Considerações sobre os fundamentos do direito tributário brasileiro

É relevante registrar que o atual texto constitucional vigente deixou de estabelecer formalmente o conceito de tributo. Caberá ao intérprete o ônus de deduzir a partir da premissa constitucional, e quais princípios jurídicos se reportou o constituinte ao regular a matéria tributária principalmente no que se refere ao conceito de tributo que inclui diversas figuras, como, por exemplo, impostos, taxas e empréstimos compulsórios.

É verdade a atividade hermenêutica é inescapável e envolve a interpretação sistêmica para se compreender o que caracteriza como tributo e, a partir da leitura conjugada de dispositivos constitucionais com o art. 3º da Lei 5.172, de 23 de outubro de 1966 (CTN).

A lei que instituiu o Código Tributário Nacional foi o Ato Complementar 36/67 e, formalmente ordinária, tendo sido recepcionada como lei complementar pelas constituições brasileiras de 1967 e de 1988 (vide STF Pleno RE 93.850/MG, Relator Ministro Moreira Alves, j. 20.05.1982, DJ 27/08/1982; RTJ 105/194).

O texto constitucional brasileiro de 1988 em seu art. 146, III atribuiu à lei complementar, entre outras funções, a de estabelecer a definição de tributos, tarefa cumprida pelo CTN.

Contudo há forte discussão doutrinária sobre o tema principalmente pelo fato de que todos os elementos que integram a sua definição conforme alune o CTN, também se adequem às outras classes de ingressos públicos.

São, ao todo, seis elementos básicos[1] para identificação conceitual de tributo.

O termo “tributo” primitivamente correspondia à imposição que ao fim da guerra, o vencedor impunha ao vencido, sendo o tributo uma fonte normal de recursos para o Estado (fim fiscal) e, também, um instrumento de que se utiliza para intervir na seara econômica, social e política (fim extrafiscal) [2].

Juridicamente, o Estado tem a seu dispor o poder de instituir tributos.  Evidentemente, por se tratar de um Estado Democrático de Direito, este poder tributário encontra fundamento, e limites, na lei — no caso do Brasil — prioritariamente na Constituição Federal.

A Constituição Federal do Brasil, no entanto, não define nem institui tributos. O que a Constituição faz é escolher certos fatos ou atos e negócios jurídicos que expressam riqueza e distribui a competência para instituir tributos sobre estes fatos aos entes federativos (União, Estado, Município e Distrito Federal) ou a entidades paraestatais.

Assim, cada ente, no âmbito da competência outorgada pela Constituição, deverá instituir os tributos respectivos.

Enfim, o tributo pode ser conceituado como dever fundamental e que se constitui em prestação pecuniária que, limitado pelas liberdades fundamentais, sob a direção dos princípios constitucionais de capacidade contributiva, do custo/benefício ou da solidariedade do grupo e com a finalidade principal ou acessória de obtenção de receita[3] para as necessidades públicas ou para atividades protegidas pelo Estado, é exigido de quem tenha realizado o fato descrito em lei e elaborado de acordo com a competência específica outorgada pela Constituição Federal.

É prestação pecuniária não sancionatória de ato ilícito[4], instituída em lei e devida ao Estado ou entidades não estatais de fins de interesse público.

Há doutrinador que critica a expressão “prestação compulsória” contida no art. 3º do CTN. Pois o devedor de obrigação não tributária também compelível a efetuar a prestação do objeto de sua obrigação jurídica, porque o credor tem o direito de exigi-la coercitivamente.

Tributo constitui receita derivada porquanto a transferência compulsória vinda do patrimônio do particular para o patrimônio público, e a obrigação de dar coisa certa porque se cuida de prestação pecuniária.

O conceito de tributo também pode variar de acordo com a visão do agente que o utiliza. Assim, para o contribuinte, o tributo geralmente é visto como algo não desejado, como uma intervenção do Estado no seu patrimônio e, sendo assim, deve ser feita nos estritos limites da lei. Ives Gandra Martins conceitua tributo como uma “norma de rejeição social” [5].

O Estado impõe ao contribuinte através de seu poder de império, uma prestação pecuniária, ou seja, uma obrigação cujo conteúdo se expressa em moeda. O tributo necessariamente é a obrigação pecuniária voltada ao custeio das atividades dos entes políticos ou outras atividades do interesse público.

A obrigação de se pagar imposto decorre diretamente da lei (obrigação ex lege) e não da vontade dos sujeitos da relação jurídica (obrigação ex voluntate).

Portanto, é irrelevante para o nascimento da obrigação tributária, a vontade de cumprir ou não, visto que esta deriva de lei.

Também não basta a existência da lei prevendo tributo ou a obrigação tributária e, surge concretamente o fato ou pressuposto que o legislador indica como sendo capaz de servir de fundamento à ocorrência da relação jurídica tributária (…) a que se dá o nome de fato gerador.

A compulsoriedade da prestação tributária decorre somente do comando legal.

Outra questão é relativa à interpretação do art. 3º e do art. 156 do CTN principalmente com a alteração promovida pela Lei Complementar 104 de 10 de janeiro de 2001, pois trouxe a inclusão do inciso XI no art. 156 quando se passou a admitir como forma de extinção do crédito tributário, a dação em pagamento de bens imóveis na forma e condições estabelecidas em lei (de caráter exemplificativo e não taxativo).

No mesmo sentido posiciona-se Amaro quando assevera que o rol do art. 156 do CTN tem natureza exemplificativa e, que a lei ao admitir em circunstâncias especiais a extinção do crédito tributário mediante a dação em pagamento, estabelece clara exceção que não infirma a regra, mas pelo contrário, a confirma.

Fato é que a partir da alteração promovida pela LC 104/01, do teor do art. 156, XI do CTN extrai-se da interpretação de que o pagamento do tributo por meio de dação em pagamento poderá ocorrer com a oferta de bens imóveis e na forma específica.
Assim caberia a cada ente da federação regular em função de sua autonomia, a viabilidade, ou não, da utilização do instituto de crédito de natureza tributária.

A rigor, o STF tem se posicionado no sentido de admitir a quitação de débito tributário por dação em pagamento, mas apenas por oferta de bens imóveis, na forma prevista no inciso XI do art. 156 do CTN, remetendo-se a lei ordinária a regulamentação da forma e das condições em que se dará a tal extinção do crédito tributário.

