Alienação fiduciária na prática em 2022

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1. Alienação Fiduciária

Também chamada de alienação em garantia, Alienação Fiduciária é a transmissão da propriedade de um bem ao credor para garantia do cumprimento de uma obrigação do devedor, que permanece na posse direta do bem, na qualidade de depositário. Essa garantia, criada pela Lei n° 4728, de 14 de julho de 1965, artigo 66, veio resolver o problema das financeiras que, ao financiar a aquisição de bens, utilizavam institutos obsoletos para garantir o pagamento da obrigação.

Para valer contra terceiros, ela deve ser registrada no Cartório de Registro de Títulos e Documentos da sede do credor e, na alienação de veículos automotores, o contrato deverá ser inscrito junto à autoridade de trânsito onde se encontra registrado o bem objeto da garantia.

Para o credor, esse tipo de garantia trouxe a novidade de, caso o devedor não liquide sua obrigação no vencimento, poderá requerer a ação de busca e apreensão do bem alienado e, após apossar-se do mesmo, vendê-lo a terceiros, aplicando o valor de venda no pagamento de seu crédito. Salienta-se que o credor não pode ficar com o bem: deve vendê-lo e liquidar a operação.

Essa forma de garantia desobriga o credor de ter que acionar o devedor e somente depois ir à busca do bem objeto da garantia, facilitando e apressando o retorno de seu investimento.

Na Alienação Fiduciária em garantia dá-se a transferência do domínio do bem móvel ao credor, denominado fiduciário (em geral, uma financeira que forneceu o numerário para a aquisição), em garantia do pagamento, permanecendo o devedor (fiduciante) com a posse direta da coisa, o domínio e a posse indireta passam ao credor em garantia, não se dá tradição real, mas sim ficta (constituto possessório).

O domínio do credor é resolúvel, pois resolve-se automaticamente em favor do devedor alienante, sem necessidade de outro ato, um vez paga a última parcela da dívida; de acordo com a legislação mencionada, somente bens móveis e alienáveis podem ser objeto de alienação fiduciária, mesmo fungíveis ou já integrantes do patrimônio do devedor (Súmula 28 do STJ).

Não se tem admitido, entretanto, a alienação fiduciária de bens fungíveis que seja também consumíveis, ainda que por destinação, como os que compõem o estoque de comércio do devedor.

A Lei n° 9.514/97, contudo, instituiu a alienação fiduciária de coisa imóvel, com regime semelhante ao dos bens móveis mas com algumas peculiaridades, dispondo ainda sobre o financiamento imobiliário e a securitização de créditos imobiliários, o contrato deve ter a forma escrita, podendo o instrumento ser público ou particular; a aquisição do domínio exige a tradição, que é ficta na hipótese, o registro no Cartório de Títulos e Documentos gera oponibilidade a terceiros.

A Lei n° 6.015/73 (LRP) alterou o Decreto-Lei n° 911/69, que entendia ser obrigatório o registro unicamente no domicílio do credor; pela referida lei, em seu art. 130, os contratos devem ser registrados no domicílio das partes contratantes, ou, quando eles forem diversos, em cada um dos ofícios, em se tratando de veículo automotor, será necessária a anotação no Certificado de Registro, previsto no art. 121 do CTB. O credor pode exigir outras garantias, como a fiança e o aval, se o débito é saldado por terceiro, em geral o avalista ou fiador, dá-se a sub-rogação no crédito e na garantia constituída pela alienação fiduciária (art. 6°, Dec.-Lei n° 911/69).

Os direitos e obrigações do fiduciante consistem em:

– ficar com a posse direta da coisa e o direito eventual de reaver a propriedade plena, com o pagamento da dívida;

–  purgar a mora, em caso de lhe ser movida ação de busca e apreensão, se tiver pago 40% do preço financiado;

– receber o saldo apurado na venda do bem efetuada pelo fiduciário para satisfação de seu crédito;

–  responder pelo remanescente da dívida, se a garantia não se mostrar suficiente;

–  não dispor do bem alienado, que pertence ao fiduciário (nada impede que ceda o direito eventual de que é titular, consistente na expectativa de vir a ser titular, independentemente da anuência do credor, levando a cessão a registro);

–   entregar o bem, em caso de inadimplemento de sua obrigação, sujeitando-se à pena de prisão imposta ao depositário infiel.

