabível o argumento de violação a preceitos constitucionais. Além do mais, encontra-se em perfeita sintonia com a tendência de solução de problemas por vias alternativas, e a consequente redução do número de processos no judiciário, principalmente nos casos de dívidas pequenas que demorariam tempo demais para serem cobradas pelo método tradicional da execução fiscal e que ao final poderiam restar-se custosas demais para a Fazenda.
Neste sentido, Sávio Luiz Oliveira Ramos: “O protesto extrajudicial de certidão de dívida ativa é meio idôneo à recuperação dos créditos da Fazenda Pública, não havendo motivo para se pretender expurga-lo do mundo jurídico mediante a declaração da sua inconstitucionalidade, como se busca na ADIN número 5.135”[26]
4.1- A eficiência e a celeridade
Em se tratando da constitucionalidade da norma questionada, não há como defendê-la sem tocar no que tange aos princípios constitucionais da eficiência e da celeridade, que são princípios basilares de uma relação processual, e que encontram-se em perfeita sintonia com o protesto das certidões de dívidas ativa em cartórios, visto que o objetivo de tal medida é a maior eficiência na cobrança de débitos perante a Fazenda, paralela ao crescimento das vias alternativas ao judiciário.
O princípio da eficiência, embora alguns doutrinadores defendessem que ele sempre esteve implícito na Constituição, surgiu expressamente com o advento da
Emenda Constitucional n° 19 de 04 de junho de 1998[27], e é classificado como um princípio da administração pública.
Nas palavras de Rosalliny Pinheiro Dantas: “Surgiu como resposta não apenas à burocratizada estrutura administrativa brasileira, mas também à necessidade que apresentou de se adequar aos novos parâmetros de organização e prestação de serviços que a política de desestatização veio a requerer.”[28]
Já o princípio da celeridade, veio à Constituição através da Emenda Constitucional n° 45 de 08 de dezembro de 2004, que trouxe o artigo 5° inciso LXXVIII[29]. É tido como uma garantia fundamental devido aos fundamentos do Estado Democrático de Direito.
A razoável duração do processo, também não foi considerada como uma inovação, pois já podia ter seu conceito extraído de outros princípios constitucionais, como por exemplo, o da eficácia, do devido processo legal e da economia processual. O prestação jurisdicional rápida e eficiente, garante a sensação de justiça, como dizia Rui Barbosa[30]: “Justiça que tarda é sempre falha”.
A Emenda Constitucional 45, que veio a trazer expressamente o princípio da razoável duração processual (celeridade), surgiu como forma de criticar o formalismo exacerbado dos processos e por fim a qualquer tipo de dúvida ou questionamento a respeito da aplicabilidade desse princípio, que já era implícito. Além de que, revela-se uma crítica do legislador as medidas protelatórias do judiciário, e uma preocupação com o devido processo legal, para assim garantir o acesso à justiça, e que esta seja justa para ambas as partes.[31]
Estamos passando por um momento na esfera judiciária em que se busca uma melhora da prestação jurisdicional pelo Estado. No decorrer dos anos, a imagem da justiça no Brasil vem sendo arranhada por questões relativas à demora no trâmite dos processos, do descaso de alguns servidores, e até mesmo pela dificuldade de se conseguir assistência jurídica, no caso da população mais carente. Para isso a busca por soluções mais práticas, funcionais e menos onerosas tem sido constantes, o uso de vias extrajudiciais como, por exemplo, as mediações de conflitos e arbitragem, tem se tornado cada vez mais uma realidade presente.
Os princípios da eficiência e da celeridade se encaixam perfeitamente no protesto de certidão de dívida ativa em cartório, por este ser um mecanismo de maior alcance de uma boa prestação jurisdicional para ambos os lados, pois tanto a Fazenda quanto o contribuinte tem a chance de resolver a questão da dívida tributária mais rapidamente.
Podemos enquadrar claramente a prática do protesto de certidões de dívida ativa em cartórios nesse momento, além dessa prática de encaixar perfeitamente com os princípios da eficiência e celeridade, e constituir um mecanismo de maior alcance de uma boa prestação jurisdicional, está também de acordo com a tendência atual de busca por soluções extrajudiciais menos onerosas e demoradas.
