Apelação Cível 70012915062 – Alimentos desde a concepção quando o genitor tinha ciência da gravidez e recusou-se a reconhecer o filho

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EMENTA: INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. recusa em submeter ao exame de dna. ALIMENTOS. FIXAÇÃO E TERMO INICIAL à data da concepção.

A recusa em se submeter ao exame de paternidade gera presunção da paternidade. O fato de inexistir pedido expresso de alimentos não impede o magistrado de fixá-los, não sendo extra petita  a sentença.

O termo inicial da obrigação alimentar deve ser o da data da concepção quando o genitor tinha ciência da gravidez e recusou-se a reconhecer o filho.

REJEITADA A PRELIMINAR. APELO DESPROVIDO, POR MAIORIA.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Desembargadores integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em rejeitar a preliminar e negar provimento ao recurso, vencido o Des. Sérgio Chaves.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves e Des. Ricardo Raupp Ruschel.

Porto Alegre, 09 de novembro de 2005.

DESA. MARIA BERENICE DIAS,
Presidente e Relatora.

RELATÓRIO

Desa. Maria Berenice Dias (PRESIDENTE E RELATORA)

Trata-se de recurso de apelação interposto por L.L.F. contra a sentença das fls. 481-91, que, nos autos da ação de investigação de paternidade que lhe move B.C.S., representado pro sua mãe, V.C.S., julgou procedente o pedido para declarar a paternidade do réu em relação ao autor e condenar aquele ao pagamento de alimentos no valor de dois salários mínimos mensais, devidos desde a concepção do demandante (agosto de 1989). Condenou, ainda, o réu ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios no valor de 20% sobre o valor da causa.

O apelante alega, em preliminar, que a sentença é nula por ser  extra petita, porquanto há ausência de pedido de fixação alimentar na petição inicial, e que o recurso deve ser recebido no efeito suspensivo, sob pena de gerar dano de difícil reparação. No mérito, alega ser improcedente o pedido de declaração de paternidade, uma vez que a perícia concluiu pela evidência contrária à paternidade. Refuta a desconsideração do exame de HLA e a presunção da paternidade em virtude da sua recusa em se submeter a exame de DNA. Sustenta que o depoimento da representante legal do apelado corrobora o resultado negativo do exame pericial, sendo a decisão contrária à prova dos autos. No tocante aos dever de pagar alimentos, diz que da forma como fixados extrapola a prova dos autos e sua condição financeira. Requer o provimento do recurso para declarar-se a nulidade da sentença, ou a improcedência dos pedidos, com a inversão dos ônus da sucumbência (fls. 495-507).

O apelo foi recebido no seu duplo efeito quanto ao pedido investigatório e apenas no efeito devolutivo quanto aos alimentos (fl. 512).

O apelado apresentou contra-razões, pugnando pelo desprovimento do recurso (fls. 514-23).

Contra a decisão da fl. 512, o apelante interpôs agravo de instrumento (processo nº 70012345021), ao qual foi negado efeito suspensivo (fls. 525-42).

O Ministério Público em primeiro grau opinou pelo conhecimento do recurso, rejeição da preliminar de nulidade e, no mérito, pelo desprovimento (fls. 545-9).

Os autos vieram a esta Corte (fls. 550-1).

Com vista, a Procuradora de Justiça manifestou-se pelo parcial provimento do apelo, aos efeitos de que o termo inicial da obrigação alimentar seja a partir da citação do recorrente (fls. 561-70).

Foi atendido o disposto no § 2º do art. 551 do Código de Processo Civil.

É o relatório.

VOTOS

Desa. Maria Berenice Dias (PRESIDENET E RELATORA)

A inconformidade procede em parte.

A preliminar de nulidade da sentença, por supostamente ser extra petita, vai rejeitada.

O fato de inexistir pedido expresso de alimentos na petição inicial não impede o magistrado de fixá-los ao julgar a ação de investigação de paternidade, quando as circunstâncias assim autorizam.

Eis o que prescreve o art. 7º da Lei nº 8.560-1992, in verbis:

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Sempre que na sentença de primeiro grau se reconhecer a paternidade, nela se fixarão os alimentos provisionais ou definitivos do reconhecido que deles necessite.

