Resumo: O presente trabalho consiste em um breve estudo acerca do conceito e da importância do procedimento de “due diligence” nos negócios empresariais, visando antever os riscos inerentes aos negócios jurídicos, sejam eles de caráter tributário, trabalhista, ético, dentre outros, a fim de reduzir as possibilidades de problemas futuros que maculem a imagem e a saúde financeira da empresa. Os mecanismos de due diligence têm sido cada vez mais adotados pelas grandes organizações, tendo em vista sua importância para evitar falências e/ou grandes perdas patrimoniais futuras em virtude de passivos trabalhistas, tributários ou atos de corrupção que degrinam a imagem e a subsistência econômica das organizações. Veremos, portanto, as formas de due diligence, os momentos em que mais é utilizado e a sua importância para a segurança nas transações empresariais.
Palavras-chave: Due diligence. Negócios empresariais. Prevenção de riscos.
Abstract: This work consists of a brief study about the concept and importance of the due diligence procedure in the corporate business, aiming at anticipating the inherent risks of legal business, be they tax, labor, ethical, among others, in order to reduce the potential for future problems that tarnish the company's image and financial health. Due diligence mechanisms have been increasingly adopted by large organizations, in view of their importance in avoiding bankruptcies and / or major future losses due to labor liabilities, tax liabilities or acts of corruption that degrade the image and economic subsistence of organizations. We will see, therefore, the forms of due diligence, the times when it is most used and its importance for security in business transactions.
Súmário: Introdução. 1. Conceito e Tratamento Jurídico. 2. Formas mais comuns de due diligence. 3. A importância do due diligence nos negócios empresariais. Conclusão. Referências Bibliográficas.
Introdução
Com a evolução das tecnologias da comunicação e de transporte, foram intensificadas as transações empresariais, mudando a concepção tradicional de empresa, de modo que as organizações passaram a formalizar negócios jurídicos cotidianamente com outras organizações e parceiros, o que gerou o aumento dos riscos dos empreendimentos.
Deste modo, reveste-se de especial importância a adoção de mecanismos e métodos de detecção prévia de tais riscos, através de estudos técnicos e minuciosos por equipes especializadas, a fim de reduzi-los ao máximo, evitando graves problemas futuros que possam comprometer a subsistência das organizações.
Nesse contexto, surgiu e ganhou destaque o denominado “due diligence”, que compreende esses mecanismos de prevenção de riscos empresariais no âmbito dos negócios empresariais, tendo em vista os vultosos aportes de recursos envolvidos nas operações das empresas na atualidade.
Portanto, o presente estudo, sem qualquer pretensão de esgotar o tema ou de trazer uma verdade absoluta sobre o assunto, visa analisar o conceito e a origem do “due diligence”, bem como as suas formas mais utilizadas pelas organizações na atualidade, além de identificar alguns aspectos que demonstrem sua importância na garantia de maior segurança às empresas no âmbito dos negócios jurídicos que formaliza. Contudo, frise-se que se trata tão somente de um debate inicial sobre o tema, com vistas a fomentar a discussão sobre este fenômeno em verdadeira crescente no mundo jurídico.
1. CONCEITO E TRATAMENTO JURÍDICO DO “DUE DILIGENCE”
O fenômeno da globalização, intensificado pela intensa difusão das tecnologias de comunicação e transporte, gerou o aquecimento das transações empresariais, tais como fusões, cisões, parcerias, incorporações, aquisições, dentre outras, aumentando a fluidez e, consequentemente, os riscos dos empreendimentos.
Antigamente, as empresas eram normalmente constituídas por uma família, passando de geração a geração, com sede fixa e com a manutenção de suas tradições durante longos anos, evitando transações de risco, com o simples intuito de se manter no mercado, por sua qualidade e tradição. Mas, atualmente, em virtude das facilidades apresentadas pelas tecnologias da comunicação e do transporte, as empresas passaram a intentar novos horizontes, com o anseio de expansão transnacional, passando a instituir filiais em diversos países de diferentes continentes, adquirir empresas de outros ramos, fundir-se com outras organizações em busca de ampliar seu mercado consumidor, sendo constantes as mutações empresariais noticiadas na mídia.
Este cenário de fluidez e mutações frenéticas, em que ao adquirirmos um produto é comum que não saibamos que ele advém de uma mesma indústria do produto concorrente que deixamos de comprar após comparação do custo-benefício, trouxe consigo, também, vultosos riscos às organizações empresariais, vez que, a partir do momento em que formalizam um negócio empresarial com determinada empresa, passam a se responsabilizar pelos atos desta, podendo, inclusive, ter seu patrimônio jurídico, econômico e moral atingidos por passivos já existentes.
