Princípios constitucionais do Tribunal do Júri

Resumo: Este trabalho monográfico tem como tema de estudo, o Tribunal do Júri, mais especificamente seus princípios constitucionais. O direito, de uma maneira geral, é uma ciência que está em constante mudança, na perspectiva de se aperfeiçoar aos acontecimentos sociais do mundo atual. Por vezes obsessivas são criados novos regimes doutrinários, os entendimentos dos Tribunais Superiores se renovam a cada julgamento, e assim por diante. Com isso, todos os ramos do direito procuram se adequar a tais mudanças. Decorrido longo tempo, o Júri continua a ser alvo de severas críticas, muitas das quais desacompanhadas de propostas de aperfeiçoamento e chamada por muitos de ultrapassada. Daí a importância desse estudo, que irá contribuir para que o leitor tenha consciência de que nesse órgão judiciário está presente a vontade popular, que tenta aplicar a justiça, tão esperada por uma sociedade transtornada com o caos das impunidades, ao caso concreto.

Palavras-Chave: Tribunal do Júri. Princípios Constitucionais Penais. Princípios Constitucionais do Júri.

Abstract: This monograph has as study subject, the jury, specifically its constitutional principles. The law, in general, is a science that is constantly changing, from the perspective of improving the social events of the world today. Sometimes obsessive new schemes are created doctrinal understandings of the Superior Courts are renewed each trial, and so on. With this, all branches of the law suit seeking such changes. Long time elapsed, the jury is still widely criticized, many of which unaccompanied proposals for improvement and called by many outdated. Hence the importance of this study, which will help the reader to be aware that this judicial body is present the popular will, which attempts to administer justice, as expected by a company upset with the chaos of impunity, the case.

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Keywords: Jury. Criminal Constitutional Principles. Constitutional Principles of the Jury.

Sumário: 1. Introdução; 2. Fundamentação; 2.1. História do Júri; 2.1.1 O Tribunal do Júri no mundo; 2.1.2 O Tribunal do Júri no Brasil; 2.2 Princípios Constitucionais Penais; 2.3 Princípios Constitucionais do Júri; 2.3.1 Plenitude da defesa; 2.3.2 Sigilo das votações; 2.3.3 Soberania dos veredictos; 2.3.3.1 Reformatio in Pejus; 2.3.4 Competência Mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida; 2.3.4.1 Crimes dolosos contra a vida praticados a bordo de navio ou aeronave; 2.4 Juizado Especial Criminal; 2.4.1 Tribunal do Júri x Juizado Especial Criminal; 2.5 A visão crítica do Júri no Brasil; 3 Considerações Finais; Referências.

1. INTRODUÇÃO

O Tribunal do Júri no Brasil teve a sua criação em Junho de 1822, só passando a ser efetivamente aplicado com o advento da Constituição Federal de 1824. Destarte, foi a partir da vigência da Carta Magna de 1988 que tal instituto teve a sua função destinada à proteção de crimes dolosos praticados contra a vida.

O Constituinte originário trouxera, assim, a democracia de volta ao Tribunal do Júri, no capítulo que resguarda os “Direito e Deveres Individuais e Coletivos”, trazendo no bojo da Carta Suprema alguns dos princípios que o norteiam, como a garantia da plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos, entre outros. Importante esclarecer, também, que a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida é exclusiva do Tribunal do Júri.

A finalidade primordial de um princípio instituído pelo Direito é dar maior sustentabilidade ao Estado. Seguindo uma linha cronológica, o princípio antecede à norma strictu sensu, sendo esta, portanto, subsequente e em conformidade àquele, sob pena de ser considerada sem validade e inconstitucional. Seja o princípio implícito ou explícito, o seu objetivo é fortalecer o Estado que o constituiu. Para que haja no Tribunal do Júri o encontro que lhe garanta fiel aplicação das normas, faz-se necessária a presença dos princípios constitucionais penais.

Para que sejam entendidos os princípios constitucionais do Tribunal do Júri, faz-se necessária uma breve análise das considerações dos princípios gerais que norteiam as normas penais pátrias, já que se trata de um tema polêmico, sendo a sua aplicação repudiada por uns e aprovada por outros.

O princípio da legalidade preceitua basicamente que ninguém poderá ser punido por fato que não tenha sido anteriormente qualificado como crime. Outrossim, se um indivíduo cometer um delito antes da entrada em vigor de uma lei que tipifique aquele fato como crime, elaborando penas para tal, não lhe será estendidos tais efeitos, pois entende-se que o princípio da legalidade carrega consigo a reserva legal, a taxatividade e a irretroatividade, já que a lei não produz efeitos anteriores à sua criação.

Quanto ao princípio do contraditório, este informa o direito a uma defesa, não devendo ninguém ser considerado culpado sem antes ser-lhe dado o direito de defender-se daquilo que lhe é imputado. Este princípio consagra também a ampla defesa, posto que o acusado poderá socorrer-se aos vários recursos que provem a sua inocência. Em rápida análise, nota-se que o princípio da ampla defesa possui estreita ligação ao princípio do contraditório, pois ambos configuram garantias instrumentais ou processuais, estando inseridos no mesmo dispositivo constitucional.

Os princípios da razoabilidade e proporcionalidade também estão intimamente interligados, já que a racionalidade das penas vem com a proporcionalidade da sua adequação, tendo, assim, que manter obrigatoriamente uma relação justa entre a gravidade do ato e a culpa do autor, para, enfim, haver uma aplicação de uma pena dispensada de exageros.

O Tribunal do Júri traz consigo um divisor de águas, onde alguns aprovam sua existência e outros o condenam pelo fato de que pessoas comuns possam dar o seu veredicto, prescindindo de qualquer vivência jurídica, devendo apenas serem maiores de dezoito anos, com notória idoneidade, estando no gozo dos direitos políticos, residindo na comarca de julgamento,  alfabetizados, estando no gozo das faculdades mentais e dos sentidos e, por fim, serem de nacionalidade brasileira.

Os jurados que apresentarem estas características farão parte de uma lista de vinte cinco nomes, sendo alguns deles sorteados para, então, estarem aptos a julgar a respeito de crimes dolosos contra a vida.

A soberania dos veredictos alcança o julgamento dos fatos, onde os jurados analisam e proferem a sua convicção sobre a “verdade” exposta, e o juiz, mesmo que togado, não possui competência para modificar a decisão obtida pelo Júri popular. Entretanto, neste caso, a parte lesada pode recorrer da decisão apresentada pelos jurados.

O princípio da plenitude da defesa divide-se em autodefesa e defesa técnica, devendo esta ser obrigatória, podendo o acusado, inclusive, trazer para o Júri o sentimentalismo e apresentar a sua versão dos fatos.

O sigilo das votações abrange a votação, a qual ocorre em uma sala fechada, onde não é identificado o nome do jurado que optou pela absolvição ou condenação do acusado, ficando, assim, resguardados a segurança e o direito da liberdade de escolha.

Desta forma, o instituto do Tribunal do Júri, constituído e resguardado na Constituição Federal, traz junto com os seus princípios uma gama de divergências sobre as suas fases e a sua aplicação, apesar de ser uma instituição sólida, onde a lei está em sintonia com a justiça almejada por aquele que sofreu o dano.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. História do Júri

O Tribunal do Júri originou-se na Antiguidade, especificamente no Tribunal da Heliéia,entretanto, passou por um longo tempo na escuridão, até que a Magna Carta inglesa, de 1215, o trouxe de volta, fazendo, assim, com que renascesse, tomando força pela Europa Continental, penetrando, ainda, na maioria dos sistemas jurídicos do mundo ocidental e transformando-se em um símbolo de democracia e liberdade pública.

Rangel (2007, p.41) diz que:

“Há quem afirme, com respeitáveis argumentos, que os mais remotos antecedentes do Tribunal do Júri se encontram na lei mosaica, nos dikastas, na Hiliéia (Tribunal dito popular) ou no Areópago gregos: nos centeni comites, dos primitivos germanos: ou, ainda em solo britânico, de onde passou para os Estados Unidos e, depois, de ambos para os continentes europeus e americanos.”