A reforçar tal entendimento é a jurisprudência desta Corte:

APELAÇÃO. INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE. ALIMENTOS. FIXAÇÃO INDEPENDENTEMENTE DE PEDIDO. POSSIBILIDADE. Em ações de investigação de paternidade julgadas procedentes, a fixação de alimentos é de rigor e pode ser feita independentemente de pedido expresso na inicial, sem que isso represente julgamento extra petita. Inteligência do art. 7º da Lei n.º 8.560/92. Precedentes jurisprudenciais (26ª conclusão do Centro de Estudos). APELO DESPROVIDO. EM MONOCRÁTICA.

(Apelação Cível Nº 70011116068, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rui Portanova, Julgado em 01/04/2005)

INVESTIGACAO DE PATERNIDADE. ALIMENTOS. SENTENCA ULTRA PETITA. IMPOSSIBILIDADE NAO DEMONSTRADA. NAO E EXTRA PETITA A SENTENCA QUE CONDENA O REU AO PAGAMENTO DE ALIMENTOS EM ACAO DE INVESTIGACAO DE PATERNIDADE JULGADA PROCEDENTE, MESMO NAO HAVENDO PEDIDO EXPRESSO NA INICIAL, PORQUE A NORMA DIRIGE COMANDO COGENTE AO JUIZ NESSE SENTIDO (ART. 7º DA LEI N.º 8.560/92). NAO COMPROVANDO O APELANTE A FALTA DE CONDICOES DE SUPORTAR O ENCARGO ALIMENTAR, FIXADO EM 50% DO SALARIO MINIMO, DEVE SER MANTIDA A SENTENCA. APELACAO DESPROVIDA.

(Apelação Cível Nº 70002201499, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Carlos Teixeira Giorgis, Julgado em 18/04/2001)

Não fosse suficiente, dos autos se extrai que o apelado formulou pedido incidental de alimentos (provisórios), conforme demonstra a petição das fls. 26-70, em razão da sua necessidade, sendo ainda que tal pedido havia sido indeferido naquele momento pelo juízo a quo (fl. 278).

É de se considerar também o teor da 26ª Conclusão do Centro de Estudos desta Corte:

Em ação de investigação de paternidade, sendo menor o investigante – e presumida, em caráter relativo, a necessidade – devem ser fixados alimentos independentemente de pedido

Portanto, sob qualquer ângulo, não há falar em sentença extra petita.

No tocante aos efeitos em que deva ser recebido o apelo, cumpre informar que descabe aqui a apreciação dessa matéria, porquanto já é objeto de recurso próprio, interposto pelo apelante, consoante demonstra a peça juntada às fls. 525-42 dos autos (Agravo de Instrumento nº 70012345021).

Quanto à declaração de paternidade, não prospera a insurgência o apelante. Pelo cotejo entre o depoimento pessoal das partes e os das testemunhas arroladas (fls. 179-83), bem se vê que o apelante e a genitora do apelado mantiveram relacionamento íntimo e eram vistos juntos à época em que o apelado teria sido concebido.

Nesse sentido bem observou a ilustrada Procuradora de Justiça em seu parecer (fls. 566-7):

Outrossim, segundo a prova testemunhal, eram vistos juntos na época da provável concepção do apelado, aquele freqüentava a casa da mãe deste e eram considerados como namorados (fls. 182, 183, 208 e 215), sendo que logo após esse período ela apareceu grávida, não havendo notícias de que mantinha relações com outra pessoa. E, além disso, segundo a inspeção judicial na pessoa das partes, existem algumas semelhanças de alguns traços fisionômicos entre eles (fl. 326).

Soma-se a isso o fato de que o recorrente não se mostrou nenhum pouco cooperativo à produção da prova nestes autos, porquanto deixou de comparecer aos atos em que se faria o exame de DNA designado. Aliás, no tópico, vale a transcrição de esclarecedor trecho da sentença que bem apreende o sucedido nestes autos (fl. 485):

No entanto, é de ser observado que posteriormente à realização deste exame [pelo método HLA, conforme laudo das fls. 77-8], foi determinado pela 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça que houvesse a produção do exame de DNA, em virtude da superioridade do exame de DNA recomendar sua realização (fls. 115/117), tendo sido adequadamente considerado ultrapassado pelo Promotor de Justiça Marcelo Dornelles em seu parecer de fls. 255/6.

O juízo tentou então a realização do exame de DNA, desde 20/05/96 (fl. 118) até 20/02/03 (quando o réu fez a manifestação de fls. 348/349 informando porque não havia comparecido ao exame de DNA designado). Inicialmente, existiu dificuldade técnica para sua realização, tendo em vista que o mesmo ainda não era realizado pelo Departamento Médico Judiciário do Tribunal de Justiça (fls. 120, 132 e 134) e depois em virtude de não comparecimentos do requerido aos exames realizados.

