Sujeitos e atos de cientificação no direito processual penal

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Resumo: Esta breve explanação tem por objetivo apresentar os sujeitos inseridos no contexto do Direito Processual Penal, bem como indicar o desenvolvimento do procedimento criminal, através de seus atos concatenados. Inicia-se pela apresentação dos atores fundamentais do processo penal, tais como o juiz, o representante do Ministério Público, o defensor, os assistentes e, é claro, as partes. Após, de forma sintética a expositiva, haverá a demonstração de alguns atos primordiais do Processo Penal, com as suas devidas especificidades extraídas do Código de Processo Penal, e as interpretações desenvolvidas pela doutrina e por alguns de nossos tribunais.


Palavras-chaves: Processo, Penal, Procedimento, Sujeitos, Atos, Democracia, Desenvolvimento, Fases.


Sumário: Introdução; 1. Sujeitos processuais; 1.1. Juiz; 1.1.1. Função Jurisdicional; 1.1.2. Poderes; 1.1.3. Deveres; 1.1.4. Prerrogativas (garantias) e vedações; 1.1.5. Impedimentos, suspeições e incompatibilidades; 1.2. Do Ministério Público; 1.2.1. Princípios; 1.2.2. Prerrogativas e vedações; 1.2.3. Impedimentos e suspeições; 1.3. Defensor; 1.4. Do Assistente de Acusação; 1.4.1. Atos do assistente; 2. Atos processuais; 2.1. Citação; 2.1.1. Citação do preso; 2.1.2. Citação do funcionário público; 2.1.3. Citação do militar; 2.1.4. Revelia; 2.1.4.1. Alteração do art. 366 do CPP; 2.2. Intimação e Notificação (arts. 370-372); 2.3. Carta Precatória; 2.4. Carta Rogatória; 2.5. Carta de Ordem; 2.6. Carta de Guia; 3. Observações críticas; Conclusão; Bibliografia.


Introdução


O Direito Processual Penal é um reflexo da quantificação e da qualificação da democracia de um Estado. É através de suas garantias que podemos extrair qual o grau de desenvolvimento das liberdades no qual se encontra uma determinada nação[1].


Neste esteio, apresentar os atos de comunicação que formam o denominado Processo Penal é faina de admirável relevância, na busca de encontrar o real patamar de democracia social no qual está inserido um país.


Eis o objetivo, portanto, do presente trabalho: demonstrar, de forma clara e objetiva, como se desenvolve o Processo Penal no Brasil, através dos sujeitos que lhe compõem, bem como dos atos de cientificação que lhe são pertinentes.


Para tanto, imprescindível um leitura atenciosa do nosso Código de Processo Penal, afinal de contas, é ele, em conjunto com a Constituição Federal, quem delimita o leito de estudo ora esposado, dispondo os atores e fases do procedimento penal.


A fim de tornar o texto mais didático, apresentar-se-á um desenvolvimento em três partes: a) a primeira tratando especificamente dos sujeitos que figuram no Processo Penal (juiz, partes, defensores, acusadores, assistentes); b) a segunda tratando especificamente dos atos de comunicação (cientificação e diligência) do Processo Penal (citação notificação, intimação, cartas); c) e a terceira apresentando a devida crítica, no sentido de avaliar o grau de desenvolvimento democrático extraído de nossa legislação processual criminal.


Vale salientar que o objetivo aqui é apresentar uma síntese dos sujeitos e atos do processo, para embasar a crítica final acerca do desenvolvimento democrático. Portanto, não haverá aprofundamento exacerbado nos institutos processuais citados, mas apenas a sua elucidação de forma rápida e objetiva, sem caráter perfunctório.


1. Sujeitos processuais


Quando falamos em sujeitos estamos fazendo reflexões e ponderações sobre homens, pessoas. Assim, o estudo dos sujeitos processuais do Processo Penal desenvolve-se pela apreciação da índole subjetiva do tema, a análise daqueles que fazem o processo acontecer. Apontam-se como sujeitos processuais principais o juiz, o membro do Ministério Público e o acusado e seu defensor, que formarão aspecto central.


Estes são os principais, mas não os únicos. Também são sujeitos processuais – por atuarem de uma forma ou de outra no processo – os órgãos auxiliares (diretores de secretarias, escreventes, oficiais de justiça, peritos), bem como os terceiros, que podem ser interessados, como o assistente (o ofendido ou seu representante legal), ou desinteressados, como as testemunhas.


Para o presente exame somente interessará o estudo do juiz, do Ministério Público e do defensor do acusado, bem como do assistente da acusação.


 1.1. Juiz


Exercente direto da função jurisdicional, o juiz possui o papel de conduzir o Processo Penal e de dizer o direito no caso que lhe é apresentado. É ele quem resolve o mérito do processo, interpretando e aplicando a lei ao caso concreto.


Para que a sua conduta seja moldada nos termos da Constituição Federal, o juiz deverá agir com total imparcialidade, desenvolvendo de forma concreta o caráter acusatório de nosso sistema processual criminal.


Segundo o nosso Código de Processo Penal (art. 251): ao juiz incumbirá prover a regularidade do processo e manter a ordem no curso dos respectivos atos, podendo, para tal fim, requisitar a força pública.


1.1.1. Função Jurisdicional


A finalidade da função jurisdicional é resolver os conflitos da sociedade, aplicando as normas aos casos concretos, levando à harmonização social (convivência harmônica). A idéia de jurisdição é a de uma decisão definitiva do conflito. O Estado-Juiz substitui a vontade particular pela vontade do Estado. Desde que as partes não consigam a chamada auto-composição (solução pacífica e natural do conflito), torna-se necessário que se leve o exame desse conflito ao Poder Judiciário.


O Poder Judiciário só exerce a função jurisdicional se for provocado por uma das partes. A provocação se dá pelo ajuizamento de uma ação, que faz com que seja levado ao Poder Judiciário, através de um profissional habilitado (salvo algumas exceções), o conhecimento da situação e a pretensão desejada.


Com a inércia, preserva-se a imparcialidade do juiz, que é a base do Poder Judiciário. Ninguém escolhe o juiz que julgará o seu caso, e nenhum juiz escolhe aquilo que irá julgar. O juiz é totalmente estranho à situação.


A função jurisdicional é para ser exercida uma só vez, a fim de resolver aquele conflito. Uma vez que o conflito esteja resolvido, entende-se que a decisão é definitiva. Esta é a definitividade da função jurisdicional. O Poder Judiciário substitui a vontade das partes pela vontade oficial do Estado.


Em suma: a função jurisdicional tem como finalidade a solução de conflitos, é exercida de forma inerte (somente se provocada), tende a substituir a vontade dar partes (que não conseguem se auto-compor) e decide a questão com definitividade.


Dentro do exercício da função jurisdicional (principalmente na análise dos casos concretos) é que é possível o controle da constitucionalidade das leis. No nosso Ordenamento Jurídico, quem mais controla a constitucionalidade das leis é o Poder Judiciário. Esta função não é dada somente ao Poder Judiciário, porém lhe é dada precipuamente.


Ainda quanto a funções e poderes, importante ressaltar que o CPP, em muitas passagens, bem como as leis penais esparsas, conferem ao magistrado poderes que discrepam, em muito do Estado Democrático de Direito que adotamos e do modelo acusatório que deveria vigorar, transmutando processo penal em verdadeiro processo inquisitivo.


Destarte, o juiz pode reconhecer agravantes, mesmo que não tenham sido alegadas, ou condenar a despeito do pedido de absolvição do MP (CPP, art. 385); de ofício requerer a produção de provas para “dirimir dúvida” sobre ponto relevante, olvidando por completo o in dubio pro reo (CPP, art. 156); decretar, de ofício, a prisão preventiva (CPP, art. 311); sem mencionar o fato de que o juiz que recebe a denúncia, já efetuando um juízo de valor sobre a existência do crime e sua autoria, é o mesmo que julga, sob o ilusório manto da imparcialide.


São comentários que mostram o falso sistema acusatório em que vivemos, com a essência viva de procedimentos inquisitoriais, que demonstram a necessidade de uma reformulação urgente no CPP, adequando, com plenitude e efetividade, aos ditames constitucionais e às garantias fundamentais dos acusados.


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1.1.2. Poderes


Os poderes do juiz, na síntese exposta pelo professor Pedro Durão[2], são:


– Instrutórios ou Probatórios: presidir a colheita das provas, ouvir testemunhas, determinar diligências, ouvir testemunhas não apresentadas, dentre outras (arts. 156, 168, 176, 196, 209, 234, 407, 425, 502, 538, etc. do Código do Processo Penal) Vale salientar que as duas derradeiras atribuições que lhe são conferidas (determinar diligências, ouvir testemunhas não apresentadas) não são de nosso agrado, uma vez que ferem, frontalmente, a isonomia do juiz no Processo Penal);


– Disciplinares ou Administrativos: atos de ordem processual e administrativos não decisórios, que dão seguimento à marcha processual (arts. 184, 187, 201, 212, 213, 218, 230, 233, 260, 264, 265, 419, 443, 450, 497, etc. do CPP);


– Decisórios: proferir decisões e sentenças que determinam ônus ás partes e decidem o processo (arts. 311, 316, 386, 387, 411, 486, 538, etc. do CPP);


– Anômalos: aqueles de natureza não penal, tais como o de requisitar Inquérito Policial, fiscalizar a ação penal, receber a notitia criminis, presidir a atuação em flagrante, conceder Habeas Corpus (arts. 5, II, 28, 39, 307, 574, etc. do CPP).


Claras são as palavras de Eugênio Pacelli, ao dispor que ao juiz defere-se a direção do processo, devendo ele zelar pela regularidade de seu desenvolvimento, para o que poderá até mesmo dispor de força pública[3].


1.1.3. Deveres


Dentre vários dos deveres do juiz, podemos destacar três, de imprescindível relevância:


– Zelar pela celeridade e regularidade processual: o juiz, como presidente da relação processual, tem o dever de zelar pelo seu liso andamento, sem morosidade e irregularidade. Essa situação, antes implícita em nosso ordenamento jurídico, hoje é de fundamental pertinência, através do art. 5°, LXXVIII da Constituição Federal:


A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.


– Imparcialidade: o juiz tem o dever de ser imparcial na relação jurídica processual criminal, em decorrência do sistema acusatório desenvolvido em nosso ordenamento jurídico;


– Urbanidade em relação às partes: o juiz é um dos sujeitos do processo penal, estando no mesmo patamar das partes, nem acima, nem abaixo. Por essa razão, é dever do juiz tratar as partes com urbanidade e cordialidade.


