Resumo: A Constituição Federal autorizou as cidades através de sua figura abstrata (municípios) a legislar sobre IPTU. Com a elaboração da regra matriz de incidência tributária do imposto identificamos os critérios ou aspectos normativos do imposto (materialidade, momento da incidência, espaço físico, sujeitos, base tributável e alíquota). Verificando a aplicabilidade do Estado da Cidade ao tema, podemos constatar que o critério espacial do imposto deve ser composto através de uma interpretação sistemática do artigo 225 da CF, artigo 32 do CTN e as diretrizes do Estatuto da Cidade.
Palavras-chave: IPTU, Incidência, Território, meio ambiente, Cidade.
Abstract: The Federal Constitution authorized the cities through his abstract figure (local authorities) to legislate on IPTU. With the preparation of the rule womb of tax incidence of the tax we identify the criteria or prescriptive aspects of the tax (materiality, moment of the incidence, physical space, subjects, taxable base and bracket). Checking the applicability of the State of the City to the subject, we can note that the space criterion of the tax must be composed through a systematic interpretation of the article 225 of the CF, article 32 of the CTN and the directives of the Statute of the City.
Keywords: IPTU, incidence, territory, environment, city.
Sumário: 1. Introdução. 2. Capacidade tributária. 2.1. Competência tributária: conceito. 2.2. Características da competência tributária. 2.3. Capacidade tributária ativa. 2.4. Outorga da competência tributária do IPTU. 3. Princípios constitucionais. 3.1. Introdução: conceito de princípio. 3.2. Legalidade. 3.3. Igualdade. 3.4. Anterioridade. 3.5. Irretroatividade. 3.6. Não-confisco. 3.7. Progressividade. 3.8. Dignidade da pessoa humana. 4. Regra matriz de incidência tributária do IPTU. 4.1. Conceito. 4.2. Critério material. 4.3. Critério temporal. 4.4. Critério espacial. 4.4.1. Critério espacial: segundo regramento do CTN. 4.4.2. Critério espacial: segundo a ótica do artigo 225 da CF. 4.4.2.1. Introdução: conceito de meio ambiente artificial. 4.4.2.2. Cidade: conceito. 4.4.2.3. Estatuto da cidade: delimitação do critério espacial do IPTU. 4.5. Critério pessoal. 4.6. Critério quantitativo. 5. Conclusão. Bibliografia
1. INTRODUÇÃO
A Constituição Federal outorgou ao Distrito Federal e aos Municípios a competência para legislar sobre o imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana.
O imposto municipal incidirá sobre bens imóveis edificados e não-edificados. Para entendemos a incidência do imposto utilizamos o conceito de regra matriz de incidência tributária, com intuito de determinar os critérios ou aspectos matéria, temporal, espacial, pessoal e quantitativo.
Destarte, o preenchimento de todos os elementos que compõe a regra padrão de incidência tributária do imposto municipal podemos identificar suas duas materialidades, o momento do nascimento da obrigação tributária, o espaço físico do território do ente tributante.
In fine, o tema abordado visa demonstrar a incidência do imposto municipal através da elaboração da sua regra padrão de incidência tributária refletindo a eficácia do artigo 225 e do Estatuto da Cidade para composição do critério espacial do imposto em questão.
2. CAPACIDADE TRIBUTÁRIA
2.1 – Competência tributária: conceito
Competência Tributária, na acepção legislativa em sentido estrito, é a aptidão outorgada pela Constituição Federal aos entes políticos para que possam expedir regras jurídicas tributárias, inovando o ordenamento jurídico, e assim, criar tributos em abstrato, dentro das limitações e restrições impostas pela mesma Normativa que lhes entregou tal poder.
Roque Antonio Carrazza disserta sobre o assunto:
“Competência tributária é a aptidão para criar, in abstracto, tributos, No Brasil, por injunção do princípio da legalidade, os tributos são criados, in abstracto, por meio de lei” (art. 150, I, da CF)[1]
“A competência tributária é a habilitação ou, se preferirmos, a faculdade potencial que a Constituição confere a determinadas pessoas (as pessoas jurídicas de direito público interno) para que, por meio de lei, tributem, obviamente, quem pode tributar (criar unilateralmente o tributo, com base em normas constitucionais), pode, igualmente, aumentar a carga tributária (agravando a alíquota ou a base de cálculo do tributo, ou ambas), diminuí-la (adotando o procedimento inverso) ou, até, suprimi-la, através da não-tributação pura e simples ou do emprego de mecanismo jurídico das isenções”.[2]
Paulo de Barros Carvalho conceitua competência tributária como “uma das parcelas entre as prerrogativas legiferantes de que são portadoras as pessoas políticas, consubstanciada na possibilidade de legislar para a produção de normas jurídicas sobre tributos” [3].
O instrumento de outorga de competência é a Constituição Federal, conseqüentemente, somente as pessoas jurídicas de direito público interno[4] podem receber e exercê-la através da produção de normas de condutas.
2.2 – Características da competência tributária
Como bem explanado por Roque Antonio Carrazza, a competência tributária possui seis características ou qualidades: privatividade, indelegabilidade, incaducabilidade, intalterabilidade, irrenunciabilidade e facultatividade[5].
A Constituição Federal prescreve as competências tributárias privativas de cada ente federativo, objetivando atender a autonomia decorrente do pacto federativo, caracterizando a privatividade da competência impositiva.
“O pacto federativo, forma de Estado que é a cláusula pétrea em nossa ordem constitucional, estabelece a autonomia entre as pessoas políticas de direito constitucional interno que juntas formam a federação brasileira: A União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Por esse prisma, é condição necessária para tal autonomia que os entes federativos tenham fontes de receita próprias e a competência tributária própria é uma das principais formas de ser alcançar isso”.[6]
Deste modo, a Constituição Federal através do poder constituinte originário, outorgou competências para cada ente instituir tributos específicos, sendo vedado que outro institua tributo privativo alheio. Qualquer invasão de competência alheia, deverá ser considerada inconstitucional, pois estará ferindo o pacto federativo, de forma indireta[7].