Inicialmente, face à impossibilidade técnico-financeira, foi designando exame pelo método GSE, para o dia 21/07/97 (ofício de fl. 153), ao qual não compareceu o requerido (fl. 162), apesar de devidamente intimado para tal a fl. 159. Afirmou o requerido que não compareceu ao exame, porque não se trataria de exame DNA como determinado pelo Tribunal de Justiça, e seria apenas repetição do exame já realizado (petição de fls. 165/166).

Foi então determinada a realização de exame DNA, que o Tribunal de Justiça havia começado a realizar (fls. 258/259), sendo designada nova data para o dia 04/06/01 (fl. 301), ao qual o requerido não compareceu novamente (fl. 308), apesar de devidamente intimado (fl. 306), não apresentando tempestivamente nenhuma justificativa para o seu não comparecimento. Posteriormente, em depoimento em audiência afirmou que estava com problema decorrente de uma cirurgia de vesícula que havia feito mais ou menos um ano antes, afirmando ter o maior interesse em fazer exame de DNA (fl. 325).

Face à referida informação de interesse do réu na realização do exame de DNA, foi novamente requisitada a sua realização, sendo designando o dia 10/04/02 (fl. 328), ao qual, mais uma vez, não compareceu o requerido (fl. 336), intimado que havia sido a fl. 332. Instado pelo juízo, veio a apresentar ‘justificativa’ pelo não comparecimento, mais de dez meses após, afirmou que não compareceu ao exame baseado em entrevista que afirma que exames de DNAs no Brasil são falhos, razão pela qual ‘entendeu’ pro não fazer o exame, além de argumentar pela sua desnecessidade, face outras provas existentes nos autos (fls. 348/349).

Patente é a recusa do investigado, ora apelante, em se submeter ao exame de DNA, motivo que resulta na forte convicção da sua paternidade em relação ao apelado, mormente quando existem nos autos provas fundadas acerca do relacionamento mantido entre a mãe do recorrido e o ora apelante.

Esta Corte já tem entendimento solidificado nesse sentido, sintetizado na 24ª Conclusão de seu Centro de Estudos, in verbis:

Em ação investigatória de paternidade, a recusa injustificada do investigado em submeter-se ao exame pericial constitui conduta processual que leva a forte convicção acerca da paternidade, uma vez que é dever de todos colaborar com o Poder Judiciário para o descobrimento da verdade (art. 339, CPC).

E o Superior Tribunal de Justiça já sumulou essa posição pelo enunciado nº 301:

Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade.

Aliás, o Código Civil de 2002 regulou a hipótese em seus arts. 231 e 232, in verbis:

Art. 231. Aquele que se nega a submeter-se a exame médico necessário não poderá aproveitar-se de sua recusa.

Art. 232. A recusa à perícia médica ordenada pelo juiz poderá suprir a prova que se pretendia obter com o exame

Destarte, não merece reparos a sentença nesse aspecto.

No tocante à condenação ao pagamento de alimentos, igualmente, não merece provimento o inconformismo do apelante.

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Embora o entendimento conhecido desta Corte[1] e também do Superior Tribunal de Justiça[2], no sentido de confirmar a disposição constante do artigo 13, parágrafo 2º, da Lei nº 5.478-68, que fixa o termo inicial dos alimentos na data da citação, no caso concreto  essa posição merece ser revista.

A sentença recorrida, da lavra do em. Juiz de Direito Ricardo Luiz da Costa Tjäder, acolhendo a tese da igualdade entre os filhos (art. 227, §6º, CRFB), determinou que os alimentos devidos pelo apelante retroagissem à data da concepção do filho, ora apelado.

Eis trecho que marca bem o teor da decisão no tópico (fls. 489-90):

E sabendo-se da importância da fase da gravidez para a formação adequada de uma criança, bem como de seus primeiros anos, é o dever de alimentar desde a concepção uma necessidade e uma obrigação decorrente da paternidade responsável que tanto é apregoada, como uma necessidade social no País.