O tributo não se confunde com as penalidades pecuniárias, e nem tampouco com as multas fiscais, embora sejam ambas as receitas[6] de natureza compulsória. O tributo é prioritariamente destinado a atender as despesas essenciais do Estado.

Quando se diz que o tributo não constitui sanção de ato ilícito, isto quer dizer que a lei não pode incluir na hipótese de incidência tributária o elemento ilicitude. Não pode estabelecer como necessária e suficiente à ocorrência da obrigação de pagar um tributo uma situação que não seja lícita. Se o faz, não está instituindo um tributo, mas uma penalidade.

Ricardo Lobo Torres, ao distinguir as penalidades pecuniárias e as multas fiscais dos tributos, leciona que as primeiras, embora constituam prestações compulsórias, “têm a finalidade de garantir a inteireza da ordem jurídica tributária contra prática de atos ilícitos, sendo destituídas de qualquer intenção de contribuir para as despesas do Estado”.

O tributo[7], contrariamente, “é o ingresso que se define primordialmente como destinado a atender às despesas essenciais do Estado”.

Aqui importa ressaltar que não importa se origem do fato ocorrido (p.ex. auferir renda) seja ilícita para que o tributo incida. Mesmo que a renda auferida por determinada pessoa tenha origens ilícitas (p.ex. tráfico de drogas, etc), o tributo recairá, pois o fato de auferir renda não se constitui um ilícito.

Por fim, os tributos são submetidos a diversas classificações pela doutrina brasileira. Vejamos as principais delas, a saber:

Quanto à espécie: conforme veremos a seguir, os tributos podem ser classificados em impostos, taxas, contribuição de melhoria, empréstimo compulsório[8] e contribuições especiais. [9]

– Quanto à competência: a competência é a aptidão outorgada pela CF/88 para instituir tributos. Assim, os tributos podem ser federais, se a competência for da União, estadual, se foi outorgada aos Estados e municipal se pertence aos Municípios.

Quanto à vinculação do fato gerador a uma atividade estatal: os tributos podem ser vinculados — quando o fato gerador se refere a uma atividade estatal especifica e relativa ao contribuinte, como por exemplo, as taxas e a contribuição de melhoria; ou não vinculados, quando o fato gerador for uma atividade do contribuinte, como no caso dos impostos e contribuições especiais.

Quanto à vinculação do produto da arrecadação — tributos com arrecadação vinculada — aqueles em que o produto da arrecadação deve ser aplicado à finalidade que deu origem ao tributo, ex: contribuições especiais e tributos com arrecadação não vinculada — são aqueles em que o valor arrecadado não precisa ser aplicado a nenhuma finalidade estabelecida, ex: taxas e impostos.

Quanto à função: Fiscal, quando seu principal objetivo é a arrecadação de recursos financeiros para o Estado.

Extrafiscal, quando seu objetivo principal é a interferência no domínio econômico, buscando um efeito diverso da simples arrecadação de recursos financeiros.

Parafiscal, quando o seu objetivo é a arrecadação de recursos para o custeio de atividades que, em princípio, não integram funções próprias do Estado, mas este as desenvolve através de entidades específicas.

Quanto à possibilidade de repercussão do encargo econômico: os tributos podem ser diretos ou indiretos.

Diretos são os tributos que não admitem repassar o encargo econômico a terceiros, ou seja, quem efetua a arrecadação aos cofres públicos é a mesma pessoa que paga efetivamente o tributo, ex. IPTU, IPVA, IR, taxas, etc.

Já os tributos indiretos são aqueles que admitem o repasse do encargo econômico do tributo, ou seja, a pessoa responsável em recolher o tributo aos cofres públicos (sujeito passivo), não é a mesma que efetivamente suporta o ônus econômico do tributo, como no caso do ICMS, em que o sujeito passivo é o comerciante, mas quem paga efetivamente o tributo é o consumidor final, pois o valor relativo a este imposto.

É repassado ao consumidor juntamente com o preço da mercadoria.

Quanto aos aspectos objetivos ou subjetivos da hipótese de incidência: serão reais os tributos que estão relacionados com uma coisa, objeto, tais como o ICMS, IPTU, IPVA, sem levar em consideração características pessoais do contribuinte. Já os tributos pessoais levam em consideração aspectos pessoais, subjetivos do contribuinte, tal como o IR, que considera características pessoais do contribuinte na sua incidência.

O tributo terá natureza de taxa[10] e/ou contribuição de melhoria, sempre que a sua exigência esteja vinculada à atuação do Estado em função da pessoa do contribuinte (taxa vinculada ao exercício do poder de polícia ou à prestação de um serviço público específico e indivisível; contribuição de melhoria, vinculada à elaboração de obra pública que gere uma valorização imobiliária em favor do contribuinte).

Desse modo, se o fato gerador de uma contribuição ou empréstimo compulsório estiver vinculado a uma atuação estatal em favor do contribuinte, estaremos diante de uma taxa. Caso contrário, a contribuição e o empréstimo compulsório terão natureza de imposto.

Com a CF/88, a teoria majoritária, que está, inclusive, em consonância com o entendimento do Supremo Tribunal Federal, é a teoria quinquipartida, defendida, entre outros, por Hugo de Brito Machado, Ives Gandra da Silva Martins e Paulo Ayres Barreto para quem, em nosso Sistema Tributário Nacional, encontram-se cinco espécies tributárias, a saber: os impostos, as taxas, as contribuições de melhoria, as contribuições especiais e os empréstimos compulsórios.

Para estes doutrinadores, a CF/88 trouxe a necessidade de se adotar os novos critérios de classificação dos tributos. Assim, além do critério da vinculação ou não a uma atividade estatal, dois novos critérios surgiram: a destinação do produto da arrecadação (critério utilizado para especificar a natureza jurídica das contribuições) e a previsão de restituição do tributo pago (critério para diferenciar o empréstimo compulsório das demais espécies tributárias).

Estes novos critérios (destinação/restituição) aparecem na doutrina ora como subclasses sucessivas, ora como classes ao lado do critério vinculado/não vinculado.

Assim, a CF/88 teria trazido o critério da destinação do produto da arrecadação como forma de diferenciação das duas figuras tributárias. O mesmo acontece com o empréstimo compulsório e o critério de restituição do valor pago.