1.1.4. Prerrogativas (garantias) e vedações


A Constituição Federal previu, de forma expressa, as prerrogativas e vedações aos juízes. O art. 95, incisos I, II e III, trazem o rol de garantias: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Os conceitos de tais prerrogativas são constitucionais e não enriquece a discussão apenas copiá-los. O que realmente importa falar, a respeito deles, é que são corolários da atuação judicante, mormente da independência jurídica e política dos juízes. Afinal, se o juiz não tivesse tais direitos garantidos em sede constitucional, não seria realmente livre para atuar conforme a lei e sua consciência, haja vista que sempre que desagradasse alguém “com influência” por meio de suas ações correria o risco de ser desligado do serviço público, ou removido para um local inadequado ou mesmo ver seus vencimentos reduzidos de forma arbitrária.


Contra tais abominações, o legislador constituinte originário protegeu o juiz.


Vê-se que essas garantias não são para a pessoa do juiz, mas para o cargo que ocupa.


Perdendo-se o cargo, perdem-se também as garantias (elas são do cargo). São garantias para o exercício da função.


As vedações, por sua vez, estão previstas no art. 95, parágrafo único. São conseqüências inafastáveis da imparcialidade que deve reger a atividade jurisdicional. Enquanto as prerrogativas agem “de fora para dentro”, impedindo que influências externas prejudiquem a atuação judicante, as vedações agem de “de dentro para fora”, visando evitar que o próprio juiz, almejando proteger interesses próprios e ilegais, deprecie sua atuação funcional, esquecendo a ordem jurídica e resguardando valores puramente mesquinhos. A vedação é uma forma de obstar o desvirtuamento do poder de dizer o direito.


1.1.5. Impedimentos, suspeições e incompatibilidades


Assim como ocorre no Processo Civil, no quais as causas de impedimentos e suspeições estão previstas nos artigos 134 a 138, CPC, abarcando juizes, serventuários da justiça, peritos, bem como membros do órgão ministerial. O Código de Processo Penal prevê, igualmente, suas causas de impedimentos e suspeições a juízes. No CPP as incompatibilidades e impedimentos residem no art. 252 e as causas de suspeição no art. 254       Por certo que, existindo impedimentos, incompatibilidades e suspeições por parte do juiz, este não deve atuar no processo, sob pena de nulidade. O que se procura preservar aqui é não somente a lisura e justeza do processo, mas, principalmente, a imparcialidade, como garantia constitucional, em toda a sua plenitude, como fator inerente ao devido processo legal.


1.2. Do Ministério Público


O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional, incumbindo-lhe a defesa da ordem pública, do regime democrático, dos interesses sociais e individuais indisponíveis, nos dizeres do artigo 127 da Constituição Federal.


Para Kildare Gonçalves Carvalho, a Constituição dispensa ao Ministério Público tratamento especial, instituindo princípios, ampliando suas funções e fixando garantias tanto para instituição quanto para os seus membros[4]. Eugênio Pacelli complementa:


No Brasil, a instituição de um modelo essencialmente acusatório somente veio a lume com a Constituição da República de 1988, com uma completa redefinição do papel do Ministério Público na ordem jurídica, com inúmeras e relevantes funções na defesa jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis[5].


A nós, interessa estudar apenas as características do MP relevantes ao Processo Criminal, dispondo, de forma concisa, os seus atributos.


1.2.1. Princípios


     O órgão ministerial atua perante o Poder Judiciário objetivando efetivar as suas atribuições constitucionais, embora, diga-se, não participe ativamente de todos os tipos de feitos judiciais. Quando o faz, contudo, sua ação adquire dupla faceta: como autêntica parte, no qual litiga diretamente buscando uma tutela jurisdicional (p. ex., nos casos de ação penal pública incondicionada), ou age apenas para preservar a ordem jurídica, sem interesses diretos no desfecho da causa, quando reveste-se de custos legis.


A atuação do Ministério Público rege-se por certos princípios explícitos, dentre eles o da unidade, da indivisibilidade e da autonomia funcional (CF, art. 127, §1º). Há, ainda, um princípio constitucional implícito a incidir sobre o MP, qual seja, o do promotor natural.


O princípio da unidade (CF, art. 128) apregoa que os componentes do Ministério Público (MP Federal, MP do Trabalho, MP Militar, MP do DF e Territórios, MP estaduais e promotores) atuam como parte de um todo, e não como órgãos isolados, ou seja, sempre ajam em nome da instituição, nunca em nome próprio, o que torna dita atuação impessoal. Obviamente que cada um desses órgãos possui esfera de atuação própria, mas isto não retira o caráter uno que integra a instituição.


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O princípio da indivisibilidade, que pressupõe o da unidade, ressalta, por sua vez, que podem os promotores ser substituídos uns pelos outros (dentro dos limites da legalidade) sem que ocorra qualquer tipo de vício, irregularidade, nulidade ou prejuízo para o processo ou o procedimento. Afinal, como eles falam pela instituição, são considerados juridicamente uma só pessoa.


Como conseqüência natural de ambos os princípios, surge o princípio da independência funcional. Isto significa que cada promotor está livre para atuar e agir de acordo com a constituição e as leis infraconstitucionais, e não consoante interesses diversos, mesmo que dos dirigentes da instituição. Assim, o Promotor de Justiça não se sujeita a qualquer submissão funcional do seu superior administrativo no que tange à sua atuação ministerial. Afinal, a hierarquia existe entre Promotores, Procuradores e Procurador-Chefe é apenas interna, administrativa, e não funcional.


Os princípios acima elucidados estão expressos na Carta Magna. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, interpretando a Constituição, considerou existir um outro princípio relevante ao órgão ministerial: o do promotor natural.


Assim como existe o princípio do juiz natural, que proíbe juízo ou tribunal de exceção, também vigora no ordenamento a garantia da vedação do acusador de exceção, que impede que o órgão que possui atribuição para atuar em determinado feito assim o faça. É um direito do réu conhecer, de antemão, que vai lhe acusar em juízo. Afinal, o individuo tem a garantia de somente ser processado pelo órgão do MP com a atribuição delimitada pela lei.


O entendimento do STJ é remansoso no sentido da existência de referido princípio[6]. No STF o caso foi decidido no julgamento do HC 67.759, no qual reconheceu-se, por maioria, a existência do princípio[7]. O posicionamento foi confirmado no HC 74.052/RJ, relatado pelo Min. Marco Aurélio, o que ratificou a presença do postulado no direito pátrio.


1.2.2. Prerrogativas e vedações


As prerrogativas e vedações dos membros do MP em muito se assemelham as dos juízes. Portanto, a forma de esclarecimento será praticamente a mesma.


A Constituição Federal previu, de forma expressa, as prerrogativas e vedações aos membros do MP. O art. 128, §5º, I, traz o rol de garantias: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos. Os conceitos de tais prerrogativas são constitucionais e não enriquece a discussão apenas copiá-los. O que realmente importa falar, a respeito deles, é que são corolários dos princípios da instituição, mormente da independência funcional. De fato, se o Promotor ou o Procurador não tivesse tais direitos garantidos em sede constitucionalmente, não seria realmente livre para atuar conforme a lei e sua consciência, haja vista que sempre que desagradasse alguém “com influência” com suas ações correria o risco de ser desligado do serviço público, ou removido para um local inadequado ou mesmo ver seus vencimentos reduzidos de forma arbitrária. Contra tais abominações protegeu o membro do MP o legislador constituinte originário.


As vedações, por sua vez, estão previstas no art. 128, §5º, II. Também são conseqüências inafastáveis da independência funcional, embora com outro enfoque. Enquanto as prerrogativas agem “de fora para dentro”, impedindo que influências externas prejudiquem a atuação do membro do MP, as vedações agem de “de dentro para fora”, visando evitar que o próprio Promotor, p. ex., visando proteger interesses próprios e ilegais, deprecie sua atuação funcional, esquecendo a ordem jurídica e resguardando valores puramente mesquinhos. A vedação é uma forma de obstar a corrupção funcional.


1.2.3. Impedimentos e suspeições


Tais proposições estão clarificadas no art. 258 do CPP, que assim dispõe:


“Os órgãos do Ministério Público não funcionarão nos processos em que o juiz ou qualquer das partes for seu cônjuge, ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral, até o terceiro grau, inclusive, e a eles se estendem, no que lhes for aplicável, as prescrições relativas à suspeição e aos impedimentos dos juízes”.


Por certo que, existindo impedimentos, incompatibilidades e suspeições por parte do membro do MP este não deve atuar no processo, sob pena de nulidade. O que se procura preservar aqui é não somente a lisura e justeza do processo, mas, principalmente, a imparcialidade, como garantia constitucional, em toda a sua plenitude.


Concernente a este tópico um ponto merece reflexão. Existe uma fortíssima discussão doutrinária e jurisprudencial a respeito da possibilidade de o Ministério Público exercer atividades investigatórias tal qual a polícia judiciária. O cerne da questão é se a Constituição outorgou ao MP tal atribuição.


Hodienarmente, o entendimento prevalecente no STJ é de admitir como válida a investigação levada a efeito pelo MP[8]. Existe nessa Corte, aliás, um verbete sumular que corrobora tal inteligência. É a Súmula 234, cuja redação é: A participação do membro o Ministério Público na fase investigatória criminal não acarreta seu impedimento ou suspeição para o oferecimento da denúncia.


O STF, ao seu turno, atesta que a Constituição não concedeu ao MP tais poderes investigatórios[9]. O certo é que a questão ainda está pendente de julgamento em Ação Direta de Inconstitucionalidade. Até agora reina a tese de que o MP possui tal prerrogativa, mas ela está condicionada à confecção de lei específica a regular o procedimento.


1.3. Defensor


Iniciada a persecução penal passa o réu a ter o direito subjetivo público do direito à defesa. Afinal, a Constituição Federal, em seu art. 5º, incisos LIV e LV, garante, respectivamente, o direito ao devido processo legal, ao contraditório e ampla defesa. Cumpre não esquecer, também, que o texto constitucional consagrou o advogado como indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei (CF, art. 133), bem como asseverou que a Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV (CF, art. 134).


Desse modo, indene de dúvidas que o acusado deve ter alguém que lhe defenda perante o Estado. Não se deve esquecer que nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor (CPP, cabeça, art. 261). O não cumprimento desse preceito acarreta a nulidade do processo, consoante o art. 564, III, “c”, CPP.


Nada obstante, não basta existir um defensor. Este deve possuir conhecimentos técnicos, pois, se do lado acusador existe um profissional do direito com arcabouço intelectual (o membro do MP), certamente o defensor também deve ser dono de cultura semelhante. É uma questão de paridade de armas, a consagração do princípio da isonomia.


Sem embargo, a mera presença do defensor técnico, com simples atendimentos formais aos atos procedimentais, é insuficiente. A defesa deve ser efetiva, plena, atuante. Aliás, o defensor é figura tão relevante que o réu tem direito, inclusive, a se ver defendido por pessoa de sua confiança[10].


Pois bem. Ainda que existam vetustos entendimentos no sentido de que a deficiência da defesa é nulidade relativa, com o condão de anular o processo somente se ficar demonstrado o prejuízo[11], os tribunais vêm alterando tal concepção, vendo, como não poderia deixar de ser, a completa nulidade de um processo cuja defesa ficou a cargo de um mero observador. Neste diapasão o HC 75.573-2, Rel. Min. Marco Aurélio:


DEFESA – EFETIVIDADE. O princípio segundo o qual ‘nenhum acusado, ainda que ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor’ – artigo 261 do Código de Processo Penal – há de ter alcance perquirido considerada a realidade. Exsurgindo dos autos que o defensor designado teve desempenho simplesmente formal, em verdadeira postura contemplativa, forçoso é concluir que o réu esteve indefeso (…).


A figura do defensor se divide em três facetas: a do defensor propriamente dito (que pode ser público, dativo e ad hoc), a do procurador e a do curador.


Quando o réu constitui um advogado, indicando-o no interrogatório (dispensando-se o instrumento de mandato, art. 266, CPP) ou mesmo mediante procuração nos autos, diz-se procurador. Ao contrário, quando o acusado não constitui advogado, geralmente quando não possui constituições financeiras de contratar um advogado particular, ser-lhe-á indicado um defensor pelo juiz, nos termos do art. 263, CPP. Neste caso tem-se o defensor. O curador é o defensor daqueles que possuem maior de 18 anos e seja portador de doença mental ou de desenvolvimento mental incompleto (art. 149, §2º, CPP), tudo em harmonia com as alterações levadas a efeito pelo art. 5º do novel Código Civil de 2002.


Embora exista parcela da doutrina que assemelhe os conceitos de defensor dativo e ad hoc, utilizando-os como sinônimos, existe diferença entre eles. O defensor ad hoc é aquele que é designado para atuar em único ato do processo. P. ex., audiência de inquirição de testemunhas. Pode ser tanto um advogado particular quanto um defensor público.


O defensor dativo, ao contrário, é aquele indicado pelo juiz para realizar a defesa do acusado em todas as fases do processo, e não apenas em atos isolados. É utilizado normalmente quando na comarca onde tramita o processo não há defensores públicos ou não há em número suficiente para a demanda. Somente advogados particulares podem servir como dativos.


O defensor dativo não se confunde com o defensor público, já que os advogados que atuam nas Defensorias Públicas formalmente constituídas são servidores públicos concursados e têm vencimentos próprios para fazer a defesa dos cidadãos. O defensor dativo, por sua vez, pode ser qualquer advogado, desde que nomeado pelo juiz, e tem direito a receber honorários por seus serviços[12]. Caso contrário, estar-se-ia legitimando um verdadeiro locupletamento ilícito do Estado em face dos cidadãos.


O defensor constituído é, apenas e tão somente, o advogado particular, que recebe honorários para atuar na causa. É vedado ao Defensor Público exercer a advocacia. Apenas relembrando tópicos acima expostos, o advogado pode ser tanto defensor ad hoc quanto dativo.


O procurador pode ser constituído tanto por meio de instrumento procuratório nos autos quanto no interrogatório, hipótese na qual se dispensa tal formalidade. Pode atuar, também, desde a fase pré-processual, ou seja, inquérito policial.


Importante salientar que se o juiz indicar um defensor dativo para o acusado, e este preferir constituir seu próprio advogado, é assegurado tal direito[13], não podendo o magistrado impedir. É a ampla defesa em toda sua plenitude.


O defensor dativo não pode abandonar a causa a não ser fundado em motivações de força maior (CPP, 265), sob pena de multa, e o constituído, se quiser renunciar ao mandato, deverá, após tê-lo feito, atuar na causa ainda por 10 (dez) dias (EOAB, art. 5º, §3º). O acusado não pode sofrer qualquer prejuízo em sua defesa.


Distinção importante entre os defensores dativo (ou mesmo público) e constituído diz respeito às intimações. Enquanto para aqueles a lei exige que seja pessoal, sob pena de nulidade, para estes pode se dar mediante publicação na Imprensa Oficial, sem se considerar que haja prejuízo para a defesa[14].


As causas de suspeição e impedimento (CPP, arts. 252 e 267) também se aplicam aos defensores, de modo geral.


1.4. Do Assistente de Acusação.


No Processo Penal brasileiro, o assistente de acusação não constitui parte da ação penal, que são, como cediço, o Estado e o acusado. Portanto, sua participação não é imprescindível para o prosseguimento do feito. Por esta razão entende-se que o assistente é parte contingente, adjunta ou adesiva. Em verdade, a lei permite sua intervenção apenas em certos casos.


Podem ser assistentes de acusação todos aqueles previstos no art. 268 e 31, CPP. Não podem, ao contrário, o co-réu no mesmo processo (CPP art. 270), por evidente conflito de interesses, nem o poder público, haja vista a presença do MP a preservar precisamente o interesse público[15].


Os casos em que podem intervir como assistentes se resumem, na verdade, a uma hipótese: a de ação penal pública. Deveras, em caso de ação privada o assistente não será assistente, mas autêntica parte do processo.


Discute-se na doutrina qual seria a verdadeira função do assistente no processo penal: meramente auxiliar a acusação ou defender interesse próprio? Enquanto alguns defendem que o assistente apenas assessora o Ministério Público buscando a devida resposta penal, outros advogam que o interesse do assistente é única e tão somente alcançar a condenação para ver-se satisfeito na esfera civil, mediante a devida indenização.


Na verdade, o entendimento mais escorreito parece ser o da dupla colimação: tanto perseguir a resposta penal que entende cabível quanto, conseguintemente, atingir a reparação proporcional na seara civil.


A admissão do assistente encontra limites legais. Somente ingressará no feito enquanto não houver sentença passada em julgado e receberá a causa no estado que a encontrar (CPP, art. 269), sendo impossível, assim, sua admissão na fase pré-processual. Ademais, sua aceitação no processo fica condicionada à aquiescência do órgão ministerial (CPP, art. 272). A decisão que admite o assistente no processo, embora deva constar nos autos, assim como o pedido de ingresso, é irrecorrível (CPP, art. 273).


Importa salientar que é vedada a participação do assistente nos julgamentos de habeas corpus. A razão é simples: uma de suas funções é acusar e, inexistindo acusação no remédio constitucional – o MP é apenas custos legis – inviável sua atuação[16].


1.4.1. Atos do assistente


O capítulo IV do título VIII do livro I do CPP trata dos assistentes. O art. 271 traz os permissivos legais para sua atuação, que a doutrina entende ser um rol taxativo.


Poderá, assim propor meios de prova (perícias, busca e apreensão, acareações, juntada de documentos, etc.) sendo certo que, antes de apreciar os pedidos, o juiz ouvirá o órgão ministerial (CPP, art. 271, §1º).


Tem a faculdade, também, de requerer perguntas às testemunhas, sejam de defesa sejam de acusação. Aqui se põe um questionamento: pode o assistente arrolar testemunhas? A questão se resolve no momento em que o assistente é admitido no processo. De conhecimento comum que o assistente somente intervirá no processo após o recebimento da denúncia. Ora, uma vez que as testemunhas de acusação deverão constar de tal peça acusatória (CPP, art. 41), e o assistente apenas surgirá em momento posterior, estampa-se a impossibilidade de que indique testemunhas.


Não poderá, da mesma forma, aditar a denúncia por falta de amparo legal. Nada obstante tal vedação, poderá, aditar o libelo, entendida esta peça como aquele ofertada após a irrecorribilidade da sentença de pronúncia.


Poderá, ainda, aditar os articulados do MP (razões finais), participar dos debates orais, inclusive no tribunal do júri, arrazoar os recursos manejados pelo MP, contra-arrazoar os recursos interpostos pela defesa, recorrer por contra própria nos casos antevistos no art. 271 c/c 584, §1º e 598 (quando for extinta a punibilidade; quando o réu for impronunciado; e quando houver sentença absolutória, seja no juiz singular seja no Tribunal do Júri). Existem, ainda, numerosos julgados que permitem ao assistente recorrer de sentença condenatória.


Destacam-se, aqui, as súmulas 210 e 448 do STF no trato do assistente e os recursos. A primeira diz que o assistente do Ministério Público pode recorrer, inclusive extraordinariamente, na ação penal, nos casos dos arts. 584, §1º e 598 do Código de Processo Penal, e a segunda afirma que o prazo para o assistente recorrer, supletivamente, começa a correr imediatamente após o transcurso do prazo do Ministério Público, o que reforça o caráter de parte contingente, adjunta ou adesiva que caracteriza a natureza jurídica do assistente.


Finalmente, cumpre discorrer sobre a intimação do assistente. Uma vez habilitado deve ser intimado (ou notificado) dos atos processuais, para que se possa dar o direito de plena interação. Contudo, uma vez notificado de determinado ato deverá comparecer, sob pena de prosseguimento do feito sem novas notificações. Somente escapará de tal conseqüência se comprovar a motivação de força maior para a falta (CPP, art. 271, §2º). A intimação (e notificação) do assistente seguirá o procedimento inserto no art. 370, §1º.


2. Atos processuais


O exame dos sujeitos processuais, efetuado alhures, é uma apreciação subjetiva do processo. Já a análise dos atos processuais constitui, por seu turno, um estudo do feitio objetivo, dos atos que impulsionam o Processo Penal.


O exame dos atos processuais de forma aprofundada torna-se inviável aqui, uma vez ser tema vastíssimo. Dessa forma, concentrar-se-á nos atos de comunicação, mais especificamente na citação, na intimação e na notificação, bem como nas formas em que podem ocorrer (cartas precatória e rogatória), assim também uma breve passagem pelas Cartas de Guia e de Ordem.


2.1. Citação


A citação, segundo as palavras do jurista Guilherme de Souza Nucci:


“É o chamamento do réu a juízo, dando-lhe ciência do ajuizamento da ação, imputando-lhe a prática de uma infração penal, bem como oferecendo-lhe a oportunidade de se defender pessoalmente e através de defesa técnica. Trata-se de um corolário natural do devido processo legal, funcionalmente desenvolvido através do contraditório e da ampla defesa[17]”.


A citação é a cientificação do réu, para que tome conhecimento da acusação e procure defender-se. Sem citação, não se realiza a relação processual e torna-se inútil a sentença, tratando-se de nulidade insanável[18] (CPP, art. 564, III, “e”, primeira parte). É ato do juiz e um direito constitucional do réu. Afinal, este tem a garantia da ampla defesa que abrange, dentre outros direitos, o de ter conhecimento amplo, pormenorizado e prévio dos fatos que lhe são imputados. Ao contrário dos demais atos de comunicação (notificação e intimação), que podem ser direcionados a várias pessoas, a citação tem um único destinatário: o acusado. Ninguém mais.


     Será pela citação pessoal do réu que se completará a formação da relação processual, iniciando-se o ônus de comparecer em juízo aos atos processuais que fora intimado, já na citação ficta (lei nº 9.271/96), as conseqüências serão outras, pois não comparecendo ocorrerá a suspensão do processo, e a suspensão do prazo prescricional.[19]


     Ao contrário da esfera civil, na qual a citação produz cinco efeitos materiais: interromper a prescrição e constituir em mora o devedor, e processuais: prevenir o juízo, litispendência e litigiosidade da coisa, no processo penal a citação tem apenas um efeito, qual seja, instauração de instância, com a vinculação do acusado à instância criminal.


O Processo Penal possui somente dois modos (ou espécies) de efetuar a citação: a real e a ficta. A real se dá diretamente na pessoa do próprio acusado (forma direta de comunicação). Também chamada de citação pessoal ou in facien. Pode ser:


por mandado, por oficial de justiça (art. 351);


por requisição ao preso (art. 360) – para apresentar-se em juízo no dia e hora designados, através do diretor do estabelecimento carcerário;


por requisição ao militar (art. 358) – através do seu chefe respectivo;


de funcionário público (art. 359) – citação ao servidor e notificação ao chefe da repartição para que este disponha de tempo para sua substituir;


do incapaz ou pessoa jurídica, na pessoa do seu representante legal;


por carta precatória (art. 353) – réu reside fora da sede do juízo da causa;


por carta rogatória – se réu estiver no estrangeiro, e;


por carta de ordem – citações determinadas pelo tribunal ao juiz monocrático


viva voz (lei 9.099/95).


A ficta ou editalícia, por sua vez, é concretizada por meio de editais, após exaurido os meios possíveis de citação pessoal (forma indireta de citação). Também chamada de citação presumida ou citatio editctalis, posto ser realizada por meio da imprensa, onde houver, e de afixação do edital na porta do juízo. A citação editalícia é forma indireta de comunicação processual, e funciona como providência anônima e excepcional, que somente se justifica diante da impossibilidade absoluta da cientificação pessoal, visando viabilizar a persecução penal. São os casos:


réu não for encontrado (art. 361) – esgotadas as diligências possíveis para localização da residência indicada pelo réu no feito ou durante o inquérito policial (15 dias);


réu se oculta (art. 362) – não comparece, nem constitui advogado, o processo e a prescrição ficam suspensos. Prazo menor em caráter punitivo indicado pelo legislador (5 dias);


residência é inacessível (art. 363) – prazo fixado de acordo com as circunstâncias (15 à 90 dias);


incerta a pessoa acusada – cuida-se de alguém que o nome e endereço não estão suficientemente claros para citação pessoal (30 dias), e;


– réu no estrangeiro (art. 368) – afiançável ou não pode ser cumprida rogatória (30 dias).


Interesse perceber, na jurisprudência, as diferenças existentes, na mesma Corte, no que se considera o esgotamento das tentativas de citação pessoal. Enquanto alguns entendem que não é necessário o exaurimento das diligências para encontrar o réu, arrimado tão somente em declarações dos familiares de que aquele se encontra em local desconhecido[20], outros são inflexíveis em propugnar pela necessária busca exaustiva ao acusado antes de citá-lo por edital[21].


Citado por edital e não atendendo ao chamado o processo ficará paralisado. Assim, desde já, podemos enunciar os requisitos de suspensão do processo adiante analisados: citação por edital, acusado não comparece em juízo e não constitui advogado.


Diferentemente do que ocorre no processo civil, o processo penal não admite a citação por hora certa e por AR.


Do mandado de citação deve, imperiosamente, por exigência legal, constar os requisitos intrínsecos (art. 352) e extrínsecos (art. 357) da citação pessoal, sob pena de nulidade.


2.1.1. Citação do preso


     Deverá ser sempre pessoal (CPP, art. 360). Estando preso na mesma comarca do juízo processante, será mediante mandado. Neste caso, também oficia-se ao diretor do presídio requisitando a apresentação do preso. Caso este esteja custodiado em outra comarca, a citação será levada a efeito mediante precatória.


2.1.2. Citação do Funcionário Público


      Em nada difere, em sua essência, da citação regular. Será feita mediante mandado ou precatória, conforme o caso, observadas as exigências legais. Apenas um detalhe: o chefe da repartição do acusado também será notificado do fato, para que, na data designada, promova a substituição necessária, visando não prejudicar a continuidade do serviço público com a falta de um funcionário.


2.1.3. Citação do militar


     Novamente mantém, em seu âmago, os requisitos da citação geral. Poderá ser feita mediante mandado ou precatória, dependendo da localização do citando. Aqui, também, existe a necessidade de informar ao superior hierárquico do fato, mediante ofício, para que o ato processual se materialize por seu intermédio (CPP, art. 358). Não é uma regra que contém privilégios, mas que visa manter a disciplina e hierarquia típicas do serviço militar. Devem ser observados os requisitos intrínsecos e extrínsecos da citação.


2.1.4. Revelia


     No Processo Civil, quando o réu é revel, a regra é tomar as alegações feitas pelo Autor na inicial como verdadeiras, com a conseqüente procedência do pedido, com base na presunção de veracidade que reveste a exposição da peça inicial. Se tal procedimento fosse adotado no processo penal, sempre que o acusado fosse revel ter-se-ia que considerá-lo culpado, implicando em sua condenação. Contudo, a simples idéia de assim proceder ofenderia a todos os princípios constitucionais atinente ao Direito Penal e Processual Penal, mormente os do devido processo legal e presunção de inocência.


     Para sem compreender as conseqüências da revelia no Processo Penal mister estudar seu conceito. Walberto Fernandes de Lima bem delimita sua acepção quando aduz que a revelia é:


“uma penalidade processual ao réu que descumpriu suas obrigações para com o processo, o qual, em razão dessa revelia, perde o direito de receber as cientificações para os atos do processo, sendo plenamente válidos aqueles que foram praticados na sua ausência[22]”.


     Como se vê, a revelia é uma sanção apenas processual, não atingindo de forma alguma o direito material, em confissão ficta. Apesar de não se poder presumir culpa pela revelia, ela não impede que se julgue o mérito da causa (no tribunal do júri, o não comparecimento arrimado em justa causa impede o julgamento – CPP, art. 451, caput).


     Assim, a revelia ocorre quando o acusado, apesar de regularmente citado (seja por mandado, precatória, rogatória, etc.) não comparece perante a autoridade que o convoca, no dia e hora designados. Contudo, existem casos em que o réu está plenamente impossibilitado de comparecer, e a sanção processual – a decretação da revelia e a conseqüente perda do direito de receber intimações e notificações – acarreta em nulidade processual por violação ao direito de defesa. Pense-se, por exemplo, no réu preso. Se o próprio Estado o segrega não pode puni-lo por suas ausências em atos do processo[23].


     Regra importante a respeito da revelia veio com a mudança ocorrida no art. 366 do CPP, que trata da citação por edital. Citada modificação será analisada no tópico seguinte.


2.1.4.1. Alteração do art. 366 do CPP


     A lei 9.271/96 deu a seguinte redação ao art. 366, CPP:


Art. 366. Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312.


§ 1° As provas antecipadas serão produzidas na presença do Ministério Público e do defensor dativo.


§ 2° Comparecendo o acusado, ter-se-á por citado pessoalmente, prosseguindo o processo em seus ulteriores atos. (Redação altera “caput” e acrescenta parágrafos no art. 366, dada pela Lei n° 9.271, de 17 de abril de 1996, publicada no DOU, de 18 de abril de 1996, pág. 6533).


     Esta alteração legislativa fez surgir dois questionamentos: a) em caso de não comparecimento do réu, o prazo prescricional poderá ficar suspenso por quanto tempo?; e b) esta lei se aplica aos delitos cometidos antes de sua vigência?


     Ambas as dúvidas já foram respondidas pela jurisprudência, o que, contudo, não fez cessar a polêmica que incide sobre elas. Quanto à primeira questão, Paulo Rangel[24] elucida que existem 5 (cinco) posicionamentos: I) como a lei não estabelece tempo, o termo final do prazo suspensivo ocorre na data em que o réu comparece em juízo; II) deve ser levado em consideração o mínimo da pena cominada em abstrato para o crime; III) incide o limite máximo da prescrição previsto no CP, ou seja, 20 anos (CP, art. 109, I); IV) leva-se em conta o tempo máximo previsto para a pena privativa de liberdade, qual seja, 30 (trinta) anos; e V) a suspensão do processo se dará, no máximo, pelo prazo prescricional regulada pela maior pena in abstracto, consoante a regra do art. 109, CP.


     A mais abalizada doutrina é unânime em apontar a última corrente como a mais correta. Tomando partido, assevera Paulo Rangel:


“Entendemos que o prazo máximo de suspensão do processo e do curso do prazo prescricional deve ser o prazo estipulado pelo legislador para que haja a perda do direito de punir pela sua prescrição. Se o legislador exige um prazo para que um delito seja punido, nada mais justo que este prazo regule também a suspensão comentada. Do contrário, criaríamos a imprescritibilidade sem autorização constitucional (cf. art. 5º, XVLL c/c XLIV c/c art. 53, §2º, todos da CRFB), pois, sempre que um crime é imprescritível ou tem seu prazo prescricional suspenso, o legislador constitucional diz expressamente e, no caso de suspensão, estabelece prazo[25]”.


     Walberto Fernandes de Lima, por sua vez, salienta:


“(…) o art. 266 do CPP, na parte em que autorizou a suspensão do prazo prescricional, deve ser interpretado como norma vinculante do direito positivo, entendendo-se que o mencionado prazo de suspensão da prescrição não é eterno, e suas balizas devem ser encontradas na doutrina e na jurisprudência.


A própria palavra suspensão (substantivo feminino), etimologicamente, traz em si a idéia de algo temporário, passageiro, transitório, isto é, não duradouro.


Suspensão que não seja provisória, temporária, não é suspensão, é perpetuação.


(…)


Melhor parece que a suspensão do prazo prescricional deva obedecer à racionalidade da combinação entre a pena em abstrato com o prazo da prescrição antes de transitar em julgado a sentença final (art. 109 do CP)” [26].