[…]

Sendo os alimentos devidos desde a concepção não haverá nenhum incentivo para que o pai, pelo motivo da obrigação alimentar, deixe de reconhecer um filho de forma mais rápida, pois, de qualquer forma, terá que pagar-lhe alimentos a partir da sua concepção, como fazem os pais responsáveis com os deveres que possuem com sua prole, despendendo desde a concepção esforços e valores para que a sua adequada formação intra-uterina, não podendo ser desigual a situação de filhos, que lnão tenham a felicidade de terem pais com o mesmo grau de responsabilidade. Isto seria legitimar, por força do acolhimento pelo Poder Judiciário, de uma situação de desigualdade fática, que se tornaria cada vez mais causa de desigualdades jurídicas entre filhos que tenham origem em paternidades responsáveis (em relações de casamento ou não) com aqueles que não tenham um pai absolutamente cônscio com os deveres e as necessidades de seu filho desde a data de sua concepção.

Por todos estes motivos, que não são poucos, estabeleço que a obrigação alimentar do requerido é devida desde a concepção do autor, estabelecendo como data da concepção a do mês de agosto de 1989, período que totaliza os nove meses normais da gestação, tendo em vista que o nascimento do autor ocorreu em data de 16/04/89.

A bem da verdade, o momento da concepção do apelado, considerando-se a data do seu nascimento (fl. 7), bem assim os fundamentos da sentença, deve ser considerado a partir do mês agosto de 1988. Há erro material no ponto, o que não afeta em nada a tese acolhida pelo juízo a quo, e que vai mantida.

Há muito que esse tema – termo inicial dos alimentos em ação de investigação de paternidade – gera-me inquietude e está a merecer reflexão mais aprofundada nesta Corte, em especial no âmbito desta Câmara.

Doutrina e a Jurisprudência admitem que na maioria das vezes é extremamente difícil fixar os alimentos a partir da concepção ou do nascimento, já que o investigado sempre terá a seu favor a alegação de que desconhecia o fato. Mas não se pode descartar – e isso não parece nem um pouco incorreto afirmar – que, diante da existência de prova nos autos, no sentido de o investigado ter conhecimento prévio do fato natural da concepção, ou do nascimento, do filho que lhe é atribuído, antes mesmo de tomar ciência da ação investigatória de paternidade que lhe é movida, os alimentos devem ter como termo inicial data anterior à citação.

Ora, a sentença na ação de investigação de paternidade é de carga eficacial declaratória, ou seja, declara a paternidade que existe desde o momento da concepção, razão pela qual, aliás, aboliu-se a idéia de que os alimentos devem ser fixados e tornam-se devidos a partir da sentença.

A posição mais cômoda, obviamente, é declarar devidos os alimentos a partir da citação, já que tal momento serviria, tanto para dar ciência ao alegado pai sobre os termos da petição inicial, como para constituí-lo em mora (art. 219, CPC) a respeito da obrigação que, nas palavras de ANTÔNIO CARLOS MATHIAS COLTRO (in O Termo Inicial dos Alimentos e a Ação de Investigação de Paternidade, Revista do Instituto dos Advogados de São Paulo, São Paulo, RT, 2000, Nº 6, p. 50-6), antes de qualquer regra escrita é de direito natural e tem a ver com o sustento dos filhos pelos pais.

Todavia, esse entendimento é ainda acanhado, porquanto sendo o reconhecimento da paternidade, como se disse, um meio pelo qual se prova um fato (a filiação), que já existia, seus efeitos retroagem ao momento da concepção.

Essa é lição de PONTES DE MIRANDA (Tratado de Direito Privado, 3ª. Ed., Tomo IX, Borsoi: 1971, p. 99), in verbis:

A filiação, que existia antes, embora sem caráter legal, passa a ser assente perante a lei. O reconhecimento, portanto, não cria: revela-a. Daí resulta que os seus efeitos, quaisquer que sejam, remontam ao dia do nascimento, e, se for preciso, da concepção do reconhecido.

Daí que os alimentos, também, devem ser fixados desde o momento em que seja possível determinar a paternidade.

Em belíssimo artigo publicado sobre o tema, que veio citado na sentença das fls. 481-91, THYCHO BARHE FERNANDES (Do Termo Inicial dos Alimentos na Ação de Investigação de Paternidade, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1993, V. 694, p. 268-70) defende que o filho pode postular alimentos, desde que reconhecido, com efeitos anteriores à sentença que declara a paternidade e toma como correta a fixação dos alimentos a partir do nascimento ou, até mesmo da concepção pois, não se pode olvidar que ‘a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro’ (art. 4º, CC), ressaltando, ainda, que não se pode dizer que o nascituro não tem necessidade de alimentos, pois, sua alimentação se dá através da correta alimentação da mãe. Assim, o pai, prestando alimentos para a mãe, o estará fazendo para o filho.

