Se a realidade social impôs o
enlaçamento das relações afetivas pelo Direito de Família e a moderna doutrina
e a mais vanguardista jurisprudência definem a família pela só presença de um
vínculo de afeto, devem ser reconhecidas duas espécies de relacionamento interpessoal: as relações heteroafetivas
e as relações homoafetivas.
Mudaram os paradigmas da família e o
casamento deixou de ser seu traço identificador, com precípua
função procriativa. Quer pelo surgimento dos métodos
contraceptivos, quer pela evolução da engenharia genética, desatrelaram-se os
conceitos de sexo, casamento e reprodução. As legislações do mundo inteiro vêm
regulamentando as relações de pessoas do mesmo sexo e a própria jurisprudência
brasileira já reconhece sua existência, ora as definindo como sociedade
de fato, ora como união estável.
Assim é de todo descabido ter o
novo Código Civil silenciado sobre os vínculos que não se definem pela
diferença do sexo do par. Mesmo para quem vê óbice constitucional
para identificar tais uniões como entidade familiar, é imperioso
emprestar-lhes juridicidade. Como há mais de cinco anos tramita
projeto de lei que busca inserir no âmbito jurídico a chamada “parceria
civil registrada”, não se justifica sua exclusão no estatuto codificado
recém aprovado.
Que ao menos durante o período da vacatio legis se busque corrigir
esta omissão nitidamente preconceituosa. Somente assim se estará dando
eficácia social à garantia constitucional de igualdade, pressuposto da
liberdade individual e base do estado democrático de direito.
Informações Sobre o Autor
Maria Berenice Dias
Advogada, Ex-Desembargadora do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Vice-Presidente Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM