Resumo: O presente estudo apresenta uma análise a respeito da forma correta de incidência do Imposto de Renda Retido na Fonte sobre verbas recebidas em processos trabalhistas, frente aos postulados normativos da capacidade contributiva e isonomia.
Palavras-chave: IRRF. Verbas trabalhistas. Isenções e deduções legais.
Sumário: 1. Aspectos legais e jurisprudências a respeito da necessidade de respeito às tabelas progressivas do imposto de renda, suas isenções e deduções, bem como a correta forma de efetuar o cálculo da exação.
No cálculo do imposto incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente ao trabalhador, devido à prolação de sentença judicial no foro trabalhista, deve ser levado em consideração as tabelas e alíquotas das épocas próprias a que se referem tais rendimentos, a fim de permitir a incidência do imposto na fonte mediante aplicação das alíquotas progressivas e respeitadas as faixas de isenção, mês a mês, nos termos como previsto no artigo 629, do RIR/94 (Decreto n.º 1.041/94) e, atualmente, artigo 620 do RIR/99 (Decreto n.º 3.000/99).
Os dispositivos legais dos regulamentos são claros em informar a forma correta de calcular o imposto devido e, segundo a jurisprudência, a aparente antinomia desse dispositivo com o artigo 12 da Lei n.º 7.713/88 se resolve pela seguinte exege-se: este último disciplina apenas o momento da incidência do imposto, já os Regulamentos do Imposto de Renda – RIR disciplinam o modo correto de calcular o mesmo.
Nesse Contexto, no ato de retenção na fonte da exação deve observar as faixas de isenção, deduções e alíquotas aplicáveis à renda que teria sido auferida mês a mês pelo contribuinte, se não fosse o pagamento a menor, e não a simples incidência do imposto sobre os vencimentos totais acumulados recebidos e atualizados em virtude de condenação judicial, sob pena de estarmos punindo o contribuinte com a retenção indevida de Imposto de Renda sobre valores dos benefícios percebidos de forma acumulada por mora exclusiva do próprio empregador e promovendo o locupletamento ilícito da Fazenda Nacional sobre verbas isentas e não tributáveis.
Nesse sentido é a majoritária jurisprudência, tanto do Superior Tribunal de Justiça, como de ambas as Turmas do E. TRF 4.ª Região, in verbis:
“TRIBUTÁRIO. REVISÃO JUDICIAL DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. VALORES PAGOS ACUMULADAMENTE. 1. No cálculo do imposto incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente, devem ser levadas em consideração as tabelas e alíquotas das épocas próprias a que se referem tais rendimentos, nos termos previstos no art. 521 do RIR (Decreto 85.450/80). A aparente antinomia desse dispositivo com o art. 12 da Lei 7.713/88 se resolve pela seguinte exegese: este último disciplina o momento da incidência; o outro, o modo de calcular o imposto. Precedentes: Resp 617081/PR, 1ª T, Min. Luiz Fux, DJ 29.05.2006 e Resp 719.774/SC, 1ª T, Min. Teori Albino Zavascki, DJ 04.04.2005. 2. Recurso especial a que se nega provimento.” (STJ, Resp n.º 901.945/PR, 1.ª Turma, Relator Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 20/08/2007, DJ de 16/08/2007, pg 300 – Grifamos)
“TRIBUTÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO RECEBIDO EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE. VALORES PAGOS ACUMULADAMENTE. 1. O imposto de renda incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente deve ser calculado com base nas tabelas e alíquotas das épocas próprias a que se referem tais rendimentos. Em outras palavras, a retenção na fonte deve observar a renda que teria sido auferida mês a mês pelo contribuinte se não fosse o erro da administração e não no rendimento total acumulado recebido em virtude de decisão judicial. Precedentes de ambas as Turmas de Direito Público. 2. Recurso especial improvido.” (STJ, Resp n.º 783.724/RS, 2.ª Turma, Relator Min. Castro Meira, julgado em 15/08/2006, DJ de 25/08/2006, pg. 328 – Grifamos)