De fato, a controvérsia acerca do assunto é grande. Tanto que os tribunais superiores – como sói acontecer em matéria penal – possuem entendimento diferenciado. Enquanto o STJ[27] assume o mesmo posicionamento de Paulo Rangel, o STF adota outra inteligência, considerando constitucional a suspensão ad infinitum do processo[28], definindo a questão (ao menos temporariamente).


     Outro aspecto diz respeito à retroatividade da norma. Tendo em vista o benefício que garante – a suspensão do processo – muitos têm defendido sua retroatividade. Ocorre, todavia, que também traz um malefício: a suspensão do prazo prescricional. Sendo assim, o ponto nevrálgico reside na possibilidade de retroagir o aspecto benéfico e, ao mesmo tempo, irretroagir o feitio gravoso. É possível adotar tal solução?


     O STJ possui entendimento consolidado sobre o assunto no sentido de ser impossível cindir a lei. Ou ela retroage de modo completo ou não. Uma vez que traz uma índole claramente desfavorável ao réu, qual seja, a suspensão do prazo prescricional, firmou-se a tese de que não deve retroagir. A jurisprudência é vastíssima[29]. O STF assume idéia convergente[30].


2.2. Intimação e Notificação (arts. 370-372)


     Já se tornou praxe na doutrina afirmar – e com razão – que o Código de Processo Penal não efetuou a necessária distinção existente entre intimação e notificação, tratando-as como institutos afins. Com o rigor conceitual que toda ciência exige, imperioso traçar as diferenças entres elas.


     Notificar é o ato de levar um fato ao conhecimento de uma pessoa, de informá-la a respeito de ato realizado ou a efetuar-se em juízo, ou de ordem emanada dele para que faça ou deixe de fazer o que está especificado no mandado. Simplesmente, é o chamamento para um ato a ser realizado (ato futuro).


     A intimação é um ato de comunicação processual dirigido às partes ou a qualquer outra pessoa que deva, de alguma forma, intervir na relação processual. Ou seja, é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos ou termos do processo, para que se faça ou deixe de fazer alguma coisa. Intimação, simplesmente, é a ciência dada à parte de um ato já realizado (ato passado).


     Assim, estampa-se a distinção entre intimação e notificação. Enquanto aquela diz respeito a um ato pretérito, visando informar a pessoa de algo já ocorrido, esta está voltada para o futuro, colimando dar ciência de ato ainda a ser realizado. Exemplificando, intima-se de uma decisão judicial, enquanto que se notifica uma testemunha ou um perito para depor.


Ainda que superficialmente, cumpre analisar os pressupostos do ato de comunicação (citação, intimação e notificação) que basicamente são: a) a previsão legal do ato de comunicação; b) a relação jurídica processual perfeitamente constituída. De outro lado, os requisitos são: a) o Estado-Juiz (emissor da mensagem); b) o receptor (réu, autor, perito, testemunha etc.) da mensagem; c) o conteúdo da mensagem, ou seja, o ato processual que foi realizado ou que será realizado; e d) o instrumento processual utilizado para fazer a comunicação, isto é, se foi carta precatória, ou carta rogatória, ou AR, ou e-mail etc.


Quanto aos fundamentos dos atos de comunicação, singelamente são os seguintes: a) o princípio da publicidade, b) o princípio da ampla defesa, c) o princípio do devido processo legal, d) o princípio do contraditório, e) o princípio da motivação das decisões, f) o princípio democrático de Direito.


     Pois bem. A intimação poderá se realizar, em regra, através da expedição de mandado (se o destinatário residir na comarca do Juízo processante), de carta precatória ou rogatória (se residir fora) e de ofício requisitório (no caso da pessoa intimada estar presa ou ser militar).


     Nas intimações (e notificações também) dos réus, testemunhas e demais pessoas que devam tomar conhecimento de qualquer ato do processo, é de ser observado, no que for aplicável, o disposto no capítulo das citações, por força do art. 370, CPP. Tratando-se de defensor constituído, do advogado do querelante e do assistente de acusação, a intimação é feita por publicação no órgão incumbido da publicidade dos atos judiciais da comarca, quando se deve incluir, sob pena de nulidade, o nome do acusado, além do número do processo, do nome do advogado e o teor do despacho do Juiz; se não houver tal órgão, a intimação far-se-á diretamente pelo escrivão, por mandado, pelo correio (com aviso de recebimento) ou através de qualquer outro meio idôneo, tudo em conformidade com o art. 370, §§ 1º, 2º e 3º, CPP.


     Tratando-se de Ministério Público e Defensor dativo, a intimação será sempre pessoal (CPP, art. 370, §4º). Observa-se que já decidiu o STF que:


“a teor do disposto no § 5º. do art. 5º. da Lei nº. 1.060/50, acrescido por força da Lei nº. 7.871/89, ‘nos Estados onde a Assistência Judiciária seja organizada e por eles mantida, o Defensor Público, ou quem exerça cargo equivalente, será intimado pessoalmente de todos os atos do processo, em ambas as instâncias, contando-se-lhes em dobro todos os prazos’. A Lei nº. 8.701/93, no que conferiu nova redação à norma geral do artigo 370 do Código Penal, não teve o condão de revogar o citado preceito porque de natureza especial” (HC 70.520-1-RS, DJU 04/02/94, p. 911.).


     A lei orgânica do Ministério Público, Lei nº. 8.625/93, também estabelece, no art. 41, IV, constituir prerrogativa do membro da Instituição receber intimação pessoal em qualquer processo e grau de jurisdição, através da entrega dos autos em vista, ou seja, necessário e imprescindível é que o escrevente ou o próprio escrivão dê ao interessado ciência do ato processual que deve conhecer (…), não se exigindo, “porém, a averbação do ‘ciente’ do Ministério Público quando intimado seu representante, bastando que se certifique nos autos a sua cientificação[31].


Quando se tratar de intimação de funcionários públicos, a expedição do respectivo mandado deve ser imediatamente comunicada ao chefe da repartição em que servirem, com a indicação do dia e da hora marcados (art. 221, § 3º, CPP). Quanto ao jurado, caso não seja encontrado pelo oficial de justiça, estará devidamente intimado com a cópia do mandado deixada em sua residência, salvo se ele não estiver no respectivo município (art. 429, § 2º.)


A intimação poderá se realizar, ainda, diretamente pelo escrivão (art. 370, § 3º.), em audiência (art. 372) ou por despacho na própria petição em que for requerida, observando-se, neste último caso, os requisitos da intimação por mandado (art. 371), ou seja, o oficial de justiça deverá ler a petição e o despacho nela proferido, entregando a contrafé e certificando no verso da petição o cumprimento da diligência e das respectivas formalidades: substitui-se, apenas, o mandado pela petição.


A Lei nº. 9.800/99 inovou, permitindo a comunicação de atos processuais através da utilização do sistema de transmissão de dados e imagens tipo fac-símile ou outro similar (art. 3º.).


Por sua vez, a Lei nº. 9.099/95, fiel aos critérios por ela adotados da informalidade, da economia processual e da celeridade (art. 62), dispõe que nos Juizados Especiais Criminais a intimação (ou notificação) poderá ser efetivada através de via postal (com AR ou mediante entrega na recepção, se se tratar de pessoa jurídica ou firma individual), por oficial de justiça (independentemente de mandado ou carta precatória), na própria audiência, ou, ainda, por qualquer outro meio idôneo de comunicação, como, por exemplo, o telefone, tomando-se sempre as cautelas para que seja intimada a pessoa certa e para que esta tenha inequívoco conhecimento da finalidade de sua intimação, bem como do dia e hora da audiência a que deva estar presente[32].


     Ressalta-se, por fim, que as intimações das decisões de pronúncia e das sentenças obedecem às regras estabelecidas, respectivamente, pelos arts. 412 a 415 e 390 a 392; quanto aos acórdãos, a respectiva intimação deverá ser feita pela imprensa oficial, salvo as hipóteses das intimações pessoais.


     Caso interessante diz respeito à intimação de audiência de oitiva de testemunha por carta precatória. A lamentável prática forense é no sentido de ser desnecessária a intimação da defesa sobre a data da audiência, bastando cientificá-la da expedição da precatória. Vide-se, neste sentido, a Súmula 273 do STJ[33].


     No STF a questão ainda permanece controvertida. Existem julgados concordando com a desnecessidade de intimação da data da audiência, considerando que o advogado constituído tem o dever de acompanhar o cumprimento da carta precatória, e outras, doutra banda, asseverando a exigência constitucional de ciência da data da audiência[34]. Dispensável dizer que este último posicionamento, indubitavelmente, é o mais escorreito em concento com o espírito constitucional.


     Por fim, impende discorrer, ainda que minimamente, sobre as nulidades decorrentes da falta de intimação (aqui abarcando a notificação) no processo penal.


     Tendo em vista os princípios que são efetivados com os atos de comunicação, e com os direitos e garantias que se pretendem defender, na maioria dos casos a falta de intimação acarreta nulidade absoluta, portanto insanável.


     Em muitos casos, a intimação se faz necessária mesmo que tenha sido decretada a revelia do réu. Se, p. ex., posteriormente ele vier a ser preso. Neste sentido: Declarada a revelia do acusado, nulo será o processo se, vindo mesmo a ser preso, não vier a ser requisitado para o interrogatório e para assistir aos atos de instrução (RTDTACrimSP, 1/188).


     Apenas tecendo breves considerações sobre as nulidades nas intimações, de ver que podem ser relativas e absolutas. Serão relativas quando faltar intimação do réu para sessão de julgamento pelo júri, quando a lei não permitir a revelia (art. 564, III, g), ou quando faltar intimação das testemunhas arroladas no libelo e na contrariedade, conforme a lei (art. 564, II, h). Doutra banda, serão absolutas se não houver a inclusão do nome do acusado nas intimações feitas aos advogados pela imprensa, só sanável pelo art. 570. (art. 370, §1º) ou mesmo se faltarem os mesmos requisitos das intimação para ciência de sentenças e despachos que cabem recurso, só sanável pela via do art. 570 (art. 564, III, o).


2.3. Carta Precatória


      A precatória é um modo de facilitação da concretização dos atos processuais de comunicação, tais como citação, intimação e notificação. É utilizada quando àquele a que se quer dar ciência de certo ato se encontra em território nacional, mas fora do jurisdição do juiz processante. Como se utiliza a forma de carta se diz “Carta Precatória”. É também, um ato de cooperação entre juízes de mesmo grau hierárquico, que pedem entre si a prática de certos atos que os próprios não podem efetivar.


     Mediante precatória se poder citar (CPP, art. 353), inquirir testemunhas (CPP, art. 222), acareá-las (CPP, art. 230), nomear peritos (CPP, art. 177), dar ciência da prisão (CPP, art. 289), etc. Concentrar-se-á, aqui, no que respeita à citação.


