Federalismo municipal e o desafio da gestão tributária eficiente

Resumo: O presente estudo se propôs a analisar alternativas para que se alcance a eficiência na gestão tributária municipal. Isso porque, o federalismo brasileiro foi um dos pioneiros ao elevar o Município à condição de ente federal autônomo, dotado de capacidade de auto-organização, autoadministração e autogoverno. Para tanto, a própria Constituição Federal de 1988 atribui aos Municípios a competência tributária para instituir e arrecadar determinados tributos, de forma a possibilitar que estes entes exerçam tal atribuição constitucional. Todavia, mesmo contando com fontes de receitas diversas, nem sempre os gestores municipais conseguem alcançar a eficiência na gestão dos seus recursos tributários.

Palavras-chaves: Federalismo. Competência tributária. Gestão tributária.

Abstract: The present study proposed to analyze alternatives for achieving efficiency in municipal tax management. This is because Brazilian federalism was one of the pioneers in elevating the Municipality to the condition of autonomous federal entity, endowed with the capacity of self-organization, self-administration and self-government. For this purpose, the Federal Constitution of 1988 attributes to municipalities the tax jurisdiction to institute and collect certain taxes, in order to enable these entities to exercise such constitutional attribution. However, even with diverse sources of income, municipal managers are not always able to achieve efficiency in the management of their tax resources.

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Key-words: Federalism. Tax jurisdiction. Tax management.

1. Introdução

A organização político-administrativa brasileira possui na Forma de Estado Federal a sua referência, tendo como uma de suas características a descentralização do poder, o qual se encontra distribuído entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, de forma a não haver hierarquia ou subordinação entre estes, mas sim autodeterminação de cada um.

No intuito de assegurar essa autonomia, a CF88 reparte competências e atribuições a cada um dos entes federativos, tanto de forma vertical, ou seja, quando há uma relação de hierarquia entre essas competências, quanto de forma horizontal, ou seja, no mesmo plano hierárquico, destinadas a manter o equilíbrio da federação.

Na lição do Ministro Gilmar Mendes:

“Na repartição horizontal não se admite concorrência de competências entre os entes federados. Esse modelo apresenta três soluções possíveis para o desafio da distribuição de poderes entre as órbitas do Estado Federal. Uma delas efetua a enumeração exaustiva da competência de cada esfera da Federação; outra, discrimina a competência da União deixando aos Estados-membros os poderes reservados (ou não enumerados); a última, discrimina os poderes dos Estados-membros, deixando o que restar para a União. Na repartição vertical, realiza-se a distribuição da mesma matéria entre a União e os Estados-membros. Essa técnica, no que tange às competências legislativas, deixa para a União os temas gerais, os princípios de certos institutos, permitindo aos Estados-membros afeiçoar a legislação às suas peculiaridades locais. A técnica da legislação concorrente estabelece um verdadeiro condomínio legislativo entre União e Estados-

Membros”. (MENDES, Gilmar Ferreira, 2015, pg.816)

Esse modelo federalista centrífugo brasileiro[1] destaca-se por conceder ao Município o título de ente federativo, igualando-o aos demais e garantindo-lhe autonomia financeira, administrativa e política para sua própria gestão interna, inclusive elencando no próprio texto constitucional as competências e atribuições municipais.

Não obstante esse status ao qual o Município foi elevado, as suas receitas próprias e derivadas não foram suficientes para garantir uma gestão pública eficiente, tampouco seus recursos tributários, que muitas das vezes sequer são regulamentados em âmbito municipal e, quando o são, padecem de uma

Assim, o presente tem por escopo analisar o modelo federalista brasileiro e a autonomia dada aos Municípios (capítulo 2) e, consequentemente, as competências constitucionais atribuídas ao ente municipal para concretizar essa autonomia (capítulo 3), inclusive na instituição dos seus tributos, e de que forma essa autonomia influencia na gestão pública municipal (capítulo 4), tudo para alcançar a eficiência na gestão tributária municipal (capítulo 5).