5- OS EFEITOS PARA O CONTRIBUINTE DEVEDOR
Como já fora mencionado, o principal empecilho hoje em dia da execução fiscal é a falta de condições pecuniárias ou de bens penhoráveis do contribuinte-devedor para quitar suas dívidas tributárias. Isto sem entrarmos no mérito da fraude a execução, que ocorre quando o executado ao longo do curso do processo, valendo-se de má-fé e aproveitando-se inclusive da morosidade do processo, vai se “desfazendo” de seus bens ou passando-os para nomes de terceiros, afim de ao chegar a etapa final da execução este encontrar-se insolvente, e assim não arcar com o devido pagamento de seus débitos tributários. Mas este não é o foco do nosso artigo, aqui falaremos dos contribuintes-devedores de boa-fé, aqueles que realmente não possuem condições de efetuar o pagamento ao final de uma execução fiscal.
Antes do advento da lei 12.767/2012, que alterou o parágrafo primeiro do artigo 1 ° da lei 9.492/1997, o contribuinte-devedor sofria apenas com a inscrição de seu nome no Cadastro Informativo de Créditos não Quitados (Cadin) do Setor Público Federal, e com isso ficava impedido de contratar empréstimos em bancos públicos.
Agora, como principal efeito do protesto em cartório para os devedores temos a inclusão do nome do devedor nos cadastros nacionais de associações de proteção ao crédito, como o SERASA e o SCPC. Esta inclusão se dá por meio de informações enviadas diariamente pelos Tabelionatos de Protestos de todo o país. Assim, todas as certidões de protesto emitidas por cartórios constarão negativas, enquanto o devedor não quitar sua dívida.
Nos tabelionatos de protesto, esta informação a respeito do devedor não prescreve jamais, somente na hipótese de pagamento da dívida com o consequente cancelamento do protesto, fora isso, o devedor tem um eterno vínculo com o credor a respeito de sua inadimplência. Porém nos cadastros de proteção ao crédito, essa negativação perdurará por no máximo 5 (cinco) anos, que é o prazo prescricional previsto em lei no artigo 174 do Código Tributário Nacional.[32]
A partir do momento que o devedor tem seu nome negativado e incluso nos cadastros nacionais de proteção ao crédito, ele passa a enfrentar algumas dificuldades e até impedimentos no seu dia-a-dia como, por exemplo, constrangimentos na hora de realizar pagamentos com cheques, além da restrição para a retirada de talões junto à sua agência bancária, restrições creditícias como financiamentos, leasing e demais operações de crédito e crediários, impossibilidade de concessão de crédito imobiliário governamentais como o do programa “Minha casa, Minha vida”, dentre outros, podendo até chegar a ter sua conta corrente no banco excluída.[33]
É nesse momento que o efeito e o objetivo do protesto em cartório das certidões de dívida ativa se encontram, o contribuinte-devedor que se encontra diante desta situação de ter seu nome negativado, impedido de constituir crédito na praça, vê a necessidade prima de quitar seu débito perante a Fazenda, para poder voltar a constituir crediários e ter seu nome “limpo” novamente.
O contribuinte-devedor que quiser quitar seu débito com a Fazenda Pública e “limpar” seu nome, ou seja, retirá-lo dos cadastros de restrições creditícias, após ter o protesto lavrado em cartório deve emitir um DARF (Documento de Arrecadação de Receitas Federais) para efetuar o pagamento da certidão de dívida ativa perante a rede bancária, porém como a informação do pagamento pode levar até cinco dias úteis para ser repassada para a Receita Federal, é recomendado que a partir do sexto dia útil após o pagamento que o contribuinte dirija-se ao cartório de títulos para efetuar o pagamento dos emolumentos cartorários e assim requerer o cancelamento do seu protesto. [34]
6- OS BENEFÍCIOS DO PROTESTO PARA A FAZENDA.
Como um importante efeito a respeito do protesto em cartório das certidões de dívida ativa, temos a segurança jurídica trazida por este, pelo fato de que o Instrumento de Protesto (comprovante do protesto do devedor), torna-se mais um documento a ser utilizado (além da própria certidão) em um processo de execução, e constitui também o respaldo necessário no caso de uma posterior ação de danos morais interposta pelo devedor, com fulcro no artigo 1°, inciso I da portaria n.º 5 da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça[35], visto que o Instrumento de Protesto é previsto na lei nº 9.492 ⁄97[36] e com isso cumpre o papel da necessidade de comprovação prévia, pois estes são enviados com aviso de recepção (AR) via Correios, ou entregues pessoalmente por oficiais cartorários.[37]
Como importante ponto positivo para a Fazenda, está a eficácia. A rápida recuperação de créditos vencidos e não pagos pelos contribuintes-devedores é notória. A viabilidade do protesto em cartório veio em boa hora e em atento a atual tendência de busca de vias alternativas ao judiciário.