     Far-se-á a citação por precatória quando o denunciado se encontrar em local fora da comarca do juízo processante. O procedimento é simples: o juízo deprecante expedirá a precatória ao juízo deprecado, instruída com todos os requisitos dos art. 354, CPP. O juízo deprecado, então, mandará cumprir, cabendo ao escrivão expedir o mandado, observados os arts. 352 e 357, CPP, e entregará ao Oficial de Justiça. Uma vez cumprida, a precatória retornará ao juízo de origem.


     Algumas hipóteses podem acontecer.


– o réu está em outra comarca: remeter-se-á a precatória para a comarca respectiva para o cumprimento da diligência (diz-se, então, “precatória intinerante”);


– o réu se encontra em lugar incerto e não sabido: a precatória retornará ao juízo deprecante e o réu será citado por edital (CPP, art. 631), e;


– o réu retornou ao juízo deprecante: a precatória será devolvida a este juízo e a citação será realizada mediante mandado (CPP, art. 351).


     Discute-se a possibilidade de realização de interrogatório mediante precatória. Cediço que o CPP não prevê tal situação, e é de todo aconselhável que o próprio juízo processante efetue o interrogatório do réu, posto que, em regra, é o mesmo que irá sentenciar. A jurisprudência tem admitido, contudo, a possibilidade de interrogatório por precatória, como forma de economia processual e financeira, além de atender aos ditames da realidade (a extensão territorial do país), desde que não haja prejuízo para o réu. É a submissão do direito pressuposto ao direito posto.


     Como última consideração, nos casos em que se utiliza a precatória para intimar a respeito da sentença, o prazo recursal começa a fluir da juntada aos autos da precatória, e não da efetiva intimação. É o entendimento pacífico do STJ[35].


2.4. Carta Rogatória


      Assim como a carta precatória é uma forma de cooperação entre juízos distintos, com a solicitação da prática de certos atos processuais, a carta rogatória possui natureza semelhante, mas o auxílio mútuo não se dá entre comarcas diferentes de uma mesmo Estado-nação, mas entre nações diferentes[36]. E se consubstancia na única forma de um país praticar no Brasil, em outra nação, os atos processuais necessários sem ferir a soberania do juízo rogado[37]. A recíproca é verdadeira.


     É utilizada com mais freqüência para efetuar a citação de acusados residentes em outros países (CPP, art. 368), desde que o paradeiro seja conhecido, com suspensão do prazo prescricional até seu cumprimento. Aqui existe discussão semelhante à do art. 366, CPP. Damásio de Jesus[38] opina pela solução remansosa da doutrina, qual seja, o prazo de tal suspensão não é ad eternum, mas aquele que, levando em conta a pena em abstrato, estipula o art. 109, CP. Mas o STF já decidiu, em caso semelhante, pela suspensão por tempo indeterminado.


     Embora seja muito utilizada para efetuar citações, nada impede que os demais atos de comunicação processual sejam realizados via rogatória, desde que não violem a ordem pública ou a soberania nacional[39].


     O STJ, ex vi o art. 105, I, “i”, da Constituição Federal, possui competência exclusiva para apreciar a concessão de exequatur das Cartas Rogatórias passivas, isto é, as requeridas por juiz estrangeiro para cumprimento no Brasil, competência que anteriormente pertencia ao STF, cuja alteração veio com a Emenda Constitucional nº. 45, que reformulou o judiciário.


     Antecipando-se às suas novas responsabilidades, a Presidência do STJ editou a Resolução nº 22, em 31.12.2004, sujeitando tais feitos, transitoriamente, aos ritos previstos no Regimento Interno do STF para a homologação de sentença estrangeira (arts. 215 a 224) e cartas rogatórias (arts. 225 a 229). A Resolução também cometeu à Corte Especial do STJ as competências atribuídas, no antigo regime, ao Plenário do STF (arts. 223, 219, § único, e 228 § único do RISTF).


     No que tange ao procedimento, o pedido de homologação – ajuizado pelo próprio interessado ou remetido por carta rogatória – será dirigido ao Vice-Presidente do STJ[40], que verificará sua regularidade formal (Arts. 218 e 219 do RISTF c/c art. 37 da Lei 9.307/96 ou art. IV da Convenção de Nova York) e, se for o caso, mandará citar o requerido para, em 15 dias, contestá-lo (art. 220 do RISTF). Por ora, acha-se suspensa a cobrança de custas processuais nos novos pedidos, tendo em vista que o STJ não a prevê nos processos de sua competência originária (art. 3º da Resolução nº 22, de 31.12.2004 e art. 112 do RISTJ).


     Impugnado o pedido pelo requerido, pelo seu curador especial (em caso de revelia) ou pelo Procurador-Geral da República, a homologação deixará a Vice-Presidência do STJ e será distribuída a um dos Ministros integrantes da Corte Especial[41]. Esta Corte é integrada pelo Presidente do STJ, pelo Vice-Presidente e pelo Coordenador-Geral da Justiça – que, em razão de suas funções, estão excluídos dessa nova distribuição –, bem assim por 18 Ministros (6 de cada Seção: de Direito Privado, de Direito Público e de Direito Penal)[42].


     Segundo o juízo de mera delibação, adotado no reconhecimento de sentenças arbitrais estrangeiras tanto no direito interno como nas convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, a contestação ao pedido é limitada. Apenas poderá versar questões de forma (v.g, ausência de tradução juramentada – STF, SEC 6.689-1/Áustria) ou de regularidade da arbitragem (v.g., prova da convenção arbitral – STF, SEC 6.753-7/Reino Unido; ausência de citação do réu – STF, SEC 5.378-1/França), vedando-se a discussão de aspectos ligados ao mérito da sentença estrangeira, a não ser para estabelecer eventual afronta à ordem pública, à soberania nacional e aos bons costumes.


     Quanto aos recursos cabíveis contra decisões proferidas na homologação de sentença estrangeira, mencionem-se o agravo regimental – cabível contra decisões do Vice-Presidente do STJ ou do relator do processo – e os embargos de declaração – destinados ao esclarecimento de obscuridade ou contradição, ou, ainda, ao suprimento de lacuna na decisão. Assim, contra a homologação deferida singularmente pelo Vice-Presidente do STJ, a parte interessada poderá interpor o agravo regimental, o que devolverá a apreciação da matéria à Corte Especial do STJ, caso não reconsiderada a decisão pelo seu próprio prolator.


     O deslocamento, para o STJ, da competência para reconhecer sentenças arbitrais estrangeiras também cria a possibilidade de reapreciação da matéria pelo STF, em sede de recurso extraordinário, sempre que houver violação de norma constitucional ou declaração de inconstitucionalidade de um tratado ou lei federal.[21] Imagine-se a hipótese de, no processo de homologação, não se garantir ao requerido o direito de defesa (ainda que sujeita ao regime de contenciosidade limitada). Contra a decisão do STJ que eventualmente defira a homologação caberá, então, recurso extraordinário fundado na ofensa ao art. 5º, LV, da Constituição, que garante aos litigantes o contraditório e a ampla defesa. Todavia, além do juízo de admissibilidade exercido no tribunal a quo,[22] o recorrente deverá enfrentar, no STF, o desafio de demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no processo de homologação, como etapa adicional de admissão do recurso.[23]
             Este é o procedimento com relação às cartas rogatórias que chegam ao Brasil. O procedimento concernente às emitida pelo país está previsto no CPP, art. 783. A rogatória será remetida pelo respectivo juiz ao Ministro da Justiça que, mediante a intervenção diplomática, terá seu cumprimento solicitado às autoridades estrangeiras competentes.


2.5. Carta de Ordem.


     Conforme visto, a precatória é uma forma de colaboração entre juizes de mesma hierarquia, visando à prática de determinado ato. Quando se quer que certo ato seja praticado pela requisição de um magistrado de hierarquia superior a um de hierarquia inferior, fala-se em Carta de Ordem.


     Esta nada mais é que o chamamento ao processo de réu, nas ações penais originárias de competência do Tribunal, de réu detentor de foro especial por prerrogativa de função. O Relator ordena ao magistrado de 1º grau que possui competência territorial sobre o réu sua citação.


2.6. Carta de Guia.


     Ao contrário das demais cartas acima referidas, a Carta de Guia tem uso exclusivo na fase de execução da pena, quando a sentença condenatória já transitou em julgado. A carta, extraída dos autos pelo escrivão e assinada pelo juiz, destina-se a encaminhar o réu à prisão, para cumprimento de sentença ao diretor do estabelecimento penal (art. 674). Seus requisitos estão previstos no art. 676, CPP.


     O Diretor do estabelecimento prisional passará recibo da carta de guia – recibo este conhecido como guia de recolhimento – para juntar-se aos autos do processo (CPP, art. 678).


     A carta de guia será registrada em livro especial, devendo constar de seu bojo todas as informações necessárias ao preso respectivo (CPP, art. 679).


3. Observações críticas


Por tudo o que foi apresentado nesta obra, podemos observar, principalmente das transcrições do Código do Processo Penal Brasileiro, que o grau de democracia alcançado pelo nosso país, tendo em conta a nossa legislação criminal, é de relevância, embora ainda pairem alguns resquícios de arbitrariedade, principalmente quando tratamos das funções dos juizes e dos acusadores no processo.


Outrossim, podemos também observar que é um largo descompasso entre o texto da lei adjetiva criminal e os anseios e dicções da Constituição Federal do 1988. Em suma, interpretando a Constituição à luz de seus princípios fundamentais, podemos crer que o sistema acusatório puro é buscado a todo momento, embora ainda pairem sob o enfoque da legalidade alguns dispositivos de constitucionalidade duvidosa no nosso CPP.


Podemos expor que o grau de democracia atingido pelo nosso Processo Penal é satisfatório, em termos de legislação, embora na prática a realidade seja complemente distinta.


Conclusão


Eis que, ainda que de forma superficial, conseguimos expor rapidamente os institutos propostos. Perpassamos pelos sujeitos que efetivamente atuam no Processo Penal, até chegarmos aos atos de comunicação a ele pertinentes, sempre expondo os dispositivos de relevância dentro do nosso ordenamento jurídico.


Outrossim, não olvidamos o momento de expor a nossa crítica ao sistema acusatório mitigado existente hoje no nosso país, de acordo com as proposições iniciais desse trabalho.


De fato, ainda temos muito a evoluir na ceara criminal, mas cremos que o caminho que está sendo percorrido, principalmente a partir da nossa Carta Magna de 1988, é o correto para que possamos chegar a um grau concreto de democracia através da nossa lei penal.




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Notas:


[1] Encarada aqui como sinônimo de Estado.

