Resumo: O IPVA foi criado pela EC nº27/1985, que acrescentou o inciso III no art.23 da Constituição de 1967. Desde então, a competência para instituir o imposto sobre propriedade de veículos automotores pertence aos Estados e ao Distrito Federal. Hoje, a competência para sua instituição está asseverada no art. 155, III, da CF/88, com redação dada pela EC nº3/1993. Diante da ausência de norma geral regulamentadora (lei complementar) do IPVA, os estados e o DF legislam de maneira suplementar, nos termos do art. 24, §3º, da CF/88. O legislador à época não delimitou o alcance da expressão “veículo automotor” contida no inciso III do art. 155 da CF/88, o que ensejou discussões acerca da possibilidade, ou não, de incidência do IPVA sobre veículos automotores aquáticos e aéreos. Pretende-se demonstrar na pesquisa que a incidência do IPVA sobre veículos automotores aquáticos e aéreos fere norma constitucional de competência legislativa, bem como as definições trazidas pelas leis 7565/86 e 9537/97.
Palavras-chave: propriedade de veículos automotores; competência; veículos automotores aquáticos e aéreos; incidência; lei complementar.
Abstract: The IPVA was created by EC nº 27/1985, which added the item III in art.23 of the Constitution of 1967. Since then, the power to impose the tax on ownership of motor vehicles belong to the states and the Federal District. Today, the competence for the institution is asserted in art. 155, III, of CF / 88, as amended by EC nº 3/1993. In the absence of regulatory general rule (complementary law) of property taxes, the states and the Federal District legislate supplementary way under art. 24, paragraph 3, of CF / 88. The legislator at the time did not define the scope of the term "motor vehicle" contained in Part III of Art. 155 CF / 88, which caused discussions about the possibility, or not, the incidence of property taxes on motor vehicles water and air. We intend to show the research that the incidence of property taxes on motor vehicles water and air strikes constitutional rule of legislative competence, and the definitions brought by laws 7565/86 and 9537/97. The research is based on the Federal Constitution and the infra-constitutional legislation, including the National Tax Code, Brazilian Traffic Code and the CBA, as well as the analysis of the Supreme Court jurisprudence, specialized resvisras and doctrine.
Keywords: property of motor vehicles; competence; water and air motor vehicles; incidence; complementary law.
Sumário: 1. Introdução. 2 aspectos gerais do IPVA. 2.1. Fato gerador e contribuinte. 2.2. Base de cálculo e alíquota. 2.3. Lançamento. 2.4. A inexistência de norma geral regulamentadora. 2.4.1. A definição de veículo automotor. 2.4.2. A guerra fiscal. 3. Precedentes do STF sobre a não incidência do IPVA sobre veículos automotores aquáticos e aéreos. 3.1.Jjulgamento do RE 379.572/RJ. 3.2. Julgamento do RE 134.509/AM. 3.3. Julgamento do RE 255.111/SP. 4. As PEC's 140/12 e 283/13. 4.1. O conflito de competência entre União e estados e a não infringência aos princípios da capacidade contributiva e da justiça fiscal. 5. Considerações finais. Referências.
1. introdução
A presente pesquisa trabalha com a análise da impossibilidade de incidência do IPVA sobre veículos automotores aquáticos e aéreos, ao considerar, em primeiro lugar, que não se deve enquadra-los no conceito de “veículo automotor” trazido pelo Código de Trânsito Brasileiro, bem como considerar que a União é a única legitimada, pela Constituição Federal de 1988, a exercer competência sobre o direito marítimo e aeronáutico, e por fim, que a União é a única legitimada a criar norma geral regulamentadora (lei complementar) acerca de matéria tributária, conforme preceitua o art.146, III, alínea a.
O IPVA é previsto no art. 155, III, da CF/88, o qual outorga competência ao Estados e Distrito Federal para instituir o imposto sobre a propriedade de veículos automotores. O CTN não tratou do IPVA, posto que na época de sua criação inexistia o direito de tributar a propriedade de veículos automotores. Destaca-se que essa situação não impede que o Estados e o DF exerçam sua competência de instituição e cobrança do referido tributo, tendo em vista que o art. 24, §3º, da CF/88 estabelece que na ausência de lei complementar que estabeleça normas gerais, os Estados poderão exercer a competência legislativa plena. Os estados e o DF assim o fizeram, instituindo suas legislações acerca do IPVA.
A redação do inciso III, do art.155 da CF/88 ensejou muitas discussões acerca do conceito de veículos automotores, de um lado aqueles que defendem que tal conceito teria abrangência a todo e qualquer veículo movido a motor de propulsão, incluindo-se, portanto, as embarcações e aeronaves, por outro lado aqueles que defendem que o conceito de veículos automotores é algo restrito a veículos automotores terrestres e que tem influência histórica da TRU (Taxa Rodoviária Única).
Ocorre que ao afirmar pela incidência do IPVA sobre embarcações e aeronaves, estaria o legislador rejeitando toda a legislação marítima e aeronáutica, que trazem consigo a definição desses tipos de veículo, bem como a própria CF, que regula a competência exclusiva da União para legislar sobre direito marítimo e aeronáutico.
O STF já se manifestou sobre o assunto em três recursos extraordinários (Amazonas, São Paulo e Rio de Janeiro), os quais julgou, de forma acertada, pela não incidência do IPVA sobre veículos automotores aquáticos e aéreos.
A presente pesquisa se faz relevante a partir do momento em que, busca-se meio alternativo para dirimir os problemas enfrentados pelos Estados e seus contribuintes, sem que haja enfrentamento das normas Constitucionais, infraconstitucionais, preservando os princípios capacidade contributiva e o da justiça fiscal.
2 ASPECTOS GERAIS DO IPVA
Antes de debatermos sobre a não incidência do IPVA (Imposto sobre propriedade de veículos automotores) sobre veículos automotores aquáticos e aéreos, é mister analisarmos os aspectos básicos do imposto em comento. Então, vejamos.
Os impostos são classificados em nosso sistema tributário como "impostos reais" e "impostos pessoais", sendo aqueles impostos que consideram de forma isolada a riqueza correspondente ao patrimônio do contribuinte, denominados também como impostos sobre o patrimônio, e estes últimos são os impostos que consideram características e condições inerentes ao contribuinte, fazendo com que essas considerações estabeleçam diferenças tributárias.
Nesse sentido, Martins (2015, p. 89-90) exemplifica desta maneira:
“[…] a) reais, quando recaem sobre a coisa, como imposto sobre a propriedade, independentemente de quem é o dono da coisa. O IPTU recai sobre a propriedade urbana. O IPVA incide sobre a propriedade de veículos automotores. Não são levadas em consideração condições pessoais ou a totalidade da renda da pessoa; b) pessoais, quando incidem sobre as pessoas, como o imposto de renda, que incide sobre a renda da pessoa.”
Desta forma, o IPVA é classificado como um imposto real, recaindo, portanto, sobre a propriedade de veículos automotores, independente de quem os possua.
O IPVA fora criado pela EC nº27/1985, que acrescentou o inciso III no art.23 da Constituição de 1967. Desde então a competência para instituir o imposto sobre propriedade de veículos automotores pertence aos Estados e ao Distrito Federal. Hoje, a competência para sua instituição está asseverada no art. 155, III, da CF/88, com redação dada pela EC nº3/1993.
Assim como os outros tributos, o IPVA submete-se também as limitações ao poder de tributar estabelecidas no art. 150 da Constituição Federal de 1988, quais sejam a legalidade (inciso I), isonomia (inciso II), a anterioridade (inciso III, alíneas b e c), a irretroatividade (inciso III, alínea a), a vedação ao confisco (inciso IV) e as imunidades (inciso VI).
2.1 FATO GERADOR E CONTRIBUINTE
O contribuinte do IPVA é o proprietário do veículo automotor, e define-se o fato gerador do IPVA como sendo a propriedade de veículo automotor.
Considerar-se-á ocorrido o fato gerador do IPVA no 1º dia de janeiro de cada ano para os veículos usados, e para os veículos novos na data de sua aquisição.
2.2 BASE DE CÁLCULO E ALÍQUOTA
A base de cálculo do imposto em estudo é o valor venal do veículo automotor. Esse valor venal é divulgado pelo Poder Executivo de cada Estado e do Distrito Federal, anualmente, e leva-se em consideração vários aspectos como o ano de fabricação do veículo, marca, modelo e etc. . As legislações estaduais e do DF que tratam do IPVA estabelecerão quais os aspectos deverão ser considerados.
As alíquotas do IPVA variam em todos os estados. Infelizmente, a falta de norma geral regulamentadora enseja a variação de alíquotas em todo país, gerando a tão combatida "guerra fiscal", assunto que será tratado oportunamente.
Sendo assim, não existe no Brasil a uniformização da alíquota do IPVA. Os estados estabelecem alíquotas diferenciadas de acordo com o tipo de veículo, de acordo com a utilização do veículo, de acordo com o tipo de combustível utilizado entre outros diversos aspectos. As legislações estatuais que regulam o IPVA também trataram das isenções quanto a esse imposto da maneira que as convêm.
A Lei nº 14.937/03 regula o IPVA no estado de Minas Gerais, estabelecendo 8 tipos de alíquotas, que variam de acordo com o tipo de veículo e sua utilização. Vejamos quais são as alíquotas estabelecidas pela referida lei estadual:
“Art. 10. As alíquotas do IPVA são de:
I – 4% (quatro por cento) para automóvel, veículo de uso misto, veículo utilitário e outros não especificados neste artigo;
II – 3% (três por cento) para caminhonete de carga picape e furgão;
III – 1% (um por cento) para veículos destinados a locação, de propriedade de pessoa jurídica que preencha pelo menos um dos seguintes requisitos:
a) exerça atividade exclusiva de locação devidamente comprovada nos termos da legislação tributária;
b) aufira receita bruta com a atividade de locação de veículos que represente, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de sua receita bruta total, mediante regime especial de tributação concedido pela Secretaria de Estado de Fazenda, na forma, nos prazos e nas demais condições estabelecidas em regulamento;
c) utilize no mínimo 2.000 (dois mil) veículos registrados no Estado destinados exclusivamente a locação, mediante regime especial de tributação concedido pela Secretaria de Estado de Fazenda, na forma, nos prazos e nas demais condições estabelecidas em regulamento;
IV – 1% (um por cento) para ônibus, micro-ônibus, caminhão, caminhão-trator e aeronave;
V – 2% (dois por cento) para motocicleta, motoneta, triciclo, quadriciclo e ciclomotor;
VI – 3% (três por cento) para embarcação;
VII – 2% (dois por cento) para automóvel, veículo de uso misto e veículo utilitário que possuam autorização para transporte público rodoviário de passageiros comprovada mediante registro no órgão de trânsito na categoria "aluguel";
VIII – (vetado).