A indelegabilidade impõe a não transferência da competência impositiva a terceiros, já que a cada ente federativo corresponde a competência legislativa estritamente demarcada pela Constituição.
Neste diapasão, a competência tributária não é passível de delegação, é indisponível, visto que a Norma Maior, ao repartir as competências impositivas, o fez de maneira rígida e inflexível.
“As competências tributárias são indelegáveis. Cada pessoa política recebeu da Constituição a sua, mas não o pode renunciar, nem delegar a terceiros. É livre, até, para deixar de exercitá-la; não lhe é dado, porém, permitir, mesmo que por meio de lei, que terceira pessoa a encampe”.[8]
O não exercício da competência tributária não significa admitir a sua caducidade ou a sua renúncia. “A competência para instituir tributos é indelegável. A cada ente federativo cabe a competência legislativa estritamente demarcada pela Constituição Federal”.[9] O ente tributante não deixa de ser competente para instituir o tributo pelo seu não exercício, já que a Constituição não delimitou prazo para o exercício da competência tributária, caracterizando a incaducabilidade.
A competência tributária é inalterável, ou seja, não pode ter suas dimensões ampliadas. Não cabe à pessoa política transbordar sua competência originariamente outorgada sob pena de padecer do vício da inconstitucionalidade. Ainda, que se tentasse ampliar a competência tributária originariamente posta através de Emenda Constitucional, estaria esbarrando em princípios constitucionais, em especial o pacto federativo.[10]
Os entes tributantes não podem renunciar a competência tributária outorgada pela Constituição Federal. Por se tratar de matéria de direito público, são indisponíveis. O ente titular da competência impositiva pode não exercitá-la, porém está impedido, pelo poder constituinte originário, de renunciá-la.
Por fim, a facultatividade possibilita ou não exercício da competência tributária, sem o receio de sua perda, já que não há qualquer previsão constitucional de sanção correlata pelo seu não exercício.
2.3. Capacidade tributária ativa
Capacidade tributária ativa é a qualidade que determinado ente político detém de figurar como sujeito ativo da relação jurídica tributária. Tal capacidade lhe é outorgada constitucionalmente, onde a pessoa figura como componente do vínculo abstrato, que se instala quando ocorre, no mundo fenomênico, o evento descrito na hipótese normativa.
Hodiernamente, a pessoa que exercita a competência tributária também figura como sujeito ativo, entretanto a capacidade tributária ativa é transferível, ou seja, a pessoa competente para instituir determinado tributo pode delegar sua capacidade tributária ativa (arrecadatória) para outro ente, que irá compor o vínculo obrigacional (com o respectivo direito subjetivo). Entretanto, como já dito, não poderá delegar sua competência tributária.
Ainda, é necessário diferenciar competência tributária de capacidade tributária ativa, já que a competência impositiva outorgou o “poder” aos entes tributantes de criar normas jurídicas em matéria tributária. E, a capacidade tributária ativa é atribuição de compor o critério pessoal (pólo ativo) da regra matriz de incidência tributária[11].
2.4 – Outorga da competência tributária do IPTU
A Constituição Federal outorgou ao Distrito Federal e aos Municípios a atribuição de instituir o Impostos sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana.
A Constituição Federal autorizou a instituição do imposto com a seguinte materialidade: propriedade de imóvel no perímetro urbano. Ou seja, há uma única materialidade (único imposto) com complementos distintos, a saber:
(i) propriedade de imóvel edificado no perímetro urbano;
(ii) propriedade de imóvel não edificado no perímetro urbano;
Dessa forma, a Constituição Federal prescreveu que o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir o Imposto sobre a Propriedade Territorial e Predial Urbana, podendo, ainda, utilizar-se-á de dois complementos a materialidade impositiva “propriedade de imóvel”.
3 – PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
3.1 – Introdução: conceito de princípio
Os valores integrantes do ordenamento jurídico positivado são refletidos na forma de princípios[12], o que nos autoriza a afirmar que os princípios são alicerces fundamentais do sistema jurídico dotados de valores, com força vinculada, impulsionando o ordenamento jurídico e dando suporte na criação de normas jurídicas:
“Princípio é o ponto de partida do intérprete, é o conjunto de normas que espelham a ideologia da Constituição, seus postulados básicos e seus fins. Dito de forma sumária, os princípios constitucionais são as normas eleitas pelo constituinte com fundamentos ou qualificações essenciais da ordem jurídica que institui”.[13]
“Princípio […] é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do sistema normativa, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que já por nome sistema jurídico positivo”.[14]
O signo princípio presente num enunciado prescritivo pode denotar-se como valor ou como limite objetivo, cuja distinção tem grande relevância quanto aos efeitos práticos. Para identificar um princípio como valor (objeto ideal), levamos em conta que os valores sempre excedem os bens em que se objetivam[15], transcendem, aplicando-se simultaneamente a vários objetos da vida social, não se esgotando, nem tampouco são adstritos a um único objeto. Assim, se inserem num universo subjetivo.
Os limites objetivos tornam mais simples a construção do sentido dos enunciados, pois sua comprovação em linguagem competente é simples e sua verificação imediata:
“os “limites objetivos” são postos para atingir certas metas, certos fins. Estes, sim, assumem o porte de valores. Aqueles limites não são valores, se os considerarmos em si mesmos, mas voltam-se para realizar valores, de forma indireta, mediata.”[16]
Sendo emissores de valores ou limites os princípios espelham o conceito de normas jurídicas, explicitas ou implícitas, que atuam no campo constitucional, limitando o poder do legislador ordinário[17].