[2] DURÃO, Pedro. Sujeitos Processuais. Disponível em: http://www.viajuridica.com.br. Acesso em 02 de dezembro de 2007.

[3] PACELLI,, Eugênio de Oliveira. Curso de Processo Penal. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 382.

[4] CARVALHO, Kildare Gonçalves. Direito Constitucional. 10 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2004, p. 683.

[5] PACELLI, Eugênio de Oliveira. Curso de Processo Penal. 7 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 386.

[6]RHC – CONSTITUCIONAL – PROCESSUAL PENAL – MINISTÉRIO PÚBLICO – PROMOTOR NATURAL. O Promotor ou o Procurador não pode ser designado sem obediência ao critério legal, a fim de garantir julgamento imparcial, isento. Veda-se, assim, designação do Promotor ou Procurador ad hoc no sentido de fixar prévia orientação, como seria odioso indicação singular de magistrado para processar e julgar alguém. Importante, fundamental é prefixar o critério de designação. O réu tem o direito público, subjetivo de conhecer o órgão do Ministério Público, como ocorre o com o juízo natural. No mesmo sentido: RHC 16.144/MA, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 22.02.2005, DJ 25.04.2005 p. 362.

[7](…) O postulado do Promotor Natural que se revela imanente ao sistema constitucional brasileiro, repele, a partir da vedação de designações casuísticas efetuadas pela Chefia da Instituição, a figura do acusador de exceção. Esse princípio consagra uma garantia de ordem jurídica, destinada tanto a proteger o membro do Ministério Público, na medida em que lhe assegura o exercício pleno e independente de seu ofício, quanto a tutelar a própria coletividade, a quem se reconhece o direito de ver atuando, em quaisquer causas, apenas o Promotor cuja intervenção se justifique a partir de critérios abstratos e pré-determinados, estabelecidos em lei. A matriz constitucional desse princípio assenta-se nas cláusulas da independência funcional e da inamovibilidade dos membros da instituição. O postulado do Promotor Natural limita, por isso mesmo, o poder do Procurador-Geral que, embora expressão visível da unidade institucional, não deve exercer a chefia do Ministério Público de modo hegemônico e incontrastável.

[8] CRIMINAL. RMS. PENAL E PROCESSUAL. CRIME CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA. ATOS INVESTIGATÓRIOS PRATICADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. POSSIBILIDADE. LEI Nº 10.174/01. RETROATIVIDADE. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO E FISCAL. PROTEÇÃO NÃO ABSOLUTA. DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA NA NECESSIDADE DA MEDIDA PARA A INVESTIGAÇÃO CRIMINAL. PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO. RECURSO DESPROVIDO. O entendimento consolidado desta Corte é no sentido de que são válidos, em princípio, os atos investigatórios realizados pelo Ministério Público. A interpretação sistêmica da Constituição e a aplicação dos poderes implícitos do Ministério Público conduzem à preservação dos poderes investigatórios deste Órgão, independentemente da investigação policial. O Supremo Tribunal Federal decidiu que a vedação dirigida ao Ministério Público é quanto a presidir e realizar inquérito policial. Esta Corte tem se orientado pela possibilidade de retroação da Lei 10.174/01, para atingir fatos geradores verificados anteriormente à sua vigência. A proteção aos sigilos bancário e fiscal não é direito absoluto, podendo ser quebrado quando houver a prevalência do direito público sobre o privado, na apuração de fatos delituosos ou na instrução dos processos criminais. Precedentes. Recurso desprovido. (RMS 17.884/SC, 5ª Turma, Rel. Ministro Gilson Dipp, DJ 19.12.2005).

[9]RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. NÚCLEO DE INVESTIGAÇÃO CRIMINAL E CONTROLE EXTERNO DA ATIVIDADE POLICIAL/DF. PORTARIA. PUBLICIDADE. ATOS DE INVESTIGAÇÃO. INQUIRIÇÃO. ILEGITIMIDADE. 1. PORTARIA. PUBLICIDADE A Portaria que criou o Núcleo de Investigação Criminal e Controle Externo da Atividade Policial no âmbito do Ministério Público do Distrito Federal, no que tange a publicidade, não foi examinada no STJ. Enfrentar a matéria neste Tribunal ensejaria supressão de instância. Precedentes. 2. INQUIRIÇÃO DE AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. ILEGITIMIDADE. A Constituição Federal dotou o Ministério Público do poder de requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (CF, art. 129, VIII). A norma constitucional não contemplou a possibilidade do parquet realizar e presidir inquérito policial. Não cabe, portanto, aos seus membros inquirir diretamente pessoas suspeitas de autoria de crime. Mas requisitar diligência nesse sentido à autoridade policial. Precedentes. O recorrente é delegado de polícia e, portanto, autoridade administrativa. Seus atos estão sujeitos aos órgãos hierárquicos próprios da Corporação, Chefia de Polícia, Corregedoria. Recurso conhecido e provido (STF, RHC 81326/DF, Relator(a): Min. NELSON JOBIM, Órgão Julgador: Segunda Turma, Julgamento: 06/05/2003).

RECURSO EXTRAORDINÁRIO. MINISTÉRIO PÚBLICO. INQUÉRITO ADMINISTRATIVO. INQUÉRITO PENAL. LEGITIMIDADE. O Ministério Público (1) não tem competência para promover inquérito administrativo em relação à conduta de servidores públicos; (2) nem competência para produzir inquérito penal sob o argumento de que tem possibilidade de expedir notificações nos procedimentos administrativos; (3) pode propor ação penal sem o inquérito policial, desde que disponha de elementos suficientes. Recurso não conhecido (STF, RE 233072/RJ, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Relator(a) p/ Acórdão: Min. NELSON JOBIM, Órgão Julgador: Segunda Turma, Julgamento: 18/05/1999).

[10]O réu tem o direito de escolher o seu próprio defensor. Essa liberdade de escolha traduz, no plano da persecutio criminis, específica projeção do postulado da amplitude de defesa proclamado pela Constituição. Cumpre ao magistrado processante, em não sendo possível ao defensor constituído assumir ou prosseguir no patrocínio da causa penal, ordenar a intimação do réu para que este, querendo, escolha outro advogado. Antes de realizada essa intimação – ou enquanto não exaurido o prazo nela assinalado – não é lícito ao juiz nomear defensor dativo sem expressa aquiescência do réu. (STF, HC 67.755/SP, 1º Turma, Rel. Min. CELSO DE MELLO, RTJ 142/477).

[11] Súmula 523/STF: No processo penal a falta de defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.

[12] HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA. CAUSAS CRIMINAIS. Em ação de cobrança contra o Estado do Rio Grande do Sul, o autor nomeado defensor dativo em vários processos-crimes de réus pobres, onde o Estado não possuía Defensoria Pública, faz jus a honorários. O Supremo Tribunal Federal, em decisão plenária, no RE 103.950-7/SP entendeu cabível o pagamento pela Fazenda Nacional da verba honorária aos advogados nomeados pelo Juiz. Recurso provido para restabelecer a sentença de primeiro grau (REsp nº 26.644-4/RS, Rel. Min. Garcia Vieira, 1ª Turma, RSTJ 46/340).

[13]Defesa. Advogado. Nomeação de defensor dativo sem a prévia intimação do patrono constituído. Prejuízo para a defesa. Nulidade. Sendo certo que o paciente vinha sendo defendido por advogado de sua livre escolha durante a fase inquisitorial, não podia o Juiz nomear-lhe outro, dativo, na fase judicial, sem que antes fosse intimado o defensor constituído para atuar no feito… (STJ, HC 11.828/PR, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, julg. em 02/03/2000, DJ 03/04/2000).

[14](…) A prerrogativa da intimação pessoal do defensor público ou dativo da data de sessão de julgamento do recurso de apelação não se estende ao patrono constituído pelo réu. Descabida a alegação de nulidade por cerceamento de defesa, pois, nos termos do art. 370 do CPP, não há necessidade de intimação pessoal de defensor constituído, sendo bastante a comunicação da data do julgamento do recurso via Imprensa Oficial. (…). Ordem denegada. (HC 60.043/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 19.10.2006, DJ 20.11.2006 p. 351).

[15] Há uma exceção: crimes contra as relações de consumo, nos quais se permite a assistência de pessoas jurídicas de direito público, consoante arts. 80 e 82, III E IV, da lei 8.078/90.

[16]Súmula 208/STF: O assistente do Ministério Público não pode recorrer, inclusive extraordinariamente, da decisão concessiva de habeas corpus.

[17]NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal comentado. 3 ed. São Paulo, RT, 2004, p.597.

[18]A citação é o canal de comunicação aberto pelo Estado-juiz em direção ao acusado para noticiá-lo da existência de uma imputação e convocá-lo a contrariá-la. Tal comunicação, que se traduz num dos enfoques do princípio constitucional do contraditório, deve ser efetiva, inquestionável, induvidosa. Por isso, está cercada de formalidades que não podem ser postergadas. A comunicação falha, deficiente, bloqueada, corresponde à falta de comunicação e vicia de modo incurável o processo (TACrimSP, HC 119.796, RT 578/364).

[19] Grinover, Ada Pellegrini. Nulidades do Processo Penal. 6 ed. ver. amp. e atual. São Paulo: RT, 1997, p. 102.

[20](…) Não é certo afirmar que o Juiz condutor tenha que exaurir todas as diligências possíveis para que seja permitida a citação por edital, pois as declarações de entes próximos aos acusados, dando notícia do incerto e não sabido paradeiro, mostraram ser a forma editalícia não só a única cabível, mas também a única eficiente. (HC 30.821/PE, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 18.03.2004, DJ 19.04.2004 p. 219).

[21]RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. CITAÇÃO POR EDITAL. NÃO EXAURIMENTO DOS MEIOS DE LOCALIZAÇÃO DO ACUSADO. CERCEAMENTO DE DEFESA. NULIDADE ABSOLUTA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. 1. É nula a citação por edital quando consta de auto de prisão em flagrante dois endereços para contato e o oficial de justiça procura o acusado em apenas um deles, porquanto não se esgotaram todos os meios possíveis para sua localização. Precedentes. 2. Recurso provido para anular o processo a partir da citação, bem como o decreto de prisão preventiva baseado, somente, na suposta evasão da acusada do distrito da culpa, e, de ofício, declarar extinta a punibilidade da ora Recorrente em decorrência da prescrição da pretensão punitiva. (REsp 684.811/MG, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 09.08.2005, DJ 05.09.2005 p. 469).

[22] LIMA, Walberto Fernandes de. Sujeitos e atos processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 238.