A recuperação da propriedade plena opera-se pela averbação da quitação do credor no cartório em que foi registrado o contrato, que pode ser obtida, em caso de recusa, por meio da ação de consignação em pagamento.

A obrigação principal do credor fiduciário consiste em proporcionar ao alienante o financiamento a que se obrigou, bem como em respeitar o direito ao uso regular da coisa por parte deste. Se o devedor é inadimplente, pode vender o bem, aplicando o produto no pagamento do crédito, acréscimos legais, contratuais e despesas, entregando o remanescente, se houver, ao devedor, ou ajuizar execução por quantia certa ou ação de busca e apreensão contra o devedor, a qual poderá ser convertida em ação de depósito, caso o bem não seja encontrado.

O artigo 1°, § 6°, do Decreto-Lei n° 911/69 proibi a inserção, no contrato, de cláusula que permita ao credor ficar com o bem, em caso de inadimplemento contratual (“pacto comissório“), se o devedor é inadimplente, cumpre-lhe promover as medidas judiciais mencionadas; a mora decorrerá do simples vencimento do prazo para pagamento, mas deverá ser comprovada mediante protesto do título ou por carta registrada, expedida por intermédio do Cartório de Títulos e Documentos, a critério do credor (art. 2°, § 1°).

Comprovada a mora do devedor, pode o credor considerar vencidas todas as obrigações contratuais e ajuizar ação de busca e apreensão, obtendo a liminar; o fiduciante será citado para, em três dias, apresentar contestação ou purgar a mora se já tiver pago 40% do preço financiado, requerida a purgação da mora e feitos os cálculos do débito, o juiz marcará data para o pagamento, contestada ou não a ação, e não purgada a mora, o juiz proferirá sentença em cinco dias.

A sentença, de que cabe apelação apenas no efeito devolutivo, em caso de procedência da ação, não impedirá a venda extrajudicial do bem e consolidará a propriedade e a posse plena e exclusiva nas mãos do proprietário fiduciário, a venda pode ser extrajudicial ou judicial; preferida esta, aplica-se o disposto nos arts. 1.113 a 1.119 do CPC (art. 3°, § 5°, do Dec.-Lei n° 911/69). Se o bem não for encontrado ou não se achar na posse do devedor, o credor poderá requerer a conversão do pedido de busca e apreensão, nos mesmos autos, em ação de depósito, na forma prevista nos arts. 901 a 906 do CPC (art. 4°), a prisão só será decretada após a sentença e depois de vencido o prazo de 24 horas para entrega da coisa, ou o seu equivalente em dinheiro.

O STJ não vem admitindo tal prisão, entretanto, após a vigência da atual Constituição Federal, ao fundamento de que se trata de depósito atípico, o STF, contudo, vem entendendo que, “na alienação fiduciária, é admitida a prisão civil do devedor que se negar a restituir o bem objeto do contrato” (RT, 756:151), de acordo com a Súmula 20 do 1° Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, o valor da coisa, para efeito da mais adequada estimação do equivalente em dinheiro, “é o correspondente ao do débito contratual, isto é, ao do saldo devedor em aberto“.

Se ocorrer a falência do devedor e a busca na tiver ainda sido efetiva, o credor fiduciário poderá simplesmente formular pedido de restituição no juízo falimentar, não estando sujeito a habilitação (art. 7° da LF), se, ao ser decretada a falência, a liminar de busca e apreensão já havia sido cumprida, a ação prosseguirá até o final no juízo em que foi proposta, passando o síndico a representar o falido.