3.2 – Legalidade
A legalidade é um dos princípios basilares do Direito Tributário Constitucional, já que inibe que os entes políticos criem ou majorem tributos, sem lei anterior, ou seja, a majoração, criação ou modificação de regras tributárias somente poderão ocorrer mediante a elaboração de lei em sentido estrito.
“O princípio da legalidade teve sua intensidade reforçada, no campo tributário, pelo art. 150, I, da CF. Graças a este dispositivo, a lei – e só ela – deve definir, de forma absolutamente minuciosa, os tipos tributários. Sem esta precisa tipificação de nada valem regulamentos, portarias, atos administrativos e outros atos normativos infralegais: por si sós, não têm a propriedade de criar ônus ou gravames para os contribuintes.”[18]
Nesse sentido as obrigações tributárias devem ser inseridas através de veículos introdutores assim eleitos pelo Sistema.
É indiscutível que o legislador municipal tem o dever de legislar a cerca do imposto sobre a propriedade predial e territorial urbana somente através do veículo introdutor de normas, isto é, a Fazenda Pública Municipal somente poderá exigir ou modificar regras do imposto sobre a propriedade através de lei ordinária.
3.3 – Igualdade
A Constituição Federal prescreve que as normas jurídicas tributária deverão ser aplicadas de forma idênticas a todos os sujeitos passivos, desde que se encontrem em situações isonômicas.
Neste mister e de acordo com o magistério Paulo de Barros Carvalho:
“[…] esta contido na formulação expressa do art. 5º, caput, da Constituição e reflete uma tendência axiológica de extraordinária importância. […] Seu destinatário é o legislador, entendido aqui na sua proporção semântica mais larga possível, isto é, os órgãos da atividade legislativa e todos aqueles que expedirem normas dotas de juridicidade.”[19]
Deste modo, o sistema normativo tributário não poderá discriminar qualquer individuo que se encontra em posição idêntica com outros individuo (s).
3.4 – Anterioridade
O princípio da anterioridade determina que a criação ou a majoração de tributos, somente surtirá efeito a partir do exercício financeiro subseqüente ao da publicação da lei tributária, salvo as excludentes do artigo 150, §1º, da C.F./88[20].
A anterioridade tem o objetivo de garantir ao sujeito passivo da relação jurídico-tributária que majoração ou instituição de tributos somente produzirá efeitos no exercício subseqüente da publicação do veículo introdutor.
A EC nº 42/03, incluindo o artigo 150, inciso III, aliena c, na C.F./88[21], que dispõe ser vedada a cobrança de tributos antes de decorridos 90 dias da data de publicação da lei que os instituiu ou aumentou, observado o princípio da anterioridade e as excludentes do artigo 150, §1º, da C.F./88.
A chamada primeira etapa da reforma tributária excluiu do campo da incidência da noventena a fixação da base de cálculo do imposto sobre a propriedade. Nesta esteira, há permissão as Fazendas Públicas Municipais de fixar a base imponível do IPTU no fim do exercício, que produzirá efeitos jurídicos no primeiro dia do exercício financeiro seguinte.
3.5 – Irretroatividade
O princípio da irretroatividade veda a eficácia jurídica de tributos antes do início da vigência da lei que os houver instituído ou aumentado – refletindo a disposição do artigo 5º, inciso XXXVI da C.F. que protege o “direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
“A irretroatividade das leis que criam direitos e obrigações é uma das principais salvaguardas à segurança jurídica e ao Estado democrático de direito. Como limite objetivo, basta verificar os termos de vigência das normas contidas na lei para constatar se as mesmas aplicam-se a fatos ocorridos antes da publicação da lei ou não”.[22]
Neste mister, Hugo de Brito Machado leciona sobre o tema:
“É sabido que a lei pode, em princípio, fixar as datas inicial e final de sua própria vigência. Admitir, porém, que o legislador pode fixar o início de vigência da lei e data anterior à de sua publicação equivalente a praticamente suprimir a regra pela qual o tributo não pode ser cobrado em relação a fatos anteriores à sua vigência. O legislador estaria contornando a limitação constitucional”.[23]
Assim, a vedação constitucional está vinculada exclusivamente a criação ou majoração de tributos, limitando o legislador ordinário de exigir obrigações anteriores da publicação da norma introduzida no sistema.
3.6 – Não-confisco
As Fazendas Públicas Federais, Estaduais, Distritais e Municipais estão proibidas de utilizar tributo com efeito confiscatório.
“A Constituição Federal proibiu a utilização de qualquer tributo que tenha ‘efeito de confisco’, terminologia esta que não é fácil de conceituar. Todavia, pode-se afirmar que, sempre que um tributo se tornou excessivamente oneroso, violando o direito de propriedade, os princípios da capacidade contributiva, da razoabilidade e da igualdade, retirando o patrimônio do contribuinte, quer seja transferido ao Fisco ou reduzido em razão da exacerbada cobrança de um tributo ou da própria carga tributária, estar-se-á diante de uma situação de tributo confiscatório”[24].
Assim, o efeito confiscatório é evidenciado quando tributo é demasiadamente oneroso, capaz de mutilar o patrimônio (de forma parcial ou totalmente) do sujeito passivo da relação jurídico-tributária que conseqüentemente atacará diretamente a dignidade da pessoa humana.
3.7 – Progressividade
O princípio da progressividade assenta-se na utilização crescente de alíquotas à medida que aumenta a capacidade econômica do contribuinte, o que acompanha o princípio da igualdade, que implica na idéia de que os contribuintes sejam tributados de forma idêntica, salvo os que estiverem em condições desiguais.
Dessa forma, podemos afirmar que a progressividade é aplicação direta do princípio da isonomia/igualdade[25] que confere tratamento igual àqueles que se encontram na mesma situação.