Não discrepa dessa posição a doutrina de MIGUEL BORGHEZAN (o Termo Inicial dos Alimentos e A Concreta Defesa da Vida na Ação de Investigação de Paternidade, Repertório IOB de Jurisprudência: São Paulo, 2001, 3/18048), para quem é biológico que o início da vida se dá com a fecundação do óvulo pelo espermatozóide, de ordinário, no ventre materno e, portanto, lhe parece ser jurídico e justo sejam os alimentos da dignidade passíveis de concessão, espontânea ou impositivamente, desde que seja possível determinar a paternidade.

E prossegue o citado autor:

Essa ilação decorre do disposto no art. 229, primeira parte, da ‘Lex Principalis’, segundo a qual ‘os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores’ […]. Assente que embrião e feto merecem proteção do direito (art. 4º, CC), inafastável a possibilidade de conceder-se alimentos ao filho ainda no ventre materno, reclamando-as a mãe. Os avanços da ciência devem reverter em proveito do homem o mais cedo possível também na seara jurídica. O descompasso será fonte de revolta, de descrença e causa de manifesta injustiça Tendo a mãe poderes para representar o nascido até 16 anos (art. 384, V, CC), com maior razão poderá fazê-lo antes, pois quem pode o mais pode o menos. Em vista dos elevados objetivos sociais, desimportante a discussão acerca da personalidade jurídica do alimentário quando no ventre (art. 4º, CC), por converter-se em formalidade retrógrada, perversa e cruel, dessintonizada da contextura Constitucional.

E da prova produzida nestes autos, sobretudo dos depoimentos pessoais e das testemunhas (fls. 180-3),  se extrai que o apelante e a mãe do apelado eram vistos juntos na época da concepção, e eram tidos por todos como namorados, sendo que logo após esse período ela ficou grávida, não havendo indício de que mantinha relações com outra pessoa. Ademais, tal prova serviu também à prova da paternidade do apelante em relação ao apelado, respaldando a presunção gerada pelas recusas injustificadas daquele em se submeter ao exame de DNA.

Todos esses elementos levam ao conseqüente e inexorável reconhecimento de que o apelante tinha conhecimento prévio da gravidez, antes mesmo de ser citado para responder à presente demanda, do que resulta seu dever de pagar alimentos em favor do filho a partir da concepção deste, ou seja, desde o mês de agosto de 1988, período que antecede em nove meses ao nascimento do apelado, ocorrido em 16-4-1989 (fl. 7).

Em relação ao quantum dos alimentos fixados, deve ser aquele que melhor resguarde a proporção entre as necessidades do alimentado e as possibilidades do alimentante, respeitando-se, assim, o princípio da proporcionalidade.

Da análise dos autos, verifica-se que, a despeito das alegações do apelante, este não demonstrou impossibilidade em arcar com o valor fixado. Os documentos acostados às fls. 403-6 são insuficientes para demonstrar a capacidade financeira atual do apelante, mormente quando sabido ser ele – inclusive é como se declara nos autos – bacharel em Economia, técnico em contabilidade, agricultor e pecuarista (fls. 325 e 472).

Por esses motivos, rejeita-se a preliminar de nulidade da sentença e nega-se provimento ao apelo.

Des. Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves (REVISOR)

Cabível a fixação de alimentos, mas estes são devidos desde a citação (art. 13, § 2º, Lei de Alimentos e art. 219, CPC).

Des. Ricardo Raupp Ruschel – Acompanho a Relatora.

DESA. MARIA BERENICE DIAS – Presidente – Apelação Cível nº 70012915062, Comarca de Cruz Alta: “POR MAIORIA, REJEITARAM A PRELIMINAR E NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, VENCIDO O DES. SÉRGIO CHAVES.”

Julgador(a) de 1º Grau: RICARDO LUIZ DA COSTA TJADER


Notas:
[1]18ª Conclusão do Centro de Estudos do TJRS: Alimentos fixados em sede de ação investigatória de paternidade são devidos desde a data da citação.
[2] Súmula nº 227: Julgada procedente a investigação de paternidade, os alimentos são devidos a partir da citação.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Maria Berenice Dias

 

Advogada, Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM

 


 

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