Em resumo, podemos concluir que as diversas correntes doutrinárias em torno da questão da divisão das espécies tributárias divergem entre si em razão dos critérios que adotam para a classificação dos tributos.

Enquanto alguns autores adotam somente o critério da vinculação, a teoria mais contemporânea adota os critérios da vinculação, destinação e restituição.

TRIBUTOS EM ESPÉCIE

Apesar desta disposição constitucional, é o CTN que conceitua em seu art. 16 a figura do imposto:

Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

Assim, segundo esta definição legal, o imposto tem por principal característica a previsão de uma situação desvinculada de qualquer atividade do Estado como fato gerador.

Amaro nos explica que “para exigir imposto de certo indivíduo, não é preciso que o Estado lhe preste algo determinado”. É por essa razão que dizemos que o imposto é um tributo não vinculado, porque independe, para sua cobrança, de qualquer atividade direta do Estado em prol do contribuinte.

Dessa forma, o fato gerador do imposto não será um ato a ser praticado pelo Estado, como veremos a seguir no caso das taxas, mas uma situação praticada pelo contribuinte.

Por exemplo, auferir renda, fato gerador do imposto sobre a renda, é uma situação vinculada ao contribuinte e não ao Estado. Da mesma forma, prestar serviços (fato gerador do Imposto sobre Serviços), importar mercadorias (fato gerador do Imposto de Importação), etc.

Todos os fatos geradores dos impostos serão situações praticadas pelo contribuinte e esta é a marca principal de definição dos impostos.

Outra característica dos impostos é o fato do produto da sua arrecadação, regra geral, não ser vinculado a uma destinação específica.

O art. 167, IV, CF/88 trata da não afetação dos impostos[11], de forma que esta espécie tributária só pode ter destinação específica caso haja previsão constitucional neste sentido.

O referido dispositivo constitucional traz, também, algumas exceções a não-afetação dos impostos. Por este motivo é que o art. 128, CTN, por exemplo, não foi recepcionado pela CF/88, pois trazia destinação específica ao Imposto de Exportação que a CF/88 não prevê.

Ainda com relação aos impostos, o parágrafo 1º do artigo 145 da CF/88 estabelece que:

“Art. 145 § 1º — Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte”.

Este dispositivo alerta para o fato de que, sempre que a estrutura do imposto assim o permitir, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte.

Ou seja, a tributação por meio dos impostos deverá, sempre que possível, ser feita (customizada) para cada contribuinte, respeitando as diferenças em termos de capacidade contributiva e econômica, tributando-se de acordo com o que cada um pode e deve pagar.

Os impostos, assim como todos os outros tributos, podem ser diretos ou indiretos.

Direto é aquele em que o sujeito passivo, chamado de contribuinte de direito, não tem a possibilidade de transferir de forma automática e individualizada o ônus financeiro da carga fiscal aos consumidores, por exemplo, o Imposto de Renda.

Indireto, por sua vez, é aquele em que o contribuinte de direito consegue transferir de forma automática e individualizada o ônus econômico da carga tributária ao consumidor dos produtos e serviços, por exemplo, o ICMS.

Existe ainda, ainda, a divisão entre impostos pessoais e reais. Os impostos pessoais possuem base em características pessoais dos contribuintes, enquanto os reais possuem base em aspectos objetivos, não levam em consideração as características pessoais dos contribuintes.

Os impostos classificam-se, também, em seletivos e não seletivos. Os seletivos são aqueles em que a alíquota é maior ou menor, dependendo da essencialidade do bem.

Já os impostos não seletivos são aqueles em que não existe a diferença entre alíquotas em razão da essencialidade do bem.

Os impostos podem ainda ser cumulativos ou não cumulativos. Um imposto cumulativo incide em todas as etapas da cadeia de circulação do bem, já os impostos não cumulativos são aqueles em que o valor pago na etapa anterior pode ser abatido na etapa subsequente.

OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA

Após termos visto o que é a regra-matriz de incidência tributária, passaremos agora a analise do vinculo jurídico que nasce a partir da ocorrência do fato descrito na hipótese da regra-matriz, ou seja, a relação jurídica que se instaura com o acontecimento do fato descrito na hipótese da regra-matriz de incidência tributária — fato imponível ou fato jurídico tributário.

Tal relação jurídica nada mais é que a concretização do consequente da regra-matriz de incidência tributária, formada pelos critérios pessoal (sujeito ativo e sujeito passivo) e quantitativo (base de cálculo e alíquota).

Ou seja, a regra-matriz de incidência tributária extraída da lei que institui e regula determinado tributo já prevê hipoteticamente a consequência da realização concreta do fato descrito em sua hipótese — o dever do sujeito passivo realizar uma prestação ao sujeito ativo.

Assim, uma vez ocorrida o fato descrito na hipótese da regra-matriz (fato gerador, fato imponível ou fato jurídico tributário), nasce a relação jurídica prevista no consequente — a obrigação tributária.

Assim como toda a obrigação jurídica, a obrigação tributária também é uma relação jurídica entre devedor e credor que tem por objeto uma prestação.

O que difere a obrigação tributária das demais é que esta tem por objeto uma prestação de natureza tributária, que pode assumir a forma de um dar, no caso de obrigação de pagar tributo ou penalidade pecuniária, ou de fazer ou não fazer alguma coisa, no caso da obrigação de cumprimento de deveres instrumentais à cobrança do tributo.

O art. 113 do CTN divide a obrigação tributária em principal e acessória. Segundo o § 1º deste artigo, a obrigação principal surge com a ocorrência do fato gerador, tem por objeto o pagamento de tributo ou penalidade pecuniária e extingue-se juntamente com o crédito dela decorrente.

Assim, equiparou o CTN à obrigação principal tanto aquela que tenha por objeto o pagamento de valores relativos a determinado tributo, quanto a que tem por objeto o pagamento de uma penalidade pecuniária. O requisito escolhido pelo CTN para classificar, portanto, as obrigações tributárias em principal é o caráter pecuniário ou não da exação.

Desta forma, sempre que a cobrança envolva a prestação de dinheiro, será ela considerada obrigação principal, mesmo que não diga somente respeito à exigibilidade do tributo em si.