A progressividade opera-se com a seguinte lógica: a alíquota cresce à medida que aumenta a respectiva base de cálculo. Sobre bases de cálculo menores incidem alíquotas percentuais menores, e, à medida que cresce a base de cálculo, aumenta, conseqüentemente a alíquota aplicável.
Após a conceituação de progressividade, vejamos quais formas a progressividade[26] é aplicada no imposto municipal:
O imposto progressivo no tempo será aplicável ao proprietário de solo urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, observado o plano direito do Município quanto ao conceito da função social da propriedade (artigo 182, § 4º, inciso II, da Constituição Federal).
Entretanto, a E.C. 29/2000, alterou o parágrafo 1º do artigo 156 da C.F., introduziu, diante de flagrante inconstitucionalidade, a progressividade em razão do valor do imóvel, já que a Constituição Federal, em seu artigo 145, parágrafo 1º, garante aos contribuintes o direito de só serem submetidos à progressividade de impostos pessoais[27], entretanto, o IPTU é um imposto real[28], que incide sobre um bem material, o que lhe retira a possibilidade de ser progressivo[29].
Ainda, o Poder Constituinte Originário confeccionou somente a progressividade imposta pelo artigo 182, da C.F./88, impossibilitando a alteração da progressividade pelo Poder Constituinte Derivado, a fim de garantir a isonomia.
3.8 – Dignidade da pessoa humana
O princípio basilar dos direitos fundamentais, bem como do ordenamento jurídico é o da dignidade da pessoa humana prescrito expressamente no artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, colocando o ser humano como fundamento nuclear do ordenamento positivado:
“A dignidade da pessoa humana é o núcleo essencial de todos os direitos fundamentais, o que significa que o sacrifício total de algum deles importaria uma violação ao valor da pessoa humana”[30].
Eduardo C.B. Bittar, em importante lição, disserta sobre esse mandamento nuclear:
“Só há dignidade, portanto, quando a própria condição humana é entendida, compreendida e respeitada, em suas diversas dimensões, o que impõe, necessariamente, a expansão da consciência ética como prática diuturna de respeito à pessoa humana”.[31]
“[a dignidade da pessoa humana é] a meta social de qualquer ordenamento que vise a alcançar e fornecer, por meio de estruturas jurídico-político-sociais, a plena satisfação de necessidades físicas, morais, psíquicas e espirituais da pessoa humana.”[32]
A dignidade e uma condição concreta do ser humano, originando-se, não no ordenamento jurídico, mas sim com o nascimento humano, isto é, inerente à sua essência, implicando, infalivelmente, sua juridicidade pelo direito posto e sua efetivação pelo Estado e respeito em todas as relações intersubjetivas e intra-subjetivas (já que a ninguém é dado o direito de atentar contra a própria dignidade).
O princípio exprime o mais alto valor jurídico e conseqüentemente, confirma, infirma e afirma direitos da pessoa humana.
“O ser humano é aquele que possui liberdade, que tem a possibilidade de, ao menos teoricamente, determinar seu ‘deve-ser’. É essa possibilidade que deve ser levada em conta, respeitada, considerada. A essência da dignidade do ser humano é o respeito mútuo a essa possibilidade de escolha. A especificidade do ser humano é sua liberdade. A dignidade a ele inerente consistirá no respeito a essa possibilidade de escolha”.[33]
Neste mister e de acordo com o magistério de Miguel Reale:
“O homem, considerado na sua objetividade espiritual, enquanto ser que só se realiza no sentido de seu dever ser, é o que chamamos de pessoa. Só o homem possui a dignidade originária de ser enquanto deve ser, pondo-se essencialmente como razão determinante do processo histórico”[34].
A dignidade da pessoa humana é a razão da existência do Estado, já que é o axioma que sustenta as máquinas administrativa e arrecadatória , isto é, a dignidade impõe restrições, funcionalidade e objetividade as regras jurídicas[35] aos entes federativos.
4 – REGRA MATRIZ DE INCIDÊNCIA TRIBUTÁRIA DO IPTU
4.1 – Conceito
A regra-matriz de incidência é a norma jurídica tributária em sentido estrito, cuja construção é obra do cientista do direito, prestando-se a definir a incidência de determinado tributo. Sua apresentação completa é formada dos juízos hipotético-condicionais, ou seja, de uma hipótese ou antecedente que se conjuga, diretamente, a uma conseqüência.
A hipótese ou antecedente é a descrição normativa abstrata do evento, trazendo a previsão de um evento, cujo acontecimento no mundo fenomênico faz irromper o vínculo da relação jurídico-tributária (prescrita no conseqüente normativo). Dentro do antecedente normativo encontramos critérios ou aspetos identificativos (material, espacial e temporal). Em outras palavras, a hipótese alude a um evento e a conseqüência prescreve os efeitos jurídicos que o acontecimento irá propagar, razão pela qual se fala em descritor e prescritor[36].
O conseqüente normativo regula a conduta abstrata, quando prescreve direitos e obrigações decorrentes do evento descrito no antecedente normativo, prevendo a estrutura da relação jurídico-tributária, que irá compor o fato jurídico. É nesse momento, que a hipótese se conjuga e identifica os sujeitos ativos e passivos da relação jurídico-tributária, fixando os direitos e obrigações dos mesmos, a partir do respectivo fato jurídico.[37]
“ao preceituar a conduta, fazendo irromper direitos subjetivos e deveres jurídicos correlatos, o conseqüente normativo desenha a previsão de uma relação jurídica, que se instala, automática e infalivelmente, assim que se concretize o fato”[38].
São dois os critérios ou aspectos que possibilitam a identificação da relação jurídica, o critério pessoal e o critério quantitativo. O critério pessoal aponta quem são os sujeitos que compõem a relação jurídico-tributária, ou seja, sujeito ativo, credor ou pretensor, e sujeito passivo ou devedor. A Normativa Maior prescreve quem são os sujeitos da relação: o sujeito ativo, quando expressamente delimitada a competência tributária e, de forma abstrata, o sujeito passivo.
O critério quantitativo refere-se ao objeto da prestação da regra, sendo formado pela base de cálculo e alíquota. É por meio desse critério que identificamos a dimensão numérica do objeto (tributo) da relação jurídico-tributária, para que se possa definir o quantum a que o sujeito ativo – credor – tem direito de receber, e o sujeito passivo, ora devedor, tem de adimplir.
Base de Cálculo é o valor positivo, a base, o axioma (suporte econômico) sobre o qual é aplicada a alíquota para se apurar o quantum. Revela, ainda, a dimensão e quantifica a materialidade da ocorrência do fato imponível [39].
A alíquota significa o percentual com que o tributo incide sobre o valor a ser tributado. Para a quantificação aritmética do montante do debitum, a alíquota une-se à base de cálculo para fornecer o valor do tributo devido pelo sujeito detentor do dever jurídico da relação jurídico-tributária.[40]
4.2 – Critério material
Prescreve o artigo 32 do CTN que a hipótese de incidência do imposto sobre a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, por natureza ou por acessão física, como definidos na lei civil:
(i) propriedade: é o uso, gozo, disposição da (s) coisa (s) conferidos ao titular do bem;
(ii) domínio útil: é a outorga dos direitos inerentes à propriedade a outrem:
“configura-se o domínio útil quando o proprietário, despojando-se dos poderes de uso, gozo e disposição da coisa, outorga-os a outrem (denominado enfiteuta), reservando-se, tão-só, o domínio direito ou eminente. Embora o novo Código Civil não tenha previsto a enfiteuse, permanecem as existentes. Não obstante os poderes que enfeixa, de uso, gozo e disposição, o enfiteuta não configura proprietário. No aprazamento ou aforamento não há a plenitude de poderes, dentre os direitos reais, do mais amplo – o enfiteuta não recebe todos os poderes do proprietário. Falta-lhe o domínio eminente.”[41]
(iii) posse: ocorre quando indivíduo reveste a roupagem de titular do domínio útil, agindo, como se proprietário fosse da coisa. Para incidência do imposto sobre a propriedade a posse deverá ser caracterizada como animuns domini, ou seja, deverá ser caracterizada como usucapionem[42].
Bem imóvel por natureza é o solo e os agregados da natureza, como árvores, por exemplo. Bem imóvel por acessão física, é tudo é incorporado artificialmente, como formação de ilhas, de aluvião, de avulsão, de abandono de álveo, de construções e edificações.
Como explanado já explanado, o imposto municipal possui duas materialidades: imóvel edificado (predial) e imóvel não edificado (territorial).
Pois bem, para caracterização de imóvel edificado é mister a presença de construções incorporadas de forma permanente ao solo, para residência ou fins empresarias[43]. Logo, imóvel não edificados são os terrenos, solos sem benfeitorias ou que não possuam construções concluídas ou não permanentes e que não “prestem” para residência ou fins empresariais.
4.3 – Critério temporal
A definição do momento da incidência do imposto municipal depende da disposição da legislação municipal. O ordenamento jurídico vigente, em regra, elegeu que subsunção do fato à norma ocorrerá todo dia primeira de cada ano.
Um dado importante é que o imposto sobre imóvel não edificado o critério temporal foi eleito como primeiro dia de cada ano, e a incidência sobre imóvel edificado deverá ocorre somente no exercício seguinte (primeiro dia do ano) do término da construção.
Sejamos claros: antes do término da construção o imóvel somente poderá incidir o imposto sobre a propriedade de bens imóveis não edificado, já que a “construção” ainda não foi incorporado ao solo de modo definitivo, bem como não “presta” a moradia ou atividade mercantil. Logo após o término da obra o imóvel já poderá ser considerado “edificado”, mas como haverá incidência do imposto sobre imóveis edificado, deverá, a Fazenda Pública Municipal, aguardar o término do exercício para iniciar a “nova” cobrança, por força do princípio da anterioridade.
4.4 – Critério espacial
4.4.1 – Critério espacial: segundo regramento do CTN
O Código Tributário Nacional fornece a base legal para definir a qualificação de zona rural e zona urbana[44]. O artigo 32, do C.T.N. estabelece em seu parágrafo 1º os requisitos mínimos para a definição de zona urbana por lei municipal, complementando a definição no parágrafo subseqüente. Não obstante o conceito de zona urbana ser definido por lei municipal, este veículo deverá observar os critérios delimitadores contidos na lei complementar (artigo 32, parágrafo 1º do CTN).
Para definição do critério espacial do I.P.T.U. observar-se-á a presença ou não de, no mínimo, dois requisitos definidores da zona urbana contidos no descritor do artigo 32, § 1º, do C.T.N., sendo que os eventos que não estiverem contido nos limites determinados pela “legislação tributária” caracterizarão zona urbana, passível da incidência do I.T.R. [45]. Assim, a definição de zona rural se faz por exclusão”[46].
Dessa forma, normas que pretendam caracterizar imóvel rural e urbano dizem respeito a princípios gerais de direito tributário, sendo matéria reservada à lei complementar, eis que refletirão, inevitavelmente, sobre conflitos de competência entre a União Federal (a quem compete instituir o I.T.R.) e Municípios (a quem compete instituir o I.P.T.U.).
Neste sentido, assevera Aires F. Barreto:
“para prevenir conflitos de competência entre Município e União, a lei complementar (o CTN) definiu as zonas urbanas por natureza (§ 1º do art. 32) e as zonas urbanas por equiparação (§ 2º). As zonas urbanas, por natureza, foram conceituadas mediante a indicação dos equipamentos mínimos (dois) de que devem ser dotadas as regiões para que sejam consideradas urbanas. Dessa forma, o critério que vige, para efeitos fiscais, é o de equipamentos urbanos”[47].