2. O modelo brasileiro de federalismo e a autonomia dos Municípios

A Constituição da República de 1988 inicia sua exposição logo em seu artigo 1º, caput, intitulando a República Federativa do Brasil como um Estado Democrático de Direito, formado pela união indissolúvel dos Estados, Município e Distrito Federal. Coligado a estas características está o art. 18 do mesmo Diploma, o qual estabelece que “a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos entre si, nos termos desta Constituição”.

Uma federação se caracteriza principalmente pela aliança entre os seus entes integrantes e pela descentralização de poder entre os mesmos, visto que a soberania será cedida por eles, mas preservada estará a autonomia de cada um. Não menos importante é a Constituição Federal, documento que unifica e norteia todo o ordenamento jurídico do Estado Federal, o qual determina a repartição de competência entre os entes federados e a inexistência do direito de secessão entre eles.

Neste diapasão, nos dizeres do doutrinador Paulo Gustavo Gonet:

“É correto afirmar que o Estado Federal expressa um modo de ser do Estado (daí se dizer que é uma forma de Estado), em que se divisa uma organização descentralizada, tanto administrativa quanto politicamente, erigida sobre uma repartição de competências entre o governo central e os locais, consagrada na Constituição Federal, sem dispor do direito de secessão”.(BRANCO, Paulo Gustavo Gonet, 2015, pg. 819)

Desta feita, imprescindível se faz uma análise mais detida do federalismo brasileiro e da sua influência na formação da autonomia municipal.

2.1. O federalismo brasileiro

O federalismo brasileiro teve sua primeira menção no Decreto nº. 1/1889, vindo a consolidar-se com a Constituição de 1891, forma esta mantida em todas as Constituições subsequentes. O Estado federal brasileiro possui como princípios basilares a autonomia, a participação política e a indissolubilidade do pacto federativo entre seus entes.

Isso porque, conforme exposto por Geraldo Ataliba, “exsurge a Federação como a associação de Estados (foedus, foederis) para a formação de novo Estado (o federal) com repartição rígida de atributos da soberania entre eles”.

Assim, a CF88 foi promulgada criando o Estado Federal e suas partes integrantes indissociáveis: a União, os Estados-membros, o Distrito Federal e os Municípios, os quais possuem autonomia constitucional, com previsão excepcional de intervenção federal entre os mesmos para a garantia do equilíbrio federativa e dessa indivisibilidade.

 Ademais, a Carta Magna prevê competências e atribuições devidamente distribuídas entre os federados, sendo necessário, inclusive, que cada um deles possua sua esfera de competência tributária, a fim de garantir-lhes receita própria para sua autoadministração.

Ainda, há que se destacar a possibilidade de criação de novo Estado-membro ou de modificação territorial daquele já existente, a depender da aquiescência da população do Estado federado, além da existência do órgão de cúpula do Poder Judiciário para proteger a Constituição Federal.

A Constituição Federal de 1988 ainda eleva o Federalismo à cláusula pétrea expressa, devidamente exposta no seu art. 60, §4º, I da CF88, a qual impossibilita qualquer proposta de emenda tendente a aboli-la.

No mesmo sentido, mister apontar o poder de ingerência dos Estados-membros na formação da vontade legislativa federal.

Dentre as várias características da Federação brasileira, as quais poderiam ser enumeradas exaustivamente neste trabalho, estranhamente, nem todas são aplicáveis aos Municípios, o que torna o modelo brasileiro peculiar e único frente a todas as outras federações conhecidas, o que será melhor exposto no item subsequente.

2.2. Autonomia dos Municípios

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O advento da CF88 elevou o Município à condição de membro da Federação, posto que passou a gozar de autonomia, Poder Legislativo e Executivo próprios, além de auto-organização por meio de lei orgânica, nos termos do art. 29 da CF88, fato este que o difere de todas as Federações existentes.

Nas palavras de Paulo Bonavides:

“(…) não conhecemos uma única forma de união federativa contemporânea onde o princípio da autonomia municipal tenha alcançado grau de caracterização política e jurídica tão alto e expressivo quanto aquele que consta da definição constitucional do novo modelo implantado no País com a Carta de 1988”.(BONAVIDES, Paulo, 2000, pg. 314)

Ocorre que parte da doutrina contesta esse patamar ao qual o Município foi elevado, visto que algumas das características essenciais a um membro Federativo não são vislumbradas na experiência municipal.