Arraigado na cultura inglesa, mostra que, tradicionalmente, os direitos e garantias individuais dos cidadãos sempre foram respeitados e protegidos pelo processo penal, embora, um novo índice de criminalidade e a depressão econômica tenham imprimido um novo rumo àquela situação, trazido pelas crises instaladas em toda a Europa. Após a Revolução Francesa de 1789, também passando por uma conjuntura política delicada, a França trouxe para seu ordenamento jurídico o Tribunal do Júri, como a melhor opção para a delicada situação em que os países Europeus se encontravam, não se rendendo, porém, a este instituto, a Holanda e a Dinamarca.

No começo, o Júri só julgava causas cíveis; com o passar do tempo, surgiu a necessidade de submeter ao seu crivo também as causas criminais, envolvendo, a partir de então, a liberdade individual e, em alguns países, os crimes contra a vida.

Dessa forma, o Júri surgiu no mundo com a função de julgar crimes, sempre com cunho democrático, por intermédio de decisões emanadas do povo, retirando das mãos dos Magistrados comprometidos com o déspota o poder de decisão.

2.1.1. O Tribunal do Júri no mundo

Neste ponto, falar-se-á sinteticamente sobre os principais países que adotam o Tribunal do Júri em seu ordenamento jurídico, mostrando o seu surgimento, características, bem como quanto às diferenças na obtenção da sentença definitiva.

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a) Inglaterra: como já afirmado outrora, fora na Inglaterra que o Júri ganhou as feições conhecidas até os dias atuais, onde ainda é figura central da justiça, já que sempre fora o elo entre a liberdade e os direitos individuais, embora atualmente seu uso se restrinja a apenas 3% (três por cento) de todos os julgamentos criminais. Toda esta diminuição veio em 1967, quando o veredicto unânime para a condenação deixou de ser exigido e várias infrações foram reclassificadas, através de uma lei datada no ano de 1977. Restaram como delitos subordinados à decisão do Júri o homicídio (doloso e culposo) e o estupro, além de outros casos que, conforme a gravidade, pode o Juiz togado decidir pelo envio ou não do processo àqueles jurados.

A introdução da lei de 1977 teve como argumento que o julgamento pelo Júri era lento e custava três vezes mais aos cofres públicos em comparação aos procedimentos conduzidos por Magistrados togados, travando, portanto, a administração da justiça.

Como requisitos, os jurados têm que ser residentes do Reino Unido há pelo menos cinco anos e esta contagem começa com a idade de 13 anos, além de terem entre 18 e 70 anos. Respeitadas tais condições, convocar-se-ão 12 jurados, a fim de decidirem se o Réu é culpado ou inocente, com um vere dictum que deve expressar a sua vontade. Para que a decisão seja considerada condenatória, é imperioso haver, pelo menos, 10 votos contra 2, pois, do contrário, se não houver essa maioria, chamada de qualificada, o Réu será submetido a novo Júri, perante novos jurados. Se no novo julgamento não for alcançada esta maioria necessária para a condenação, o Réu será considerado inocente e, consequentemente, absolvido.

O Juiz apenas intervém para garantir que o debate na sala de audiência seja conduzido de modo justo e encaminhar o julgamento para um final coerente, fazendo com que as questões sejam de fato apreciadas pelo Júri até a sua decisão final. A comunicação entre os jurados é plena, pois os membros decidem com base no juramento (ou promessa solene). A decisão é obtida através de uma comunicação entre os jurados, democratizando, o máximo possível, a decisão sobre a liberdade do Réu, evitando, assim, o puro capricho, arbítrio ou abuso de poder.

Como diz Nucci (1999, p. 66), “em síntese, no entanto, nota-se que ainda permanece a aura do Júri como direito fundamental do homem (julgamento pelos seus pares), insculpido nas mentes britânicas há muitos séculos”.

b) Estados Unidos: nos Estados Unidos, o Júri traz uma característica bem marcante e diferente, pois, no seu sistema processual, também há o processamento de causas cíveis e penais perante aquele tribunal. Os Juízes têm a função de direcionar os debates, controlar os interrogatórios e a decisão das questões de direito, presidindo a seção na função de guardiãs dos direitos consagrados na emenda constitucional norte-americana.

Os jurados têm a função de responsabilidade pela educação da sociedade, sobre os valores morais, democráticos e legais, legitimando as decisões que emanam do povo, tendo em vista que ser jurado é um direito de todo e qualquer cidadão que preencha os requisitos legais.

Toda a base do Tribunal do Júri americano está escrita na Constituição, razão pela qual o Júri é direito substantivo fundamental de todo e qualquer acusado que comete delito, devendo ser a ele submetido. Nos Estados Unidos, cada Estado tem um sistema de jurado próprio. Assim, somente sete Estados exigem um Júri de doze membros, submetido ao critério de decisão por unanimidade, tanto em casos cíveis como em criminais. Desta forma, a quantidade de jurados varia entre seis e doze membros e, quanto à decisão, esta pode ser por unanimidade até a maioria de dois terços de votos, dependendo do Estado.

A decisão do júri, em regra, não deve ser somente unânime, mas, principalmente, discutida entre os integrantes do corpo de jurados, já que é, com a participação dos cidadãos, que acontecem as decisões judiciais. E, por intermédio do debate, os participantes condenam ou absorvem o indivíduo, sempre através de diálogo, sem deixar de comprometerem-se com ética no exercício deste poder.

c) Portugal: o Tribunal do Júri português é composto por três Juízes que constituem o tribunal coletivo e por quatro jurados efetivos e quatro suplentes, sendo presidido pelo Presidente do tribunal coletivo e intervindo os jurados suplentes, quando, durante o julgamento ou antes do seu início, algum dos efetivos ficarem impossibilitados do comparecimento.

O jurado exerce função de funcionário público obrigatório e é remunerada, não sendo lícita a recusa, que, se assim o fizer, é considerado crime de desobediência qualificada. O sorteio dos jurados é feito entre os eleitores que constam no caderno de recenseamento eleitoral.

O Ministério Público e a defesa técnica podem recusar, cada qual, até dois jurados, prescindindo de justificativas para esta decisão. Só podem ser jurados aqueles que sejam cidadãos portugueses, estejam inscritos no recenseamento eleitoral e que preencham estes requisitos: a) idade inferior a 65 anos; b) escolaridade obrigatória; c) ausência de doença ou anomalia física ou psíquica que torne impossível o bom desempenho do cargo; d) pleno gozo dos direitos civis e políticos; e) não estarem presos ou detidos, em estado de contumácia, nem haverem sofrido condenação que implique incapacidade para o exercício da função de jurado.

Assim, cada juiz e jurado devem explicar os motivos pelos quais decidem daquela forma, indicando, quando necessário, os meios de prova que serviram para a sua tomada de decisão. Por isso, existe a necessidade de fundamentação na decisão do júri.

Segundo Rangel , apud Marques Silva (2007 p. 58):

“Os jurados devem decidir apenas segundo a lei e o direito, o que parece tarefa ciclópica, muito difícil de alcançar. Para decidir segundo a lei e o direito importa necessariamente conhecê-los e a lei não exige que os jurados sejam conhecedores da lei e do direito que lhe cumpre aplicar.”

Quando há dentro do Júri a necessidade de uma fundamentação e comunicação entre os jurados, estamos nos referindo ao sistema judicial amparado no regime democrático, porém a maioria, por si só, não significa democracia, mas sim consenso que, se for contra a liberdade do outro, não haverá validade.

d) França: a partir da Revolução de 1789, a França foi considerada o berço dos direitos humanos, necessitando, consequentemente, combater o autoritarismo dos Magistrados do ancién régime, que cediam à pressão da Monarquia e das dinastias das quais dependiam, vendo o Tribunal do Júri como um meio para chegar àquela salvação.