IX – 0,5% (zero vírgula cinco por cento) para caminhões destinados a locação, de propriedade de pessoa jurídica que utilize no mínimo quinhentos veículos registrados no Estado destinados exclusivamente a locação, mediante regime especial de tributação concedido pela Secretaria de Estado de Fazenda, na forma, nos prazos e nas demais condições estabelecidas em regulamento”. (MINAS GERAIS, 2003, p. 7-8, grifo nosso)
Para comparação entre as legislações estatuais que regulam o IPVA, tem-se a Lei nº 6.999/01 que regula o IPVA no estado do Espirito Santo, estabelecendo, por sua vez, apenas 2 tipos de alíquotas, que variam, assim como a legislação de Minas Gerais, de acordo com o tipo e utilização do veículo. Senão, vejamos:
“Art. 12. As alíquotas do Imposto são:
I – 2% (dois por cento), para carros de passeio, de esporte e de corrida, camioneta de uso misto ou utilitário, aeronaves e embarcações;
II – 01% (um por cento) para:
a) veículos de carga, ônibus, caminhões, motocicletas, ciclomotores e outros veículos; e
b) veículos utilizados com a finalidade específica de locação, de propriedade de empresas prestadoras de serviços, cujo objetivo social seja a locação de veículos automotores.
§ 1.º Para os efeitos do inciso II, a, entende-se por caminhão o veículo rodoviário com capacidade de carga igual ou superior a 3.500 kg (três mil e quinhentos quilogramas).
§ 2.ºO disposto no inciso II, b, fica limitada ao período em que o veículo for efetivamente utilizado com a finalidade específica de locação, devendo o seu proprietário efetuar o recolhimento, proporcional, do imposto regularmente incidente sobre o mesmo, caso seja cessada a sua utilização com a finalidade que deu ensejo à redução da alíquota”. (ESPIRITO SANTO, 2001, p. 4, grifo nosso)
Como pode-se notar, a diferenciação das alíquotas entre os estados é exorbitante e principal aspecto para perpetuar a guerra fiscal entre eles.
2.3 LANÇAMENTO
Existem 3 modalidades de lançamentos estabelecidos pelo CTN em seus artigos 147 a 150, sendo eles o lançamento por homologação, por declaração ou de oficio. Existe também o autolançamento pevisto no art.148 do CTN , porém este ocorrerá de forma excepcional e subsidiária. Portanto, tal lançamento será utilizado somente quando dá impossibilidade de apuração da base de cálculo real do montante devido.
Nesse sentido, PAULSEN (2015, p. 224-225) frisa “que o lançamento por arbitramento não constitui sanção, mas método substitutivo para a apuração do montante devido, não podendo basear-se em elementos destoantes da realidade, ficando, sempre, sujeito à impugnação por parte do contribuinte”.
Em se tratando de IPVA a modalidade de lançamento utilizada é a de oficio, sendo assim a autoridade fiscal quando verificar a ocorrência do fato gerador, o objeto a ser tributado e identificar o contribuinte, calculará o valor a ser pago de tributo e, logo em seguida, emitirá a guia de pagamento ao contribuinte.
2.4 A INEXISTÊNCIA DE NORMA GERAL REGULAMENTADORA.
Muito já se debateu sobre a criação de norma geral regulamentadora do IPVA no Brasil, e o fato é que a sua inexistência é ponto chave para a insatisfação do contribuinte desse imposto, bem como para a perpetuação da guerra fiscal entre os estados.
Embora a Constituição Federal estabeleça em seu artigo 146, III, alínea a, que cabe a lei complementar estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados na CF/88, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes, o legislador ainda não se preocupou em criar a respectiva norma para o IPVA restando, assim, aos Estados e ao DF exercerem a competência suplementar prevista no art.24, §2º da CF/88, vejamos:
“Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:
I– direito tributário, financeiro, penitenciário, econômico e urbanístico […}
§ 2º A competência da União para legislar sobre normas gerais não exclui a competência suplementar dos Estados”. (BRASIL, 2016, p. 60-70)
De fato, os estados e o DF exercem tal competência, mas de modo que o seu exercício tem trazido diversas controvérsias aos tribunais, que por sinal já duram alguns anos, entre elas, se não as mais relevantes, estão o debate acerca da definição e conceituação do que é veículo automotor, sendo este o aspecto que compõe o fato gerador do IPVA, bem como a diversidade de leis estaduais e suas respectivas alíquotas como ensejadoras da chamada guerra fiscal entre os estados e o DF.