Ou seja, serão consideradas obrigações principais tanto uma prestação cobrada do sujeito passivo que se refira à cobrança de tributo, quanto outra que diga respeito à cobrança de penalidade pecuniária (multas) pelo descumprimento de obrigações tributárias.

Já o § 2º do art. 113 do CTN define a obrigação acessória como aquela que decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.

Portanto, diferentemente da obrigação classificada como principal, a obrigação acessória, também chamada por parte da doutrina como deveres instrumentais, tem por objeto uma prestação não-pecuniária, ou seja, um fazer ou não fazer alguma coisa.

Como exemplos de obrigações acessórias temos a) prestar declarações, b) emitir notas fiscais, c) escriturar livros contábeis e fiscais, d) guardar documentos, etc.

Por fim, acrescenta ainda o § 3º do artigo 113 do CTN que a obrigação acessória, pelo simples fato da sua inobservância, converte-se em obrigação principal relativamente à penalidade pecuniária.

Ou seja, se acaso uma obrigação acessória não for observada, o seu descumprimento enseja a aplicação de uma penalidade pecuniária, normalmente representada por uma multa.

Esta multa, por ter caráter pecuniário — é representada por uma quantia em dinheiro — torna-se uma obrigação principal, já que, conforme vimos, toda a obrigação tributária de cunho patrimonial é classificada como principal, segundo o § 1° do art. 113 do CTN.

CONCEITO DE RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

O sujeito passivo da relação jurídica tributária é aquele de quem se exige o cumprimento da obrigação, geralmente sendo aquele sujeito que produz o fato gerador: o contribuinte.

Ocorre, no entanto, que outra pessoa, que não aquela que praticou o fato gerador, pode também ser alçada à posição de sujeito passivo da obrigação tributária. A esta pessoa dá-se o nome de responsável tributário.

O parágrafo único do art. 121 do CTN dispõe sobre o sujeito passivo da obrigação principal:

“Parágrafo único. O sujeito passivo da obrigação principal diz-se:

I — contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador;

II — responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei.”

Já o art. 128 do CTN define a figura do responsável tributário, nos seguintes termos:

“Art. 128. Sem prejuízo do disposto neste capítulo, a lei pode atribuir de modo expresso a responsabilidade pelo crédito tributário a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, excluindo a responsabilidade do contribuinte ou atribuindo-a a este em caráter supletivo do cumprimento total ou parcial da referida obrigação”.

Assim, da leitura dos dispositivos do CTN, podemos concluir que poderão figurar como sujeito passivo da obrigação tributária: o contribuinte.

— Aquele que tem relação pessoal e direta com o fato previsto no critério material — ou o responsável — aquele que, sem ter praticado diretamente o fato gerador, tem com ele relação indireta ou por expressa disposição legal.

Maria Rita Ferragut define a responsabilidade como “a ocorrência de um fato qualquer, lícito ou ilícito, que autoriza a constituição da relação jurídica entre o Estado-credor e o responsável, relação essa que deve pressupor “a existência de fato jurídico tributário”“.

FORMAS E LIMITES DA RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA

A responsabilidade pode ser imputada ao terceiro de três formas diferentes: pessoalmente, subsidiariamente ou solidariamente.

A responsabilidade será pessoal quando competir exclusivamente ao terceiro adimplir a obrigação desde o nascimento desta.

Ou seja, o responsável figurará como único sujeito passivo da obrigação e o contribuinte será, por algum motivo previsto em lei, afastado da obrigação de pagar o tributo.

Com relação à responsabilidade subsidiária, nesta o terceiro será chamado para o pagamento somente se restar constatado a impossibilidade de pagamento pelo contribuinte, devedor originário.

Ou seja, se determinada responsabilidade for do tipo subsidiária, primeiro se cobrará do contribuinte e, somente no caso deste não cumprir com a obrigação tributária devida, se chamará o responsável para efetuar o respectivo pagamento.

Por fim, a responsabilidade será solidária quando mais de uma pessoa integra o polo passivo da obrigação tributária, sendo todos, responsáveis ao mesmo tempo pela integralidade da divida tributária.

Com relação aos limites da responsabilidade tributária, é o legislador ordinário livre para escolher qualquer pessoa para figurar como sujeito passivo da obrigação?

Apesar da Constituição não prever expressamente os sujeitos passivos da obrigação tributária de cada tributo nela previsto, nem por isso o legislador é livre para alçar à posição de devedor qualquer pessoa. Primeiramente, hão que ser respeitados os princípios constitucionais da capacidade contributiva e do não-confisco.

Maria Rita Ferragut ainda elenca dois outros requisitos decorrentes destes princípios. Para a referida doutrinadora, para que um sujeito seja considerado responsável pelo pagamento de determinada obrigação tributária, terá que estar “a) indiretamente vinculado ao fato jurídico tributário, ou seja, ao fato descrito pelo critério material da regra-matriz de incidência tributária ou b) direta ou indiretamente vinculada ao sujeito que o praticou”.

Assim, sem que estejam presentes estes requisitos, um sujeito não poderá ser chamado a compor a sujeição tributária passiva de determinada obrigação.

A responsabilidade tributária é dividida em várias espécies, de acordo com o motivo que enseja o seu nascimento.

Assim, são espécies de responsabilidade prevista no CTN e CF/88:

Responsabilidade por substituição art. 150, parágrafo 7° da CF/88.

Responsabilidade por solidariedade art.124 do CTN

Responsabilidade dos sucessores  arts. 129 à 134 do CTN

Responsabilidade de terceiros         arts.134 e 135 do CTN

Responsabilidade por infrações    arts. 136 à 138 do CTN

REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA DO ICMS— MERCADORIAS

O ICMS encontra-se previsto no art. 155, II da CF/88, nos seguintes termos:

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: II — operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

Com relação ao ICMS podemos extrair ao menos três regras-matrizes de incidência tributária, tendo em vista que a Constituição reuniu diferentes materialidades sob o mesmo imposto.

Vejamos quais os principais critérios materiais que podem ser extraídos com relação ao ICMS:

i) realizar circulação de mercadorias

ii) prestar serviços de transporte interestadual e intermunicipal

iii) prestar serviços de comunicação

Nesta apostila, faremos a análise somente do primeiro critério material — realizar circulação de mercadorias, enquanto que posteriormente veremos as demais materialidades.

De início, importante verificar os pressupostos para a realização da circulação da mercadoria.