Passados os anos, o Júri na França tomou formas diferentes das nascidas na Revolução de 1789 e, atualmente, é composta por três Magistrados e nove jurados, sendo um Juiz na função de Presidente e os outros dois, na de assessores. O escabinato – formação do Júri – decide em sessão secreta e individual, por meio de quesitos distintos e sucessivos que se dirigem ao fato principal da imputação penal e, após, sobre cada uma das circunstâncias agravantes, das questões subsidiárias e dos fatos que constituem causa legal de diminuição da pena.

O Réu só será considerado culpado se houver pelo menos oito votos, dentre os doze integrantes do Júri, ou seja, dois terço dos votos, decidindo-se também a respeito da aplicação da pena, sendo a pena máxima aplicada pelo voto de oito jurados, por decisão de maioria absoluta.

2.1.2. O Tribunal do Júri no Brasil

No Brasil, o Tribunal do Júri nasceu em junho de 1822, mas sua previsão constitucional só se deu com a Carta Magna de 1824. De fato, a primeira legislação que abordou o Tribunal do Júri foi a lei de 18.6.1822, que foi criada para julgamentos pelo Júri dos crimes contra a imprensa, se repetindo tal norma em todas as Constituições que a sucederam. Já na Constituição de 1934, houve um verdadeiro retrocesso democrático. Se já não bastasse o desprestígio que a Carta Suprema dera ao Júri, a Constituição de 1937 trouxe o autoritarismo reinante à época, haja a vista a não referência ao Tribunal do Júri, ao menos, sequer, como apêndice do Poder Judiciário, demonstrando ser, assim, uma Constituição Federal antidemocrática. Apenas em 1891, o Tribunal do Júri toma grande vulto, porquanto se desvincula do capítulo destinado ao Poder Judiciário para tomar assento junto ao capítulo da “Declaração de Direito”.

a) Constituição de 1824: conhecida como a Constituição Imperial, colocava os jurados como integrantes do Poder judiciário com competência territorial sobre a decisão do fato tanto nas causas cíveis como nas criminais, cabendo aos juízes a aplicação da lei.

Explana os dois artigos que tratavam do assunto:

“Art. 151. O poder judicial é independente, e será composto por juízes, e jurados, o quaes terão logar assim no Cível, como no Crime nos casos, e pelo modo, que os códigos determinarem.

Art. 152. Os jurados pronunciam sobre facto, e os Juízes aplicam a lei (BRASIL – CONSTITUICÃO POLITICA DO IMPERIO DO BRAZIL, 1824).

Os fatores locais e regionais, como as más condições de vida dos militares e a rígida disciplina a que eram submetidos, assim como as questões internacionais, como a queda de Carlos X na França, a guerra entre Brasil e Argentina, na época das Províncias Unidas do Rio Prata, favorecem a abdicação em 7 de abril de 1831 e o retorno de Dom Pedro I para Inglaterra, a fim de recuperar o trono que era ocupado em Portugal por seu irmão Dom Miguel, deixando aqui seu filho de apenas cinco anos de idade, Pedro II. Como Pedro II era menor, o País foi governado por figuras políticas que dirigiam em nome do Imperador, por isso, essa fase de 1831 a 1840, ficou conhecida como Regência e neste período houveram várias reformas importantes para tentar diminuir as atribuições de órgãos da Monarquia e estabelecer nova estrutura legal para o País.

Foi então que, em 1832, entrou em vigor o Código de Processo Criminal, dando maiores poderes aos Juízes de paz, eleitos nas localidades durante o reinado de Dom Pedro I, mas que agora podiam, por exemplo, prender e julgar pessoas acusadas de cometer pequenas infrações . Tomando como exemplo o modelo americano e inglês, o Código de Processo instituiu o Júri, a fim de julgar a grande maioria dos crimes, e o habeas corpus, a ser concedido a pessoas presas ilegalmente, ou cuja liberdade fosse ameaçada.

Como já dito, inspirado nos modelos inglês e americano, havia o grande e o pequeno Júri, este formado por 12 e aquele por 23 jurados. O grande Júri tratava a respeito de acusações em si, pois fazia-se o sumário de culpa e, caso admissível a pretensão acusatória, o processo era submetido ao pequeno Júri, que decidia, então, quanto mérito da causa.

b) Constituição de 1891: nasceu na República, em 24 de fevereiro daquele ano, colocando o Júri dentro do título referente aos cidadãos brasileiros e na secção da declaração dos direitos, estabelecendo no seu art. 72, § 31:

“Art. 72.  A constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:(…)

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§ 31 – É mantida a instituição do Júri (BRASIL – CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, 1891).”

Tal assertiva fez com que se sustentasse que a Constituição, quando matinha o Júri, impedia que leis posteriores pudessem alterar sua essência e, caso assim o fizessem, seriam declaradas inconstitucionais.

c) Constituição de 1937: com a chegada do Estado Novo, fez-se necessária uma nova ordem jurídica processual penal, para que se pudessem consagrar legalmente os interesses do capitalismo. Com isso, editou-se o primeiro decreto n0 167, de 05 de janeiro de 1938, sendo considerado a primeira lei processual da República.

O Júri então, passou a sofrer a influência do novo regime e da nova classe que assumiu o poder, logo, sua independência e soberania foram limitados. O Déspota tinha que ter o Júri sob controle, e a melhor forma era retirando sua soberania, silenciando-o e diminuindo seu número para sete.

d) Constituição de 1946: a constituição de 1946 fez uma alteração, colocando o Júri na Seção atinente aos direitos e garantias fundamentais, indicando o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, in verbis:

“Art. 141 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

§ 28 – É mantida a instituição do Júri, com a organização que lhe der a lei, contanto que seja sempre ímpar o número dos seus membros e garantido o sigilo das votações, a plenitude da defesa do réu e a soberania dos veredictos. Será obrigatoriamente da sua competência o julgamento dos crimes dolosos contra a vida (BRASIL – CONSTITUIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DO BRASIL, 1946).”

e) Constituição de 1967: a Constituição de 1967 nasceu em pleno Regime Militar. De igual modo, aquela ordem constitucional trouxe a seguinte previsão do Júri.

“Art. 153 – A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(…)

§ 18 – São mantidas a instituição e a soberania do Júri, que terá competência no julgamento dos crimes dolosos contra a vida (BRAIL – CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL,1967).”

A instituição do Júri foi uma das poucas previsões constitucionais que fora respeitada, mesmo tendo que enfrentar barreiras, cujos ventos surgiam à medida que os interesses políticos se alternavam nos poderes. Em 1969, através da Emenda Constitucional nº. 1, retirou-se a soberania do Tribunal do Júri, ocorrendo, assim, um flagrante retrocesso à democracia, influenciado pela regime ditatorial em que vivia o Estado Brasileiro, onde não havia democracia e sim, repressão.

f) Constituição de 1988: na atual Constituição, o Júri apresenta-se disciplinado no Capítulo direcionado aos direitos e garantias individuais e, como tal, não pode ser suprimido nem por emenda constitucional, classificado como cláusula pétrea, por força da limitação material explícita contida no art. 60, § 4, inc. IV, da CRFB:

“Art. 60 – A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:(…)

§ 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:(…)

IV – os direitos e garantias individuais (BRASIL – CF, 1988).”

O Júri é assume o papel de direito, quando à participação popular no julgamento de crimes dolosos contra a vida, e de uma garantia fundamental, tendo em vista a possibilidade de o acusado ser julgado por um juiz leigo. A participação da população, mesmo sendo esta restrita, já que só poderá conter sete jurados do povo, é uma forma de trazer a democracia.

O art. 5º, XXXVIII, traz previsões sobre o Júri e é neste dispositivo que são traçados os quatros princípios fundamentais da sua instituição.

“Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (…)

XXXVIII – é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;

c) soberania dos veredictos;

d) a competência para o julgamento de crimes contra a vida (BRASIL – CF, 1988).”