Os imóveis industriais, comerciais e etc. localizados fora dos núcleos urbanos, mas que ostentem pelo menos dois requisitos contidos no artigo 32, § 1º, do C.T.N., sofrerão incidência do I.P.T.U. (por natureza). Ainda, se o bem imóvel estiver localizado em área conforme descrito no artigo 32, § 2º, do C.T.N., da mesma forma, haverá incidência do imposto municipal, isto é, se houve previsão em lei municipal, bem como loteamento aprovado, que se destine à moradia, indústria ou comércio, mesmo que servidas pelos requisitos do § 1º. (por equiparação).
4.4.2 – Critério espacial: segundo a ótica do artigo 225 da CF
4.4.2.1 – Introdução: conceito de meio ambiente artificial
Segundo o artigo 3º, da Lei nº 6.938/1981 meio ambiente é o “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”.
Havendo harmonia entre o veículo descrito e o conteúdo estrutural normativo do artigo 225, da Constituição Federal, podemos, firmar o entendimento que o veículo em questão foi recepcionado pela ordem constitucional vigente.
Assim, podemos conceituar meio ambiente como toda estrutura física ou não que influência e rege a vida em todas as suas formas.
Neste contexto, meio ambiente artificial é toda manifestação (construção) humana refletiva na modificação do ambiente a quo delimitada no espaço territorial urbano[48]:
“[…] o meio ambiente artificial é compreendido pelo espaço urbano construído, consistente no conjunto de edificações (chamado de espaço urbano fechado), e pelos equipamentos públicos (espaço urbano aberto). Dessa forma, todo o espaço construído, bem como todos os espaços habitáveis pela pessoa humana compõem o meio ambiente artificial”[49].
Não será compreendido nesta análise o perímetro rural como meio ambiente artificial, por ausência de aglutinação de construções humanas.
O meio ambiente artificial encontra-se normatizado nos artigos 182 e 183 da Constituição Federal e Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade). O Estatuto prescreve condutas de ordem pública e de interesse social relacionadas ao uso da propriedade urbana, para proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado delimitado ao perímetro urbano.
4.4.2.2 – Cidade: conceito
Podemos conceituar cidade como espaço físico pertinente a ofertar as condições necessárias ao ser humano, tais como: dignidade, saúde, educação, cultura, lazer e habitação.
Sendo a cidade o mandamento nuclear do meio ambiente artificial, deve seguir o objetivo basilar da política de desenvolvimento urbano prescrito no artigo 182, da C.F.:
“Art. 182. A política de desenvolvimento urbano, executada pelo Poder Público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem- estar de seus habitantes.”
Neste mister, são objetivos da política urbana:
“a) a realização do pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade; e b) a garantia do bem-estar dos seus habitantes”[50]
Com o exposto, a política urbana prescrita no artigo 182, da C.F. impõe ao núcleo urbano o dever de zelar pela vida, segurança, igualdade, propriedade, bem como direitos sociais, para refletir sua função social[51].
A função social da cidade é atingida “quando proporciona a seus habitantes uma vida de qualidade, satisfazendo os direitos fundamentais, em consonância com o que o art. 225 preceitua”.[52]
De acordo Celso Antonio Pacheco Fiorillo a cidade possui, além das citadas, cinco principais funções sociais: “a) da habitação; b) da circulação; c) do lazer; d) do trabalho e e) do consumo”.[53]
A respeito do tema, o prof. Fiorillo, entende que a função social da cidade somente será exercida quando possibilitar aos seus habitantes moradia digna, livre e tranqüila circulação e lazer[54].
A somatória de todas as funções sociais da cidade resulta na garantia do bem-estar dos seus habitantes, isto é, as regras traçadas pela Lei Maior têm por objetivo jurídico-social respeitar e garantir o sobre-princípio da dignidade da pessoa humana[55].
4.4.2.3 – Estatuto da cidade: delimitação do critério espacial do IPTU
Conforme prescreve o artigo 225 da Constituição Federal, o meio ambiente ecologicamente equilibrado está relacionado com a dignidade da pessoa humana, ou seja, o equilíbrio do meio ambiente a efetivação do princípio da dignidade da pessoa humana.
Sendo o meio ambiente artificial – cidade – o espaço físico aonde a pessoa humana reside e circula o seu equilíbrio importa na sadia qualidade de vida de seus habitantes.
Equilíbrio do meio ambiente artificial é cristalizado pela entrega do piso vital mínimo aos seus habitantes, bem como respeito às regras capitalistas (trabalho, comercio e etc), bem como aspectos intrínsecos (intimidade, religião, lazer e etc).[56]
Neste sentido, as regras constitucionais delimitadas ao campo de incidência espacial das cidades prescreverão condutas positivas e negativas impostas aos entes federativos[57], com intuito de proteger o meio ambiente artificial para glorificação do princípio da dignidade da pessoa humana.
Pois bem, tratando-se de cidade, os regramentos estatuídos nos artigos 182, 183 e 225, da Constituição Federal autorizaram o legislador ordinário a veicular o denominado Estatuto da Cidade (Lei n. 10.257/2001) com intuito de disciplinar, de forma correta, a propriedade urbana, para o equilíbrio do meio ambiente artificial.
O Estatuto da Cidade vem trazendo uma carga de valor jurídico-social refletindo os ditames do artigo 225, da CF, ou seja, traz a cidade como meio ambiente, o qual, deve ser, “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”.