Além disso, a falta da dita norma gera dúvidas, também, quanto a definição exata do que são “veículos automotores”, ou seja, quando o legislador utilizou a referida expressão ele estaria restringindo o genêro apenas à espécie de veículos terrestres, ou estaria ele abrangendo toda e qualquer especie de veículo automotor. Questões como estas há anos vem sendo debatidas nos tribunais. Veremos no subitem abaixo.
2.4.1 A definição de veículo automotor
Como fora explicado anteriormente, a falta de norma geral regulamentadora levou aos tribunais, chegando ao STF pela primeira vez em 2002, discussões acerca do conceito de veículo automotor e quais os veículos automotores se encaixariam no fato gerador do IPVA.
As demandas sobre esse assunto, propostas pelos estados do Amazonas, São Paulo e Rio de Janeiro, pleiteavam junto aos STF à época a incidência do IPVA sobre veículos aquáticos e aéreos, porém não lograram êxito em seus recursos extraordinários.
A indefinição do que vem a ser veículo automotor, legitima a arbitrariedade dos Estados, que nada mais querem do que arrecadar, vem gerando insegurança jurídica entre os contribuintes.
Aos que comungam da ideia de que o IPVA deve incidir sobre as embarcações e as aeronaves, Harada (2010) afirma que “o fato gerador do IPVA é a propriedade de veículo automotor de qualquer espécie. Veículo automotor significa veículo autopropulsionado, ou seja, aquele que se locomove com seus próprios meios, o que envolve as aeronaves e as embarcações marítimas, além dos veículos terrestres”.
Nesse mesmo sentido o anexo I do Código de Trânsito Brasileiro define veículo automotor da seguinte forma: “Todo veículo a motor de propulsão que circule por seus próprios meios, e que serve normalmente para o transporte viário de pessoas e coisas, ou para a tração viária de veículos utilizados para o transporte de pessoas e coisas".
Ocorre que considerar tais definições, abrangendo os veículos automotores aquáticos e aéreos seria, de forma inegável, rejeitar toda a legislação aeronáutica e marítima (Lei 7565/86 e Lei 9537/97, respectivamente), as quais trazem a definição do que são aeronaves e embarcações. Vejamos a definição trazida pelo legislador no Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7565/86):
“Art. 106. Considera-se aeronave todo aparelho manobrável em voo, que possa sustentar-se e circular no espaço aéreo, mediante reações aerodinâmicas, apto a transportar pessoas ou coisas.” (BRASIL, 2016)
Da mesma forma, se preocupou o legislador em trazer a definição de embarcações, para que não ocorresse nenhuma controvérsia no que diz respeito a essa conceituação. Vejamos, portanto, a Lei 9537/97 que dispõe sobre a segurança do tráfego aquaviário em águas sob jurisdição nacional:
“Art. 2° Para os efeitos desta Lei, ficam estabelecidos os seguintes conceitos e definições: […]
V – Embarcação – qualquer construção, inclusive as plataformas flutuantes e, quando rebocadas, as fixas, sujeita a inscrição na autoridade marítima e suscetível de se locomover na água, por meios próprios ou não, transportando pessoas ou cargas”. (BRASIL, 2016)
Sendo assim, podemos notar que os veículos automotores aquáticos e aéreos não podem se enquadrar no critério material estabelecido pela Constituição Federal, pois esta não foi abrangente o suficiente para inclui-los. Assim como o conceito de veículo automotor trazido pelo CTB, também não abrange, em hipote aguma, as embarcações e aeronaves, não havendo que se falar em incidência do IPVA. Uma vez que o Código de Trânsito Brasileiro em seu art.1º diz claramente que sua função é reger o trânsito de qualquer natureza nas vias terrestres do território nacional, abertas à circulação, assim como o anexo I do CTB, onde consta o conceito de “veículo automotor”, trata apenas de conceitos e definições que terão efeitos para este código.
Além disso, sobre o aspecto conceitual, pode-se compreender que os três conceitos trazidos acima sobre “veículo automotor”, “embarcações” e “aeronaves”, não são passiveis de comunicação uns com os outros. São conceitos essencialmente distintos, portanto não aceitam analogias.
Nesse sentido Mazzoni (2005) conclui que “devido à sofisticação e peculiaridades das aeronaves e das embarcações, não permitem que estas sejam enquadradas no conceito de veículo automotor, tanto é que na linguagem popular, quando na técnica (onde se incluem os textos normativos), a expressão veículo automotor jamais é utilizada para designar as aeronaves e as embarcações. Portanto, aeronave, embarcação e veículo automotor são gêneros diferentes de meios de locomoção, sendo que o legislador constitucional ao prever o IPVA, restringiu apenas aos veículos automotores terrestres. ”
Mas, ainda que superados os argumentos supra, e num esforço conceitual se aceite a inclusão, o problema maior recairá, sem dúvida, na impossibilidade absoluta de o legislador estadual se inserir na competência privativa da União, conforme o art. 22, I, CF/88, o que restara melhor explicado adiante.
