Resumo: O presente artigo visa esclarecer e a enumerar os entendimentos jurisprudenciais e doutrinários, que defendem e autoriza no âmbito judicial oportunizar a defesa para as empresas indicadas em suposta formação de grupo econômico, respeitando assim, o contraditório e a ampla defesa.
Palavras-chave: Direito Tributário. Grupo econômico. Responsabilidade solidária. Princípio do contraditório e ampla defesa. Responsabilidade Subsidiária.
Abstract: This article aims to clarify and to enumerate the jurisprudential and doctrinal understandings, that defend and authorize in the judicial scope to give the defense to the companies indicated in the supposed formation of economic group, respecting, thus, the contradictory and ample defense.
Keywords: Tax law. Economic group. Solidarity responsibility. Principle of contradictory and ample defense. Subsidiary liability.
Sumário: Introdução. 1. Da violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, devido processo legal, apreciação da lesão ou ameaça a direito pelo Poder Judiciário. 1.1. Da inobservância pelo Tribunal de origem a oportunizar defesa às empresas indicadas da suposta formação de grupo econômico. Decisão contrária aos artigos 5º, XXXIV, XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal. Conclusão. Referências.
Introdução
O estudo esclarece que sob a alegação pela Fazenda Pública dos pressupostos para o reconhecimento da desconsideração da personalidade jurídica da pessoa jurídica executada, bem como, o reconhecimento da formação do alegado grupo econômico, é necessário que todas as empresas sejam citadas, oportunizado o direito da ampla defesa e do contraditório, para que tragam as razões de fato e de direito pela responsabilidade ou não do débito tributário.
1. Da violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, devido processo legal, apreciação da lesão ou ameaça a direito pelo Poder Judiciário.
1.2 Da inobservância pelo Tribunal de origem a oportunizar defesa às empresas indicadas da suposta formação de grupo econômico. Decisão contrária aos artigos 5º, XXXIV, XXXV, LIV e LV, da Constituição Federal
Importante trazer à baila a previsão da Constituição Federal sobre os princípios do devido processo legal, do contraditório e ampla defesa, em que garante a todos cidadãos um devido processo antes da perda dos bens da vida, bem como o acesso ao Judiciário a apreciar lesão ou ameaça a direito, in verbis:
“TÍTULO II – DOS DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS CAPÍTULO I – DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS
Art.5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)
XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;
XXXV – a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;(…)
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal.
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”
Os princípios em voga, não se encontram elucidado somente a partir do texto constitucional, mas também consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, artigo 8º, e na Convenção de São José da Costa Rica, promulgada pelo Decreto n° 678/92, artigo 8º, I, conforme segue:
“Artigo VIII
Toda pessoa tem direito a receber dos tributos nacionais competentes remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei.
Artigo 8º – Garantias judiciais
1. Toda pessoa terá o direito de ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou Tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou na determinação de seus direitos e obrigações de caráter civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza. (…).
Artigo 10º Toda a pessoa tem direito, em plena igualdade, a que a sua causa seja equitativa e publicamente julgada por um tribunal independente e imparcial que decida dos seus direitos e obrigações ou das razões de qualquer acusação em matéria penal que contra ela seja deduzida.
Partindo da análise de que o princípio do devido processo legal destina-se a reafirmar todas as garantias processuais constitucionalmente previstas, o doutrinador Luiz Fux estabelece as seguintes orientações, a saber:
“(…) É imagem estabelecida a de que o processo que não segue o procedimento traçado padece do vício do descompasso com o dogma constitucional do devido processo legal. O princípio do devido processo legal tem como um de seus fundamentos o processo “justo”, que é aquele adequado às necessidades de definição e realização dos direitos lesados. O senso de justiça informa, inclusive o due processo of law na sua dupla conotação, a saber: lei justa e processo judicial justo – substantive due processo of law e judicial process. O devido processo legal está encartado no direito ao processo como direito ao meio de prestação da jurisdição, que varia conforme a natureza da tutela de que se necessita. O direito a jurisdição não é senão o de obter uma justiça efetiva e adequada. Isso basta para que o juiz possa prover diante dessa regra in procedendo maior, ínsita na própria Constituição Federal, a despeito de sua irrepetição na legislação infraconstitucional. Previsão na Carta Maior revela a eminencia desse poder-dever de judicar nos limites do imperioso (…).