Após a veiculação do Estatuto da Cidade a propriedade urbana passou a caracteriza-se como elemento ambiental e componente do meio ambiente artificial:
“[…] o meio ambiente artificial passa a receber uma tutela mediata (revelada pelo art. 225 da Constituição Federal, em que encontramos a proteção geral ao meio ambiente enquanto tutela da vida em todas as suas formas, centrada na dignidade da pessoa humana) e uma tutela imediata (que passa a receber tratamento jurídico aprofundado em decorrência da regulamentação dos arts. 182 e 183), relacionando-se diretamente às cidades. É, portanto, impossível desvincular de vida, assim como o direito à satisfação dos valores da dignidade da pessoa humana e da própria vida.”[58]
A norma estrutural urbana de 2001 tem por objetivo basilar prescrever princípios gerais, regras de ordem pública interesse geral, para “regular o uso da propriedade urbana em benefício da coletividade[59], da segurança e do bem-estar”[60] dos habitantes da cidade para manutenção do equilíbrio ambiental.
O artigo 2º do regramento urbano prescreve as seguintes diretrizes:
“I – garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações;
II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;
III – cooperação entre os governos, a iniciativa privada e os demais setores da sociedade no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;
IV – planejamento do desenvolvimento das cidades, da distribuição espacial da população e das atividades econômicas do Município e do território sob sua área de influência, de modo a evitar e corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente;
V – oferta de equipamentos urbanos e comunitários, transporte e serviços públicos adequados aos interesses e necessidades da população e às características locais;
VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar:
a) a utilização inadequada dos imóveis urbanos;
b) a proximidade de usos incompatíveis ou inconvenientes;
c) o parcelamento do solo, a edificação ou o uso excessivos ou inadequados em relação à infra-estrutura urbana;
d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra-estrutura correspondente;
e) a retenção especulativa de imóvel urbano, que resulte na sua subutilização ou não utilização;
f) a deterioração das áreas urbanizadas;
g) a poluição e a degradação ambiental;
VII – integração e complementaridade entre as atividades urbanas e rurais, tendo em vista o desenvolvimento socioeconômico do Município e do território sob sua área de influência;
VIII – adoção de padrões de produção e consumo de bens e serviços e de expansão urbana compatíveis com os limites da sustentabilidade ambiental, social e econômica do Município e do território sob sua área de influência;
IX – justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização;
X – adequação dos instrumentos de política econômica, tributária e financeira e dos gastos públicos aos objetivos do desenvolvimento urbano, de modo a privilegiar os investimentos geradores de bem-estar geral e a fruição dos bens pelos diferentes segmentos sociais;
XI – recuperação dos investimentos do Poder Público de que tenha resultado a valorização de imóveis urbanos;
XII – proteção, preservação e recuperação do meio ambiente natural e construído, do patrimônio cultural, histórico, artístico, paisagístico e arqueológico;
XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;
XIV – regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda mediante o estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, consideradas a situação socioeconômica da população e as normas ambientais;
XV – simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das normas edilícias, com vistas a permitir a redução dos custos e o aumento da oferta dos lotes e unidades habitacionais;
XVI – isonomia de condições para os agentes públicos e privados na promoção de empreendimentos e atividades relativos ao processo de urbanização, atendido o interesse social.”
As diretrizes, bem como os demais regramentos contidos na norma estrutural urbana condicionam a propriedade ao meio ambiente como o todo, para sadia qualidade de vida das pessoas que circulam na cidade.
Assim, o Estatuto da Cidade criou a obrigação da existência de cidades sustentáveis, “que deverá assegurar, como importantíssima diretriz da política urbana no Brasil, os direitos básicos de brasileiros e estrangeiros residentes no País no que se refere à relação pessoa humana/lugar onde se vive”.[61]
Para concluímos, o Estatuto da Cidade, para garantia do direito a cidades sustentáveis, prescreveu as seguintes diretrizes:
(i) direito à terra urbana: distribuição dos habitantes em determinado espaço territorial e a forma que serão distribuídos;
(ii) direito à moradia: direito a espaço delimitado (específico) de conforto e respeito as regras constitucionais de intimidade;
(iii) direito ao saneamento ambiental: vinculo o ente federativo a assegurar as condições mínimos para garantir a saúde dos habitantes da cidade;
(iv) direito à infra-estrutura urbana: reflete “direito material metaindividual organizado a partir da tutela jurídica do meio ambiente artificial, revele a necessidade de uma ‘gerência’ da cidade por parte do Poder Público municipal vinculada a planejamento previamente discutido não só com o Poder Legislativo mas com a população, com a utilização dos instrumentos que garantem a gestão democrática das cidades, explicados nos arts. 43 e 45 do Estatuto da Cidade exatamente no sentido de integrar juridicamente as cidades ao Estado Democrático de Direito”.[62]
(v) direito ao transporte: reflete os meios necessários para livre circulação da pessoa humana dentro do perímetro municipal;
(vi) direito aos serviços públicos: humanização e isonomia na prestação de serviços públicos;
(vii) direito ao trabalho: espelho nas prescrições do art. 6º da CF (piso vital mínimo);
(viii) direito ao lazer: idem;
Após a explanação dos conceitos de meio ambiente artificial e cidade, podemos concluir que segundo o regramento estatuído no Arrigo 225 da CF em consonância com o disposto no Estatuto da Cidade, o conceito ou delimitação do espaço de incidência tributária do IPTU passou a ser prescrito pelo para diretor no âmbito de cada cidade, sem desprezar os elementos do artigo 32 do CTN.
“A par da dificuldade de utilização de tal critério, tendo em vista a realidade brasileira, na qual os chamados estabelecimentos marginais, ou bairros irregulares, “crescem com muito maior velocidade que os estabelecimentos regulares, e abrigam agora em muitos países a maioria da população”, endentemos que o Estatuto permite tal critério diferenciador. Extraímos esse raciocínio do próprio texto legal, em cujo art. 2º, I, se estabelece que a garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infra-estrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, vem a ser um exemplo de permissão legal em utilização de tal critério diferenciador”[63].
