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Ronaldo Saunders Monteiro
Militar e Mestrando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá (UNESA)
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Militar e Mestrando em Direito Público pela Universidade Estácio de Sá (UNESA)
A Comissão de Constituição e Justiça do Senado Federal, recentemente, aprovou, por unanimidade, projeto de lei (PLS 679/07) que autoriza a utilização do sistema de videoconferência em interrogatório, viabilizando, portanto, a presença virtual do acusado em audiência.
Com esse projeto, busca-se legitimar o uso desse recurso tecnológico em nossa prática forense, pois embora o país seja signatário da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, denominada Convenção de Palermo, tendo editado o Decreto n. 5.015/2004, o qual prevê o uso da videoconferência, a matéria ainda não se encontra disciplinada em nosso país.
Por força dessa omissão legislativa, e tendo em vista a necessidade de o Poder Público lançar mão de um mecanismo eficaz que evitasse os transtornos provocados pelo transporte de presos das unidades prisionais aos fóruns, o sistema de videoconferência vinha sendo utilizado, ainda que sem lei federal disciplinando a matéria, chegando os Tribunais Superiores, muitas vezes, a admitir a legitimidade de seu emprego, quando não provado o prejuízo ao réu. (Nesse sentido: STJ, 5ª T., HC 76.046/SP, rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 10-5-2007, DJ, 28 maio 2007, p. 380. No mesmo sentido: STJ, 6ª T., HC 34.020, rel. Min. Paulo Medina, j. 15-9-2005, DJ, 3 out. 2005, p. 334 e STJ, 5ª T., RHC 15.558/SP, rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, j. 14-9-2004, DJ, 11 out. 2004, p. 351), o que provocou amplos e calorosos debates.
Com o intuito de normatizar o emprego desse recurso tecnológico no Estado de São Paulo, foi editada a Lei n. 11.819/2005, a qual previu o uso de aparelho de videoconferência nos procedimentos judiciais destinados ao interrogatório e à audiência de presos.
Referida Lei, no entanto, acabou sendo objeto de questionamento na Suprema Corte, cujo Plenário, por maioria, concedeu habeas corpus, impetrado em favor de condenado pela prática do delito previsto no art. 157, § 2º, I e II, do CP, e declarou, incidenter tantum, a sua inconstitucionalidade formal. Concluiu-se que a mencionada norma teria invadido a competência privativa da União para legislar sobre direito processual (CF, art. 22, I). Os Ministros Carlos Britto e Marco Aurélio, vencidos em parte, consideraram também caracterizada a inconstitucionalidade material do diploma examinado. A Min. Ellen Gracie, relatora, em voto vencido, indeferiu o writ, por não vislumbrar vício formal, já que “o Estado de São Paulo não teria legislado sobre processo, e sim sobre procedimento (CF, art. 24, XI), nem vício material, haja vista que o procedimento instituído teria preservado todos os direitos e garantias fundamentais, bem como por reputar não demonstrado qualquer prejuízo na realização do interrogatório do paciente. HC 90900/SP, rel. orig. Min. Ellen Gracie, rel. p/ o acórdão Min. Menezes Direito, 30.10.2008.” (Informativo n. 526, Brasília, 27 a 31 de outubro de 2008)
Cumpre consignar que, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, no HC 88.914, Rel. Min. Cezar Peluso, já havia considerado que o interrogatório realizado por meio de videoconferência violaria os princípios constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa. Dentre os argumentos propugnados, nessa decisão, podemos destacar que: (a) o interrogatório realizado por intermédio desse recurso tecnológico agrediria o direito de o acusado estar perante o juiz, isto é, o de sua presença real no interrogatório, pois estatui o art. 185, caput, do CPP, com a redação dada pela Lei n. 10.792/2003, que “o acusado que comparecer perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal será qualificado e interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado”. No mesmo sentido, prescreve a Convenção Interamericana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), no art. 7º, 5. Da mesma forma, preceitua o art. 399, §1º, do CPP, com a nova redação determinada pela Lei n. 11.719/2008: “O acusado preso será requisitado para comparecer ao interrogatório, devendo o poder público providenciar sua apresentação”. (b) o interrogatório em estabelecimento carcerário reduziria a garantia da autodefesa, pois, não proporcionaria ao acusado a serenidade e segurança necessárias para delatar seus comparsas; além disso, não haveria a garantia de proteção do acusado contra toda forma de coação ou tortura física ou psicológica; (c) haveria a perda do contato pessoal entre o juiz e o acusado, o que tornaria a atividade judiciária mecânica; (d) o interrogatório on-line violaria o princípio da publicidade dos atos processuais, já que o mesmo aconteceria em estabelecimento carcerário.
Objetivando disciplinar a matéria, por intermédio de lei federal, foi, então, proposto, pelo Senador Aloizio Mercadante, um projeto de lei (PLS 679/07), o qual sofreu alterações com o substitutivo do Senador Tasso Jereissati, que acabou sendo aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado.