Complementa dito raciocínio Cassio Scarpinella Bueno[1], in verbis:
(…) o princípio do “devido processo legal” volta-se, basicamente, a indicar as condições mínimas em que o desenvolvimento do processo, isto é, o método de atuação do Estado-juiz para lhe dar com a afirmação de uma situação de ameaça ou lesão a direito deve se dar.
(…) trata-se, pois, de conformar o método de manifestação de atuação do Estado-juiz a um padrão de adequação aos valores que a própria Constituição Federal impõe à atuação do Estado e em conformidade com aquilo que, dadas as características do Estado brasileiro, esperam aqueles que se dirigem ao Poder Judiciário obter dele como resposta. É um princípio, destarte, de conformação da atuação do Estado a um especial modelo de agir.
O processo deve ser devido porque, em um Estado Democrático de Direito não basta que o Estado atue de qualquer forma, mas deve atuar de uma específica forma, de acordo com as regras preestabelecidas e que assegurem, amplamente, que os interessados na solução da questão levada ao Judiciário exerçam todas as possibilidades de ataque e de defesa que lhe pareça necessárias, isto é, de participação”.
De outra banda, o princípio do acesso ao Poder Judiciário, significa que todos têm acesso à justiça para postular tutela jurisdicional preventiva ou reparatória relativa a um direito. Denota-se que o princípio contempla não só direitos individuais como também os difusos e coletivos e que a Constituição achou por bem tutelar não só a lesão a direito como também a ameaça de lesão, englobando aí a tutela preventiva.
Desta feita, nas lições de Cândido Rangel Dinamarco (1998):
“A tutela jurisdicional é exercida através da garantia de acesso à justiça e se constitui um dos maiores, senão o maior instrumento para garantir uma ordem jurídica justa e então efetivar o exercício da cidadania plena.
O acesso à justiça está intimamente ligado à justiça social. Pode-se até afirmar que é a ponte entre o processo e a justiça social.
Ao final e também importante princípio, destacamos as lições de Humberto Theodoro Júnior[2], quanto ao princípio do contraditório e ampla defesa:
(…) embora os princípios processuais possam admitir exceções, o do contraditório é absoluto, e deve sempre ser observado, sob pena de nulidade do processo. A ele se submetem tanto as partes como o próprio juiz, que haverá de respeitá-lo mesmo naquelas hipóteses em que procede a exame e deliberações de ofício acerca de certas questões que envolvem matéria de ordem pública. Entende-se, na moderna concepção do processo assegurado pelo Estado Democrático de Direito, que o contraditório é mais do que a audiência bilateral das partes, é a garantia da participação e influência efetiva das partes sobre a formação do provimento jurisdicional (…)”
Ainda sobre o tema, o i. Min. Gilmar Ferreira Mendes[3] assim orienta, in verbis:
“(…) A Constituição de 1988 (art. 5º, LV) ampliou o direito de defesa, assegurando aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. As dúvidas porventura existentes na doutrina e na jurisprudência sobre a dimensão do direito de defesa foram afastadas de plano, sendo inequívoco que essa garantia comtempla, no seu âmbito de proteção, os processos judiciais ou administrativos. Há muito vem a doutrina constitucional enfatizando que o direito de defesa não se resume a um simples direito de manifestação no processo. Efetivamente, o que o constituinte pretende assegurar – como bem anota Pontes de Miranda – é uma pretensão à tutela jurídica.”
Ainda sobre referido princípio convém ressaltar as liçõeos do Ilustre Professor MARCUS VINÍCIUS RIOS GONÇALVES, em Direito Processual Civil Esquematizado, 2ª Edição, Editora Saraiva, página 62:
“Do contraditório resultam duas exigências: a de se dar ciência aos réus da existência do processo, e aos litigantes de tudo o que nele se passa; e a de permitir-lhes que se manifestem, que apresentem suas razões, que se oponham à pretensão do adversário. O juiz tem que ouvir aquilo que os participantes do processo têm a dizer, e, para tanto, é preciso dar-lhes oportunidade de se manifestar, e ciência do que se passa, pois que sem tal conhecimento, não terão condições adequadas para se manifestar”.