2.4.2 A guerra fiscal
A autonomia que os estados e o DF obtiveram diante da ausência de norma geral regulamentadora do IPVA desencadeou uma interminável guerra fiscal entre estados, tendo como aspecto a disputa pela arrecadação do referido imposto.
Mesmo a Constituição Federal tendo previsto que a competência para instituir o IPVA é dos estados e do DF, permaneceu-se na dúvida quanto a qual estado deveria ser competente para a arrecadação do imposto, se era o estado de domicilio e residência do proprietário de veículo ou se no estado que o veículo foi licenciado e registrado. Tal dúvida só poderá ser sanada quando o legislador regulamentar a situação mediante lei complementar, o que ainda não o fez.
Diante da falta de norma regulamentadora e da autonomia que o próprio texto constitucional auferiu aos Estados e ao DF, estes travaram entre si uma batalha de alíquotas. A diferença exorbitante de alíquotas faz com que os contribuintes do IPVA optem por registrar seus veículos nos estados cuja alíquota esteja menor, afim de pagar menos imposto, gerando assim uma defasagem na arrecadação do estado e por consequência no município que o contribuinte verdadeiramente reside, tendo em vista que, como determina a CF/88 em seu art. 158, III, os municípios recebem 50% do valor arrecadado de IPVA pelo seu respectivo estado.
O Código de Trânsito Brasileiro estabelece que o registro do veículo, a fim de que seja cobrado e arrecadado o IPVA, deve acontecer no município de domicílio ou residência do proprietário do veículo. Vejamos:
“Art. 120. Todo veículo automotor, elétrico, articulado, reboque ou semi-reboque, deve ser registrado perante o órgão executivo de trânsito do Estado ou do Distrito Federal, no Município de domicílio ou residência de seu proprietário, na forma da lei”. (BRASIL, 2016, grifo nosso)
O que ocorre é que o CTB é norma criada por meio de lei ordinária, não podendo, portanto, dispor sobre matéria que venha a ter efeitos na esfera tributária, sendo assim tal controvérsia só poderá ser sanada por meio de lei complementar, como determina a Constituição Federal em seu artigo 146, III, alínea a, portanto, enquanto a norma geral não for criada, a guerra fiscal entre os entes federativos permanecerá.
3 PRECEDENTES DO STF SOBRE A NÃO INCIDÊNCIA DO IPVA SOBRE VEÍCULOS AUTOMOTORES AQUÁTICOS E AÉREOS.
Pela primeira vez, em 1986, o STF teve que se posicionar acerca da incidência do IPVA sobre veículos automotores aéreos e aquáticos. Tratava-se da RP (Representação) nº 1.344-8, a qual tinha sido feita perante o STF pelo então Procurador-Geral da República Sepúlveda Pertence, que alguns anos depois assumiria cargo de Ministro do STF, tendo como representados os estados do Rio de Janeiro e Espirito Santo. A representação tinha como finalidade declarar a inconstitucionalidade do decreto promulgado pelo Rio de Janeiro, bem como de ato normativo do Espirito Santo, que previam a cobrança de IPVA sobre veículos automotores aéreos e aquático.
Ocorre que tal representação restou prejudicada, tendo em vista que esta fora oferecida com base na CF de 1967 e o julgamento da mesma deu-se em 20 de outubro de 1988, quando já estava em vigor a Constituição Federal de 1988.
Entretanto, na vigência da CF de 1988 , foram interpostos três recursos extraordinários perante o STF, os quais veremos a seguir.
3.1 JULGAMENTO DO RE 379.572/RJ.
Em síntese, o recurso extraordinário interposto contra o estado do Rio de Janeiro, tinha como objetivo declarar a inconstitucionalidade do art.5º, II, da lei estadual 948/85, bem como o art.1º, parágrafo único, do decreto nº 9146/86, os quais determinavam a incidência do IPVA sobre veículos automotores aquático e aéreos.
O julgamento do respectivo RE deu-se em 11 de abril de 2007, o qual foi reconhecido por unanimidade e provido por maioria dos votos pelo STF, tendo naquela sessão o Ministro Gilmar Mendes como relator.
Como fora dito na pesquisa, o conceito de veículo automotor não poderá ser definido pelo Código de Trânsito Brasileiro, bem como caso o legislador tivesse verdadeira intenção de tributar por meio do IPVA os veículos automotores aquático e aéreos assim teria feito de forma expressa no inciso III do art.155, CF/88. Asseverando tal afirmação, o Ministro Cezar Peluso abordou esse aspecto em seu voto da seguinte maneira:
“A definição do alcance da expressão "veículos automotores", que deve ser tomada em sua acepção técnica, abrange exclusivamente os veículos de transporte viário ou terrestre; escapam de seu alcance, pois, as aeronaves ("aparelho manobrável de voo, apto a sustentar e circular no espaço aéreo mediante reações aerodinâmicas e capaz de transportar pessoas e coisas", de acordo com a legislação aeronáutica) e embarcações. Se houvesse pretendido abranger constituinte teria sido específica”. (RE 379.572/RJ, 2007, p.11)
Muito bem destacado pelo Ministro Cezar Peluso, bem como por todos aqueles que acompanharam o voto do Ministro relator Gilmar Mendes, foi o aspecto histórico da criação do IPVA, o qual corrobora a não incidência do respectivo imposto sobre embarcações e aeronaves, bem como quanto ao tipo e as divergências entre os registros de veículos automotores terrestres, aquáticos e aéreos.