A justificativa do projeto de lei foi embasada no voto exarado pelo Rel. Min. Cezar Peluso, no HC 88.914, o qual, embora tenha considerado nulo o interrogatório virtual, “indicou quais seriam as características de uma futura lei em sintonia com a Constituição Federal”. Nesse sentido: “Não fujo à realidade para reconhecer que, por política criminal, diversos países, Itália, França, Espanha, só para citar alguns, adotam o uso da videoconferência, sistema de comunicação interativo que transmite simultaneamente imagem, som e dados, em tempo real, permitindo que um mesmo ato seja realizado em lugares distintos na práxis judicial. É certo, todavia, que, aí, o uso desse meio é previsto em lei, segundo circunstâncias limitadas e decisão devidamente fundamentada, em cujas razões não entra a comodidade do juízo. Ainda assim, o uso da videoconferência é considerado mal necessário, devendo ser empregado com extrema cautela e rigorosa análise dos requisitos legais que o autorizam.”
Dentro desse contexto, o projeto não prevê a utilização desse recurso tecnológico como meio obrigatório, mas excepcional, devendo o juiz fundamentar a decisão sobre a sua necessidade.
O interrogatório do acusado preso será realizado no estabelecimento prisional em que estiver recolhido, em sala própria, desde que estejam garantidas a segurança do juiz e auxiliares, a presença do defensor e a publicidade do ato.
Em qualquer caso, antes da realização do interrogatório, o juiz assegurará o direito de entrevista reservada do acusado com seu defensor. A sala reservada no estabelecimento prisional para a realização dos atos processuais à distância será fiscalizada por membros do Ministério Público, da Magistratura, serventuários da justiça e pela Ordem dos Advogados do Brasil.
O projeto também prevê a realização de oitiva de testemunha, que resida fora da jurisdição, por videoconferência ou outro recurso tecnológico de presença virtual, em tempo real, permitida a presença de defensor.
A futura edição de lei federal sobre o sistema de videoconferência, no entanto, longe está de resolver todos os problemas, pois, no mérito, persistirá a celeuma quanto à necessidade da presença física do juiz, de forma a preservar todos os direitos e garantias fundamentais do preso.
Do mesmo modo, subsistirão os argumentos no sentido de que o contato físico com o juiz proporcionará a este maiores elementos para a formação de sua convicção, pois esteve “cara a cara” com o réu, o que lhe propiciará maiores subsídios para a prolação da decisão.
Nesse contexto, a discussão sobre os vícios materiais do diploma legal continuará, em que pese o vício de ordem formal ter sido remediado, com a edição de uma lei federal.
Não obstante as teses defensivas contrárias ao sistema de videoconferência, deve-se esclarecer que o mesmo constitui um avanço incomparável na prática forense.
Sabemos que são gastos pelo Estado milhões de reais mensais com despesas de escolta para interrogatórios de réus presos.
Além da despesa em si, o Poder Público necessita de um contingente significativo de Policiais Militares para esse mister, os quais são colocados também em risco, pelo fato de serem “alvos” de tentativas de resgates de presos a caminho do fórum.
Importante ressaltar que, no dia da escolta, através do conhecido “bonde”, via de regra, os presos são separados desde cedo, independente do horário do interrogatório, passando por um longo período de espera nos fóruns. Muitas vezes essa espera vem acompanhada de fome e sede, além do próprio constrangimento que o preso sofre ao ser visto publicamente com uniforme prisional e algemado, constituindo grave atentado ao princípio fundamental da dignidade humana, plasmado no art. 1º, inciso III, do Texto Constitucional.
Todos esses fatores são extremamente prejudiciais aos presos, aos policiaias e quiçá à sociedade em geral.
Os pontos positivos desse novo instrumento judicial, portanto, preponderam sobre os pontos negativos. O Estado economizará com escolta, já que, não haverá contingente de policiais à disposição, como também combustível e refeição aos presos. Os detentos não passarão pelo constrangimento e cansaço da verdadeira “maratona” que é o deslocamento até o juízo. Os próprios policiais acabarão se beneficiando, pois, com tal sistema, ficará mais difícil o resgate de presos, na medida em que serão, com menor freqüência, transportados de um lugar para o outro.
Além do que, o avanço da tecnologia é tamanho, que não haverá prejuízo aos presos, dada a qualidade do som e da imagem do sistema de videoconferência, trazendo ao juiz os mesmos subsídios, que a presença física proporcionaria, para a formação de sua convicção; e, o mais importante, as garantias individuais deles serão resguardadas por membros do Ministério Público, da Magistratura, pela Ordem dos Advogados do Brasil e demais pessoas envolvidas nesta operação.
Enfim, embora não haja consenso sobre o tema, não há como fechar os olhos para essa nova realidade que se descortina, sob pena de serem impostos maiores gravames ao Estado, aos policias, à população em geral e ao próprio preso.