Isso porque, é típico do Estado Federal que os seus entes participem da formação da vontade geral, sendo tal atribuição exercida pelo Senado Federal, no caso brasileiro. Todavia, este órgão de cúpula possui membros que representam apenas os Estados-membros, fato este que exclui o Município de tal atribuição.

No mesmo sentido, o ente municipal não possui Poder Judiciário próprio, diferentemente dos Estados e da União, e tampouco é capaz de realizar intervenção em qualquer destes entes, sendo que a União é capaz de intervir nos Estados, e os Estados nos Municípios, em casos excepcionais e constitucionalmente dispostos.

Ademais, o Supremo Tribunal Federal, designado à guarda da Constituição Federal, não possui competência para as demandas às quais os Municípios integram o pólo passivo, não obstante o façam naquelas em que envolvem a União e os Estados.

Contrariando todos os discursos opostos, o mesmo diploma constitucional inclui o Município na união indissolúvel da República Federativa do Brasil, bem como confere a sua auto-organização através de Lei Orgânica própria e por edição de leis municipais.

Além disso, atesta a sua capacidade de autogoverno pela previsão de eleição direta de seu Prefeito, Vice-prefeito e Vereadores, sem nenhuma ingerência dos Governos Federal ou Estadual; ainda, destaca a autonomia municipal como princípio sensível e ratifica a sua autoadministração, ao repartir as competências administrativas, legislativas e tributárias entre os entes federativos, reservando parcela destes ao Município, de forma expressa.

Assim, a afirmação de que o Município é um ente federativo e autônomo restou inconteste.

3. A repartição de competências na CF88

A repartição de competências constitucionais é uma conseqüência direta da autonomia das entidades federativas, de forma a manter o equilíbrio do pacto federativo. Isso porque, ao estabelecer as matérias próprias de cada uma delas, a CF88 poderá distribuir as matérias legislativas, administrativas e tributárias, de forma a centralizá-las ora na própria Federação, ora em algum(ns) de seu(s) ente(s).

Essa distribuição de competências é realizada pelo princípio da preponderância do interesse: à União cabem aquelas matérias nas quais predominam o interesse geral; aos Estados, as matérias nas quais predominam o interesse regional; e aos Municípios, as de interesse local, sendo que o Distrito Federal, por possuir natureza híbrida, acumula as competências estaduais e municipais, por expressa disposição legal.

Desta feita, o legislador constitucional decidiu por enumerar as competências administrativas e legislativas da seguinte forma:

“- Competências administrativas e legislativas da União: arts. 21 e 22;

– Competências administrativas e legislativas dos Estados: art. 25, § 1º;

– Competências administrativas e legislativas dos Municípios: art. 30;

– Competências administrativas e legislativas do Distrito Federal: art. 32, §1º;

– Competências administrativas comuns a todos os entes: art. 23;

– Competências legislativas concorrentes entre a União, os Estados e o Distrito Federal: art. 24;”

Com o único propósito de primar pela objetividade do presente trabalho, a exposição será voltada à competência tributária dos Municípios.

3.1. A competência municipal na instituição dos tributos

A competência tributária consiste no poder constitucionalmente atribuído ao Município, no caso, de editar leis para instituir tributos, sendo o exercício desse poder uma faculdade conferida ao ente municipal, baseado nas disposições de oportunidade e conveniência política e tributária.

No mesmo sentido, a competência tributária é dotada de indelegabilidade, ou seja, os tributos conferidos ao Município não podem ser atribuídos a outros entes federativos, salvo as funções de fiscalizar, arrecadar e executar leis ou atos normativos referentes a estes tributos, nos termos do art. 7º do CTN.

Ao repartir essas competências, a CF88 optou por fazê-la conforme o tributo seja ou não vinculado a uma atividade estatal, de forma que o IPTU, o ISSQN e o ITBI, que são tributos não vinculados, são atribuídos privativamente aos Municípios, de forma exaustiva. No mesmo sentido, a Contribuição de Iluminação Pública, tributo vinculado e privativo dos Municípios e a contribuição previdenciária dos seus servidores, que seriam não vinculados, mas ambos de natureza privativa do Município.

Insta esclarecer que os fatos geradores dos tributos vinculados, quais sejam, as taxas e contribuições de melhoria, as quais possuem competência tributária comum de todos os entes federativos, não foram determinadas expressamente pela CF88. Isso porque, o ente que prestar o serviço público específico e divisível, exercer o poder polícia, ou realizar a obra pública da qual decorra valorização imobiliária, será o responsável por instituir e cobrar a taxa ou a contribuição de melhoria, respectivamente, inclusive os Municípios.

Assim, forçoso concluir que a competência na instituição de tributos no Brasil foi distribuída de forma descentralizada, fato este que enseja uma participação maior dos entes federados, o que poderia viabilizar uma maior arrecadação e melhor fiscalização dos seus recursos.

Todavia, esse mesmo processo de arrecadação descentralizado incorre, muitas vezes, na ineficiência da gestão tributária, mormente dos Municípios, que dispõe de uma receita menos significativa, ou que quase sempre depende dos repasses federais e estaduais para se manter.

4. Gestão pública municipal

A gestão pública orçamentária nada mais é que um instrumento de controle das receitas e despesas municipais, englobando o planejamento das suas finanças, com o escopo de desenvolver políticas públicas que concretizem as atribuições designadas constitucionalmente aos Municípios.

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Neste sentido, o orçamento público, o qual prevê essas receitas e fixa as despesas municipais, constitui-se no meio de gestão tributária de maior eficiência dentro da Administração Pública, principalmente por refletir as decisões políticas e ações prioritárias de seu governo.

Para tanto, o ordenamento jurídico brasileiro dispõe das Leis 4.320/1964, da Lei Complementar 101/2000, além da própria previsão constitucional disposta no art. 165, as quais instituem os mecanismos de elaborar leis e executar orçamentos: o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA).

O PPA consiste em um plano traçado pelo gestor municipal para metas e objetivos a serem atingidos pela Administração Pública Municipal em um período de 04 anos, abrangendo os três últimos anos do mandato vigente e o primeiro do posterior, a fim de propiciar a continuidade das políticas públicas dos governos. Trata-se de instrumento de suma importância para a gestão pública, mormente por prever e legitimar as despesas públicas que serão efetuadas, nos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal.

A LDO é a lei elaborada pela gestão vigente, de forma a estabelecer metas e prioridades para o exercício financeiro seguinte, as quais se encontram previstas no plano plurianual, orientando a elaboração do orçamento público municipal e regulamentando a legislação tributária municipal.

Por fim, a LOA é a lei orçamentária propriamente dita, por meio da qual o governo estima as receitas e autoriza as despesas, sendo elaborada ano a ano pelo Chefe do Executivo Municipal, tudo de acordo com as metas e objetivos estabelecidos no Plano Plurianual e o programa de ações dispostos na Lei de Diretrizes Orçamentárias.

4.1. Receitas e despesas públicas municipais

A receita pública municipal consiste no montante total de verbas auferidas pelo Poder Público e incorporadas ao patrimônio público, sendo os tributos de competência municipal e as transferências intergovernamentais umas das suas principais fontes de receita.

Conforme já explanado, os tributos de competência municipal consistem no IPTU, ITBI, ISSQN, taxas, COSIP, contribuições previdenciárias de servidores públicos municipais e contribuições de melhoria.

No tocante às transferências intergovernamentais, há as obrigatórias, referentes ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), compensação financeira dos royalties de petróleo, minério e afins, participação no produto de arrecadação federal do ITR e da arrecadação estadual do ICMS e do IPVA; e as voluntárias, referentes às transferências voluntárias da União e do Estado por meio de convênios, contratos de repasse e transferências de fundos nas áreas de saúde e assistência social.

Já as despesas públicas consistem no conjunto de gastos do ente público municipal para custear os serviços públicos, bem como para a realização dos investimentos em infraestrutura e desenvolvimento socioeconômico, sendo classificadas como despesas orçamentárias aquelas que necessitam de autorização legislativa, e extraorçamentárias aquelas que prescindem de tal ordem.