“O IPVA foi criado em substituição à Taxa (T.R.U.), como demonstram os trabalhos preparatórios e justificações do Congresso Nacional. Sua instituição oi motivada por razões de "distribuição mais equitativa do produto da arrecadação do novo imposto, em benefício dos Estados e Municípios", e não visou elastecer o âmbito material de incidência pertinente ao tributo substituido, para alancaçar novas áreas reveladoras de capacidade contributiva. […] outras normas constitucionais corroboram o entendimento segundo o qual veículos automotores são apenas os terrestres, como é oo caso do artigo 23, § 13, da Constituição Federal, acrescentado pela EC nº 27/85, que destina cinquenta por cento do produto da arrecadação do imposto para o Município onde estiver licenciado o veículo. Só faz sentido falar-seem “Município onde estiver licenciado o veículo” se estiver em jogo a propriedade de veículos terrestres, únicos que, “em face da legislação e pela ondem natural das coisas, estão sujeitos a licenciamento nos municípios de domicílio ou residência dos respectivos proproetários”, nos termos do Código Nacional de Trânsito. […] em contraste, as embarcações estão sujeitas a registro no Tributal Marítimo (ou nas Capitanias dos Portos, para embarcações com menos de vinte toneladas), cujo efeito é o de conferir validade, segurança e publicidade de sua propriedade. As aeronaves, por sua vez, sujeitam-se ao Registro Aeronautico Brasileiro, do Ministério da Aeronáutica. Como observou o Ministro Francisco Rezek, em voto-vista proferido na ocasião, “navios e aeronaves não se vinculam, por nenhum ato registral, à célula que é o município. Sequer aos Estados, visto que existem capitanias de portos que abrangem mais de uma unidade federada. E o registro aeronáutico é único – aí não se trata apenas de escapar às municipalidades, mas também a qualquer vínculo estadual”. Segue-se, daí, a impossibilidade de licenciamento de aeronaves e embarcações em cada um dos milhares de municípios brasileiros.” (RE 379.572/RJ, 2007, p.11-12)
3.2 JULGAMENTO DO RE 134.509/AM.
De todos os recursos extraordinários propostos no STF com essa matéria, o RE do Estado do Amazonas talvez tenha sido o que obteve as mais acaloradas discussões, tendo em vista a argumentação brilhante trazida pelo então Ministro Sepúlveda Pertence, que defendia de forma veemente a não incidência do IPVA sobre embarcações e aeronaves. Frisa-se de plano, que o RE/AM reconheceu a inconstitucionalidade do Decreto Estadual nº 10.816/87, que cobrava IPVA de embarcações e aeronaves.
Neste julgamento destacou-se a origem do IPVA e a influência total da TRU (Taxa Rodoviária Única) sobre a sua criação, bem como a conceituação da expressão “veículo automotor”. Utilizando a argumentação trazida pelo Procurador da República Moacir Antônio Machado da Silva em seu parecer sobre a incostitucionalidade da cobrança de IPVA sobre embarcações e aeronaves, o então Ministro Sepúlveda Pertence ressaltou:
“[…] é certo que os preceitos em causa da Emenda Constitucional nº27, de 1985, tiveram a finalidade de alterar a sistemática de distribuição dos recursos entre as entidades políticas, através da criação de um novo imposto estadual, em substituição à Taxa Rodoviária Única, para permitir a sua divisão, meio a meio, entre os Estados e Municípios (cf. Justificação ao Substitutivo às Propostas de Emenda à Constituição nºs 57, 58, 59, 60 e 61, de 1985, Diário do Congresso Nacional nº 140, de 24/10/85, p.2088). Ao instituir a nova especie tributária, não pretendeu o legislador constituinte elastecer o âmbito material de incidência pertinente ao tributo substituído, para alcançar novas áreas reveladora de capacidade contributiva, mas sim o de propiciar distribuição mais equitativa do produto da arrecadação do novo imposto, em benefício dos Estados e Municípios.” (RE 134509-8/AM, 2002, p. 32)
De fato, os trabalhos preparatórios para a criação do IPVA, revelam de forma clara e concisa que o legislador pretendeu transformar a TRU no referido imposto, tendo assim o IPVA a mesma área de incidência da taxa rodoviária única. Nota-se isso, de forma inequívoca, na justificativa da PEC 27/85, vejamos:
“[…] com relação ao art.2º, o que se pretende é a criação de um imposto para substituir a Taxa Rodoviária única. […] sem dúvida alguma, esse é um acréscimo fundamental e de grande significação nas receitas dos grandes e médios Municípios brasileiros, já que a Taxa Rodoviária Única tem os seus fatos geradores, na sua imensa maioria, ocorrendo nos grandes e médios Municípios”. (DCN nº 140, 1985, p. 2088)
O voto-vista do Min. Sepúlveda concluiu que as divergências no âmbito registral dos veículos automotores aéreos, aquáticos e terrestres são inuméras, levando a total impossibilidade de qualquer tipo de licenciamento das aeronaves e embarcações nos municípios brasileiro.