Por fim, vivencia-se, sob a égide da Constituição Federal de 1988, um Tribunal do Júri fortalecido, recolocado no seu devido lugar, qual seja, no capítulo dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos.

Segundo D’Angelo e D`Ângelo (2008, p.130):

“A experiência política e constitucional do Brasil, da independência até 1988, é a melancólica história do desencontro de um país com sua gente e com seu destino. Quase dois séculos de ilegitimidade renitente do poder, de falta de efetividade das múltiplas Constituições e de uma infindável sucessão de violações da legalidade constitucional. Um acúmulo de gerações perdidas (…) A constituição de 1988 foi o marco zero de um recomeço, da perspectiva de uma nova história. Sem velhas utopias, sem certezas ambiciosas, com o caminho a ser feito ao andar. “

2.2. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS

De início, falar-se-á, por ora, resumidamente, sobre o que seriam os princípios constitucionais penais. Para alguns autores, as normas dividem-se em princípios e regras, porém, esta diferença é notada majoritariamente diante da análise do caso concreto.

O professor Nucci (2003, p.1034) mostra como diferenciar princípio de regra, utilizando-se, para tanto, dos seguintes critérios:

a) “Grau de abstração: os princípios são normas com um grau de abstração relativamente elevado; de modo diverso, as regras possuem uma abstração relativamente reduzida.

1) Grau de determinabilidade na aplicação do caso concreto: os princípios, por serem vagos e indeterminados, carecem de mediações concretizadoras, enquanto as regras são susceptíveis de aplicação direta.

b) Caráter de fundamentabilidade no sistema das fontes de direito: os princípios são normas de natureza ou com um papel fundamental no ordenamento jurídico devido à sua posição hierárquica no sistema das fontes ou à sua importância estruturante dentro do sistema jurídico.

c) Proximidade da idéia de direito: os princípios são Standards juridicamente vinculantes radicados nas exigências de justiça ou na ideia de direito; as regras podem ser normas vinculativas com um conteúdo meramente funcional.

d) Natureza normogenética: os princípios são fundamento de regras, isto é, são normas que estão na base ou constituem a ratio de regras jurídicas, desempenhando, por isso, uma função normogenética fundamentante.”

Após uma breve exposição das principais discrepâncias entre princípios e normas, passa-se ao estudo dos princípios constitucionais penais.

Desse modo, pode-se dizer que os princípios constitucionais penais são garantidores de um Estado de Direito, ainda que este Estado não tenha adotado o regime democrático. Mesmo percorrendo um árduo caminho, os princípios constitucionais penais tiveram que buscar seu espaço aos poucos, já que inseridos em uma sociedade cheia de costumes e enraizada naqueles que detêm o poder de comando. 

Afirma Nucci (1999, p.16) que:

“No mesmo modo, identificado os princípios inseridos na Constituição, pode o intérprete evitar contradições na aplicação das próprias normas constitucionais. Se aparentemente há um conflito, através dos princípios que norteiam o sistema, certamente saber-se-á solucioná-lo sem necessidade de negar vigência a qualquer preceito constitucional. “

Segundo o ilustre jurista, Nucci (1999, p.262):

“Os princípios constitucionais outra coisa não representam, senão os princípios gerais de Direito, ao darem a estes o passo decisivo de sua peregrinação normativa, que, inaugurada nos Códigos, acaba nas Constituições.”

Em síntese, portanto, o papel essencial e prático dos princípios constitucionais, citando Nucci (1999, p.15-16), é “embasar as decisões políticas fundamentais tomadas pelo constituinte e expressar os valores superiores que inspiram a criação ou reorganização de um dado Estado”, estabelecendo-se os alicerces e traçando as linhas mestras das instituições, dando, por fim, o impulso vital inicial. A eles é reservada a função de ser o “fio condutor dos diferentes segmentos do texto constitucional, dando unidade ao sistema normativo”.

A partir do desenvolvimento das características principais dos princípios constitucionais penais, é correto afirmar que o princípio da legalidade nasceu na Carta Magna da Inglaterra de 1215, entretanto, fora realmente difundido na França, gerando daí a aprovação da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, preceituando, em matéria penal, in verbis (D’Angelo e D’Angelo, 2008, p.155):

“Art. 8o A lei apenas deve estabelecer penas estritas e evidentemente necessárias. E ninguém pode ser punido, senão em virtude de uma lei estabelecida e promulgada antes do delito e legalmente aplicada.”

O Brasil conta com o princípio da legalidade desde a sua Constituição Imperial de 1824 (art.179, III), mas foi no Código Penal de 1890 que se estampou com maior clareza em matéria penal, vez que dispunha (D’Angelo e D’Angelo, 2008, p.156):

“Art. 1o Ninguém poderá ser punido por fato que não tenha sido anteriormente qualificado como crime, e nem com penas que não estejam previamente estabelecidas. A interpretação extensiva por analogia ou paridade não é admissível para qualificar crimes ou aplicar-lhes penas.”

A partir do desdobramento do princípio da legalidade, emerge o da reserva legal, da taxatividade e a irretroatividade. O principio da reserva legal está previsto no art. 5o XXXIX, da Constituição Federal, bem como no art. 1o do Código Penal, e trata-se de uma cláusula pétrea. Segundo este princípio, não há crime sem lei que o defina, nem pena sem cominação legal, ou seja, é de exclusividade da lei a edição sobre matéria de Direito Penal, sendo vedado até mesmo o uso de Medida Provisória para tratar do assunto.

O Princípio do Contraditório veio insculpido na Constituição Brasileira de 1937 no art. 122, n. 11, segunda parte, ou seja, até então, o povo brasileiro era submetido a um julgamento totalmente injusto, cujos resultados já eram conhecidos previamente, pois bastava acusar alguém e este certamente seria condenado, tal como ocorrera há alguns séculos na Europa, em particular durante a Idade Média, na época em que reinava a ausência dos elementos essenciais e a possibilidade de reação.

O contraditório remete ao pensamento de que todos têm o direito de se defender de quaisquer acusações, sejam procedentes ou improcedentes, isto é, assiste ao acusado o direito de dizer sua versão a respeito dos fatos a ele imputados. Entretanto, é necessário que o acusador e o julgador respeitem o princípio da igualdade, vale dizer, não se pode admitir que uma pessoa venha a ser processada e condenada sem que lhe tenha sido dado o meio legal para a sua defesa.

Junto ao princípio do contraditório, tem-se o da ampla defesa, tendo em vista que os dois configuram as garantias instrumentais ou processuais, estando ambos inseridos no mesmo dispositivo constitucional, qual seja, o art. 5o, inciso LV, CF/88. Dessa maneira, pode-se dizer que se tratam de princípios imanentes a qualquer litígio, na esfera judicial ou administrativa, e, ainda, no procedimento policial.

De fato, a ampla defesa deve atender às partes litigantes, independentemente de quem venha a ser o primeiro a acusar, mesmo porque nem sempre quem acusa deixa de ser também acusado por aquele a quem inicialmente imputava-se o ato ilícito.

Certifica D’Ângelo e D’Angelo (2008, p.146) que:

“Em resumo, podemos asseverar, ainda, que o Tribunal do Júri é, também, uma garantia formal e instrumental, haja vista assegurar ao julgador e ao julgado a garantia de se sujeitarem a um devido processo legal, onde se admite a ampla defesa, daí ser despicienda a argumentação do apelante de que houve coordenação incriminadora.

Com efeito, pode-se assegurar que o principio da proporcionalidade, em verdade, veio por fim às intermináveis decisões de âmbito penal exorbitantes, ainda que estivessem delimitadas pelas normas secundárias, vale dizer, o quantum da pena.

2.3. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO JÚRI

Segundo Lyra (1935, p.6 e 47), “o Júri decide por sua livre e natural convicção. Não é o jurado obrigado, como o juiz, a decidir pelas provas do processo, contra os impulsos da consciência”. A multiplicidade infinita dos fatos e a necessidade social de uma decisão verdadeira e justa impeliram o legislador a conceder ao jurado esfera de ação mais ampla.