Para que se considere ocorrida a circulação de mercadorias para fins de incidência do ICMS é preciso estar presentes as seguintes situações simultaneamente:

i) realização de operação mercantil (negócio jurídico): para que a circulação da mercadoria seja passível de tributação pelo ICMS é preciso que esta circulação seja precedida de um negocio jurídico, geralmente um contrato de compra e venda.

Em outras palavras, a circulação da mercadoria deve ocorrer em função de uma operação mercantil prévia;

ii) circulação jurídica: o segundo requisito para a configuração do critério material do ICMS é que ocorra uma circulação jurídica e não meramente física da mercadoria, ou seja, que haja uma transmissão da posse ou propriedade da mercadoria de uma pessoa à outra.

A circulação, por conseguinte, deve ser entendida como mudança de titularidade da mercadoria, a sua passagem de uma pessoa à outra;

iii) existência de mercadorias enquanto objeto: por fim, o ultimo requisito do critério material do ICMS é que a operação mercantil que acarreta a circulação jurídica da mercadoria tenha como objeto uma mercadoria.

Mercadoria é todo objeto, bem móvel sujeito à mercancia, objeto da atividade mercantil e introduzido no processo econômico circulatório com a finalidade de venda ou revenda.

O propósito da mercadoria é ter uma destinação comercial.

Assim, a mercadoria não se equipara à bem para uso e consumo próprios, pois estes não se destinam ao comércio, não incidindo, por conseguinte o ICMS sobre operações que acarretem sua circulação.

Em conclusão, para ocorrer o critério material do ICMS- Mercadorias, deve ocorrer os três pressupostos: operação + circulação + mercadoria — simples contrato (sem transferência do domínio) não basta, simples circulação (sem mudança de titularidade) não basta!

Assim, levando-se em consideração os critérios acima fixados, não podem ser tributadas pelo ICMS a simples circulação física da mercadoria, ou seja, quando ela é transferida de um estabelecimento a outro da mesma empresa, bem como a venda de bens de uso e consumo e do ativo fixo imobilizado da empresa, pois tais operações não tem como objeto uma mercadoria.

Ex. um liquidificador para uma loja de eletrodomésticos é considerado mercadoria, pois tal produto é destinado ao comércio. Sobre esta operação, portanto, haverá a incidência do ICMS.

Se uma pessoa física, no entanto, vender seu liquidificador usado à outra pessoa, não será tributada pelo ICMS, pois o mesmo produto, neste caso, não é mercadoria, mas bem utilizado para uso e consumo da pessoa que o está vendendo.

Em continuação à regra-matriz do ICMS, temos como segundo critério o espacial.

Tendo em vista que o ICMS é um tributo de competência estadual, o critério espacial coincide com o âmbito de validade da lei que o rege: território de determinado Estado. Assim, todas as operações que acarretem a circulação de mercadorias dentre do território de um determinado Estado, será tributado pelo ICMS do respectivo Estado.

Para finalizar a hipótese da regra-matriz do ICMS, temos o critério temporal, quando se reputara ocorrida a circulação da mercadoria.

Com relação a este critério, a princípio, caberá a cada lei estadual estabelecer o momento de ocorrência do fato descrito no critério material: momento da entrada da mercadoria no estabelecimento, momento da sua saída, momento da extração da nota fiscal, etc.

O art. 12, I da LC 87/96, que dispõe sobre normas gerais do imposto, define que se considera “ocorrido o fato gerador do imposto no momento da saída de mercadoria de estabelecimento do contribuinte”. Assim, reputar-se-á ocorrida a circulação da mercadoria, para fins de incidência do ICMS, no momento em que a mesma sai do estabelecimento do comerciante.

Passaremos agora à análise do consequente da regra-matriz do ICMS. No critério pessoal, temo como sujeito ativo da obrigação tributária o Estado onde a operação mercantil que tem por objeto a circulação da mercadoria se realizou. Será este Estado que terá a capacidade tributária ativa de cobrar o tributo do sujeito passivo?

No que tange ao sujeito passivo da obrigação, poderá figurar nesta posição quem realiza a operação mercantil ou outra pessoa vinculada ao fato gerador a que a lei atribua o dever de recolher o tributo.

Segundo o art. 4º da LC 87/96, será sujeito passivo do ICMS pessoa física ou jurídica que realiza com habitualidade ou em volume que caracterize intuito comercial.

Por fim, a base de cálculo do ICMS será o valor da operação mercantil, ou seja, o valor de saída da mercadoria. Cumpre salientar que somente deverão integrar a base de calculo do ICMS valores inerentes às mercadorias, não se podendo incluir, portanto, elementos estranhos como seguros, juros, multas, etc.

A alíquota a ser aplicada será definida pela legislação estadual e geralmente é estabelecida em 17% ou 18%.

Com relação às alíquotas, a CF/88 estabeleceu que o Senado fixará  as alíquotas “aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação” (art. 155, § 2°, IV) e poderá fixar as alíquotas mínimas e máximas nas operações internas (art. 155, § 2°, II e III).

Por fim, o art. 155, § 2°, VII dispõe que em relação às operações e prestações que destinem bens e serviços ao consumidor final localizado em outro Estado, adotar-se-á:

“a) a alíquota interestadual, quando o destinatário for contribuinte do imposto e,

b) a alíquota interna, quando o destinatário não for contribuinte dele.”

No caso da operação interestadual ser destinada a contribuinte do imposto, caberá ao Estado da localização do destinatário o imposto correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual (155, § 2°, VIII).

NÃO-CUMULATIVIDADE DO ICMS

O § 2.º do artigo 155 da CF/88 dispõe sobre a não-cumulatividade do ICMS nos seguintes termos:

Art. 155. § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

“I — será não-cumulativo, compensando-se o que for devido em cada operação relativa à circulação de mercadorias ou prestação de serviços com o montante cobrado nas anteriores pelo mesmo ou outro Estado ou pelo Distrito Federal;”

Na prática, o princípio se materializa por uma sistemática de compensações entre “créditos” e “débitos”.

Os “créditos” dizem respeito ao ICMS incidente nas operações de aquisição de bens e prestações de serviços prestadas ao comerciante.

Já os “débitos” dizem respeito ao ICMS devido nas operações próprias, ou seja, na circulação de mercadoria ou prestação de serviço realizada pelo próprio comerciante.