Esse campo material da incidência do imposto sobre propriedade de veículos automotores resulta ainda de outras normas constitucionais, a começar pela contida no § 13 do mesmo art.23 da Constituição Federal, também acrescentada pela Emenda nº 27, de 1985, que, tratando da destinação do produto da arrecadação do imposto, dispõe que cinquenta por cento constituirá receita do Município onde estiver licenciado o veículo. Essa locução adverbial de lugar somente pode ser referida aos veículos automotores em circulação nas vias terrestres, porque estes, em face da legislação e pela ordem natural das coisas, estão sujeitos a licenciamento nos municípios de domicílio ou residência dos respectivos proprietários. […] Já as aeronaves e embarcações devem ser registradas no Registro Aeronáutico Brasileiro e no Tribunal Marítimo, respectivamente, nos termos da legislação relativa. (RE 134509-8/AM, 2002, p. 35-36)
3.3 JULGAMENTO DO RE 255.111/SP
O julgamento do recurso extraordinário do Estado de São Paulo ocorreu no mesmo dia e ano,29/05/2002, do RE do Estado do Amazonas.
O RE 255.111/SP, foi interposto com o propósito de declarar a inconstitucionalidade do art. 34, § 3º, da Lei Estadual 6.606/89, que assim como os estados do Amazonas e do Rio de Janeiro, reconhecia e autorizava a cobrança do IPVA sobre embarcações e aeronaves. O Ministro Marco Aurélio, então relator neste julgamento, foi voto vencido, tendo sido declarada a inconstitucionalidade do referido artigo da Lei Estadual de São Paulo que regulava o IPVA.
O Min. Sepúlveda Pertence, na ocasião, reportou-se ao voto que já havia instantes antes proferido no recurso extraordinário do Estado do Amazonas.
4 AS PEC's 140/12 E 283/13.
Buscando solucionar tal embate entre os tribunais e os estados, dois deputados federais apresentaram proposta de emenda à constituição, as quais veremos a seguir.
A PEC 140/12, foi apresentada em 06/03/2012 pelo Dep.Federal Assis Carvalho, tendo como proposta alterar o inciso III do art. 155 da Constituição Federal para determinar que seja o imposto incidente sobre veículos automotores terrestres, aéreos e aquáticos. A justificativa apresentada para embasar a proposta de emenda à constituição nº 140, foi de que os Estados necessitam de uma capitação maior de recursos para que possam atingir os objetivos fundamentais descritos na CF/88, bem como para realizar as atividades delegadas em normas infraconstitucionais.
A PEC 283/13 encontra-se apensada a PEC acima mencionada, porém esta vai além da alteração da redação do inciso III do art. 155 da CF/88, ela também propõe a inclusão do inciso III ao §6º do art.155 da carta magna. A inclusão deste inciso no § 6º do referido artigo, traria imunidade (não incidência constitucionalmente qualificada) de IPVA aos veículos aquáticos e aéreos de uso comercial, destinados à pesca e ao transporte de passageiros e de cargas. A justificativa apresentada pelo Deputado Federal Vicente Candido, autor da PEC em comento, é de que o conceito de veículo automotor deve ser aquele inserido no Código de Trânsito Brasileiro, questão já debatida nos capítulos anteriores, bem como o grande contingente de aeronaves que sobrevoam nosso país.
4.1 O CONFLITO DE COMPETÊNCIA ENTRE UNIÃO E ESTADOS E A NÃO INFRINGÊNCIA AOS PRINCÍPIOS DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E DA JUSTIÇA FISCAL
Reafirmando o já mencionado, não pode o legislador descumprir normas constitucionais de competência legislativa para preservar princípios básicos do direito tributário, não que estes sejam menos importantes que aqueles.
Àqueles que defendem que a não incidência do IPVA sobre veículos automotores aquático e aéreos fere o princípio constitucional da capacidade contributiva, previsto no art.145, §1º, CF/88, e da justiça fiscal, aqui teremos novamente que discordar. Não há o que se falar em infringência dos princípios supra, tendo em vista que a propriedade desses veículos é tributada pelo Tribunal Marítimo, pela ANAC e pela Capitania dos Portos. Diante das peculiaridades legislativas aprensentadas pelas embarcações e aeronaves, estas necessitam de tributação diversa ao IPVA cobrado pelos estados sobre os veículos automotores terrestres. É normal que as embarcações e aenoraves sofram tributação diversa a dos demais veículos.