Os jurados possuem total independência em relação ao Pode Judiciário, ao Mistério Público, à Defensoria Pública e à Ordem dos Advogados do Brasil, tampouco estão adstritos às provas apresentadas e aos argumentos produzidos, haja vista não serem meros reprodutores de decisões já proferidas, daí o entendimento de que as jurisprudências em nada vinculam as decisões dos jurados.

A instituição do Júri é formada por quatro princípios básicos, todos eles assegurados no art. 5º, XXXVIII, alíneas a à d, da Constituição Federal, sendo eles: a plenitude da defesa, o sigilo das votações, a soberania dos veredictos e a competência mínima para julgamentos dos crimes dolosos contra a vida.

2.3.1. Plenitude da defesa

Segundo este princípio, nos processos do Júri, mais que a ampla defesa, que é exigida em todo e qualquer processo criminal, conforme o art. 5º, LV da CF, vigora a plenitude da defesa, de tal maneira que, naquele instituto, não apenas a defesa técnica, relativa aos aspectos jurídicos do fato, pode ser produzida.

Assim, a plenitude da defesa é exercida pela defesa técnica e autodefesa. A primeira refere-se à liberdade que possui o Advogado em preparar os argumentos que favorecerão o Réu, podendo, assim, expor o que melhor lhe couber, ainda que não haja respaldo jurídico necessário. Porém, se o Juiz analisar a defesa e assim constatar que esta, desenvolvida em plenário, é inepta, pode dissolver o Conselho de Sentença, declarando o Réu indefeso.

Conforme o art. 497 do CPP:

“São atribuições do juiz presidente do Tribunal do Júri, além de outras expressamente referidas neste Código:

V – Nomear defensor ao acusado, quando considerá-lo indefeso, podendo, neste caso, dissolver o Conselho e designar novo dia para o julgamento, com a nomeação ou a constituição de novo defensor (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

O princípio da ampla defesa está intimamente ligado à plenitude da defesa, pois o primeiro tem relação à possibilidade de o Réu defender-se de modo irrestrito, sem sofrer limitações indevidas, quer pela parte contrária, quer pelo Estado-juiz, enquanto a plenitude da defesa significa o exercício efetivo de uma defesa irretocável, sem qualquer arranhão, calcada na perfeição, logicamente inserida na natural limitação humana.

Ao se falar em argumentações não jurídicas, está-se referindo às questões sociológicas, religiosas e morais, decorrentes da plenitude de defesa, trazidas pelos laudadores ou testemunhas de beatificação, que são aquelas pessoas que trazem aos autos dados sobre a vida do acusado.

Para Nucci (1999, p. 136-137):

“O direito á liberdade é um dos mais importantes à existência e desenvolvimento da pessoa humana, justamente por isso é considerado, universalmente, um direito fundamental. Sem liberdade, o homem não conseguiria garantir nem mesmo o direito à vida – o mais notável de todos, pois assegura o próprio fato de existir, algo indispensável para aplicação do direito.”

2.3.2. Sigilo das votações

Este é um princípio específico do Júri, também denominado de princípio informador, diferindo do princípio da publicidade disposto no art. 93, IX, da CF, não devendo ser conhecido o conteúdo de cada decisão dos jurados e não havendo, portanto, a publicidade destes atos. O CPP prevê várias maneiras de manter o sigilo nas votações, devendo citar algumas delas, como:

a) Incomunicabilidade dos Jurados: os jurados não podem expressar qualquer opinião sobre o processo, sendo admitida a conversa entre eles, desde que não seja sobre o processo em questão, ou seja, assuntos do cotidiano. Os jurados estão proibidos, ainda, de se comunicar com qualquer terceiro estranho ao caso, devendo a comunicação com a parte externa ocorrer somente por intermédio do meirinho.

Conforme preceitua o art. 466 do CPP e o §1º deste artigo:

“Antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença, o Juiz Presidente esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449 deste Código.

§1º – O Juiz Presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do §2º do art. 436 deste Código (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

b) Julgamento em sala especial: Os votos são proferidos em sala secreta, se o Fórum dispuser deste local, caso contrário, o Magistrado determinará a saída do público, permanecendo em Plenário apenas o Ministério Público, os próprios jurados, o Oficial de Justiça, o Escrivão que estiver a cargo do Juiz Presidente e o Advogado, evitando-se que uma das pessoas que esteja no recinto perceba qual foi o voto dos jurados, impedindo também qualquer tipo de constrangimento.

Segundo o art. 485 do CPP:

“Não havendo dúvida a ser esclarecida, o Juiz Presidente, os jurados, o Ministério Público, o assistente, o querelante, o defensor do acusado, o escrivão e o oficial de justiça dirigir-se-ão à sala especial a fim de ser procedida a votação (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

c) Julgamento baseado na íntima convicção: Significa dizer que não é necessária a justificativa da decisão, ou seja, a motivação. Configura exceção à regra do livre convencimento motivado.

Preceitua o Art. 486 do Código Processual Penal que:

“Art. 486: Antes de proceder-se à votação de cada quesito, o Juiz Presidente mandará distribuir aos jurados pequenas cédulas, feitas de papel opaco e facilmente dobráveis, contendo 7 (sete) delas a palavra sim, 7 (sete) a palavra não (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

2.3.3. Soberania dos veredictos

Neste terceiro princípio, que é específico do Júri, somente os jurados podem decidir pela procedência ou não da imputação. Ou seja, os Juízes togados são substituídos pelos jurados na decisão da causa. Assim, um Tribunal composto por Juízes togados não pode modificar, no mérito, a decisão do Júri Popular. Desta forma, pode a decisão do Júri ser modificada quando prejudicial ao Réu por meio de revisão criminal, já que não é correto uma decisão permanecer absolutamente injusta em respeito ao princípio da soberania dos veredictos. Também como forma de mitigação deste princípio, tem-se a possibilidade de apelação contra a decisão do Júri.

Conforme D’Angelo e D’Angelo (2008, p.145):

“Não são os jurados onipotentes, com o poder de tornar o quadrado redondo e de inverter os termos da prova. Julgam eles segundo os fatos objeto do processo; mas exorbitam se decidem contra a prova. Não é para facultar-lhes a sua subversão que se destina o preceito constitucional.”

Segundo preceito legal descrito no art. 593, II, alínea d, CPP, é permitida a Apelação das decisões do Júri quando consideradas manifestamente contrárias às provas dos autos, sendo tal instituto recursal julgado pelo Tribunal. Se este der provimento ao recurso, anula-se o julgamento e determina-se a realização de outro. Vale afirmar, porém, que o Tribunal não decide o mérito, devendo, ainda, a Apelação com esse fundamento ser interposta uma vez.

Falando em Revisão Criminal, Nucci (1999, p. 108) conceitua muito bem o que é a revisão criminal dentro do princípio da Soberania dos Veredictos. Afirma este Autor que:

“Sendo a revisão criminal uma garantia individual implícita e a Soberania dos Veredictos uma garantia da instituição do Júri, portanto, explícita, não há necessidade de se prejudicar uma para dar lugar a outra. Neste caso, é perfeitamente possível a conciliação, desde que haja boa vontade do intérprete para fazê-lo, afastando-se o preconceito existente na maioria da doutrina e da jurisprudência contra a instituição do Júri. Aliás, sendo também a coisa julgada uma garantia individual, é natural que, como toda garantia, comporte limitação. A revisão criminal é uma restrição à coisa julgada, em nome da simetria que deve reinar dentre os direitos e garantias fundamentais, pois maior segurança tem a sociedade se uma sentença injusta for revista do que se for mantida imutável.”