“TRIBUTÁRIO – BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – INCIDÊNCIA SOBRE O SOMATÓRIO DE PROVENTOS PAGOS EM ATRASO – INADMISSIBILIDADE. 1 – No cálculo do imposto incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente, devem ser levadas em consideração as tabelas e alíquotas das épocas próprias a que se referem tais rendimentos. 2 – Apelação e remessa oficial desprovidos.” (TRF 4.ª Região, AC n.º 2006.71.04.006735-5/RS, 2.ª Turma, Relator Eloy Bernst Justo, julgado em 06/11/2007, de 28/11/2007 – Grifamos)
“TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – INCIDÊNCIA SOBRE O SOMATÓRIO DE PRESTAÇÕES PAGAS EM DECORRÊNCIA DE DECISÃO JUDICIAL – INADMISSIBILIDADE. 1 – “No cálculo do imposto incidente sobre rendimentos pagos acumuladamente, devem ser levadas em consideração as tabelas e alíquotas das épocas próprias a que se referem tais rendimentos, nos termos previstos no art. 521 do RIR (Decreto 85.450/80). A aparente antinomia desse dispositivo com o art. 12 da Lei 7.713/88 se resolve pela seguinte exegese: este último disciplina o momento da incidência; o outro, o modo de calcular o imposto.” (RESP 424225/SC, 1ª Turma, Rel. Min. Teori Zavascki, DJ de 19/12/2003, p. 323). 2 – Não poderia a Fazenda lançar o tributo sobre o valor acumulado dos valores e sim sobre cada parcela devidamente discriminada, de acordo com as alíquotas e faixas de isenção vigentes na época em que deviam ser pagas.” (TRF 4.ª Região, AC n.º 2004.04.01.022941-8/PR, 1.ª Turma, Relatora Maria Lúcia Luz Leiria, julgado em 03/06/2004, DJU de 01/12/2004, pg. 311 – Grifamos)
Após a análise da jurisprudência suso transcrita, verificamos ser cristalino o direito dos trabalhadores agraciados por verbas decorrentes de condenações em sede de sentenças trabalhistas, em ver readequado o cálculo do Imposto de Renda devido, como se fosse apurado mês a mês, acrescido dos valores que deveria ter percebido na época e que só receberá agora de forma acumulada, graças à decisão judicial do Foro Trabalhista, respeitadas é claro as isenções e deduções legais.
Para melhor visualização, estampamos a tabela progressiva para cálculo do IR mensal atualmente em vigor e, de forma exemplificativa, efetuaremos o cálculo da exação devida simulando um rendimento mensal hipotético.
Admitamos que determinada pessoa física que receba rendimentos do trabalho assalariado, possua 2 (dois) dependentes e apresente os seguintes dados no mês de março do ano de 2001:
Levando-se em conta os valores da tabela progressiva supra, o rendimento bruto apresentado corresponderia à alíquota de 27,5% (vinte e sete e meio por cento), com a parcela a deduzir de R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais). Vamos, agora, calcular o valor do IR Fonte:
Fica assim demonstrado que um rendimento mensal de R$ 3.000,00 (três mil reais), percebido no mês de março do ano de 2001, estaria sujeito à retenção na fonte de R$ 375,32 (trezentos e setenta e cinco reais e trinta e dois centavos), após os devidos descontos e deduções legalmente previstas, aplicáveis a cada caso específico. Ao admitirmos a incidência sobre valores acumulados e à alíquota máxima de 27,5% estaremos tributando a maior o contribuinte em desrespeito aos postulados normativos da isonomia (artigo 150, inciso II, da CF/88) e capacidade contributiva (§ 1.º do artigo 145, da CF/88).
Assevere-se que, além das faixas de isenção no cálculo mês a mês, existem ainda determinadas verbas que estão albergadas por isenções legalmente previstas, como é exemplo o artigo 19, II e § 1.º, da Lei n.º 10.522/2002 c/c o Ato Declaratório n.º 06, de 07/11/2006, aonde a União Federal está dispensada de contestar o pedido relativo ao abono de que trata o artigo 143, da CLT e conversão em pecúnia de 1/3 do período de férias, da mesma forma que com relação às férias indenizadas, conforme Ato Declaratório n.º 01, de 18/02/2005.
O pagamento de férias vencidas e não gozadas feito pelo empregador ao seu empregado em decorrência de rescisão do contrato de trabalho, bem como o auxílio refeição e ajuda cesta alimentação, aviso prévio, FGTS e a multa de 40%, inclusive os juros de mora e a correção monetária, não se sujeitam à incidência do imposto de renda.
Tais pagamentos estão abrangidos na regra de isenção referente à indenização paga por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, prevista no artigo 6.º, incisos I, II e V, da Lei n.º 7.713, de 1988 e no artigo 39, incisos IV, XIII e XX, do Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto n.º 3.000, de 1999.
Os pagamentos feitos pelo empregador a seu empregado, relativamente ao auxílio refeição e ajuda cesta alimentação, às férias vencidas não-gozadas e às férias proporcionais, bem como o adicional de 1/3, quando decorrente de rescisão do contrato de trabalho, não se sujeitam à cobrança do Imposto de Renda, pois estão abrangidos na regra de isenção referente à indenização paga por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, prevista no art. 6.º, I, II e V, da Lei n.º 7.713/88 e repetida no art. 39, IV, XIII e XX, do Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto n.º 3.000/99 c/c art. 146 da CLT. Nesse sentido é a jurisprudência, tanto do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região como do e. STJ, in verbis:
“TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. PAGAMENTO A EMPREGADO, POR OCASIÃO DA RESCISÃO DO CONTRATO. GRATIFICAÇÃO ESPECIAL. FÉRIAS PROPORCIONAIS. TERÇO CONSTITUCIONAL. NATUREZA. REGIME TRIBUTÁRIO DAS INDENIZAÇÕES. PRECEDENTES. 1. O imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador, nos termos do art. 43 e seus parágrafos do CTN, os ‘acréscimos patrimoniais’, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte. 2. O pagamento feito pelo empregador a seu empregado, a título de adicional de 1/3 sobre férias tem natureza salarial, conforme previsto nos arts. 7º, XVII, da Constituição e 148 da CLT, sujeitando-se, como tal, à incidência de imposto de renda. Todavia, o pagamento a título de férias vencidas e não gozadas, bem como de férias proporcionais, convertidas em pecúnia, inclusive os respectivos acréscimos de 1/3, quando decorrente de rescisão do contrato de trabalho, está beneficiado por isenção. A lei isenta de imposto de renda ‘a indenização (…) por despedida ou rescisão de contrato de trabalho, até o limite garantido pela lei trabalhista ou por dissídio coletivo e convenções trabalhistas homologados pela Justiça do Trabalho’ (art. 39, XX do RIR, aprovado pelo Decreto 3.000/99 e art. 6º, V, da Lei 7.713/88). Precedentes: REsp 782.646/PR, AgRg no Ag 672.779/SP e REsp 671.583/SE. (…)” (STJ, Resp n.º 1.017.535/SP, 1.ª Turma, Relator Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 06/03/2008, DJ de 27/03/2008, pg. 001 – Grifamos)
“TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. INÉPCIA DA INICIAL. PRESCRIÇÃO. INCIDÊNCIA SOBRE LICENÇASPRÊMIO E FÉRIAS NÃO GOZADAS. ABONO-ASSIDUIDADE. TERÇO CONSTITUCIONAL. FORMA DE RESTITUIÇÃO. 1. Tratando-se de imposto de renda na fonte, é suficiente a prova da retenção do tributo pela fonte pagadora, para tanto servindo os contracheques ou fichas financeiras acostados na inicial. Eventual restituição decorrente do ajuste anual poderá ser comprovada quando da apuração do quantum debeatur. 2. Para as ações ajuizadas até o término da vacatio legis da LC 118/2005, como a presente ordinária de repetição de indébito, permanece inalterado o já sedimentado entendimento jurisprudencial no sentido de que, na hipótese de tributo sujeito a lançamento por homologação, caso esta não ocorra de modo expresso, o prazo para haver sua restituição é de cinco anos contados do fato gerador, acrescido de mais cinco anos da data da homologação tácita, operando-se a prescrição do direito de requerer a restituição no prazo de dez anos, a contar do fato gerador. 3. O imposto de renda pessoa física somente incide sobre rendimentos ou proventos, ou seja, sobre a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica que não tenha natureza indenizatória. As licenças-prêmio e as férias não gozadas, convertidas em pecúnia, possuem natureza indenizatória, razão pela qual não incide o imposto de renda. (…)” (TRF 4.ª Região, AC n.º 2003.72.01.003426-9/SC, 2.ª Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, julgado em 13/12/2005, DJU de 22/02/2006, pg. 477 – Grifamos)
Até mesmo o pagamento relativo às férias vencidas não-gozadas, quando realizado no curso do contrato de trabalho, também não se sujeitariam à cobrança da exação, por força do entendimento jurisprudencial consolidado no verbete da Súmula n.º 125, do e. STJ, segundo a qual “o pagamento de férias não gozadas por necessidade do serviço não esta sujeito a incidência do imposto de renda.”