4.2. A fiscalização na administração tributária

A administração tributária é atividade estatal essencial, a qual consiste na arrecadação de tributos e na fiscalizaçãodo cumprimento das obrigações tributárias, sendo estas as principais fontes de recursos para o desenvolvimento da gestão pública municipal.

Nas palavras de Ricardo Alexandre:

A fiscalização é um poder-dever orientado pela isonomia, que, em matéria tributária, se prende à ideia de tributar cada pessoa na medida de sua capacidade contributiva. Nessa linha, a própria Constituição.Federal faculta à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e, nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte (CF, art. 145, § 1º). (ALEXANDRE, Ricardo, 2017, pg. 607)

O Código Tributário Nacional, em seu art. 194, determina que a legislação tributária regule a competência das autoridades administrativas em matéria de fiscalização, de acordo com a natureza do tributo a ser fiscalizado.

No mesmo sentido, essa legislação tributária fiscalizatória é de caráter geral, aplicando-se às pessoas naturais e jurídicas, aos contribuintes e até mesmo àqueles que não o são, como os que gozam de imunidade e isenção. Inclusive, o Fisco está autorizado a entrar na intimidade econômica dos particulares, não sendo oponíveis quaisquer excludentes dos direitos de examinar bens e documento, conforme disposto no art. 145, §1º da CF88 e o art. 195 do CTN.

Ademais, a autoridades fiscais ainda possuem o poder de requisitar informações de autoridades e empresas, relativamente aos bens, negócios ou atividades de terceiros, de forma que a própria sociedade contribua com a fiscalização tributária.

Assim, toda a legislação tributária é voltada no sentido de se obter uma maior arrecadação e, supostamente, uma melhor gestão desses recursos tributários. Ocorre que, nem sempre essa premissa é verdadeira, inclusive na gestão tributária municipal.

Isso porque, ainda que os Municípios disponham de bases de receitas diversificadas, suas atribuições enquanto ente autônomo são significativas, inclusive na seara social, sendo que suas receitas tributárias ou repasses financeiros quase nunca são suficientes para chegar a um equilíbrio no orçamento.

Nesse sentido, Luís Roberto Barroso explana que:

 “a carência financeira dos Municípios não se deve apenas à repartição de rendas, mas também, à repartição de encargos, pois no caso dos entes locais os impostos próprios lhes conferidos têm representatividade econômica apenas em municipalidades de indústria desenvolvida em localidades urbanas”. (BARROSO, Luís Roberto, 2006, pg. 145)

Esse desequilíbrio entre receita e despesa faz com que os Municípios sejam cada vez mais dependentes dos repasses da União e dos Estados para concretizar suas políticas públicas e atribuições constitucionais.

Fato que corrobora com a ineficiência dessa gestão tributária é também a ausência de cadastros informáticos do ISSQN e do IPTU, o que muitas vezes dificulta o processamento de informações referentes aos contribuintes, responsáveis tributários, fatos geradores e até mesmo ao lançamento destes tributos, isso quando o próprio Chefe do Executivo Municipal opta por simplesmente não lançá-los, por questões políticas.

Ainda, há que se considerar que nem sempre a administração tributária municipal dispõe de contingente humano devidamente capacitado para captar esses recursos, fiscalizá-los e geri-los, conforme a necessidade do ente, inclusive para evitar a evasão fiscal dos contribuintes.

Assim, esses são alguns dos fatores que dificultam a devida gestão pública de recursos na esfera municipal, pelo que serão analisados alguns aspectos que podem contribuir para uma gestão tributária mais eficiente.

5. A eficiência na gestão tributária municipal

A busca da eficiência na gestão dos recursos tributários é um dos grandes desafios enfrentados pela Administração Pública Municipal. Uma análise mais detida da situação atual de cada Município, acompanhada de um estudo aprofundado da sua legislação tributária e o conhecimento de outras experiências que aprimoraram a gestão tributária de outros entes municipais podem contribuir de maneira significativa para o alcance dessa eficácia.

Primeiramente, os gestores municipais precisam dar efetividade à competência constitucional delegada aos Municípios, instituindo por lei todos os tributos os quais possuem atribuição, de forma que a legislação tributária seja mais simplificada e de acordo com os ditames constitucionais.