2.3.3.1. Reformatio in Pejus

O princípio da Reformatio in Pejus nos diz que, no caso de uma interposição de recurso por parte do Réu para anulação do julgamento, este não poderá ter sua pena agravada pelo Órgão superior. No novo julgamento proferido, não poderá haver agravamento da pena, em respaldo à non reformatio in pejus indireta, ou seja, quando o julgamento anterior for anulado, a pena da novel decisão proferida não poderá ser superior a que fora estabelecida.

A non reformatio in pejus é efeito do princípio da ampla defesa, já que, se não fosse esta proibição da reforma para agravar a situação do Réu, o mesmo ficaria com medo de exercer com liberdade o seu direito ao recurso e, assim, a ampla defesa ficaria prejudicada e sofreria limitação. No Júri, este princípio não atinge os jurados, que são soberanos em suas decisões, sendo o limite aplicado ao Juiz que tem a responsabilidade de fixar a pena.

A proibição da reforma para pior ganhou referência jurisprudencial, conforme decisão da Segunda Turma do STF, HC 89544/RN, REL. MIN. CESAR PELUSO, 14.4.2009:

“Tribunal do Júri e Princípio da “Ne Reformatio in Pejus” Indireta – I. A Turma deferiu habeas corpus para assentar que o princípio da ne reformatio in pejus indireta tem aplicação nos julgamentos realizados pelo Tribunal do Júri. No caso, acusado como incurso nos delitos capitulados no art. 121, § 2º, I e IV, c/c o art. 29, ambos do CP, fora absolvido pelo conselho de sentença, o qual acolhera a tese de legítima defesa. Interposta apelação pelo Ministério Público, o Tribunal de Justiça local dera-lhe provimento para submeter o paciente a novo julgamento, por reputar que a decisão dos jurados teria sido manifestamente contrária à prova dos autos. Em novo julgamento, conquanto reconhecida a legítima defesa, entendera o Júri ter o paciente excedido os limites dessa causa de justificação, motivo pelo qual o condenara por homicídio simples à pena de 6 anos de reclusão, a ser cumprida em regime semiaberto. Irresignada, a defesa interpusera Recurso de Apelação, provido sob o argumento de que a contradição na formulação dos quesitos teria maculado o decreto condenatório, eivando de nulidade absoluta o feito. O paciente, então, fora submetido a terceiro julgamento perante o Tribunal do Júri, sendo condenado por homicídio qualificado à pena de 12 anos de reclusão, em regime integralmente fechado. A defesa, desse modo, recorrera à corte local e ao STJ, concluindo este que, em crimes de competência do Tribunal do Júri poderia ser proferida em novo julgamento, decisão que agravasse a situação do Réu, tendo em vista a soberania dos veredictos. A impetração sustentava que, decretada a nulidade do julgamento anterior, não poderia o Conselho de Sentença, no novo julgamento, agravar a pena do Réu, sob pena de violar o princípio constitucional da ampla defesa, bem como a vedação da reformatio in pejus. HC 89544/RN, rel. Min. Cezar Peluso, 14.4.2009. (HC-89544).”

“Tribunal do Júri e Princípio da “Ne Reformatio in Pejus” Indireta – 2

Inicialmente, salientou-se que, se, de um lado, a Constituição da República reconhece a instituição do Júri e a soberania de seus veredictos (art. 5º, XXXVIII, c), de outro, assegura aos acusados em geral o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes (art. 5º, LV). Observou-se que ambas as garantias, as quais constituem cláusulas elementares do princípio constitucional do devido processo, devem ser interpretadas sob a luz do critério da chamada concordância prática, que consiste em uma recomendação para que o aplicador das normas constitucionais, em se deparando com situações de concorrência entre bens constitucionalmente protegidos, adote a solução que otimize a realização de todos eles, mas, ao mesmo tempo, não acarrete a negação de nenhum. Ressaltou-se que tal situação seria decorrência lógico-jurídica do princípio da unidade da Constituição, e cuja ratio juris estaria em garantir a coexistência harmônica dos bens nela tutelados, sem predomínio teórico de uns sobre outros, cuja igualdade de valores fundamenta o critério ou princípio da concordância. Considerou-se, ademais, que, como corolário do contraditório e da ampla defesa, o CPP contempla, dentre outros, o princípio da personalidade dos recursos (art. 617, parte final), que obsta a reformatio in pejus, tratando-se, aí, de proibição taxativa, segundo a qual o recorrente não pode ver agravada sua situação jurídica, material ou processual, quando não haja recurso da parte contrária. Acrescentou-se, nesse sentido, ser consolidada a jurisprudência da Corte, ao estabelecer que o Juiz, o qual venha a proferir nova decisão, em substituição à cassada no âmbito de recurso exclusivo da defesa, está limitado e adstrito ao máximo da pena imposta na sentença anterior, não podendo de modo algum piorar a situação jurídico-material do Réu, sob pena de incorrer em reformatio in pejus indireta. HC 89544/RN, rel. Min. Cezar Peluso, 14.4.2009. (HC-89544).”

“Tribunal do Júri e Princípio da “Ne Reformatio in Pejus” Indireta – 3 Esclareceu-se que, em que pese ser pacífica essa orientação na Corte, a proibição da reformatio in pejus indireta tem sido aplicada restritivamente ao Tribunal do Júri, sob a explícita condição de o Conselho de Sentença reconhecer a existência dos mesmos fatos e circunstâncias admitidos no julgamento anterior. Entendeu-se que tal restrição aniquilaria, na prática, a ampla defesa, na medida em que, intimidando o condenado, embaraçar-lhe-ia, senão que lhe inibiria o manejo dos recursos. Aduziu-se que o Conselho de Sentença deve decidir sempre como lhe convier, ao passo que o Juiz presidente do Tribunal do Júri, ao fixar a pena, estaria obrigado a observar o máximo da reprimenda imposta ao Réu no julgamento anterior. Registrou-se, no ponto, ser necessário distinguir, na sentença subjetivamente complexa do Tribunal do Júri, qual matéria seria de competência dos jurados — e, portanto, acobertada pela soberania — e qual a de competência do Juiz Presidente — despida, pois, desse atributo. Enfatizou-se que, no âmbito de julgamento de recurso exclusivo da defesa, conferir ao Tribunal do Júri o poder jurídico de lhe agravar a pena, resultaria em dano ao Réu, em autêntica revisão da sentença pro societate, favorecendo a acusação, que não recorrera. Destarte, na espécie, concluiu-se não estar o terceiro Júri jungido à decisão anterior, que reconhecera excesso doloso à legítima defesa, de modo que lhe era lícito decidir como conviesse, adstrito às provas dos autos. O Juiz Presidente é que, ao dosar a pena, deveria ter observado aquela fixada no julgamento anulado em razão do recurso exclusivo da defesa. Asseverou-se, ademais, não se encontrar nenhuma razão lógico-jurídica que, legitimando outra conclusão, preexcluísse estender a proibição da reformatio in pejus indireta, sempre admitida na província das decisões singulares, aos julgamentos da competência do Tribunal do Júri, ainda quando consideradas circunstâncias que o não tenham sido em julgamento anterior. Por fim, acrescentou-se que a regra que o sustenta é, em substância, de natureza processual e, no específico quadro teórico desta causa, apareceria, com caráter cogente, dirigida apenas ao Juiz Presidente do Júri, que a deveria reverenciar no momento do cálculo da pena, sem que isso importasse limitação de nenhuma ordem à competência do Conselho de sentença ou à soberania dos veredictos. Nesse sentido, concedeu-se a ordem para fixar a pena do paciente nos exatos termos em que imposta no segundo julgamento, qual seja, 6 anos de reclusão, em regime inicial semi-aberto. HC 89544/RN, rel. Min. Cezar Peluso, 14.4.2009. (HC-89544)”

2.3.4. Competência mínima para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida

Os crimes dolosos contra a vida que devem ser julgados pelo Tribunal do Júri são: Homicídio (artigo 121 do CPP), Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio (artigo 122 do CPP), Infanticídio (artigo 123 do CPP) e aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento e aborto provocado por terceiro (artigos 124 e 126 do CPP). Entretanto, a sua competência pode ser ampliada por Lei Ordinária, segundo artigo 74, §1º do CPP, quando afirma que:

“Art. 74 – A competência pela natureza da infração será regulada pelas leis de organização judiciária, salvo a competência privativa do Tribunal do Júri.