Em consonância aos regramentos e as lições doutrinárias, tem-se que evidente a violação dos dispositivos constitucionais, quando se nega as empresas indicadas pelos suposta formação de grupo econômico para o chamamento da responsabilidade solidária em matéria tributária, a se manifestarem, assim, claramente se verifica a negativa de acesso ao poder judiciário, impedindo as empresas em exercer seu direito constitucional da ampla defesa e contraditório, conforme a seguir delineado:
Trazemos á baila entendimento do Ilustríssimo Desembargador Joaquim Barbosa em análise a caso semelhante, quanto a responsabilidade em matéria tributária e o respeito ao contraditório:
“Ementa: AGRAVO REGIMENTAL. TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA. AUSÊNCIA DE CORRETA CARACTERIZAÇÃO JURÍDICA POR ERRO DA AUTORIDADE FISCAL. VIOLAÇÃO DO CONTRADITÓRIO, DA AMPLA DEFESA E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INEXISTÊNCIA NO CASO CONCRETO.
Os princípios do contraditório e da ampla defesa aplicam-se plenamente à constituição do crédito tributário em desfavor de qualquer espécie de sujeito passivo, irrelevante sua nomenclatura legal (contribuintes, responsáveis, substitutos, devedores solidários etc). (…) STF. Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 608426. DATA DE PUBLICAÇÃO DJE 24/10/2011 – ATA Nº 161/2011. DJE nº 204, divulgado em 21/10/2011.”
Importante destacar julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que bem pontuou:
“AGRAVO DE IINSTRUMENTO. REDIRECIONAMENTO. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO SÓCIO E DE TERCEIRAS EMPRESAS. INVIABILIDADE. 1. A desconsideração da personalidade jurídica da empresa executada e de terceiro ente compreende ato que exige ampla e profunda cognição, em procedimento específico a este fim, no qual resguardadas as garantias constitucionais do devido processo legal, contraditório e ampla defesa, não se revelando razoável em cognição sumária. 2. Estando pendente a tentativa de localização de demais bens da executada aptos à penhora e não concretamente configurados os requisitos necessários ao redirecionamento, descabe o deferimento de tal medida. Nº 2009.04.00.011244-9/SC. Agravante União Federal Fazenda Nacional. Agravado Plasvale Ind. De Plásticos do Vale. Des. Federal Marcelo de Nardi. Decisão disponibilizada em 29/05/2009.”
Diante do entendimento jurisprudencial, tratando-se de procedimento judicial objetivando o redirecionamento do feito para sociedade diversa da executada, ao argumento da existência de grupo econômico, e como em qualquer outro da mesma natureza, inclui-se a sua realização na previsão contida no inciso LV do art. 5º da Carta Magna.
E isso significa, obviamente, que não pode ser constituído e desenvolvido sem conhecimento e participação da pessoa jurídica que deva, eventual e oportunamente, sofrer os efeitos patrimoniais do redirecionamento da execução fiscal para responder com patrimônio próprio por dívida alheia: inibe-o, por certo, não só o enfático enunciado do colacionado preceito constitucional, como do antecedente inc. LIV, que, regrando a inafastabilidade, em situações que tais, do devido processo legal, exige a paridade de armas entre os litigantes e, por via de consequência, o contraditório ínsito à ampla defesa do agente ao qual imputados o fato ou os fatos objeto da investigação prévia.
Desta maneira, quando se verifica que a desconsideração da personalidade jurídica, sob o argumento da existência de formação de grupo econômico fora realizada de forma sumária, não oportunizando a defesa das empresas indicadas pela Fazenda Nacional. Bem como, não evidencia perigo de dano, na asseguração da execução, quando a execução já estava suficientemente garantida, antes mesmo da alegação de formação de grupo econômico e pedido de desconsideração da personalidade jurídica, viola os preceitos constitucionais, disposto no artigo 5º, XXXIV, XXXV, LV e LIV da Constituição Federal.
Conclusão
Diante do entendimento jurisprudencial, tratando-se de procedimento judicial objetivando o redirecionamento do feito para sociedade diversa da executada, como no caso presente, ao argumento da existência de grupo econômico, e como em qualquer outro da mesma natureza, inclui-se a sua realização na previsão contida no inciso LV do art. 5º da Carta Magna.
Informações Sobre o Autor
Mayara Maximiano Veneziano
Formada em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Estácio de Sá. Especialista em Direito Processual do Trabalho pela Universidade Estácio de Sá. Graduando na Especialidade em Direito Tributário Universidade Estácio de Sá. Advogada integrante do Escritório de Advocacia MMV na cidade de Cuiabá e Diamantino – Estado de Mato Grosso