Ao final, para evitar a tributação em cascata, ou seja, a cobrança de imposto sobre imposto, apura-se o ICMS devido compensando-se os débitos menos os créditos.

Detalhe importante é o fato de que a expressão “montante cobrado”, contida na segunda parte do art. 155 § 2.º, I da CF, deve ser juridicamente entendida como “montante devido” e, não como “montante exigido”.

Ou seja, para fins de creditamento de ICMS, pouco importa se o sujeito passivo da operação anterior recolheu efetivamente o imposto aos cofres públicos. O que importa é a ocorrência da hipótese de incidência tributária descrita em lei e, por consequência, o nascimento da obrigação tributária.

Carrazza assim explica o instituto: “Desta forma, o contribuinte, para calcular o montante de ICMS a recolher, deve subtrair, periodicamente, de todos os débitos (causados por saídas de mercadorias, bens e serviços tributáveis), todos os créditos (provenientes de entradas de mercadorias, bens e serviços tributáveis).”.

Assim, se o resultado da compensação dos débitos com os créditos for positivo, o sujeito passivo recolherá a diferença aos cofres públicos. Se negativo, ficará com créditos para serem utilizados em períodos de apuração futuros.

A Lei Complementar 87/96 estabelece critérios para a possibilidade de creditamento.

Regra geral, segundo o artigo 20 desta lei, “é assegurado ao sujeito passivo o direito de creditar-se do imposto anteriormente cobrado em operações de que tenha resultado a entrada de mercadoria, real ou simbólica, no estabelecimento, inclusive a destinada ao seu uso ou consumo ou ao ativo permanente, ou o recebimento de serviços de transporte interestadual e intermunicipal ou de comunicação”.

A mesma lei traz, no entanto, limitações ao exercício imediato do crédito no caso de aquisição de bens para o ativo permanente, destinadas ao uso e consumo (nestas, o crédito só será permitido a partir de 01/01/2020, de acordo com a Lei Complementar 138/2010) e referente ao consumo de energia elétrica, entre outras restrições.

CONCESSÃO DE BENEFÍCIOS FISCAIS

A Constituição Federal de 1988, ao conceder a competência para a instituição do ICMS aos Estados, prescreve em seu art. 155, § 2°, XII, g, que cabe “a lei complementar regular a forma, como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados”.

Ao comentar o dispositivo, Roque Antônio Carrazza afirma que, ao contrário dos demais impostos, a isenção, incentivos e benefícios fiscais no ICMS não podem ser concedidos unilateralmente, nem mesmo por lei ordinária, pelos Estados ou Distrito Federal.

A regulamentação da matéria é feita pela Lei Complementar n° 24/75 da seguinte maneira:

Art. 1º As isenções do imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias serão concedidas ou revogadas nos termos de convênios celebrados e ratificados pelos Estados e pelo Distrito Federal, segundo esta Lei.

“Parágrafo único. O disposto neste artigo também se aplica:

I — À redução da base de cálculo;

II — À devolução total ou parcial, direta ou indireta, condicionada ou não, do tributo, ao contribuinte, a responsável ou a terceiros;

III — À concessão de créditos presumidos;

IV — A quaisquer outros incentivos ou favores fiscais ou financeiro-fiscais, concedidos com base no imposto de circulação de mercadorias, dos quais resulte redução ou eliminação, direta ou indireta, do respectivo ônus;

V — Às prorrogações e às extensões das isenções vigentes nesta data.”

O artigo 2° desta mesma Lei Complementar estabelece a forma pela qual os convênios serão celebrados:

“Art. 2º Os convênios a que alude o artigo 1º, serão celebrados em reuniões para as quais tenham sido convocados representantes de todos os Estados e do Distrito Federal, sob a presidência de representantes do Governo Federal.

1º As reuniões se realizarão com a presença de representantes da maioria das Unidades da Federação.

2º A concessão de benefícios dependerá sempre de decisão unânime dos Estados representados; a sua revogação total ou parcial dependerá de aprovação de quatro quintos, pelo menos, dos representantes presentes.”

Desta forma, os Estados e o Distrito Federal, para concederem incentivos ou benefícios fiscais dentro de seus respectivos territórios, devem antes firmar acordo sobre a matéria com os demais, através de convênios estabelecidos para este fim.

Estes convênios são celebrados perante o CONFAZ — Conselho Nacional de Política Fazendária — que conta com a participação de representantes de cada Estado brasileiro.

Carrazza chama a atenção ao fato de que os convênios celebrados perante o CONFAZ, por si só, não dão força normativa às deliberações tomadas, devendo eles ser aprovados pelos respectivos poderes legislativos e transformados em decretos legislativos para poderem integrar o ordenamento jurídico do Estado.

Além disso, a Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 155, § 2.º VI, com relação às alíquotas internas do ICMS, que “salvo deliberação em contrário dos Estados e do Distrito Federal, nos termos do disposto no inciso XII, “g”, as alíquotas internas, nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, não poderão ser inferiores às previstas para as operações interestaduais”. Resolução 22/89 do senado federal

Por fim, o art. 150. § 6.º da CF/88 exige que qualquer “subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g”.

Com relação ao posicionamento do STF sobre o tema, recentemente este Tribunal ratificou decisões anteriores, ao julgar 14 (quatorze) ações contra leis de cinco Estados e do Distrito Federal que concediam benefícios e isenções fiscais sem que houvesse convênios para este fim. Uma destas decisões teve a seguinte ementa:

“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÃO DE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS. ICMS. BENEFÍ-CIOS FISCAIS. NECESSIDADE DE AMPARO EM CONVÊNIO INTE-RESTADUAL. ART. 155, XII, G DA CONSTITUIÇÃO. Nos termos da orientação consolidada por esta Corte, a concessão de benefícios fiscais do ICMS depende de prévia aprovação em convênio interestadual, como forma de evitar o que se convencionou chamar de guerra fiscal. Interpretação do art. 155, XII, g da Constituição. São inconstitucionais os arts. 6º, no que se refere aos “benefícios fiscais” e” financeiros-fiscais”, 7º e 8º da Lei Complementar estadual 93/2001, por permitirem a concessão de incentivos e benefícios atrelados ao ICMS sem amparo em convênio interestadual. Ação direta de inconstitucionalidade julgada parcialmente procedente.” (ADI 3794, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal Pleno, julgado em 01/06/2011, DJe-146 DIVULG 29-07-2011 PU-BLIC 01-08-2011 EMENT VOL-02556-01 PP-00014).