§1º – Compete ao Tribunal do Júri o julgamento dos crimes previstos nos artigos 121, §§ 1º e 2º, 122, parágrafo único, 123,124,125,126 e 127 do Código Penal, consumados ou tentados (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

Já segundo o artigo 78, I, CPP:

“Art. 78 – Na determinação da competência por conexão ou continência, serão observadas as seguintes regras:

I – No concurso entre a competência do Júri e de outro órgão da jurisdição comum, prevalecerá a competência do Júri (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

Assim, o CPP prevê que o julgamento dos crimes conexos com os crimes dolosos contra a vida também será de competência do Tribunal do Júri, entretanto, somente quando o elemento subjetivo do tipo for o dolo, nas suas modalidades direta e indireta, ou seja, alternativo ou eventual.

Há alguns casos, todavia, que fogem à competência do Júri, quando o dolo do agente não atenta contra a vida, como, por exemplo, o Latrocínio, que não é crime contra a vida, sendo o objeto jurídico o patrimônio, devendo ser julgado, então, pelo juízo singular.

A Súmula 603 do STF nos fala bem isso, quando preceitua que “A competência para o processo e julgamento de latrocínio é do Juiz singular e não do Tribunal do Júri”.

O Estupro seguido de morte e lesão corporal com o mesmo resultado, também são de competência do juiz singular.

As pessoas que têm prerrogativa de foro em razão da função não são julgadas pelo Júri, como os membros do Ministério Público, Magistrados, Prefeitos,Presidente da República.Desta forma, se a prerrogativa for prevista tão-somente na Carta Estadual, haverá competência do Júri.

Assim, a Súmula 721 do STF diz que “A competência Constitucional do Tribunal do Júri prevalece sobre o foro por prerrogativa de função estabelecida exclusivamente pela Constituição estadual”.

Sabendo-se que o instituto do Júri é um órgão da justiça comum, pode ele ser estadual ou federal. O Júri Federal tem competência para julgar casos específicos, como os crimes dolosos contra a vida de Funcionários Públicos federais ou praticados por estes, em razão de suas funções.

2.3.4.1. Crimes dolosos contra a vida praticados a bordo de navio ou aeronave

Segundo a Constituição, a Justiça Federal tem competência para julgar os crimes praticados a bordo de navios ou aeronaves, sem esquecer da competência da Justiça Militar, conforme o art. 109, IX da CF, que diz: “Aos juízes federais compete processar e julgar: IX os crimes cometidos a bordo de navios ou aeronaves, ressalvada a competência da Justiça Militar”, este artigo fala a respeito dos navios, e não de embarcações, segundo o Código de Processo Penal nos artigos 70, 88 e 89 do CPP.

É preceito deste último artigo:

“Art. 89 – Os crimes cometidos em qualquer embarcação nas águas territoriais da República, ou nos rios e lagos fronteiriços, bem como a bordo de embarcações nacionais, em alto – mar, serão processados e julgados pela justiça do primeiro porto brasileiro em que tocar a embarcação, após o crime, ou, quando se afastar do País, pela do último em que houver tocado (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).”

Em se tratando de crimes dolosos contra a vida praticados a bordo de navio, a competência será do Júri Federal, consoante o Decreto-Lei nº 253/67

Conforme o art. 4º do Decreto-Lei nº 253, de 28 de Fevereiro de 1967:

“Art. 4º Nos crimes de competência da Justiça Federal, que devem ser julgados pelo Tribunal do Júri, observar-se-á o disposto na legislação processual, cabendo a sua presidência ao juiz a que competir o processamento da respectiva ação penal.

Parágrafo único. Nas Seções Judiciárias, onde houver mais de uma Vara, competentes em matéria criminal, a lista dos jurados será organizada, anualmente por um dos Juízes, mediante rodízio observada sua ordem numérica (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 253, 1967).”

“TRIBUNAL DO JÚRI FEDERAL. DECRETO-LEI N. 253/67. ARTIGOS 215, IV, E 153, PARAGRAFO 18, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. O Júri Federal atende precisamente à conciliação dos dois textos constitucionais: o julgamento dos crimes dolosos contra a vida pelo Tribunal do Júri (artigo 153, parágrafo 18, da CF) e a competência da Justiça Federal para processar e julgar os crimes praticados em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas ou empresas públicas … (art. 125, IV, da CF). 'Habeas corpus' indeferido.” (1ª Turma – HC 63.662/PE – Unânime – publicado no DJ de 14/08/1986)

Competência da Justiça Militar

Os crimes cometidos dentro do território nacional serão considerados uma extensão do território brasileiro, segundo ditame expresso no art. 5º, §1º, CP:

“Art. 5º – Aplica-se a lei brasileira, sem prejuízo de convenções, tratados e regras de direito internacional, ao crime cometido no território nacional.

§1º – Para os efeitos penais, considera-se como extensão do território nacional as embarcações e aeronaves brasileiras, de natureza pública ou a serviço do governo brasileiro onde quer que se encontrem, bem como as aeronaves e as embarcações brasileiras, mercantes ou de propriedade privada, que se achem, respectivamente, no espaço aéreo correspondente ou em alto-mar “(BRASIL – DECRETO-LEI Nº 2.848, 1940).

Ou seja, os crimes que ocorrerem a bordo de navio público ou os que prestam serviço ao governo brasileiro serão processados e julgados pela Justiça Militar.

Para que possa haver o Tribunal do Júri, é necessária a aplicação daqueles quatro princípios aos jurados, para que os mesmos possam decidir a respeito do destino do Réu, que resultará na sua condenação ou absolvição. É importante ressaltar, como já mencionado outrora, que somente haverá competência do Júri quando o elemento subjetivo do tipo for o dolo, nas suas modalidades diretas e indiretas, ou seja, alternativo ou eventual.

Preceitua Bonfim (2011, p.564) que:

“A competência penal do Júri possui extração constitucional. Assim, conforme o caráter absoluto que apresenta e por efeito da vis attractiva que exerce, estende-se às infrações penais conexas ao crime doloso contra a vida.”

2.4. JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL

O Juizado especial criminal, conhecido como JECrim,  nasceu como forma de promover a conciliação ou julgar as infrações de menor potencial ofensivo. A sua efetiva implantação se deu com a Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995.

2.4.1. Tribunal do Júri x Juizado Especial Criminal

Os crimes julgados pelo Juizado Especial são os crimes diversos daqueles que são de competência do juiz singular, diferenciando também do Tribunal do Júri, que julga os crimes dolosos contra a vida, tentados e consumados.

Alguns crimes que são considerados crimes dolosos contra a vida, quando chegam ao juiz, este se convence de que não se trata de competência do Tribunal do Júri, desclassificando o crime e fazendo que ele seja remetido para o juiz singular. Entretanto, o juiz, ao fazer a desclassificação, não pode apontar o novo crime, sob pena de invadir a competência do juiz monocromático.

Quando o juiz do Júri faz a desclassificação do crime e as partes não recorrem deste processo, remete-se novamente ao juiz singular. Caso as partes queiram recorrer da decisão, é cabível o Recurso em Sentido Estrito, conforme art. 581, II, do CPP, que diz que “Caberá recurso, no sentido estrito, da decisão, despacho ou sentença: (…) II – que concluir pela incompetência do juízo.

Para o art. 419, parágrafo único:

“Art. 419 – Quando o juiz se convencer, em discordância com a acusação, da existência de crime diverso dos referidos no $ 1 do art. 74 deste Código e não for competente para o julgamento, remeterá os autos ao juiz que o seja.