Vejamos que a competência para legislar sobre matéria de direito aeronáutico e marítimo, pertence de forma privativa a União, como prevê o art.22, I, da CF/88. Desta forma a União criou (Lei nº 11.182/2005) e delegou as funções de normatizar e fiscalizar a aviação civil brasileira à ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), que é uma agência reguladora. Entre as suas atribuições, compete a ANAC o RAB (Registro Aeronáutico Brasileiro), assim as aeronaves são registradas pela agência reguladora, fiscalizadas e pagam seguro obrigatório a ela. Em caso de compra e venda de aeronaves, toda a tramitação da alienação ocorre perante a ANAC também.
Já para as embarcações, foi criado pelo Decreto nº 20.829/1931 o Tribunal Marítimo, tendo esta atuação em todo o território nacional. Entre suas diversas atribuições está a do RPM (Registro da Propriedade Marítima) e de todos os demais ônus que incidem sobre as embarcações nacionais. Ainda para o proprietário de uma embarcação, deverá ser registrada na Capitania dos Portos em cuja jurisdição for domiciliado o proprietário ou onde for operar a embarcação, é o que prevê o art. 3º, da Lei 7652/88. A referida lei tem como finalidade regular o registro da propriedade marítima, dos direitos reais e demais ônus sobre embarcações e o registro de armador. Regula ainda em seu art.4º que “a aquisição da propriedade de uma embarcação pode ser feita por qualquer meio permitido pelo direito, porém ela só irá ser consolidada após registro no Tribunal Marítimo ou, para aquelas não sujeitas a esta exigência, pela inscrição na Capitania dos Portos”.
Tecido breves comentários acerca do registro e fiscalização das embarcações e aeronaves, nota-se total impossibilidade de qualquer registro desses veículos perante os Estados, quisá pelos Municípios. O desejo incansável dos Estados pela incidência do IPVA sobre os veículos automotores aquáticos e aéreos é no mínimo inviável, uma vez que estes veículos possuem legislação própria e os órgãos que os regulam foram criados pela União, único ente federativo competente para legislar sobre o assunto (art. 22, I, CF/88), a qual delegou aos repectivos órgãos as funções de fiscalizar e regular o funcionamento maritimo e aeronáutico.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como se demonstrou no decorrer da exposição, o maior problema enfrentado por esta pesquisa, reside na omissão legislativa quanto a criação de normas gerais para regular o IPVA, o que por si só já traz inúmeras consequências negativas, como foram estudadas ao longo da pesquisa.
O legislador constituinte foi pouco esclarecedor ao criar o fato gerador do IPVA e acabou abrindo ampla possibilidade de interpretação, o que, especificamente em relação a aeronaves e embarcações, deu margem à cobrança do tributo em vários Estados. Tendo em vista esse aspecto, uma das consequências ensejadoras de tamanha discussão, reside na conceituação de “veículo automotor”, que durante o estudo de toda legislação infraconstitucional pertinente e os julgados do STF, nos resta esclarecido que tal conceito é trazido de forma diversa para embarcações, aeronaves e veículos terrestres, permitindo assim que não seja aceito, de forma única, o conceito trazido pelo CTB.
Derivado do problema da conceituação, surge o desejo desenfreado dos Estados-Membros em tributar veículos automotores aquáticos e aéreos, sob a argumentação de que a não incidência do IPVA sobre esses veículos fere o princípio da capacidade contributiva e da justiça fiscal. Tal desejo não prospera, em primeiro lugar a Constituição Federal, em seu art.22, I, de forma clara, atribui privativamente à União a criação de normas aeronáuticas e marítimas, o que, já é devidamente regulamentado. Além disso, o arcabouço jurídico infraconstitucional inviabiliza a logística de tal tributação por parte dos Estados, e para isso, basta a constatação do terrível défict humano fiscal, para perceber que a fiscalização pelos Estados e os mais de 500 municípios Brasil seria impossível.
Quanto a ofensa aos princípios da capacidade contributiva e da justiça fiscal, o que restou demonstrado é que ambos permanecem íntegros, na medida em que, por serem embarcações e aeronaves bens de alto valor, e que dependem de outra infraestrutura e logística, é natural que ambos sofram outras formas de tributação, o que tende a trazer equilíbrio, além de uma distribuição de receita mais simples.
Por fim, o mais conveniente depois de enfrentados todos os questionamentos, seria a criação da norma geral regulamentadora, onde seriam estabelecidos todos os critérios de cobrança do IPVA, bem como suas alíquotas e definindo, por fim, que “veículo automotor” são apenas os veículos automotores terrestes. Porém, sabemos da morosidade legislativa para criar a referida lei, portanto, seria viável, no presente momento, a apresentação de uma proposta de emenda à constituição, com o objetivo pontual de alterar o inciso III do art. 155, da CF/88, para que nele conste que o fato gerador do IPVA é a propriedade de veículo automotor terrestre.
Informações Sobre o Autor
Isabela de Sousa Rodrigues
Bacharela em direito pela Faculdade de Direito do Vale do Rio Doce-MG; Advogada atuante nas áreas tributária cível e consumidor; Pós-graduada em Direito Tributário pela UCAM-RJ e Pós-graduanda em Direito Civil e Direito Processual Civil pela Estácio-MG