A literatura jurídica costuma afirmar a existência de três espécies de paternidade: a biológica que se origina de congresso sexual entre os pais e que redunda na filiação consangüínea, baseada no matrimônio, na união estável, ou nas relações entretidas por pessoas impedidas de casar; a jurídica, que decorre da presunção resultante da convivência com a mãe; e socioafetiva, que se constitui em ato de opção fundado no afeto, e que teve origem jurisprudencial na denominada adoção à brasileira.
Na paternidade sociológica releva-se a posse do estado de filho, concebida como a exteriorização da condição de descendente reconhecida pela sociedade; e que a doutrina romana entendia sedimentar-se no nome, no tratamento público e na fama, todos apontando que a pessoa pertence a um núcleo familiar; e que não representa menoscabo à biologização, mas travessia para novos paradigmas derivados da instituição das entidades familiares.
Prevalece nela a visibilidade das relações, mostrando vínculo psicológico e social entre o filho e o suposto pai, um momento permanente de comportamento afetuoso recíproco, com tal densidade que torna indiscutível a filiação e a paternidade.
Costuma-se até sublinhar que a posse do estado de filho observa o princípio da aparência, oriunda do exercício das faculdades inerentes à linhagem, sustentada pela convicção de publicidade.
O fato é bastante comum, bastando referir os filhos de criação, onde, mesmo ausente algum elo biológico ou jurídico, os pais abrigam, criam, sustentam e educam criança ou adolescente, destinando-lhes carinho e amor, mesmo sem buscar a adoção.
Sabe-se que a paternidade biológica e jurídica é alcançada através da ação de investigação, em que, além de outra prova, a pretensão é pavimentada por exame genético entre os interessados, suficientes para alicerçar a declaração de filiação; enquanto isso, o reconhecimento da paternidade socioafetiva ainda não logrou obter uma demanda específica para atestá-la, embora precedente (TJRS, APC 70008795775).
Contudo, é absolutamente razoável e sustentável o ajuizamento de ação declaratória de paternidade socioafetiva, com amplitude contraditória, que mesmo desprovida de prova técnica, seja apta em obter veredicto que afirme a filiação com todas suas conseqüências, direito a alimentos, sucessão e outras garantias.
O que se fará em respeito aos princípios constitucionais da dignidade da pessoa, solidariedade humana e maior interesse da criança e do adolescente.
Admitir-se a impossibilidade jurídica do pedido seria rejeitar o acesso à justiça e desprezar a igualdade que os tribunais reconhecem aos diverso tipos de paternidade.
Informações Sobre o Autor
José Carlos Teixeira Giorgis
Desembargador aposentado. Professor da Escola Superior da Magistratura. Especialista em Direito Processual Civil. Mestrando. Autor de obras de Direito de Família. Articulista de periódicos. Palestrante. Sócio do Instituto dos Advogados do RS. Membro da Diretoria do IBDFAM/RS