Parágrafo único – Remetido os autos do processo a outro juiz, á disposição deste ficará o acusado preso” (BRASIL – DECRETO-LEI Nº 3.689, 1941).

Assim, os crimes julgados no Juizado Especial são diferentes daqueles apreciados no Tribunal do Júri, sendo de competência distinta,  trabalhando em âmbitos diferentes e com matérias distintas. Desta forma, nem todo crime praticado será julgado pelo Tribunal do Júri, sendo necessário olhar a potência em que fora praticado e, caso o juiz assim entenda, pode-se remeter para nova apreciação de outro Magistrado.

2.5. A VISÃO CRÍTICA DO JÚRI NO BRASIL

Afirmar-se que o Tribunal do Júri seria uma das mais democráticas instituições do Poder Judiciário, ainda que submeta o homem ao julgamento de seus pares e não ao da Justiça Togada, ou seja, é aplicado o direito segundo o entendimento popular e não em consonância com as técnicas que regem os Tribunais.

O Tribunal do Júri, além de democrático, configura-se eivado de arbitrariedade, em razão da inexistência do dever de motivação dos julgamentos. Nas respostas aos quesitos, não há nenhuma fundamentação acerca da opção, fazendo com que o jurado firme seu convencimento segundo o que lhe pareça como verdade, ou seja, conforme o que lhe é revelado e tomado como verdade absoluta.

A instituição do Júri, cercada de polêmica, permanece em grande parte nas legislações modernas, ainda que sob diversos modelos, na medida em que traz uma espécie de legitimação para o sistema jurídico em razão da participação popular, que injeta novos valores democráticos ao processo legal.

Aliás, a participação de cidadãos no julgamento dos crimes mais graves é um princípio recorrente nos diversos modelos de sociedade ao longo da história, desde a Grécia antiga, que concebeu a forma primitiva do Júri, por intermédio do Tribunal da Helieia – os heliastas -, onde era, originalmente, em número de seis mil, distribuídos em dez seções de seiscentos membros cada, designados anualmente por sorteio em meio aos cidadãos com mais de trinta anos, de reputação ilibada e não devedores do Estado.

Exemplificadamente, enumeram-se como os principais argumentos contrários à existência do Júri:

a) A decisão do Júri não é fundamentada;

b) O Júri decide em segredo;

c) Em muitos países, o Júri está praticamente extinto;

d) A maioria dos jurados não tem experiência;

e) O Júri não é verdadeiramente representativo da comunidade;

f) Os resultados do Júri são imprevisíveis;

g) A mídia pode influenciar decisivamente no veredicto;

h) Frequentemente os resultados do Júri são frutos da persuasão e não da razão;

i) Falta aos jurados a necessária habilidade para entender e julgar corretamente;

j)Não existe grande diferença entre o resultado de um julgamento de um Júri e o de um Juiz técnico;

k) Se o resultado é aproximado, melhor um julgamento menos oneroso financeiramente e mais rápido, realizado por um Juiz togado;

l) Alguns julgamentos refletem mais o envolvimento emocional dos jurados do que propriamente uma decisão racional;

m) Os jurados se enganam frequentemente ao votar;

n) A tarefa de julgar é para profissionais, não para amadores;

o) Os jurados absolvem com muita frequência;

p) Veredictos absurdos são prolatados costumeiramente;

q) Os jurados podem ser intimados ou “cabalados”;

r) O jurado, sendo compelido a fazer parte do Júri, não julga com o mesmo interesse de um Juiz, que escolheu a Magistratura como profissão.

Por outro lado, tem-se como principais argumentos favoráveis ao Júri os seguintes:

a) O Júri está se expandindo para outros países atualmente, não sendo verdade que esteja em extinção;

b) O Júri é uma garantia da liberdade individual e do regime democrático;

c) O Júri julga crimes que atentam contra o mais importante bem jurídico: a vida, daí a razão de o julgamento ser colegiado;

d) Sete consciências julgam melhor que uma;

e) O Júri confere legitimidade ao Estado e à justiça, na medida em que é o próprio povo quem julga;

f) É mais relevante o veredicto prolatado pela comunidade do que por um poder constituído;

g) Julgando crimes dolosos contra a vida, os jurados têm mais liberdade de entender e julgar corretamente o fato, contrariamente ao Juiz togado, afeito ao tecnicismo legal;

h) O Júri faz a lei para caso concreto;

i) Diferentemente de um Magistrado, o Júri pode fazer justiça, na medida em que tem a possibilidade de desprezar o frio texto da lei;

j) O Conselho de Sentença não motiva suas decisões, chegando ao veredicto de acordo com sua própria ética e standards sociais;

k) O Júri julga com mais sensibilidade e acerto do que a Magistratura togada;

l) No Brasil, o exemplo mais eloquente de erro judiciário é um elogio ao Júri e uma crítica à justiça togada, que trata-se do “Caso dos Irmãos Naves”, em que o Júri absolvera por duas vezes os acusados inocentes e o Tribunal técnico condenou-os equivocadamente, perpetrando o erro;

m) No Júri, se julga o homem, além do fato. Sendo a justiça técnica mais reducionista, faz-se um julgamento mediante complexas fórmulas legais, esquecendo-se do “homem”;

n) O Júri possibilita uma verdadeira aproximação da comunidade com a justiça;

o) O Júri é símbolo da justiça e não deve ser destruído por representar historicamente uma conquista da cidadania;

p) O risco de a imparcialidade do Júri ser comprometida por medo ou corrupção dos jurados é pequeno se comparado ao julgamento de um Juiz togado, visto que no Júri o número de jurados convocados é expressamente maior.

Enfim, bom ou ruim, o Júri tem previsão constitucional.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificou-se com o presente estudo que a origem do Tribunal Popular remonta à época longínqua. No Brasil, fora instituído antes mesmo da independência para julgar crimes de imprensa, encontrando-se, atualmente, ratificado no feitio adotado pela Constituição e pelo posicionamento da maioria dos doutrinadores no assunto.

Apoiado em ensinamentos doutrinários, defendeu-se a ideia de que o Tribunal Leigo tinha a sua existência justificada pelo papel neutralizador que exercia frente à tirania estatal, se tornando uma instituição arcaica ao tempo que o Estado Democrático de Direito se fortalecia, acompanhado pelo estabelecimento das garantias individuais.

Este trabalho trouxe em pauta o estudo dos princípios constitucionais que norteiam o Júri, comprovando através da soberania dos veredictos que os jurados leigos são tão importantes quanto os juízes togados, pois suas decisões são soberanas no Tribunal do Júri, além de baseadas na íntima convicção e no bom senso do ser humano social. Com isso, ficou claro que a metodologia técnica, tão relevante nas decisões judiciais, pode se tornar relativa diante das sentenças coerentes dos jurados, mostrando que não depende, única e exclusivamente, dos conhecimentos jurídicos, mas sim de uma boa sabedoria comum e de senso de justiça, que, sem dúvida, são características inerentes aos jurados.

Na esfera penal, o Júri é o símbolo e a esperança de uma justiça mais sensível às transformações sociais, pois busca aproximar o Direito de sua verdadeira legitimação. Afinal, essa instituição é capaz de converter o sistema judiciário dos simples saberes técnicos para uma promoção social da justiça, deixando de lado as exclusões sociais que tomam conta do país. Basta que o Júri seja enfocado de maneira menos legalista para que todos possam entender a estrutura jurídica da instituição, com as feições democráticas que progressivamente se firmou em todos os sistemas jurídicos democráticos do mundo.

Assim finaliza-se este trabalho com a convicção de que o Tribunal do Júri deve ser cada vez mais alvo apenas de mudanças para o aprimoramento do seu funcionamento, dando-lhe o devido valor e preservando o papel democrático perante a sociedade.

 

Referências:
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Informações Sobre o Autor

Beatriz Rolim Cartaxo

Bacharel em direito assessora jurídica da policlínica Jaguaribe. Pós graduanda em processo civil e civil por Damásio de Jesus


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