A tônica adotada pela jurisprudência consolidada é o fato de que, conforme previsão do artigo 43 do CTN, o imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador apenas os “acréscimos patrimoniais”, assim entendidos os acréscimos ao patrimônio material do contribuinte, sendo as verbas eminentemente indenizatórias beneficiadas pela isenção legal que deve ser observada no cálculo da exação, além das deduções legais e alíquotas progressivas, sob pena de ocorrer o pagamento a maior e indevido, gerando direito ao contribuinte que assumiu o encargo à repetição do indébito apurado (art. 165, I e II, do CTN).
A orientação jurisprudencial majoritária também assevera que o Imposto de Renda não incide sobre os juros de mora e correção monetária, por terem a mesma natureza indenizatória. Muito menos sobre o aviso prévio, FGTS e a multa de 40%, conforme as previsões legais já apresentadas, pois não se tratam de acréscimo patrimonial do contribuinte, nem são fatos geradores do imposto, exemplificativamente, in verbis:
“TRIBUTÁRIO – IMPOSTO DE RENDA – INCIDÊNCIA SOBRE DIFERENÇAS SALARIAIS RECEBIDAS ACUMULADAMENTE E SOBRE JUROS DE MORA – INADMISSIBILIDADE – ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. 1 – O imposto de renda não incide sobre os créditos trabalhistas recebidos acumuladamente por força de decisão judicial. 2 – Os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito. Inteligência do art. 404 do Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002). 3 – No caso de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos, a indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda. 4 – Provimento antecipatório concedido.” (TRF 4.ª, AI n.º 2005.04.01.012942-8/RS, Relator ANTÔNIO ALBINO RAMOS DE OLIVEIRA, D.J.U. de 20/7/2005 – Grifamos)
Destacamos as razões do Voto vencedor, proferidas pelo eminente Des. Federal Antônio Albino Ramos de Oliveira, no processo suso ementado, verbis:
“(…) no tocante aos juros moratórios que são, por natureza, verba indenizatória dos prejuízos causados ao credor pelo pagamento extemporâneo de seu crédito, e como tal conceituados no art. 404 do vigente Código Civil (Lei 10.406, de 10/01/2002):
‘Art. 404. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, serão pagas com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, abrangendo juros, custas e honorários de advogado, sem prejuízo da pena convencional.
Parágrafo único. Provado que os juros da mora não cobrem o prejuízo, e não havendo pena convencional, pode o juiz conceder ao credor indenização suplementar.’
Outro não era o tratamento dado à matéria pelo art. 1.061 do Código Civil de 1916:
‘Art. 1.061. As perdas e danos, nas obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da mora e custas, sem prejuízo da pena convencional.’
A única inovação trazida pelo Código Civil de 2.002 foi a possibilidade de o juiz conceder indenização suplementar caso os juros de mora não cubram o prejuízo do credor – o que vem, mais uma vez, ressaltar o caráter indenizatório desses juros.
Cuida-se, aqui, de mora no pagamento de verba trabalhista, que tem notória natureza alimentar, impondo ao credor a privação de bens essenciais de vida, e/ou o endividamento para cumprir seus próprios compromissos. A indenização, através dos juros moratórios, corresponde aos danos emergentes, ou seja, àquilo que o credor perdeu em virtude da mora do devedor. Não há nessa verba, portanto, qualquer conotação de riqueza nova, a autorizar sua tributação pelo imposto de renda. Indenização não é renda.