2. Considerações Finais

Como se vê, quis o constituinte de 1988 conferir maior cautela as exceções ao princípio que veda a prisão civil por dívida, seja adjetivando os casos de descumprimento de obrigação alimentícia, seja excluindo do texto anterior a expressão “na forma da lei”. Com a exclusão desta cláusula ficou afastada a possibilidade de, por via de legislação ordinária, desfigurar-se a garantia constitucional, por via de equiparações elásticas ao instituto do depositário infiel.

O Código Civil, em seus artigos 1.265 a 1.287, disciplina tal instituto e lhe confere as linhas conceituais, nas suas modalidades de depósito voluntário e depósito necessário.

O depósito, na lição de Clóvis Beviláqua, “é o contracto, pelo qual uma pêssoa recebe um objeto móvel alheio, com a obrigação de guardá-lo e restitui-lo em seguida”. (Código Civil Comentado, edição histórica, Editora Rio, vol. IV, p. 376).

Assim, na sua concepção clássica, o depositário é mero custo diante da coisa depositada e sua obrigação é restituí-la, logo que lhe seja exigida. O depositário, no modelo definido no Código Civil, não detém a coisa com o objetivo de adquiri-la, mas apenas de custodiá-la e devolvê-la ao depositante, quando este a reclamar.

A luz desses conceitos, não se pode, em absoluto, equiparar-se o adquirente fiduciário com mero depositário.

Quem adquire um bem por via do engenhoso contrato de alienação fiduciária situa-se em plano de autêntico proprietário do mesmo, pois assume, desde o início do negócio, o risco da perda da coisa. E se a coisa perece para o dono (res perit dominium), caberia ao credor sofrer os riscos normais do direito de propriedade, o que não ocorre no contrato de alienação fiduciária, pois uma vez perdida a coisa fiduciada, sem culpa do devedor, o credor poderá executar o contrato com as garantias nele constantes, como, por exemplo, títulos de crédito avalizados.

No caso, portanto, caracterizado está uma situação de desigualdade, pois para executar sua garantia, o fiduciário-credor é proprietário, mas para correr o risco da perda do bem fiduciado, sem culpa do devedor-fiduciante, não o é, cabendo a este sofrer tal perda.

Além do mais, o credor, em caso de inadimplemento da obrigação, não se torna proprietário do bem alienado fiduciariamente.

Razão porque é de se concluir, mais uma vez, que o Decreto-lei n.º 911/69 perdeu sua validade jurídica com a vigência da nova Constituição, que excluiu a possibilidade de, por lei ordinária, equiparar-se situações outras ao instituto do depósito, de modo a burlar-se a garantia da vedação de prisão civil por dívida, o que reforça a presente tese de inconstitucionalidade da prisão do devedor fiduciário.

Mesmo diante da orientação jurisprudencial largamente dominante, notadamente do col. Supremo Tribunal Federal, guardião-mor da Constituição Federal, mesmo assim, não há como aceitar a constitucionalidade da prisão civil do depositário infiel na alienação fiduciária, notadamente porque o texto constitucional em vigor não inviabiliza a prisão civil do depositário infiel, que tem a posse do bem em razão do contrato de alienação fiduciária, daí não ser cabível a prisão civil do devedor-fiduciante porquanto ele não é depositário infiel, sem esquecer que o conceito de norma jurídica evoluiu sobremodo no último quartel do século XX para englobar duas espécies: os princípios e as regras jurídicas. Aqueles de infinita superioridade quando confrontados com estas, pelo elevado grau de abstratividade de que se revertem, respeitado, por outro lado, a validade principiológico do artigo 5.º, da LICC, sensivelmente superior à regra do Decreto-lei 911/68, daí porque preservo minha convicção pessoal em sentido de inadmitir a prisão civil do devedor-fiduciante não rendendo-me à jurisprudência do STF e STJ que entendem constitucional a prisão civil do devedor-fiduciante.  

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Thais de Arruda Gondim

 

Acadêmica de Direito na Universidade Federal do Ceará/CE

 

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