Nesse contexto, as empresas passaram a sentir a necessidade de mecanismos que busquem identificar tais riscos, estudando a vida pregressa da organização com a qual vão se relacionar, como a eventual existência de passivos trabalhistas, tributários, ambientais, bem como outros fatores relacionados, por exemplo, à propriedade intelectual e/ou industrial, que possam lhes trazer prejuízos futuros.
Conforme salientado por Gustavo Escobar (2008), “em razão disso, temos a disseminação de uma expressão de origem inglesa que, muitas vezes, não é compreendida corretamente, merecendo, mais do que traduzida, ser exemplificada para que se contextualize sua aplicabilidade”.
Convém destacar que o due diligence não é previsto na legislação pátria nem mesmo na estrangeira, consistindo em uma construção advinda da prática empresarial e dos estudiosos e atuantes do Direito Empresarial. Trata-se de uma expressão inglesa que, pela tradução literal para o português, significaria “diligência devida” ou “diligência prévia”.
Em vista da ausência de doutrina sedimentada sobre o tema, podemos trazer à baila o conceito apresentado pelo sítio eletrônico “wikipédia”, segundo o qual due diligence significa diligência prévia e “refere-se ao processo de investigação de uma oportunidade de negócio que o investidor deverá aceitar para poder avaliar os riscos da transação. Embora tal investigação possa ser feita por obrigação legal, o termo refere-se normalmente a investigações voluntárias”.
Em síntese, podemos concluir que due diligence constitui um conjunto e mecanismos, métodos, diligências de investigação que a organização empresarial executa com vistas a identificar, avaliar, mensurar e, com isso, evitar ou minimizar os riscos inerentes às transações e negócios empresariais que realiza. Aliás, conforme bem disse Galileu Galilei certa vez: “Todas as verdades são fáceis de perceber depois de terem sido descobertas; o problema é descobri-las”.
2. FORMAS MAIS COMUNS DE “DUE DILIGENCE”
Os atos de due diligence permeiam diversas áreas do Direito, envolvendo diferentes setores da organização empresarial e suas numerosas áreas de atuação. As diligências realizadas pela equipe especializada nessas atividades exigem expertise técnica em diferentes áreas do conhecimento, envolvendo direito do trabalho, direito empresarial, direito tributário, contabilidade, legislação de propriedade intelectual e industrial, direito ambiental, dentre outros.
Deste modo, a equipe a ser formada para a realização do due diligence deve ser multidisciplinar, reunindo diferentes saberes, e deve focar os seus esforços nas áreas que apontem maiores riscos para aquele determinado empreendimento, otimizando a sua atuação a garantindo maior eficiência no seu trabalho. Como exemplo, podemos mencionar uma empresa que atua com elementos de alto grau tóxico, a qual apresenta elevados riscos de poluição e degradação ambiental, os quais devem receber maior atenção e relevância pela equipe que realiza o due diligence. Por outro lado, uma empresa que atua apenas na atividade inventiva, sem relevantes repercussões no meio ambiente, deve ter seu foco em questões de propriedade industrial e intelectual, dispensando menor esforço nas questões ambientais.
Isso demonstra que o due diligence não possui uma receita fechada de aspectos a serem analisados e diligências a serem colocadas em prática, vez que depende da área de atuação da organização sob exame, da quantidade de empregados, da modalidade de empresa em que foi constituída, dos impostos incidentes sobre suas atividades e, ainda, do grau de impacto ambiental decorrente de suas operações.
2.1. Due diligence trabalhista
As diligências investigativas no âmbito trabalhista têm por objetivo identificar e mensurar as contingências trabalhistas do parceiro em potencial ou da empresa que se pretende adquirir ou incorporar, analisando se possui grande passivo trabalhista, se deixa(va) de cumprir obrigações previstas na legislação trabalhista, se há ou havia naquela organização práticas que podem ensejar reclamações de assédio moral, jornada extraordinária não paga na forma devida, contratação irregular e/ou fraudulenta de colaboradores e etc., que demonstrem risco de futura responsabilização.
Sabe-se que, diante do fenômeno da sucessão de empregadores, prevista nos arts. 10, 448 e 448-A da CLT, a empresa que adquire, incorpora ou resulta de fusão de outra empresa é considerada, para fins trabalhistas, como sucessora e responde por todas as obrigações trabalhistas da empresa sucedida, inclusive as contraídas à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida.
Desta forma, é de especial importância que, antes de concluir uma transação empresarial como as mencionadas acima, a organização realize diligências que visem identificar a existência dessas obrigações trabalhistas, ainda que em potencial, analisá-las e quantificá-las economicamente, a fim de se precaver e avaliar se poderão comprometer a saúde econômica, jurídica e moral da empresa sucessora. Inclusive, os resultados das diligências investigativas poderão servir de parâmetros para a negociação dos valores pagos no negócio jurídico, de acordo com os riscos envolvidos.