Segundo a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, cerca de 30% dos créditos protestados em cartório são quitados em até três dias após a notificação[38], isto se dá por conta do efeito do protesto, que é a restrição de crédito. Com isso, a Fazenda economiza movimentar a máquina do Judiciário, e também economiza tempo e dinheiro.
Outro grande ponto positivo do protesto em cartório para a Fazenda é a gratuidade deste, já que os emolumentos cartorários devem ser pagos pelo devedor. Uma pesquisa realizada pelo IPEA calculou que em média, um processo de execução fiscal custa R$ 4.368,00 (quatro mil trezentos e sessenta e oito reais) para os cofres públicos. [39]
Enquanto isso, com o teto máximo estabelecido pela portaria 429 de 04 de junho de 2014[40] da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), digamos que um contribuinte protestado queira pagar sua dívida, estabelecida nesse valor máximo, este irá pagar, além, claro de sua dívida tributária, o valor a títulos de emolumentos cartorários para cancelar seu protesto, de R$ 1.831,08 (mil oitocentos e trinta e um reais e oito centavos). Ou seja, até para o contribuinte-devedor esta conta sai mais barata, pois com certeza ele gastaria muito mais com sua defesa e honorários advocatícios no caso de uma execução fiscal.
Não podemos deixar de citar também a característica educadora do protesto, pois é sabido que numa escala de prioridades, as dívidas com o poder público são deixadas por último, justamente pelo fato dos devedores saberem que estas levam tempo para serem cobradas. O protesto em cartório além de retirar da sociedade os custos com inúmeras execuções fiscais, evita a bola de neve da inadimplência, que vai se formando conforme os devedores percebem que as dívidas não são cobradas, além de tornar-se um meio eficaz para os municípios, estados e o distrito federal de aumentarem suas arrecadações, e assim poderem investir na própria sociedade, investindo em segurança e educação por exemplo.
Por último e não menos importante, obsta observarmos a tendência de reduzir a sobrecarga do judiciário que esta medida torna capaz. Este meio extrajudicial de cobrança reduz imensamente o número de processos de execução fiscal, principalmente os de baixo valor, que demoram o mesmo tempo para se chegar a uma sentença, mas que nem sempre acabam efetivamente sendo um meio eficaz de cobrança.
O protesto em cartório de certidões de dívida ativa segue a tendência de busca por soluções extrajudiciais de resolução de conflitos e por se encontrarem em plena sintonia com os princípios constitucionais da eficácia, celeridade, dentre muitos outros, ganha cada vez maior visibilidade no cenário jurídico do Brasil, por todos os benefícios que proporciona ao Poder Público, visando uma melhor prestação jurisdicional à todos.[41]
CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Diante do exposto, conclui-se que o protesto de dívida ativa da Fazenda, seja ela Federal, Estadual, municipal ou distrital, por não infringir nenhuma regra da Constituição nem ferir preceitos e princípios constitucionais, encontra-se em perfeita sintonia e viabilidade com o atual momento do nosso poder judiciário.
Há atualmente uma tendência por buscar soluções extrajudiciais viáveis e que ao mesmo tempo passe a segurança esperada ao cidadão que precise do Estado moderador. Seguindo esta linha de pensamento, e diante de um momento em que o judiciário encontra-se assoberbado e oferecendo longas esperas pelo julgamento de uma demanda, o protesto em cartório se posiciona como uma solução rápida e acessível para a discussão de causas tributárias desse tipo.
Além do mais, diante dos casos expostos e pesquisas concretas sobre a eficácia desta modalidade do protesto, mostraram-se plenamente satisfatórios os resultados obtidos, no que tange a rapidez e eficácia do método de cobrança, além de ser extremamente menos oneroso em matéria de desgaste processual, relativos a tempo e custas monetárias.
Com o presente estudo podemos criar uma análise social, além da jurídica sobre o protesto de certidões de dívida ativa, pois esta se enquadra num tempo em que estamos evoluindo no que diz respeito a imagem do sistema judiciário, que ao ponto de vista da população em geral, está desgastada diante de tanta morosidade. Os novos métodos extrajudiciais de solução de conflitos vem contribuindo para que esse jogo possa ser virado.
Os protestos de certidões de dívida ativa, demostram-se plenamente constitucionais e passíveis de gerar segurança jurídica aliada a uma boa dose de rapidez, fazendo com que os contribuintes tenham acesso direto a sua situação atual junto aos cadastros de proteção ao crédito e também possibilitando-os de efetuar o pagamento e regularizar sua situação de uma maneira mais rápida e simples, junto aos próprios cartórios.
Informações Sobre o Autor
Ana Carolina Fragoso
Advogada pós-graduando em direito tributário e contabilidade tributária pelo IBMEC-Rio