Neste ponto, entendemos que o critério espacial demarcador da territoriedade de incidência do IPTU deve ser interpretado ou extraído através da junção do artigo 32 do CT com as diretrizes contidas no Estatuto da Cidade que autorizará a incidência do imposto predial através de prescrição contida no plano diretor de cada cidade, devendo, ainda, o bem “cumprir função social a bem de sua população, considerada individualmente”.[64]
4.5 – Critério pessoal
O sujeito ativo da relação jurídico-tributária será os Municípios e o Distrito Federal, conforme disposição do artigo 156, I, da CF.
A sujeição passiva ficará a cargo do proprietário (pleno, de domínio exclusivo ou na condição de co-proprietário), titular do domínio útil (enfiteuta e usufrutuário – titular dos direitos de usar, de administrar e fluir) e o possuidor.
A legislação municipal não poderá escolher qualquer possuidor, já que regra padrão do IPTU. não comporta o locatário ou comodatário no critério pessoal, pois são meros titulares de direitos pessoais limitados em relação à coisa, cujos proprietários mantém a posse indireta sobre o imóvel. O imposto incidirá na posse ad usucapionem, ou seja, aquela que exterioriza a propriedade ou o domínio (porém sem título hábil) e que, decorrido certo tempo, gera direito ao usucapião. Desse modo, é indispensável que se trate de posse que, por suas características, possa conduzir à propriedade.
4.6 – Critério quantitativo
A base imponível do IPTU é o valor venal (gênero), isto é, o valor comercial ou de mercado do imóvel.
Possuindo imposto municipal duas materialidades teremos duas situações ou valores que iram compor a base de cálculo do imposto.
Neste emaranhado, a base imponível do imposto sobre bens imóveis edificado é composta pela somatória do valor venal do imóvel com o valor venal da construção, e por sua vez, a base de cálculo do imposto sobre bens imóveis não-edificado é composta, exclusivamente, pelo valor venal do imóvel.
E mister esclarecer que qualquer modificação que implique na alteração da base de cálculo do imposto que corresponda em aumento da tributação, deve ser veiculada através de lei ordinária, seguindo o princípio da estrita legalidade tributária (150, I, da CF), já que o veículo decreto (municipal) não possui hierarquia ou força estrutural para alterar a regra padrão de incidência já definida através do veículo ordinário municipal[65] .
Assim, citamos como exemplo, a modificação da planta genérica do imóvel que implique em majoração do I.P.T.U. estabelece novo valor venal, constituindo esse valor a base de cálculo daquele tributo. Equipara-se à majoração do tributo a modificação de sua base de cálculo que importe em torná-lo mais oneroso. Se somente a lei pode aumentar o tributo, conforme o inciso II, do art. 97, é evidente que apenas a lei pode tornar o tributo mais oneroso, seja por qual meio for, inclusive, pela alteração de sua base de cálculo [66].
Quanto a alíquota, a C.F. não prescreveu alíquotas mínimas ou máximas, sendo certo, que a verificação das alíquotas deverá ser “estudada” sob a olhares, subjetivos, do princípio do não-confisco.
Como explanado nos itens anteriores, a atual estrutura normativa da Constituição Federal admite a progressividade do imposto municipal, o que acarretará variedade de alíquotas sobre bases (valores) diferentes.
5 – CONCLUSÃO
Os municípios e o distrito federal receberam a competência impositiva de legislar a cerda de imposto sobre a propriedade de imóvel no perímetro urbano, com duas materialidades: (i) imóveis edificados e (ii) não-edificados.
Para criação do imposto sobre a propriedade de imóvel no perímetro urbano a Fazenda Pública Municipal deverá verificar, antes da publicação da norma padrão de incidência, o reflexo dos princípios demarcadores do I.P.T.U.: (i) legalidade; (ii) isonomia e capacidade contributiva; (iii) anterioridade; (iv) irretroatividade; (v) não-confisco; (vi) progressividade e (v) dignidade da pessoa jurídica.
Antes de adentramos a incidência do imposto municipal, procuramos conceituar a regra padrão de incidência, que demarca a incidência normativa, sendo composta por uma hipótese (descrição de um evento) e uma conseqüência normativa (prescritor).
Como vimos o imposto municipal possui duas materialidades e incidindo via de regra todo dia primeiro de cada ano, com exceção da materialidade “edificado”, pois há necessidade de aguardar o início do exercício seguinte ao término da edificação (incorporação ao solo permanente que ‘preste’ para habitação ou fins empresariais).
Objetivando regular o limite de incidência do imposto (critério espacial), o artigo 225, da CF, Estatuto da Cidade e o artigo 32, §1º e § 2º do CTN autorizam a cidade a verificar ou demarcar o espaço físico do imposto municipal.
O sujeito ativo será o Município ou o Distrito Federal, já que somente a estes receberam a competência impositiva prescrita no artigo 156, inciso I, da Constituição Federal.A sujeição passiva será composta pelo proprietário do bem imóvel, titular do domínio útil e pelo possuidor (ad usucapionem).
A base de cálculo será composta por duas situações: (i) materialidade edificação: valor venal do imóvel agregado ao valor da construção; (ii) materialidade não-edificação: valor venal do imóvel.
A alíquota, após a E.C. 29, poderá incorrer na progressividade em razão do valor ou localização, bem como ser progressiva em razão da subutilização ou não utilização do bem imóvel, observados os ditames do Plano Diretor do Município.
Informações Sobre o Autor
Nilson Nunes da Silva Junior
Mestre em Direito pela UNIFIEO; Especialista em Direito Tributário pelo IBET/SP; Professor de Direito de Direito de Administrativo e Tributário da Anhembi Morumbi; Advogado em São Paulo.