É praticamente pacífica, assim, a posição do STF no que diz respeito à necessidade de convênio interestadual para a concessão de benefícios fiscais de ICMS pelos Estados, tendo sido declaradas inconstitucionais por este Tribunal as leis que não cumpriram tal requisito.

ICMS NA IMPORTAÇÃO DE MERCADORIAS

A parte final do art. 155, II da CF/88 dispõe que o ICMS incidirá sobre a circulação de mercadorias e prestações de serviços de comunicação e trans porte intermunicipal e interestadual “ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior”.

A redação original da CF/88 dispunha, em seu artigo 155, § 2°, IX, “a” que o ICMS incidiria também:

“IX — incidirá também:

a) sobre a entrada de mercadoria importada do exterior, ainda quando se tratar de bem destinado a consumo ou ativo fixo do estabelecimento, assim como sobre serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o estabelecimento destinatário da mercadoria ou do serviço;”

Segundo a redação deste dispositivo, não era toda e qualquer importação que seria tributada pelo ICMS.

O imposto só seria devido no caso de importação de mercadorias feita por contribuinte do imposto, seja para a finalidade de comercialização, seja para o consumo ou para integrar o ativo fixo deste.

Ou seja, nesta sistemática, não seria devido o ICMS no caso de importação feita por pessoa física ou por não contribuinte do imposto. O STF havia, inclusive, editado súmula neste sentido:

Com esta redação, então, a CF/88 passou a permitir a incidência do ICMS nas importações feitas por pessoas físicas e por não contribuinte do imposto, mesmo que estes não revistam os requisitos de habitualidade e comércio.

“INCIDÊNCIA — ICMS — IMPORTAÇÃO POR PESSOA QUE NÃO SEJA CONTRIBUINTE. Não incide ICMS na importação de bens por pessoa física ou jurídica que não seja contribuinte do imposto.” (STF Súmula nº 660 — 24/09/2003 — DJ de 9/10/2003, p. 3).

Ocorre que a Emenda Constitucional n° 33/2001 modificou o art. 155, § 2°, IX, “a” que passou a ter a seguinte redação:

“IX — incidirá também:

a) sobre a entrada de bem ou mercadoria importados do exterior por pessoa física ou jurídica, ainda que não seja contribuinte habitual do imposto, qualquer que seja a sua finalidade, assim como sobre o serviço prestado no exterior, cabendo o imposto ao Estado onde estiver situado o domicílio ou o estabelecimento do destinatário da mercadoria, bem ou serviço; e seja para qual finalidade for (uso próprio, revenda, etc).”

Parte da doutrina entende que esta emenda é inconstitucional, tendo em vista que violaria direitos fundamentais do contribuinte — como os princípios da capacidade contributiva e não-cumulatividade, cláusulas pétreas do ordenamento, além de desvirtuar a sistemática do ICMS tornando-o, neste caso, um adicional do Imposto de Importação.

A matéria teve repercussão geral reconhecida pelo STF e está pendente de julgamento:

“RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL RECO-NHECIDA. ICMS. EC 33/2001. O debate travado nos presentes autos diz com a incidência de ICMS na importação de equipamento médico por sociedade civil não-contribuinte do imposto, após a Emenda Constitucional n. 33/2001, que conferiu nova redação ao disposto no artigo 155, § 2º, IX, alínea “a”, da Constituição do Brasil. Repercussão Geral reconhecida.” (RE 594996 RG, Relator (a): Min. EROS GRAU, julgado em 11/06/2009, DJe-148 DIVULG 06-08-2009 PUBLIC 07-08-2009 EMENT VOL-02368-12 PP-02387 LEXSTF v. 31, n. 368, 2009, p. 341-345).

TRIBUTAÇÃO SOBRE O CONSUMO: ICMS-SERVIÇOS

1)ESTUDO DE CASO

GVT negocia perdão de dívida tributária com Estados

Folha de São Paulo, sexta-feira, 08 de julho de 2011.

Proposta de pagamento de pendências será discutida hoje em reunião de secretarias da Fazenda; dívida seria de R$ 900 milhões.

JULIO WIZIACK

TATIANA RESENDE

DE SÃO PAULO

Autuada por diversas secretarias da Fazenda no país, a operadora GVT negocia o perdão de parte de sua dívida de ICMS. A proposta da companhia será discutida hoje pelo Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária). Caso seja aprovado, o acordo servirá de base para que a Prefeitura de São Paulo decida sobre a liberação da entrada da empresa na cidade.

A Folha apurou que a dívida gira em torno de R$ 900 milhões e que ela pretende pagar entre 10% e 20%. Os Estados, no entanto, querem, no mínimo, 40%. Consultada, a operadora não quis comentar, afirmando que poderia interferir no processo. Informou ainda que uma equipe negocia com o Confaz para “chegar a um entendimento comum” [hoje a companhia se vale de pareceres jurídicos para recolher de forma diferente].

O problema para os Estados é que, em sua defesa, a GVT usa o caso da Embratel. Em 2006, a operadora do bilionário mexicano Carlos Slim obteve perdão de seus débitos, pagando cerca de 14% do total.

Pela legislação tributária vigente, as alíquotas dos serviços de telecomunicações variam de acordo com o Estado. No caso da GVT, há um fatiamento do preço do serviço de internet. Uma pequena parte é discriminada como serviço de comunicação (internet em banda larga, por exemplo). Sobre esse valor, a operadora recolhe ICMS.

A maior parte (entre 70% e 90%) a GVT afirma ser aluguel de infraestrutura (modem ou outro equipamento usado na prestação do serviço). E sobre aluguel não há cobrança de ICMS nem de ISS (Imposto Sobre Serviços).

Resultado: a maior parte das receitas escaparia do imposto, indo para o caixa. Com isso, a GVT reduziria sua carga tributária de 40%, média do setor, para cerca de 16%. Para ter o perdão das secretarias, a companhia terá de se comprometer em acabar com o fatiamento.

“A empresa já admite mudar a forma de tributação”, afirma Carlos Marques de Santana, coordenador do Confaz. “Estamos discutindo quando vai ser isso e como fica o passado.”