Cumpre destacar que, conforme mencionado acima, os riscos avaliados devem ser analisados não apenas no tocante às questões financeiras e econômicas da empresa, mas também em relação à sua imagem perante a sociedade, vez que, na atualidade, o nome e a imagem das organizações ganham cada vez mais importância no mercado consumidor e no cenário internacional, de modo que o descrédito perante a sociedade pode levar a quedas bruscas no mercado internacional de ações e de consumo, resultando muitas vezes na própria falência da empresa.
2.2. Due diligence tributário
Outra importante forma de due diligence consiste em medidas investigativas no âmbito tributário e fiscal da empresa com a qual se pretende negociar. Com efeito, as tecnologias empregadas pelos Estados na investigação de operações com repercussão tributária, cruzando dados de diversas origens, estão cada vez mais evoluídas e precisas, tornando-se cada dia mais arriscada a sonegação fiscal.
A fiscalização tributária e fiscal mostra-se cada vez mais severa, com a imposição de vultosas multas contra os sonegadores, de modo que, na formalização de um negócio empresarial, é de estrema necessidade que a empresa adote medidas acautelatórias que visem identificar possíveis débitos tributários, ainda que em potencial, a fim de avaliar as possíveis repercussões financeiras, jurídicas e morais à empresa.
Devem ser analisados, portanto, o cumprimento das obrigações tributárias, principais e acessórias, as práticas organizacionais no tocante à correta emissão de notas fiscais, os tributos normalmente incidentes sobre a atividade desempenhada pela empresa, dentre outros aspectos, que visem minimizar problemas futuros, e evitar surpresas desagradáveis.
2.3. Due diligence ambiental
Atualmente, a preservação do meio ambiente tem ocupado posição de destaque na quase totalidade dos debates e estudos nacionais e internacionais. A preocupação com a perpetuação dos recursos ambientais tem exigido dos Estados uma atuação severa na fiscalização de atividades lesivas ao meio ambiente, ainda que potencialmente, com vistas a evitar danos ambientais e/ou exigir a sua indenização ou reparação, se possível.
As atividades potencialmente poluidoras do meio ambiente recebem cada dia mais a atuação dos fiscais, exigindo procedimentos e análises técnicas de diversas modalidades, a fim de evitar ao máximo a ocorrência de danos ao meio ambiente, os quais geram repercussão a toda a sociedade presente e futura.
Deste modo, a legislação ambiental pátria qualifica as obrigações ambientais como “propter rem” (art. 2º, §2º, Lei 12.651/2012), isto é, obrigações que acompanham o bem para quem quer que seja transferido, de modo que, ao adquirir um bem ou um empreendimento, o adquirente deve efetuar diligências minuciosas a fim de analisar possível existência de obrigações ambientais, vez que será totalmente responsável por elas.
Assim, previamente à formalização dos negócios empresariais, devem as organizações realizar o due diligence ambiental, a fim de identificar possíveis obrigações decorrentes da legislação ambiental, ou ainda danos já praticados ao meio ambiente, que poderão lhes gerar graves prejuízos futuros, colocando em risco a subsistência da empresa.
CONCLUSÃO
O tema que envolve o due diligence, embora relativamente novo nos debates jurídicos, vem recebendo cada dia mais destaque no mundo empresarial, nacional e internacional, vez que, com o cenário da globalização que encurtou as distâncias e permitiu a expansão transnacional das organizações empresariais, foram intensificadas as transações entre as empresas, sendo corriqueiras as notícias de fusões, incorporações, parcerias e aquisições entre as empresas.
Com isso, também houve o incremento dos riscos inerentes aos empreendimentos, vez que toda forma de ampliação, alteração, diversificação empresarial envolve inúmeros riscos trabalhistas, tributários, ambientais, dentre outros, que podem resultar em responsabilização da empresa.
Assim, tais riscos devem ser necessariamente estudados previamente, buscando a sua prévia identificação, quantificação, avaliação e análise, a fim de minorar os prejuízos futuros e evitar surpresas desagradáveis que possam comprometer a saúde econômico-financeira, jurídica e moral das empresas envolvidas nas operações.
Informações Sobre o Autor
Rayssa Sousa Kuhn
Analista Processual do Ministério Público do Trabalho. Graduada em Direito pela Universidade Federal de Goiás Campus Goiânia. Pós-Graduada em Direito Constitucional Aplicado pela Faculdade Damásio de Jesus. Pós-Graduada em Direito Notarial e Registral pela UNIDERP – Universidade Anhanguera