Via de consequência, com renovada vênia ao ilustre Relator, voto dando provimento ao agravo em maior amplitude, concedendo a antecipação da tutela não só para que o imposto de renda incidente sobre as diferenças salariais devidas ao autor seja calculado pela alíquota de 15%, como também para afastar sua incidência sobre os juros moratórios.”
Pelo Todo exposto, verifica-se que o tema referente à natureza das verbas recebidas a título de juros de mora, correção monetária, aviso prévio, FGTS e a multa de 40%, da mesma forma que as férias vencidas e proporcionais, respectivo terço constitucional e indenização adicional não comportam mais discussão perante a jurisprudência: têm natureza indenizatória e não estão sujeitas à incidência do imposto de renda ante as previsões legais apresentadas.
Após as devidas alocações de valores, aplicando as isenções legais a que tem direito e as tabelas e alíquotas das faixas de isenção mês a mês da época a que se referem tais rendimentos, é possível verificar uma diferença considerável em relação ao que será retido na fonte no processo trabalhista e que deveria ser efetivamente pago pelo substituto tributário e, em conseqüência, efetivamente recebido pelo trabalhador.
Demonstrado o conteúdo e o alcance dos termos do Regulamento do Imposto de Renda – RIR, para fins de aplicação das alíquotas e tabelas de faixas de isenção vigentes na época, bem como a necessidade de respeito às isenções legais e/ou não incidência do IR para determinados pagamentos percebidos pelo trabalhador, poderemos verificar se a retenção na fonte será, ou não, indevida e a maior, sempre observando-se no cálculo a renda que teria sido auferida mês a mês pelo trabalhador excetuando-se alguns dos valores recebidos, por serem isentos e/ou não tributáveis conforme a legislação de regência asseverada.
Para fins de comprovação da adequação ao disposto no artigo 166, do CTN, apesar de ser o substituído na relação jurídica tributária de retenção na fonte do Imposto de Renda, deve ser asseverado que o trabalhador é o único que está a assumir o respectivo encargo financeiro, o que fica suficientemente comprovado pois a retenção na fonte, se ocorrer, irá incidir exclusivamente sobre o vencimento devido à ele, sendo a fonte pagadora (substituto tributário) mera repassadora do desconto fiscal apurado.
Com estas observações, torna-se possível aos trabalhadores beneficiados por valores recebidos em processos trabalhistas obter a restituição dos valores pagos (retidos na fonte) a maior ou, impedir a retenção de forma indevida. No primeiro caso, através de pedido restituição a ser formulado diretamente a Secretaria da Receita Federal do Brasil, após prévia habilitação do crédito judicial transitado em julgado, nos termos da IN SRF n.º 600, de 2005.
A possibilidade legal para deferimento da restituição diretamente à SRFB encontra amparo na previsão dos artigos 2.º, II e 3.º, I e II, da IN SRF n.º 600, 2005.
Nesse aspecto, salientamos a total inaplicabilidade da Regra Geral a respeito do pagamento de verbas devidas pela União Federal (Fazenda Nacional), em virtude de sentença judiciária, prevista no artigo 100, §§, da Constituição Federal, tendo em vista a necessidade de observância do princípio da especialidade em matéria tributária, previsto no § 6.º do artigo 150, da mesma Constituição Federal, o qual prevê que qualquer subsídio ou concessão de crédito, relativo a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser instituído mediante lei específica que regule exclusivamente a matéria.
O pagamento indevido de tributos administrados pela Secretaria da Receita Federal, além das previsões dos artigos 165 e seguintes do CTN e, especialmente com relação ao Imposto de Renda, possuem uma Regra Matriz que, entre legislações, Portarias e Instruções Normativas que regulam de forma exclusiva o procedimento para pagamento dos recolhimentos indevidos e efetuados a maior que o devido – restituição (art. 54, § único, da IN SRF n.º 600, de 2005), sendo normas especiais que prevalecem sobre as regras gerais previstas, como no caso dos precatórios.