 

A

 

 

Referências:
CARRAZZA, Roque Antônio. ICMS. São Paulo: Malheiros, 2009.
KOCH, Deonísio. Manual do ICMS.  Curitiba: Juruá, 2ª Ed. 2010.
MELO, José Eduardo Soares de. ICMS — Teoria e Prática.  São Paulo: Dialética, 11ª Ed., 2009.
PAULSEN, Leandro. MELO, José Eduardo Soares de. Impostos Federais, Estaduais e Municipais.  Porto Alegre: Livraria do Advogado, 6ª edição, 2011.
MENDONÇA, Christine. A Não —Cumulatividade do ICMS.  São Paulo: Quartier Latin.
OLIVEIRA, Jose Jayme de Macedo. Impostos Estaduais — ICMS, ITCMD, IPVA.  São Paulo: Saraiva.
IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário.
São Paulo: Impetus, 16ª Ed. 2011.
BARRETO, Paulo Ayres. Contribuições — Regime Jurídico, Destinação e Controle. São Paulo: Noeses, 2006.
MELO, José Eduardo Soares de. Contribuições Sociais no Sistema Tributário.
São Paulo: Malheiros, 6ª Ed., 2010.
AMARO, Luciano, Direito tributário brasileiro. 16ª ed.
São Paulo: Saraiva, 2010.
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 32ª ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2011.
TORRES, Ricardo Lobo. Curso de Direito Financeiro e Tributário. Rio de Janeiro: Renovar, 2009.
FERRAGUT, Maria Rita. Responsabilidade Tributária e o Código Civil de 2002. São Paulo: Noeses, 2009.
 
Notas:
[1] A definição contida no art. 3° do CTN é composta, assim, de seis elementos, quais sejam, a) prestação, b) pecuniária ou em valor que nela se possa exprimir; c) compulsória; d) que não constitua sanção de ato ilícito; e) instituída em lei; f) cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

2. Ocorre, porém, que os tributos podem igualmente ser utilizados pelo Estado como instrumento de parafiscalidade ou extrafiscalidade, ou seja, tanto como uma forma de intervenção na economia, como um elemento chave na aplicação das políticas sociais e de redistribuição.

[3] A doutrina tradicionalmente classifica a receita pública em originária e derivada. As primeiras têm sua origem na exploração do patrimônio público ou decorrem da prestação de serviços públicos. As segundas, por sua vez, derivam diretamente da sociedade exigidas por ato de autoridade, como já ensinava ALIOMAR BALEEIRO. São exemplos de receita pública originária os valores pagos pela utilização de imóveis públicos (Riocentro, Maracanã, etc…). Exemplos de receitas derivadas são as multas, os tributos e as reparações de guerra.

[4] O tributo não é uma sanção por ato ilícito. Logo, sempre que alguém reparar um dano, pagar uma indenização ou estiver sujeito a uma multa por infração devida ao Estado, este pagamento não será um tributo. É por esta razão, que as multas de trânsito – devidas por infração à legislação pertinente – não são tributos.

[5] Assim, a relação fisco-contribuinte é por, sua natureza, marcada por um confronto de vontades e ideias. De um lado, o contribuinte tende a ver o tributo como uma interferência estatal em seu patrimônio; de outro, o tributo representa um pilar fundamental para o funcionamento e funções do Estado. O tributo está, assim, no meio termo entre a liberdade do contribuinte em organizar seus negócios e a necessidade do Estado em arrecadar.

[6] ALIOMAR BALEEIRO distinguia as receitas originárias (tarifas e preços públicos) das receitas derivadas adotando como critério a coação (melhor seria dizer compulsoriedade) e a origem. Dizia BALEEIRO que esta classificação (originária e derivada) “se funda na existência da aquisição compulsória em relação às receitas derivadas, o que as distingue das receitas originárias. Outro fundamento dessa divisão é a diferente origem dumas e doutras receitas: as originárias saem do próprio setor público, isto é, do patrimônio do Estado, ao passo que as derivadas são exigidas do patrimônio ou das rendas dos particulares.”.

[7] O tributo, finalmente, é cobrado por ato administrativo vinculado. Ato vinculado é aquele em que o agente público não tem liberdade de escolha, não pode deixar de praticá-lo ou não pode agir dentro de seu juízo de oportunidade e conveniência. A cobrança de tributos é imperativa e obrigatória. As autoridades tributárias são obrigadas a exigir o pagamento dos tributos e devem fazê-lo nos precisos termos da lei específica.

[8] O próprio CTN traz ainda uma quarta espécie tributária — o empréstimo compulsório — estabelecendo em seu art. 15 que “somente a União, nos seguintes casos excepcionais, pode instituir empréstimos compulsórios”.  Esta figura tributária igualmente foi prevista pela CF/88 que no art. 148, dispõe que “a União, mediante lei complementar, poderá instituir empréstimos compulsórios”.

[9] Tanto o CTN quanto a CF/88 preveem certas figuras tributárias. O art. 5º do CTN dispõe que “os tributos são impostos, taxas e contribuições de melhoria”. Já a CF/88, estipula em seu art. 145 o seguinte: Art. 145. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I — impostos; II — taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III — contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas.

[10] Curiosamente, porém, o TJ/RJ admite que mesmo tratando-se de taxa a relação entre o usuário e o concessionário do serviço está submetida às normas de proteção do consumidor, criando situação sui generis, vale dizer, de uma relação de direito público submetida ao ordenamento jurídico de proteção do consumidor. O Superior Tribunal de Justiça, ao menos a princípio, já pacificou a questão, definindo que o critério a ser utilizado na distinção entre preço público e taxa é a compulsoriedade. Isto quer dizer que, havendo lei estipulando a ligação obrigatória de toda construção à rede de água e/ou esgoto, o serviço é compulsório, devendo, portanto, ser remunerado através de taxa.

[11] A grande discussão sobre este tema gira em torno da remuneração dos serviços públicos. Que serviços devem ser remunerados por taxas? Que serviços são remunerados por preços públicos ou tarifas? A doutrina não é unânime nesta identificação, embora possam ser indicados alguns pontos comuns no pensamento de diversos juristas.


Informações Sobre o Autor

Gisele Leite

Professora universitária, Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, pedagoga, advogada, conselheira do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas.


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