Procurador de Justiça licenciado e Deputado Estadual. Presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Mestre em Direito pela USP e doutor pela PUC/SP. Professor da Escola Superior do Ministério Público e de Cursos Preparatórios para Carreiras Jurídicas. Autor de várias obras jurídicas
O site do Superior Tribunal de Justiça noticiou esta semana a invalidação de interrogatório de um condenado por tráfico de drogas feito pela justiça paulista por intermédio de videoconferência por entender que referido procedimento deve contar com a presença física do juiz e réu já que a ausência deste requisito desrespeita o principio constitucional do contraditório e da ampla defesa.
Decisão semelhante foi proferida anteriormente pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal nos autos de um habeas corpus concedido a condenado a prática do crime de roubo e extorsão, pois que os Ministros daquela corte consideraram ilegal ato realizado por videoconferência argumentando, dentre outras que, referido procedimento, torna a atividade judicante mecânica e insensível violando o devido processo legal e a ampla defesa além do que não existe previsão legal para este tipo de procedimento.
Diante destas decisões das mais altas cortes judiciais do país achamos necessária a evidência, através deste ensaio, de algumas ponderações sobre o assunto vez que consideramos que as mesmas trazem retrocesso desnecessário ao processo judicial bem como trazem obstáculos a natural evolução da informática como meio possível de solução efetiva e rápida dos conflitos judiciais.
Primeiramente entendemos que os profissionais que atuam na área jurídica, principalmente os mais experientes, não estão conscientes em sua forma plena de que a informática não é uma opção e sim uma obrigação que nos tempos atuais é indispensável ao correto funcionamento da justiça. NÃO HÁ MAIS JUSTIÇA SEM A UTILIZAÇÃO DA INFORMÁTICA.
Afirmamos isso porque, necessitamos do computador para desenvolver nossas atividades, desde a confeccção de petições até os atos mais complexos de pesquisa e intercâmbio de informações e dados.
Qualquer ato que vá de encontro a evolução ou inserção da informática no sistema processual vigente deve ser veementemente rechaçado pois que os argumentos contrários a informatização sucumbem facilmente diante da realidade que constatamos em nosso dia-a-dia em relação a morosidade e ineficiência dos órgãos judicantes que, por diversos fatores, dentre eles o insuportável crescimento de ações levam os processos a se arrastarem por longos anos sem solução.
A videoconferência é um mecanismo fabuloso pois permite que o juiz realize seus atos de inquirição sem a necessidade de deslocamento físico da parte até o fórum. Seus benefícios são incontáveis, sendo um deles o de economia para o Estado que deixa de gastar dinheiro público com o transporte de acusados de extrema periculosidade que muitas vezes necessitam de uma logística custosa além de colocar em risco toda a sociedade diante de possíveis fugas.
Rebateríamos, ainda, tranquilamente, todos os argumentos expostos pelos juristas contrários a implantação do sistema de videoconferência para realização de atos judiciais, porém, dois deles são os mais comuns e merecem atenção especial.
O primeiro aduz que não há lei vigente que permita utilização de videoconferência, por exemplo, em interrogatórios. Existe sim. A Lei 11.419/06 que dispõe sobre a informatização do processo e, em seu artigo 1º § 1o afirma: “Aplica-se o disposto nesta Lei, indistintamente, aos processos civil, penal e trabalhista, bem como aos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição”, e continua em seu § 2o : “ Para o disposto nesta Lei, considera-se: “II – transmissão eletrônica toda forma de comunicação a distância com a utilização de redes de comunicação, preferencialmente a rede mundial de computadores”.
Outro argumento apontado que justifica a não utilização da videoconferência é a de que o juiz necessita “sentir” o acusado. Ora, no processo penal, a exemplo dos demais, o interrogatório do acusado acontece muitas vezes, muitos meses ou anos antes da prolação da sentença o que leva o juiz a manter-se fiel ao registro escrito, e pior, quando o processo tramita nas instâncias superiores Desembargadores e Ministros somente possuem condições de julgar com base nos elementos escritos trazidos nos autos sem qualquer vinculação depoimento presencial ou visual do acusado.
Ora, logicamente, se o depoimento estivesse em meio eletrônico, o julgamento, em todas as instâncias judiciais seria feito com base no fiel interrogatório o que daria a todos os julgadores a percepção real e visual da grande maioria dos atos do interrogado, sendo inclusive, mais humano para o acusado pois daria ao mesmo o direito de depor a todos os julgadores que apreciassem seu processo e com todos os detalhes que uma gravação visual permite.
Portanto, como já pudemos expressar em diversos outros trabalhos, a tecnologia esta a serviço do sistema judicial brasileiro e a mesma deve ser enaltecida por todos os profissionais do direito como uma espécie de longa manus ou braço direito do Judiciário e, suas incorreções, não devem levar o lidador a excluir sua utilização e sim a tentar aperfeiçoar sua correta aplicação como forma de distribuir de forma mais ágil, real e visual a tão sonhada Justiça.
Advogado em Belém; sócio do escritório Paiva & Borges Advogados Associados; Sócio-fundador do Instituto Brasileiro da Política e do Direito da Informática – IBDI; Presidente da Comissão de Estudos de Informática Jurídica da OAB-PA; Conferencista