[23]É intolerável que se dê como em lugar incerto e não sabido alguém que o próprio Estado detém, em um de seus presídios (RT 447/383). Nulo é o processo quando o denunciado, citado mediante edital, encontra-se preso em cumprimento de pena em outro juízo. Hábeas corpus concedido (STF, RTJ 44/83, abril de 1968).

[24]RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 12 ed. Rio de Janeiro: Lumen Júris, 2007, p. 683.

[25] Idem, p. 683.

[26] LIMA, Walberto Fernandes de. Sujeitos e atos processuais. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004, p. 229.

[27]HABEAS CORPUS. CONTRAVENÇÃO PENAL. CITAÇÃO POR EDITAL. ART. 366 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. LIMITE. PENA MÁXIMA. PARÂMETROS DO ART. 109 DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE. ORDEM CONCEDIDA. 1. O entendimento pacificado nesta Corte é no sentido de que, diante do silêncio do art. 366 do Código de Processo Penal e da impossibilidade de tornar imprescritíveis crimes assim não definidos, quando o acusado, citado por edital, não comparece nem constitui advogado, devem ser utilizados os parâmetros do art. 109 do Código Penal para determinar o período de suspensão do prazo prescricional. 2. (…). (HC 24.986/RJ, Rel. Ministro PAULO GALLOTTI, SEXTA TURMA, julgado em 09.02.2006, DJ 18.12.2006 p. 519).

[28]Controle incidente de inconstitucionalidade: reserva de plenário (CF, art. 97). “Interpretação que restringe a aplicação de uma norma a alguns casos, mantendo-a com relação a outros, não se identifica com a declaração de inconstitucionalidade da norma que é a que se refere o art. 97 da Constituição..” (cf. RE 184.093, Moreira Alves, DJ 05.09.97). II. Citação por edital e revelia: suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, por tempo indeterminado – C.Pr.Penal, art. 366, com a redação da L. 9.271/96. 1. Conforme assentou o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ext. 1042, 19.12.06, Pertence, a Constituição Federal não proíbe a suspensão da prescrição, por prazo indeterminado, na hipótese do art. 366 do C.Pr.Penal. 2. A indeterminação do prazo da suspensão não constitui, a rigor, hipótese de imprescritibilidade: não impede a retomada do curso da prescrição, apenas a condiciona a um evento futuro e incerto, situação substancialmente diversa da imprescritibilidade. 3. Ademais, a Constituição Federal se limita, no art. 5º, XLII e XLIV, a excluir os crimes que enumera da incidência material das regras da prescrição, sem proibir, em tese, que a legislação ordinária criasse outras hipóteses. 4. Não cabe, nem mesmo sujeitar o período de suspensão de que trata o art. 366 do C.Pr.Penal ao tempo da prescrição em abstrato, pois, “do contrário, o que se teria, nessa hipótese, seria uma causa de interrupção, e não de suspensão.” 5. RE provido, para excluir o limite temporal imposto à suspensão do curso da prescrição. (STF, RE 460971/RS, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Órgão Julgador: Primeira Turma, Julgamento: 13/02/2007).

[29](…). 3. Em se cuidando de norma jurídica complexa dirigida a assegurar a efetividade do direito penal e a proteção do direito constitucional à ampla defesa, não há falar na incidência parcial retroativa do artigo 366 do Código de Processo Penal, evidenciando, como evidencia, a sua objetividade dupla, a complementaridade que vincula, indissociavelmente, a regra penal instrumental de suspensão do processo à regra penal material de suspensão da prescrição. (…) (HC 39.492/RJ, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA, julgado em 30.05.2006, DJ 04.09.2006 p. 329). No mesmo sentido: RHC 17.838/SP, Rel. Ministro JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 13.09.2005, DJ 03.10.2005 p. 288; e RHC 17.802/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 27.09.2005, DJ 07.11.2005 p. 310, entre muitos outros.

[30]Encerrando o art. 366 do CPP institutos umbilicalmente ligados e revelados e, normas instrumental e material, sendo a primeira (da suspensão do processo) favorável ao acusado, descabe a aplicação de tal dispositivo considerados delitos anteriores à lei 9.271/96, que imprimiu ao art. 366 do CPP nova redação. Precedentes HC 75.284/SP, 1ª Turma, Rel. Min. Carlos Velloso. Em idêntico sentido, a melhor doutrina: Tourinho Filho, CPP comentado, Júlio Fabbrini Mirabete, CPP Interpretado, e Damásio de Jesus, CPP Anotado (STF, HC 76.354-8, Rel. Min. Marco Aurélio, j. 10/03/98, DJU 17/04/98, p. 5).

[31] MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 7 ed. São Paulo: Atlas, 1996, p. 433.

[32]FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES, Luiz Flávio; GOMES FILHO, Antonio Magalhães; GRINOVER, Ada Pellegrini. Juizados Especiais Criminais, 3ª. ed., São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, p. 91.

[33] Súmula 273/STJ: Intimada a defesa da expedição da carta precatória torna-se desnecessária intimação da data da audiência no juízo deprecado.

[34]Devido processo legal. Carta precatória. Oitiva de testemunha de defesa. Intimação. O exercício do direito de defesa pressupõe a necessidade de intimação para a audiência designada, no juízo deprecado, visando à oitiva da testemunha. A formalidade é essencial à valia do ato, implicando, a falta de observação, a nulidade do processo. A ciência referente à expedição de carta precatória não a supre (STF, HC 73.822-2/PB, Rel. Min. Marco Aurélio, 2ª Turma, julg. Em 20/08/1996). In: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Manual de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 512. E ainda: RHC 79.917/RJ, 2ª Turma, Rel. Min. Marco Aurélio.

[35]RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO. PRAZO. INTIMAÇÃO. CARTA PRECATÓRIA. CONTAGEM. TERMO INICIAL. JUNTADA. 1. Na ocorrência de intimação do réu ou do seu defensor da sentença penal condenatória por meio de carta precatória, o termo inicial para a contagem do prazo recursal será da juntada da intimação cumprida aos autos, em virtude da aplicação analógica do art. 241, inciso IV, do Código de Processo Civil, nos termos do que dispõe o art. 3º, do Código de Processo Penal. 2. Recurso conhecido e provido. (REsp 565.580/SC, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ 5/4/2004).

RECURSO ESPECIAL. PROCESSO PENAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. INTIMAÇÃO POR PRECATÓRIA. APELAÇÃO. PRAZO. CONTAGEM. O prazo para a interposição da apelação – quando o réu ou seu defensor é intimado da sentença condenatória por meio de carta precatória – é contado a partir da juntada daquela peça aos autos, e não da data da efetiva intimação. (REsp 168.369/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA, Quinta Turma, DJ 3/5/1999).

[36](…). – O procedimento da carta rogatória é revestido do caráter de mútua cooperação e reciprocidade entre países, a incumbir à Justiça rogada o dever de proceder da melhor forma possível na requisição formulada pelo Juízo rogante. (…). (AgRg na CR .571/EX, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, CORTE ESPECIAL, julgado em 06.06.2007, DJ 06.08.2007 p. 382).

[37]CARTA ROGATÓRIA. AGRAVO REGIMENTAL. ASSISTÊNCIA DIRETA. NECESSIDADE DE EXEQUATUR. – Ante o disposto no art. 105, I, “i”, da Lei Maior, a Suprema Corte considerou que a única via admissível para a solicitação de diligência proveniente do exterior é a Carta rogatória, que deve submeter-se previamente ao crivo do Superior Tribunal de Justiça (…). (AgRg na CR 2.484/EX, Rel. Ministro BARROS MONTEIRO, CORTE ESPECIAL, julgado em 29.06.2007, DJ 13.08.2007 p. 281).

[38] JESUS, Damásio E. de. Prescrição penal e rogatória não cumprida. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 192, 14 jan. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4596>. Acesso em 14 de dezembro de 2007, dispõe que: se um dos fundamentos da prescrição penal reside na inércia da autoridade, que não encerra o processo dentro dos prazos legais, impondo como castigo a extinção da punibilidade, a suspensão indefinida do prazo ofende o princípio da igualdade das partes. Permitindo-se a suspensão da prescrição sem limite temporal, esta, não cumprida a carta rogatória, jamais ocorreria, encerrando-se o processo somente com a morte do réu ou outra causa extintiva da punibilidade. Se o Estado perde, pelo decurso do tempo, a pretensão punitiva, não é lógico que, diante da expedição da rogatória não cumprida, pudesse exercê-la indefinidamente. Por isso, entendemos que deve ser adotada a mesma orientação sugerida em relação ao art. 366 do CPP: o limite da suspensão do curso prescricional, na hipótese do art. 368 do CPP, corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de liberdade imposta abstratamente ao delito. Assim, por exemplo, expedida carta rogatória em processo por crime cujo prazo prescricional da pretensão punitiva é de oito anos, o impedimento do curso prescricional tem o termo máximo de oito anos, i. e., o prazo prescricional da pretensão punitiva só pode ficar suspenso até oito anos. Nesse limite, recomeça a ser contado o lapso extintivo, que é de oito anos, computando-se o tempo anterior à suspensão. Se, para admitir a extinção da punibilidade pela prescrição, o legislador entendeu adequados os prazos do art. 109, da mesma forma devem ser apreciados como justos na disciplina do prazo da suspensão do decurso prescricional.

[39]AGRAVO REGIMENTAL. CARTA ROGATÓRIA. EXEQUATUR CONCEDIDO. IMPUGNAÇÃO REJEITADA. QUESTÕES DE MÉRITO. APRECIAÇÃO PELA JUSTIÇA ROGANTE. Observados os critérios objetivos e não atentando o pedido contra a ordem pública e a soberania nacional, concede-se o exequatur para inquirição de testemunha em processo criminal de competência da justiça estrangeira. Questões de mérito não comportam apreciação em sede de carta rogatória, ficando o exame a cargo da justiça rogante. Agravo regimental não provido. (AgRg na CR .733/EX, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, CORTE ESPECIAL, julgado em 19.12.2005, DJ 10.04.2006 p. 106).

[40] A competência do Presidente do STJ para tais feitos foi delegada ao Vice-Presidente pelo Ato n° 15, de 16.2.2005, publicado no D.J. de 18.2.2005.

[41] Art. 223 do RISTF c/c art. 1º, § único, da Resolução nº 22, de 31.12.2004. A Corte Especial equivale ao órgão especial previsto no art. 93, XI, da Constituição.

[42] Art. 2º, § 2º, do RISTJ.


Informações Sobre os Autores

Arthur Laércio Homci da Costa Silva

Mestre em Direitos Humanos pela UFPA. Professor de Teoria Geral do Processo e Direito Processual Civil da UNAMA e do Centro Universitário do Pará – CESUPA. Advogado.

Marcelo Rômeu de Moraes Dantas


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