Ademais, aprimorar os meios de administração, arrecadação e fiscalização desses recursos tributários torna-se imprescindível, inclusive com o apoio da população. Assim, investimentos em softwares de gestão de tributos para organizar, lançar e fiscalizar a arrecadação desses tributos pode contribuir para o incremento das receitas e melhor administração destas.

No mesmo sentido, a capacitação dos profissionais alocados nos órgãos relacionados ao setor de tributação municipal, os quais devem ser compostos apenas por servidores efetivos, por se tratar de setor estratégico e dotado de responsabilidade, além da freqüência em cursos sobre a administração tributária e gestão de recursos públicos.

Neste diapasão, a eficiência na cobrança administrativa e judicial dos tributos também seria de grande valia para o incremento do orçamento público.

Ainda, a adoção de políticas públicas que favoreçam a transparência das informações na Administração Pública Municipal, de forma que a população disponha de meios para conhecer, investigar e denunciar supostas irregularidades fiscais também poderia contribuir para que se alcance essa eficiência.

6. Conclusão

Os Municípios brasileiros ostentem uma condição diferenciada perante as demais federações existentes, isso é inegável. Todavia, a sua autonomia enquanto ente federado não foi capaz de conferir-lhe uma independência financeira, principalmente em razão da ineficiência na gestão dos seus recursos próprios.

Essa dependência financeira acarreta no desequilíbrio do Federalismo brasileiro, visto que, ainda que as competências e atribuições de cada ente federado estejam devidamente distribuídas na Constituição Federal, isso não é capaz de conferir aos Municípios uma condição isonômica perante a União, os Estados e o Distrito Federal.

Para a mudança deste cenário, medidas importantes se impõem, inclusive as que incrementem a administração tributária municipal, mormente quanto à arrecadação de impostos, a gestão dessas receitas derivadas e a sua fiscalização.

No mesmo sentido, melhoras na gestão pública como um todo se fazem imprescindíveis, como a modernização de seus sistemas de tributação, capacitação de seus recursos humanos, estudo da sua legislação tributária, transparência nas informações e aumento da participação da sociedade na fiscalização. Esses são apenas um primeiro passo rumo ao alcance da eficiência da gestão tributária municipal. Mas, já é um grande começo.

 

Referências
ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário. 11. ed.Salvador: JusPodivm, 2017.
BARROSO, Luís Roberto. A derrota da federação: o colapso financeiro dos estados e municípios. In: BARROSO, Luís Roberto. Temas de Direito Constitucional. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
BONAVIDES, Paulo. Ciência política. 10. ed. São Paulo: Malheiros, 2000.
LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 19.ed.rev.atual.ampl. São Paulo: Saraiva, 2015.
MENDES, Gilmar Ferreira. COELHO, Inocêncio Mártires. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional.10.ed.rev.atual, São Paulo: Saraiva, 2015.
SILVA, Albertiano Dias da. Gestão tributária dos municípios brasileiros: a busca da autonomia municipal. 2016. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2568/86620.pdf?sequence=3>.Acesso em: 20 set. 2017.
VIEIRA DE MELO, Clóvis Alberto; SANTOS DE SOUZA, Saulo; DE SOUSA BONFIM, Washington Luís. Federalismo e bons governos: uma análise política da gestão fiscal dos municípios. Opinião Pública, v. 21, n. 3, 2015.
 
Notas
[1] O federalismo centrífugo consiste na forma de Estado que opta por distribuir amplamente os seus poderes em favor dos seus entes integrantes. Este tipo de modelo surge da fragmentação de um Estado Unitário, o qual detém o poder, que passa a dividi-lo entre os Estados-membros. Assim, há uma verdadeira fuga do centro, ou seja, o poder é pulverizando entre os demais entes regionais, como aconteceu no caso do federalismo brasileiro.


Informações Sobre o Autor

Marilia Mendonça

Procuradora na Prefeitura Municipal de Conceição do Mato Dentro graduada pela Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Pós-graduada em Direito Constitucional pela Universidade Anhanguera-Uniderp. Pós-graduanda em Gestão Pública pela Escola de Contas e Capacitação Professor Pedro Aleixo do Tribunal de Contas de Minas Gerais


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