As previsões legais e normativas são claras e específicas, então, uma vez reconhecido judicialmente o direito de ter descontado do IRRF, a diferença apurada com o cálculo efetuado mês a mês, nos moldes previstos pelo RIR (Decreto n.º 3.000/99) e, relativo aos valores sobre os quais deveria ter sido respeitada a isenção legal, deve-se reconhecer também, de forma expressa no dispositivo da sentença, o seu direito de efetuar o pedido de habilitação de crédito (arts. 50 e 51, §§, da IN SRF n.º 600, de 2005), para posterior pedido de restituição do montante recolhido indevidamente, conforme artigo 54, § único, da IN SRF n.º 600, de 2005 ou, mediante processamento eletrônico da Declaração de ajuste Anual do Imposto de Renda da Pessoa Física (DIRPF), nos termos do artigo 3.º, II, da IN SRF n.º 600, 2005.
Para apuração do quantum debeatur deverá ser elaborada conta mediante a consideração dos cálculos aritméticos apresentados no processo, que serão elaborados a partir das verbas discriminadas na planilha utilizada e que foi homologada pelo juízo trabalhista, aonde foram apresentadas a natureza de cada uma delas. Vejamos a jurisprudência a respeito, verbis:
“TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. INCIDÊNCIA SOBRE PERCEPÇÃO ACUMULADA DE DIFERENÇAS SALARIAIS DECORRENTE DE SENTENÇA PROFERIDA EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. INAPLICABILIDADE DO § 2.º, DO ARTIGO 46, DA LEI N.º 8.541/92. ARTIGO 12, DA LEI N.º 7.713/88. ARTIGO 43, DO CTN. ARTIGO 150, II, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A percepção acumulada das diferenças salariais, obtida a partir do reconhecimento judicial do direito do contribuinte de receber valores equivalentes a verbas salariais, não representa o montante auferido pelo mesmo mês a mês (renda mensal). Assim, o contribuinte, por ter recebido valores com atraso imputado ao empregador não pode sofrer tributação em alíquota máxima. 2. A retenção de imposto de renda na fonte deve levar em conta os valores percebidos mensalmente sob pena de afrontar a isonomia tributária (artigo 150, II, da CF), nos casos de valores recebidos pelo contribuinte em razão de decisão judicial trabalhista. Assim, verificada que a renda proveniente do trabalho do contribuinte era obtida mensalmente, inaplicável, ao caso, o § 2.º, do artigo 46, da Lei n.º 8.541/92. 3. Deve ser a elaborada a conta mediante a apresentação de cálculos aritméticos pela autora, a partir dos valores recebidos e correta a incidência do imposto de renda sobre os mesmos, atualizados. 4. A restituição dos valores retidos indevidamente deve sofrer atualização monetária a partir da retenção pelos índices determinados. 5. Apelação do autor provida e apelação da União improvida.” (TRF 4.ª, AC n.º 2005.71.00.008176-2/RS, 1.ª Turma, Relator Álvaro Eduardo Junqueira, julgado em 18/10/2006, DJU de 29/11/2006 – Grifamos)
Apesar do direito à repetição do indébito nas formas suso referidas, a melhor solução para a restituição do valor é o deferimento de antecipação de tutela a fim de determinar União Federal (Fazenda Nacional) promova a suspensão da exigibilidade da exação questionada, oficiando-se a fonte pagadora (substituto tributário) para que se abstenha de efetuar o desconto fiscal ou, alternativamente, promova o depósito judicial do montante integral do imposto a ordem deste juízo, até o término do presente processo.
A documentação necessária para o ingresso da medida é o cálculo discriminado das verbas que serão ou foram recebidas no processo trabalhista, a última Declaração de IR do cliente e, se for o caso, a Declaração de Imposto de Renda da data do recebimento das verbas trabalhistas, aonde aparece o desconto da exação, além de decisões judiciais e peças processuais a respeito da homologação dos cálculos e que indiquem quem é o substituto tributário (fonte pagadora). É possível recuperar os valores pagos (retidos na fonte) pelo substituto tributário a título da exação nos últimos 10 (dez) anos.
Informações Sobre o Autor
Alexandre Röehrs Portinho
Advogado e Contabilista, Especialista em Direito Tributário, Financeiro e Econômico pela UFRGS, sócio da HOMRICH PORTINHO ADVOCACIA EMPRESARIAL S.S. e consultor da GESTÃO TRIBUTÁRIA CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA.