A reforma do CPP e seus reflexos para o acusado: A busca pela conformidade constitucional do processo penal

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Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar criticamente algumas das alterações produzidas pela reforma do CPP, especificamente quanto ao momento do interrogatório, ao prazo da prisão preventiva em face dos novos prazos procedimentais e à regulamentação das provas ilícitas. Vale salientar, aqui, que não se pretende exaurir o tema, por demais extenso, mas apenas pontuar os aspectos da reforma que procuraram aproximar o processo penal às normas constitucionais, suscitando, assim, novas discussões e trazendo às antigas um novo fôlego.


Palavras-chave: reforma do Código de Processo Penal; interrogatório; prazo; prisão preventiva; prova ilícita.


Abstract: The current article aims to analyze critically some of the modifications brought by the recent reform of the Penal Procedure Code, specifically concerning the moment in which the interrogatory now takes place in the criminal procedure, the lack of a term for the preventive detention of the suspect/defendant and the regulation of illegal evidence. There is no intention to exhaust the theme but to punctuate some of the aspects of the reform that clearly tried to bring together the criminal procedure and the Federal Constitution, in order to prompt further discussions regarding this matter.


Key-words: Criminal Procedure Code; interrogatory; term; preventive detention; illegal evidence.


Sumário: Introdução. 1. A reforma do CPP: uma análise crítica. 2. A consolidação do interrogatório como ato de defesa. 3. O novo procedimento e o “novo” prazo da prisão preventiva. 4. A regulamentação legal das provas ilícitas. 5. Conclusão. Referências.


INTRODUÇÃO


Com a promulgação da Constituição Federal em 1988 passou-se a verificar a necessidade de uma reforma do Processo Penal brasileiro. Isso decorreu do rol de garantias asseguradas no art. 5º da Carta Magna, as quais aplicadas ao processo demonstravam que muitos dos institutos previstos no Código de Processo Penal de 1941 não haviam sido recepcionados pelo texto constitucional.


Nesse contexto, a atualização e a modernização do Código de Processo Penal mostravam-se imperativas. As Leis nº. 11.689, 11.690 e 11.719, que entraram em vigor em 2008, trouxeram alterações substanciais em diversas fases da persecução criminal, modificando várias facetas da dinâmica processual.


Diante disso, o presente trabalho tem por objetivo analisar criticamente algumas das alterações produzidas pela nova legislação, especificamente quanto ao momento do Interrogatório pela nova sistemática, o novo prazo da Prisão e Preventiva em face dos novos prazos procedimentais e a nova percepção das provas ilícitas no CPP. Intentou-se observar, principalmente, as conseqüências práticas acarretadas pela reforma no que diz respeito a essas alterações e sua relação com a efetividade das garantias processuais constitucionais. Vale salientar, aqui, que não se pretende exaurir o tema, por demais extenso, mas apenas pontuar os aspectos da reforma que procuraram aproximar o processo penal às normas constitucionais, suscitando, assim, novas discussões e trazendo às antigas um novo fôlego.


1. A REFORMA DO CPP: UMA ANÁLISE CRÍTICA


Antes de se tratar especificamente sobre as reformas do código de processo penal, faz-se importante avaliar criticamente a reforma processual advinda, sem dúvida necessária[1], todavia, tida por grande parte da doutrina como “desordenada, assistemática e, por isso, contraproducente em determinados momentos” (NUCCI, 2008, p. 115). Ao analisar os novos dispositivos legais, tem-se a impressão de que o legislador “lançou-se na tarefa de realizar uma obra sem haver […] projeto que lhe permitisse produzir resultados com linhas harmônicas[2]” (NUCCI 2008, p. 115).


Jacinto de Miranda Coutinho (2002, p. 34) já asseverava antes mesmo da reforma advinda que,


“[…] as reformas parciais não têm sentido quando em jogo está uma alteração que diga respeito à estrutura como um todo, justo porque se haveria de ter um patamar epistêmico do qual não se poderia ter muita dúvida. Isso, todavia, não é o que se passa com o sistema processual penal, onde, antes de tudo, não se consegue sequer delimitar corretamente o conceito de sistema. […] não se pode deixar de sustentar que um processo global consistente, refletindo seu tempo, há de vingar”.


Com efeito, percebe-se que reformas parciais operadas em uma codificação legal muitas vezes resultam na sua falta de coerência interna, pois renova alguns dispositivos, adequando-os à realidade social e às novas concepções jurídicas, enquanto permite a permanência e coexistência de outros tantos que já não se coadunam com essa nova ordem, causando o enfraquecimento do próprio sistema. Em obra publicada sobre a reforma do CPP e o Sistema Acusatório, afirmou-se do mesmo modo que:


“O risco que se delineia a partir da entrada em vigor das primeiras alterações é o insucesso da pretensão de se estabelecer um processo uno e coerente. Tal risco […] já se mostra em face das reformas pontuais. Logicamente, por razões que não se precisa aqui aduzir, a reforma global seria a melhor forma de permitir a adoção de um princípio unificador, que criaria para o processo a pretendida unidade” (PEREIRA; MEZZALIRA, 2008, s.p.).


Não obstante, não se podem negar os aspectos positivos da reforma. Isso porque as modificações por ela trazidas demonstram clara intenção de adequar o diploma processual às normas e garantias constitucionais. Ainda que o ideal fosse, de fato, a edição de uma nova codificação integral das regras processuais penais, na qual não restariam tantas incongruências internas, há que se aceitar que a alteração delineou um processo mais próximo às exigências constitucionais. Superadas as críticas quanto à forma utilizada para realização da reforma processual penal, alguns comentários merecem ser tecidos sobre algumas das alterações feitas pelo legislador, consoante se passa a discorrer. 


2. A CONSOLIDAÇÃO DO INTERROGATÓRIO COMO ATO DE DEFESA


A reforma processual penal alterou significativamente os ritos, em especial o comum, regulado nos arts. 394 a 405 do CPP. Na nova dinâmica procedimental, atenta-se para o fortalecimento da ampla defesa através da obrigatoriedade de uma resposta à acusação escrita e anterior a qualquer produção probatória, havendo possibilidade de, logo após, operar-se a absolvição sumária do denunciado, e da inversão da ordem de ouvida deste. O novo posicionamento do interrogatório trouxe novamente à baila a discussão sobre a sua natureza.


Tendo em vista a importância que tal definição tem para o acusado dentro do processo, haja vista que interfere na valoração dos elementos que são colhidos durante a sua ouvida, justifica-se uma análise mais aprofundada sobre o instituto.


Na antiga sistemática do diploma processual, o direito do réu de exercer a sua autodefesa ao ser interrogado ficava em segundo plano, mormente em face da menção de que o seu silêncio poderia lhe causar prejuízos e em razão da posição em que o interrogatório se encontrava no decorrer do procedimento, o que sugeria que o objetivo supremo de tal ato era a obtenção da confissão, que, por sua vez, serviria de alicerce para a condenação (CAPEZ, 2007, p. 327). Assim, evidente que o Código de Processo Penal, dotado de forte inspiração inquisitiva, uma vez que construído em momento político propício às idéias absolutistas e ditatoriais, considerava a ouvida do acusado preponderantemente como momento de se recolher provas, funcionando tal ato apenas acidentalmente como meio de defesa (BARROS, 1996, p. 133).


Contudo, a maneira como o processo penal era visto sofreu profundas mudanças com o advento da Constituição Federal, em 1988, que consagrou, dentre inúmeras garantias, o direito ao silêncio do acusado como extensão da própria ampla defesa (art. 5o, LXIII), bem como determinou a rígida separação entre as funções de acusar, defender e julgar, conferindo ao processo penal linhas claras do sistema acusatório. Em virtude disso, conclui Walter Nunes da Silva Jr. (2009, p. 131) que a Constituição de 1988,


“[…] resgatou a natureza jurídica de genuíno meio de defesa para o interrogatório. Por isso, no desiderato de adaptar o sistema normativo à Constituição, foi dada nova redação ao art. 186 do CPP e se inseriu um parágrafo único a esse dispositivo, a fim de deixar claro que o silêncio é um direito, de modo que ele não importa em confissão, ademais de não poder ser interpretado em prejuízo da defesa”.


Nesse passo, igualmente Fernando da Costa Tourinho Filho defende que, face às mudanças trazidas pela Constituição Federal, o interrogatório passou a ter natureza jurídica de meio de defesa. Explica o autor a sua posição:


“[…] o certo é que a Constituição de 1988 consagrou o direito ao silêncio. O réu não é obrigado a responder às perguntas que lhe forem formuladas. […] Se o acusado pode calar-se, não se pode dizer seja o interrogatório um meio de prova. Por outro lado, não estando ele obrigado a acusar a si próprio, não tem nenhuma obrigação nem dever de fornecer elementos de prova” (TOURINHO FILHO, 2002, p. 468).


Em compasso com esse entendimento, Ada Pellegrini, Antonio Scarance e Antonio Magalhães Gomes Filho (2007, p. 93) argumentam que,


“[…] consubstanciando-se a autodefesa, enquanto direito de audiência, no interrogatório, é evidente a configuração que o próprio interrogatório deve receber, transformando-se de meio de prova (como considerava o Código de Processo Penal de 1941, antes da Lei 10.792/2003) em meio de defesa: meio de contestação da acusação e instrumento para o acusado expor sua própria versão. É certo que, por intermédio do interrogatório […], o juiz pode tomar conhecimento de notícias e elementos úteis para a descoberta da verdade. Mas não é para esta finalidade que o interrogatório está preordenado. Pode constituir fonte de prova, mas não meio de prova: não está ordenado ad veritatem quaerendam.”


Nesse sentido também se posiciona Fernando Capez (2007, p. 328), compartilhando da compreensão de que é no interrogatório que o acusado concretiza a sua autodefesa, insurgindo-se contra as acusações que lhe são feitas e influindo, destarte, na convicção do órgão jurisdicional. Ainda que se possa inferir do seu interrogatório algum elemento de instrução probatória, será decorrente de mera eventualidade[3], mormente porque essa não é a finalidade primordial, de acordo com a Constituição Federal, do ato processual em apreço.


Amilton Bueno de Carvalho e Salo de Carvalho (2005, p. 44), ao analisar o momento da ouvida do acusado e as diferentes correntes doutrinárias acerca de tal ato, obtemperam:


“Outros, porém – e aí me incluo –, têm o interrogatório como, preponderantemente, meio de defesa. Diria mais: em nível prático, é o momento defensivo – como regra – mais importante de todos. É que o interrogatório baliza – e até define – toda a estratégia defensiva. É o momento – tal como a contestação no cível – onde o acusado resiste à pretensão deduzida na inicial de acusação”.


Por outro lado, há doutrinadores que, antes da reforma processual, posicionavam-se no sentido de que o acusado, não obstante possa aproveitar o momento do interrogatório para esboçar sua defesa, fornece quase que invariavelmente elementos de prova sobre os fatos cuja verdade se procura descobrir, sendo, desta feita, preponderantemente meio probatório o ato em comento. Dentre os defensores desta posição encontra-se Júlio Fabbrini Mirabete (2003, p. 277), que sustenta ser o interrogatório um meio de prova perante a legislação brasileira, sem todavia negar que tal ato processual guarda características também de meio de defesa, “pois não há dúvida de que o réu pode dele valer-se para se defender da acusação, apresentando álibi, dando a sua versão dos fatos, etc”.


Argumenta, ainda, que, mesmo quando o acusado utiliza o interrogatório para refutar as acusações que pesam contra si, não deixa de oferecer ao magistrado elementos probatórios e que influirão no seu julgamento, e até o seu silêncio, não obstante a proibição de ser interpretado em seu prejuízo, poderia acabar contribuindo para a formação da íntima convicção do juiz quando amparado por outras provas do processo. Por tais razões, assevera que o interrogatório é eminentemente de meio de prova.


Igualmente defendia que o interrogatório representa meio probatório Nicola Framarino Dei Malatesta (2001, p. 414-426), que pondera:


“Nunca se afirmou, nem se poderia afirmar, que o testemunho suspeito não é prova testemunhal. O testemunho do acusado é, portanto, para nós, um testemunho como outro qualquer, com a qualidade particular na testemunha, que, nem sempre, mas em determinados casos, gera suspeitas, tomadas em consideração, como qualquer suspeita do testemunho. […] O interrogatório é tão útil à descoberta da verdade, que não é lícito descuidá-lo principalmente com o acusado e não só tendo o objetivo de alcançar a descoberta da sua eventual criminalidade, mas também, sobretudo, visando chegar à descoberta da sua eventual inocência; mas o interrogatório, repito, não será legítimo senão quando respeite a consciência do acusado, a quem se reconhece o direito de silenciar”.


E. Magalhães Noronha, ao refletir sobre a temática, também concluiu, em reflexão anterior à reforma, ser o interrogatório meio de prova, porquanto inserido no título reservado às provas dentro do Código de Processo Penal. Admite, contudo, que é possível ser tal ato também um meio de defesa, embora secundariamente. Isso porque, ainda que o acusado utilize o momento da sua ouvida para realizar a sua autodefesa, “não deixa de ministrar ao juiz elementos úteis à apuração da verdade, seja pelo confronto com provas existentes, seja por circunstâncias e particularidades das próprias declarações que presta” (NORONHA, 1998, p. 137).


Por fim, observa-se, ainda, uma terceira corrente, na qual se defende a natureza jurídica mista do interrogatório. Através desse entendimento, tal instituto representaria concomitantemente meio de prova e meio de defesa, haja vista a possibilidade de se obter, com o depoimento judicial do réu, elementos de prova acerca dos fatos investigados no processo criminal, não obstante seja, também, o momento em que o acusado apresenta a sua versão dos fatos, defendendo-se das acusações que lhe foram feitas. É o entendimento de Edilson Mougenot Bonfim (2008, p. 339), que argumenta: “A nova disciplina, entretanto, conquanto empreste ao interrogatório características mais proximamente relacionadas à defesa do réu, não altera a natureza mista do interrogatório, mantendo-se, também, sua função probatória”.


Nesse mesmo sentido se posiciona também Aury Lopes Jr., que obtempera:


“[…] as alternativas “meio de prova” e “meio de defesa” não são excludentes, senão que coexistem de forma inevitável. Assim, se de um lado potencializamos o caráter de meio de defesa, não negamos que ele também acaba servindo de meio de prova, até porque, ingressa na complexidade do conjunto de fatores psicológicos que norteiam o “sentire” judicial materializado na sentença” (2007, p. 597).


Aline Iacovelo El Debs (2001, p. 2), do mesmo modo, filia-se a essa corrente sustentando que a inquirição do réu é tanto momento de produção probatória quanto de se manifestar a sua defesa em relação aos atos que lhe são atribuídos. Desta forma, a autora esclarece que o interrogatório:


“[…] trata-se de meio de defesa porque é a oportunidade que o acusado tem de ser ouvido, garantindo sua ampla defesa na forma de autodefesa, ele poderá narrar sua versão dos fatos e indicará provas em seu favor. Poderá também calar-se sem que isso seja usado contra ele. E ainda é possível que assuma o delito, porém, alegue alguma excludente de ilicitude ou de culpabilidade. Todavia não deixa de ser meio de prova para a lei brasileira. As respostas que o réu resolver dar ao magistrado, poderão ser usadas para formar o convencimento desse na busca da verdade real, a favor ou contra a defesa” (EL DEBS, 2001, p. 2).


A jurista argumenta que o direito ao silêncio do acusado, elevado a garantia constitucional pela Constituição Federal de 1988, não retirou do interrogatório a característica de meio de prova, pois, se permanecer calado, o réu não contribuirá nem para a elucidação dos fatos, nem tampouco para se defender, hipótese em que não será nem meio probatório, nem defensivo. Todavia, quando decide se manifestar, o acusado, por mais que se limite a refutar todas as imputações que lhe são feitas, acabará, de algum modo, influindo na formação da convicção do magistrado, razão pela qual também deve ser considerado meio de prova.


Nesse sentido também é o posicionamento de Antonio Milton de Barros (1996, p. 133). Segundo o autor, ao mesmo tempo em que o interrogatório surge como oportunidade para que o réu apresente a sua versão dos fatos, constitui também momento de produção de prova, uma vez que o acusado fornece através da sua fala dados para que o juiz afira a sua responsabilidade.


No entanto, o que se percebe, após a reforma processual penal, é que, conquanto o interrogatório continue sendo regulado na seção destinada às provas, não há como negar que o interrogatório adquiriu contornos ainda mais claros de meio de defesa. Isso porque agora tal ato se situa no final da fase instrutória, de modo a possibilitar que o acusado exerça a sua autodefesa de posse de todas as provas já apuradas, fornecendo, assim, versão coerente com os elementos já colhidos. Ainda que o réu venha a confessar a prática delitiva, a sua declaração somente poderá ser considerada como prova se confirmada por outros dados dentro do conjunto probatório. Nesse sentido se manifesta Nereu José Giacomolli (2008, p. 69):


“A disposição importante e acolhedora da tese de que o interrogatório integra a garantia da ampla defesa, na modalidade de defesa pessoal ou autodefesa, é a que determina a sua realização como último ato da audiência, após a colheita de toda a prova, derradeira oportunidade ao exercício da defesa pessoal antes do veredicto do magistrado de primeiro grau”.


Na mesma esteira é a conclusão do autor Andrey Borges de Mendonça (2008, p. 294), que, ao abordar as mudanças no Código de Processo Penal trazidas pela novel reforma, esclarece:


“[…] por fim, será realizado o interrogatório do acusado, após toda a produção da prova. O fato de o legislador ter colocado o interrogatório apenas no final demonstra que este é visto como meio de defesa (embora eventualmente possa ser, também, meio de prova, em caso de confissão).”


Com efeito, nota-se que a reforma do Código de Processo Penal evidenciou a intenção do legislador de fazer do interrogatório um ato de concretização da autodefesa. Consoante afirma Walter Nunes da Silva Jr. (2009, p. 134):


“Como se vê, agora, sim, o ordenamento jurídico infraconstitucional está dando ao interrogatório o efetivo tratamento de direito de defesa, permitindo, que o acusado, ao exercer o direito de ser ouvido pelo juiz, possa reportar-se a todas as provas apuradas contra si e contraditá-las”.


Ademais, na esteira das mudanças recentemente realizadas no Código de Processo Penal no que tange ao interrogatório, convém mencionar a lei 11.900, de 08 de janeiro de 2009, que trouxe a possibilidade de se realizar, dentre outros atos instrutórios, a inquirição do réu por meio de videoconferência. Apesar de haver controvérsia doutrinária no que diz respeito à violação da ampla defesa do acusado em virtude da realização do interrogatório por meio desse novo método, não há que se falar em modificação da natureza jurídica deste instituto, pois a lei continua a considerá-lo meio de defesa; ele continua sendo o derradeiro dos momentos instrutórios, com os mesmos direitos garantidos constitucionalmente ao acusado que presta depoimento estando fisicamente na presença do juiz, como o direito ao silêncio, ao contraditório, à audiência e à prévia consulta com seu defensor. Nesse sentido é o posicionamento de Walter Nunes da Silva Jr. (2009, p. 145):


“O interrogatório por videoconferência é um grande avanço no sistema processual penal e compreende um dos passos necessários à informatização do processo, conforme a Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. Não se diga que a videoconferência ofende os princípios da ampla defesa e do contraditório. Basta que algumas cautelas para a maior transparência da realização do ato processual sejam tomadas, as quais, é verdade, devem ser estabelecidas em lei, a fim de evitar que não sejam dadas as devidas garantias ao acusado. A tecnologia utilizada para alguns interrogatórios feitos por essa via permite o contato privativo – em linha exclusiva e criptografada – entre o acusado e seu defensor, sendo assegurada a presença do advogado ao lado de seu cliente.”


Além disso, não se pode olvidar que se trata de medida excepcional, devendo o juiz fundamentar a sua decisão com base em um dos incisos do §2º do art. 185 do Código de Processo Penal, de forma que a regra geral continua sendo a ouvida do acusado presente em audiência. O interrogatório por videoconferência, portanto, não altera a natureza jurídica do ato em apreço, nem tampouco fere a ampla defesa do acusado (GOMES, 2009-b, p. 30).


Assim, percebe-se que as mudanças estabelecidas nos procedimentos criminais pela reforma processual penal vêm reforçar os argumentos já aventados pelos defensores da corrente que propugna ser o interrogatório preponderantemente meio de defesa, de forma a robustecer tal entendimento, especialmente tendo em vista a nova posição da realização do ato dentro do procedimento criminal, qual seja, após a colheita das provas. Por tais motivos é que não restam dúvidas de que o interrogatório é momento de efetivação da autodefesa do acusado, podendo, entretanto, configurar, ainda que eventualmente, momento de obtenção de elementos probatórios, sendo, assim, apenas subsidiariamente considerado fonte de prova.


3. O NOVO PROCEDIMENTO E O “NOVO” PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA


Outro ponto que merece ser analisado é o instituto da prisão preventiva. Isso porque a reforma processual alterou também os prazos de duração das fases investigatória e processual, de forma a retirar o alicerce do entendimento jurisprudencial fixado a respeito do prazo razoável da segregação preventiva, deixando uma lacuna quanto a esse quesito.


Os fundamentos da prisão preventiva estão devidamente previstos no art. 312 do Código de Processo Penal. Entretanto, situação diversa ocorre quanto ao prazo dessa medida cautelar. Segundo Aury Lopes Jr. (2004, p. 41), ao analisar a duração do processo, “no Brasil, a situação é gravíssima. […] sequer existe limite de duração das prisões cautelares, especialmente a prisão preventiva, mais abrangente de todas”.


Diante de tal omissão legislativa, passou-se a entender pela aplicabilidade de um prazo de oitenta e um dias[4] como limite à prisão preventiva, tendo tal limite temporal surgido a partir da Lei 9.034/95, conhecida como a Lei dos Crimes Organizados, mais tarde alterada pela Lei nº. 9303 de 1996, a qual trouxe regramento considerado “a consagração legislativa do critério jurisprudencial dos 81 dias” (LOPES JR.; BADARÓ, 2009, p. 115). Em face dessa regra legal, passou a jurisprudência a entender que, se crimes graves – como é o caso dos crimes previstos na Lei 9.034/95 – previam o encarceramento do acusado por no máximo oitenta e um dias, então os delitos comuns previstos no Código Penal, processados através das regras do Código de Processo Penal, não poderiam prever medida cautelar pessoal mais prolongada e gravosa.


Com o mesmo objetivo de sanar a omissão legislativa, o Superior Tribunal de Justiça consolidou seu entendimento sobre o tema através de súmulas[5], todas no intuito de afastar argumentos sobre o excesso de prazo no processo penal.


Tais súmulas corroboraram os entendimentos jurisprudenciais que passaram a admitir exceções ao limite de oitenta e um dias, tornando-se tal prazo “somente um marco para a verificação do excesso. A sua superação não traduzia necessariamente constrangimento ilegal, o qual deveria ser verificado em cada processo”. Todavia, apesar dessa indefinição do limite temporal da prisão cautelar preventiva antes da reforma processual advinda, é inegável que os oitenta e um dias eram utilizados, ainda que superficialmente, como forma de aferição do excesso de prazo da medida e conseqüente constatação de constrangimento ilegal do acusado. Dessa forma, havia pelo menos um parâmetro anterior para decretação do prazo razoável da medida cautelar pessoal preventiva.


Atualmente, com a reforma do Código processual penal pátrio, parece fixar-se novamente o vácuo quanto ao tempo da prisão preventiva, pois o procedimento penal foi alterado, tornando-se mais enxuto, concentrado, não podendo mais, portanto, ser utilizado o mesmo prazo construído através de limites temporais antigos e não mais aplicáveis. Os oitenta e um dias que antes eram usados como parâmetro para reflexão sobre o excesso de prazo daquela medida cautelar, agora não mais podem ser considerados, acarretando, assim, a necessidade de se refletir criticamente sobre o prazo da prisão preventiva à luz do novo procedimento do CPP.


A reforma nos procedimentos penais advinda com as Leis 11.689/08 e 11.719/08 alteraram substancialmente os prazos no processo penal, repercutindo tal situação, obviamente, nos limites de tempo razoável da prisão preventiva. 


A Lei 11.689 de junho de 2008, referente ao procedimento do júri, o manteve com suas peculiaridades, definindo, porém, algumas modificações referentes aos prazos para cumprimento dos atos processuais. A que mais interessa para este trabalho é aquela prevista no novo art. 412 do CPP, o qual assevera que “o procedimento, na primeira fase, será concluído no prazo máximo de 90 (noventa) dias” (BRASIL, 2008). Apesar de inúmeras críticas quanto ao novo dispositivo legal, que não parece se coadunar com a realidade do Poder Judiciário, tal, por óbvio, altera o entendimento sobre o excesso de prazo da prisão preventiva daqueles acusados que estão encarcerados cautelarmente por cometimento de crimes dolosos contra a vida. Ora, como utilizar-se da regra dos 81 dias anteriormente vigente se o próprio CPP entende razoável a duração da instrução por 90 dias?


Consoante entendimento de Aury Lopes Jr. e Gustavo Badaró (2009, p. 155):


“Se o acusado estiver preso cautelarmente, e o iudicium accusationis não estiver concluído em 90 dias, estará configurado inegável constrangimento ilegal, devendo a prisão ser relaxada. A prisão será legal durante os 90 dias inicias. Após o nonagésimo dia, a prisão se torna ilegal e, toda e qualquer prisão ilegal deverá ser relaxada, nos termos do art. 5,inc. LXV, da Constituição.”


Quanto às alterações trazidas pela lei 11.719/08, relacionadas ao procedimento comum, também alterou os prazos para cumprimento dos atos processuais, como, por exemplo, existência de resposta escrita por parte do acusado em 10 (dez) dias, e, em especial, a regra estabelecida no art. 400, caput, do novo CPP, referente ao procedimento ordinário, a qual informa que “na audiência de instrução e julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias […]” (BRASIL, 2008).


Sobre tal dispositivo legal, Andrey Borges de Mendonça (2008, p. 288) entende que,


“[…] quando se tratar de réu preso, deverá, em princípio, ser observado, salvo se se tratar de atraso devidamente justificado pelas circunstâncias concretas do caso (necessidade de diligências, número de acusados, etc.), à luz do princípio da razoabilidade. Caso o excesso não seja razoável, caracterizará constrangimento ilegal, sanável pela via do habeas corpus.”


Assim, também parece ser impossível nesses casos o uso da regra dos oitenta e um dias para delimitar a razoabilidade da prisão preventiva do acusado. 


Quando da análise das Leis que alteraram o Código de Processo Penal, além de concluir-se pela impossibilidade de permanência do uso dos 81 dias como fixador de limite da prisão cautelar preventiva, percebe-se também que, apesar das inúmeras críticas já existentes há tempos sobre a omissão legislativa em fixar um prazo legal como sendo aquele razoável para a fixação da prisão preventiva, a reforma processual penal advinda novamente silenciou quanto a tal matéria, permanecendo a ausência de previsão legal sobre o tempo da prisão cautelar. 


Veja-se que os novos dispositivos legais do CPP acima ressaltados, que trazem parâmetros de duração do tempo da fase instrutória do processo, não estão ali previstos como prazos de limitação da prisão cautelar preventiva. Tal conclusão parece óbvia na medida em que a prisão preventiva pode, seguramente, ser mantida por mais tempo que a fase de instrução do processo, como se constata quando da análise dos prazos processuais ao longo de toda a persecução penal após a reforma do CPP:


“Seguindo-se o critério da soma dos prazos dos atos processuais, para a prática dos diversos atos do inquérito e do procedimento comum ordinário, até a sentença perfaz-se um total de 85 dias: Inquérito 10 dias (art. 10); denúncia 05 dias (art. 46);defesa preliminar 10 dias (art. 396); audiência de instrução e julgamento 60 dias (art. 400, caput); soma 85 dias. No caso de interrupção da audiência, pela complexidade do caso, a tal prazo de 85 dias, devem ser somados mais 30 dias, perfazendo um total de 115 dias: Alegações das partes: 10 dias (art. 404, par. Único), sentença: 20 dias (art. 404, par. Único, c/c art. 800, §3º), soma: 115 dias. Finalmente, caso a audiência tenha sido interrompida pela necessidade de realização de diligências complementares ao prazo de 115 dias, devem ser somados 5 dias, perfazendo um total de 120 dias” (LOPES JR.;BADARÓ, 2009,p. 146).


Nesse sentido, tem-se a análise de Guilherme de Souza Nucci (2008, p. 603) que, verificando as reformas do CPP, afirma que,


“[…] inexiste em lei, um prazo determinado para sua duração (da prisão preventiva) […]. A regra é que perdure, até quando seja necessário, durante a instrução, não podendo, é lógico, ultrapassar eventual decisão absolutória […] bem como o trânsito em julgado da decisão condenatória […]. Torna-se muito importante, entretanto, respeitar a razoabilidade de sua duração, não podendo transpor os limites do bom senso e da necessidade efetiva para instrução do feito.”


Assim, com o advento da reforma processual, além da percepção de que permanece o processo penal sem um limite legal para a medida cautelar preventiva, constata-se também que os entendimentos anteriores à reforma não podem mais ser considerados como limitadores de tal medida, haja vista as alterações ocorridas nos procedimentos, que necessariamente alteraram os prazos existentes no Processo Penal brasileiro.


Com a reiterada omissão legislativa no que diz respeito à fixação do tempo da prisão preventiva e a ausência de entendimento atual sobre os parâmetros de limitação do tempo dessa medida, parece óbvio que a garantia de um prazo razoável de tal prisão cautelar merece uma melhor análise, pois:


“O processo não pode se transformar numa pena antecipada. Todo réu presumido inocente tem direito de ser julgado em prazo razoável. Não é razoável ficar três anos, aguardando um julgamento. Beccaria, em 1764, já se insurgia calorosamente contra o cruel tormento da incerteza, afirmando que “o cidadão detido só deve ficar na prisão o tempo necessário para a instrução do processo” (GOMES;MOLINA;BIANCHINI, 2007, p. 270).


Ainda, quanto ao tempo das prisões cautelares, entende-se que estas “devem durar um prazo razoável para a necessária maturação e cognição, mas sem excessos, pois o grande prejudicado é o réu, aquele submetido ao ritual degradante e à angústia prolongada da situação de pendência” (CRUZ, 2006, p. 174). Quanto ao Prazo Razoável, a Emenda Constitucional nº. 45 acrescentou formalmente ao inciso LXXVIII do art. 5º da Carta Magna[6] “o direito a uma duração razoável do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação entre os direitos e garantias fundamentais constitucionais[7]” (DIAS, 2007, p. 235).


Apesar, portanto, da referência constitucional ser direcionada para a duração processual como um todo, assevera Rogério Machado Cruz (2006, p. 107) que através desse preceito pode-se concluir acerca da garantia de que,


“[…] ninguém possa ser mantido preso, durante o processo, além do prazo razoável, seja ele definido em lei, seja ele alcançado por critério de ponderação dos interesses postos em confronto dialético. É dizer, todos têm o direito de ser julgado em prazo razoável e também o direito de não serem mantidos presos por prazo irrazoável”.


Segundo leciona Bárbara Sordi Stock (2006, p. 148), a legislação brasileira não prevê limite temporal à duração do processo penal[8], tampouco as Cortes Internacionais, situação que dificulta a definição de “prazo razoável”. Entretanto, essa ausência de fixação legal acerca dos prazos máximos para duração do processo e da medida cautelar preventiva no ordenamento jurídico brasileiro surge em decorrência da opção do legislador de utilizar-se da “doutrina do não-prazo”, também utilizada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos e Convenção Americana de Direitos Humanos (LOPES JR. 2007, p. 153). Por tal entendimento,


“[…] considera-se como ilegítimo qualquer movimento legislativo que, a priori, tente fixar o limite de extensão temporal do processo, sob pena de desprezar-se as circunstâncias do cotidiano que, em sua inteireza, não são passíveis de previsão e tratamento pelo ordenador normativo” (GOMES, 2007, p. 84).


Na opinião de Aury Lopes Jr. e Gustavo Badaró (2009, p. 41), tal doutrina “deixa amplo espaço discricionário para avaliação segundo as circunstâncias do caso e o sentir do julgador”. A partir dessa doutrina, passou-se a se analisar alguns critérios para aferição da razoabilidade da prisão cautelar, haja vista inexistência de previsão legal. Inicialmente, Em 27 de junho de 1968, o Tribunal Europeu de Direitos Humanos decidiu um dos primeiros casos fáticos, conhecido como caso “Wemhoff” em que se discutiu o que se deveria entender por razoabilidade da prisão cautelar, tendo se utilizado, na ocasião, a “teoria dos três critérios”, a saber: “a) complexidade do caso[9]; b) a atividade processual do interessado (imputado)[10]; c) a conduta das autoridades judiciárias[11]”(LOPES JR.;BADARÓ,2009,p.40).


Segundo os autores, tais critérios “têm sido sistematicamente invocados, tanto pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos[12], como também pela Corte Interamericana de Direitos Humanos” (LOPES JR.; BADARÓ, 2009, p. 41). Dessa forma, desrespeitando-se esses três critérios, estar-se-ia diante de uma dilação indevida do processo.


A reforma processual penal advinda em agosto de 2008 permaneceu utilizando-se do critério do não-prazo, omitindo-se em relação à fixação de limites para o tempo da prisão cautelar preventiva. A decisão do legislador em não delimitar prazos legais para o tempo de duração da prisão preventiva vai ao encontro da doutrina que entende pela desnecessidade desse marco legal.


A indeterminação do tempo da prisão cautelar pessoal preventiva, mesmo após a reforma do CPP, corrobora a necessidade de utilização do princípio da Razoabilidade como fator determinante para estabelecer os contornos de duração daquela medida. Conforme já verificado neste trabalho, atualmente não há qualquer critério para limitar o tempo da medida cautelar, havendo a imperiosidade de análise da razoabilidade como fixador do prazo máximo de duração da prisão preventiva e conseqüente verificação de constrangimento ilegal em face do acusado encarcerado.


Verificando a necessidade de análise do Princípio da Razoabilidade frente a qualquer situação fática que envolva a prisão cautelar do indivíduo, parece claro que a partir da reforma do Código de Processo penal, omissão do legislador em tomar para si a responsabilidade de determinar o prazo da medida cautelar com a reforma processual e sucessiva queda da doutrina dos 81 dias, o princípio constitucional recebe um status ainda maior, deixando de ser apenas um norteador das decisões jurisprudenciais e passando a ser o único meio de fixação do tempo da prisão preventiva e delimitação do excesso de prazo de tal medida, sendo a melhor forma de coadunar a regra processual penal com os preceitos e garantias constitucionais.


4. A REGULAMENTAÇÃO LEGAL DAS PROVAS ILÍCITAS


Por fim, insta tecer algumas observações quanto à regulamentação infraconstitucional das provas ilícitas, introduzida no Código de Processo Penal pela lei 11.690/2008.


A nova redação do art. 157 do Código de Processo Penal preceitua serem ilícitas todas as provas “obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”. A doutrina, antes mesmo de haver previsão constitucional quanto à proibição de tais provas, já costumava identificar como suas sub-espécies a prova ilegítima e a prova ilegal (ou ilícita em sentido estrito). A primeira era resultante do desrespeito a normas procedimentais; a segunda, da violação de regras de cunho material (GOMES FILHO, 2009, p. 265-266). Antônio Magalhães Gomes Filho (2009, p. 266) ressalta que:


“Outra diferença entre elas decorre do momento em que se configura a ilegalidade: nas ilícitas, ela ocorre quando da sua obtenção; nas ilegítimas, na fase de produção. Também é diversa a consequência dos respectivos vícios: as ilícitas são inadmissíveis no processo (não podem ingressar e, se isso ocorre, devem ser desentranhadas); as ilegítimas são nulas e, por isso, a sua produção pode ser renovada, atendendo-se então às regras processuais pertinentes.”


Maria Elizabeth Queijo (2003, p. 377-378) salienta, outrossim, que há dois aspectos que devem ser considerados relativamente ao tema ora tratado: o primeiro, de natureza material, diz respeito à produção da prova, isto é, à “individualização do ato ilícito”; o segundo, processual, refere-se à admissibilidade da prova e à sua utilização e valoração dentro do processo.


A importância de se considerar esses dois aspectos consiste no fato de que anteriormente havia dois entendimentos[13] quanto às consequências da produção de uma prova por meios ilícitos: alguns doutrinadores entendiam que o aspecto material não influenciava o processual, de modo que as evidências colhidas deveriam sempre ser aceitas no processo, não importando o modo pelo qual se deu a sua obtenção. A responsabilização por eventual desrespeito a direitos ou formalidades na produção de provas seria diretamente aplicada ao seu infrator, através da imposição de sanção administrativa, civil e penal (QUEIJO, 2003, p. 379).


De outra banda, havia quem sustentasse que provas colhidas por meios ilícitos não poderiam ser admitidas dentro do processo, pois “mesmo que fossem punidos os autores das infrações, não seria adequado que o Estado, que objetiva combater os ilícitos, deles se beneficiasse, utilizando a prova ilícita” (QUEIJO, 2003, p. 379). Na jurisprudência brasileira, como bem ressalta a autora, o entendimento inicial dos Tribunais era pela aceitação no processo de provas obtidas por meios ilícitos. Posteriormente, contudo, passou-se a entender pela inadmissibilidade de tais provas (QUEIJO, 2003, p. 390). 


A vedação à admissibilidade de provas ilícitas no processo surgiu expressamente na legislação brasileira com a Constituição Federal de 1988, sendo elencada como direito fundamental, no art. 5º, inciso LVI. Até então, a questão da (in)admissibilidade de provas obtidas por meios ilegais ou ilegítimos era discutida apenas doutrinariamente e em âmbito jurisprudencial, através da aplicação de teorias desenvolvidas principalmente no direito americano e alemão (SILVA JR., 2009, p. 171).


Nos Estados Unidos, desenvolveu-se a tese da inadmissibilidade das provas produzidas por meios ilícitos (exclusionary rules) a partir do julgamento do caso Boyd vs. US, no ano de 1886, no qual se sustentou que a teoria estaria implícita na Constituição Americana, pois se presta à proteção dos direitos fundamentais ali declinados. Por tal motivo, a Corte Suprema argumentou que, havendo a violação simultânea da Quarta e Quinta Emendas à Constituição, que se referem respectivamente à segurança do indivíduo e de seus bens contra apreensões arbitrárias e à garantia contra a auto incriminação, na busca de provas, estas não poderiam ser admitidas dentro do processo (SILVA JR. 2009, p. 171).


 Tempos depois, no ano de 1920, em outro caso emblemático dentro do tema, conhecido como Silverthone Lumber Co vs. US, fixou-se na jurisprudência americana o entendimento de que não só as provas obtidas por meios ilícitos não poderiam ser utilizadas em processos judiciais como também aquelas cuja descoberta resultasse da obtenção das primeiras. Trata-se da teoria que ficou conhecida como fruits of the poisonous tree – frutos da árvore envenenada –, na qual se inadmite também as provas derivadas das ilicitamente produzidas (SILVA JR. 2009, p. 171). Frise-se, contudo, que ambas as teorias de exclusão admitem exceções; há casos em que a prova, ainda que derivada de prova ilícita, poderá entrar no processo:


“(…) excepcionam-se da vedação probatória as provas derivadas da ilícita, quando a conexão entre umas e outras é tênue, de modo a não se colocarem a primária e as secundárias como causa e efeito; ou, ainda, quando as provas derivadas da ilícita poderiam de qualquer modo ser descobertas por outra maneira. Fala-se, no primeiro caso, em independent source e, no segundo, na inevitable discovery. Isso significa que, se a prova ilícita não foi absolutamente determinante para o descobrimento das derivadas,ou se estas derivam de fonte própria, não ficam contaminadas e podem ser produzidas em juízo” (grifo dos autores – GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2007, p.163).


As exclusionary rules passaram a ser aplicadas também na Justiça alemã, através da tese das Beweisverbote – proibição de provas –, em que a inadmissibilidade de provas ilícitas no processo resulta do entendimento de que “(…) as limitações ou obstáculos à produção das provas, em verdade, são normas processuais impostas como forma de preservar os direitos subjetivos fundamentais encartados no ordenamento jurídico” (SILVA JR., 2009, p. 171).  Maria Elizabeth Queijo (2003, p. 381) salienta que, no sistema jurídico alemão, assim como no americano, a inadmissibilidade de provas ilícitas se refere apenas àquelas produzidas ao arrepio de direitos constitucionais.


Contudo, no sistema alemão, a tese desenvolvida para amenizar a Beweisverbote foi a teoria da proporcionalidade, na qual são sopesados, em cada caso, o grau e extensão da violação ao direito individual e o dano que poderá advir da não aceitação da prova ilícita, “evitando-se solução desproporcional e inaceitável” (QUEIJO, 2003, p. 382-383). Nesse mesmo sentido a lição de Walter Nunes da Silva Júnior (2009, p. 200):


“O princípio da proporcionalidade foi construído na doutrina e jurisprudência alemãs, possuindo ampla aceitação no Direito europeu continental. Quanto ao tema da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilícitos, que, na dogmática alemã, segue o regime das Beweisverbote, o Tribunal Constitucional Federal do referido país (…) adota, em sua linha argumentativa, duas vertentes, pondo, de um lado, o paradigma da preservação dos direitos da personalidade (direitos fundamentais) e, do outro, recorre ao princípio da proporcionalidade,a fim de fazer a ponderação de interesses e, com isso, conceber a legitimação da prova, sacrificando, assim, na hipótese, o bem jurídico do acusado” (grifos do autor).


Como bem ressalta Walter Nunes da Silva Júnior (2009, p. 174-176), a jurisprudência pátria, que em um primeiro momento aceitava no processo provas ilicitamente obtidas em prol da busca da verdade, passou, paulatinamente, a rejeitá-las, aceitando-as eventualmente, contudo, em face da aplicação do princípio da proporcionalidade. Inspirando-se no direito comparado, os Tribunais passaram a entender também inaceitáveis as provas derivadas das ilícitas, uma vez que a violação de direitos fundamentais não poderia resultar em um benefício ao Estado na persecução criminal (QUEIJO, 2003, p. 379).


Com o advento da Constituição Federal em 1988, consolidou-se o posicionamento já dominante na jurisprudência e doutrina brasileiras quanto à inadmissibilidade das provas ilícitas, assim entendidas tanto as ilegais quanto as processualmente ilegítimas, sendo-lhes aplicada a sanção de invalidade (GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2007, p. 166-167).


Lastreado na Carta Magna, o Supremo Tribunal Federal assentou seu entendimento de que não seria pertinente ao sistema jurídico pátrio a aplicação do princípio da proporcionalidade, pois a vedação de provas ilícitas constitui direito fundamental. Todavia, considerando-se que não há hierarquia entre os direitos fundamentais (SILVA JR., 2009, 174), admite-se a atenuação da inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos quando estas forem pro reo, uma vez que é levado em conta, aqui, o direito de defesa, o qual também é fundamental e se coaduna perfeitamente com o princípio processual penal do favor rei (QUEIJO, 2003, p. 383).


Ademais, também se argumenta que, em se tratando de prova diretamente colhida pelo acusado, seria possível a sua admissão em razão da excludente de ilicitude da legítima defesa (GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2007, p. 162). Nesse ponto, cumpre transcrever a ilação destes autores:


“Pensamos que, nesses casos (admissibilidade da prova ilícita que beneficie a defesa, eventual adoção do princípio da proporcionalidade e vícios da prova regular derivada da ilicitamente obtida), a Constituição brasileira não afasta radicalmente nenhuma tendência; e isto porque, como já dito (…), os direitos e garantias fundamentais não podem ser entendidos em sentido absoluto, em face da natural restrição resultante do princípio de sua convivência, que exige a interpretação harmônica e global das liberdades constitucionais” (GRINOVER; FERNANDES; GOMES FILHO, 2007, p. 170).


Com a reforma do Código de Processo Penal houve mudanças significativas no campo da prova ilícita, demonstrando claramente a intenção do legislador em disciplinar a matéria baseando-se nas diretrizes estabelecidas pela jurisprudência e em consonância com a determinação constitucional. O caput do art. 157 do mencionado diploma traz, agora, uma definição do que se deva entender por provas ilícitas, unindo, sob este conceito, as provas ilegítimas e as ilegais. Nesse ponto, Antônio Magalhães Gomes Filho (2009, p. 266) refere não ter sido essa decisão a mais acertada, porquanto desconsidera que as ilegítimas, por desrespeitarem a forma, são nulas e podem, por isso mesmo, serem refeitas.


Outrossim, a lei 11.690/08 acrescentou ao dispositivo aludido três parágrafos. O primeiro deles traz em seu bojo a inadmissibilidade das provas derivadas das ilícitas, contemplando a teoria americana dos frutos da árvore envenenada, bem como duas das exceções a essa tese. Assim, não se considerará maculada a prova derivada “quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras”.


O §2º do art. 157, por sua vez, cuida da definição de fonte independente. Entretanto, salienta Antônio Magalhães Gomes Filho (2009, p. 268-269) que a descrição foi infeliz, uma vez que o legislador confundiu os conceitos de fonte independente e descoberta inevitável, caracterizando o primeiro com a definição do segundo. Nesse contexto, oportuna a lição do autor:


“Os fundamentos dessas duas exceções à contaminação da prova são evidentemente diversos: na hipótese de haver uma fonte independente, a prova derivada tem concretamente duas origens – uma ilícita e outra lícita –, de tal modo que, ainda que suprimida a fonte ilegal, o dado probatório trazido ao processo subsiste, e, por isso, pode ser validamente utilizado. Já na situação de descoberta inevitável, a prova tem efetivamente uma origem ilícita, mas as circunstâncias do caso permitem considerar, por hipótese, que seria inevitavelmente obtida, mesmo se suprimida a fonte ilícita.”


Assim, verifica-se que, pela redação dada ao artigo, está-se a falar de fato de descoberta inevitável, porquanto menciona-se a mera possibilidade de que, retirada a prova ilícita, encontrar-se-ia a prova derivada, por outros meios. Por tal motivo, o autor defende a inconstitucionalidade desse dispositivo, haja vista que, da forma como foi escrito, dá oportunidade de convalidar toda e qualquer prova derivada, “o que subverte não só aquela idéia original, mas também coloca em risco a própria finalidade da vedação constitucional” (GOMES FILHO, 2009, p. 269).


Contudo, por toda a evolução jurisprudencial no tema das provas ilícitas, acredita-se que tal situação não ocorrerá. Por certo que houve um equívoco na redação do artigo, mas, tendo em vista que se trata o Código de Processo Penal de legislação infraconstitucional, há que se o interpretar conforme a Constituição Federal. Assim o fazendo, não há riscos de se retorcer a vedação constitucional às provas ilícitas. Até porque mesmo no caso da descoberta inevitável há que se considerar que, pelas peculiaridades do caso concreto, seria aquela prova cuja obtenção se deu por meio de outra ilícita invariavelmente encontrada.


Vale mencionar que o fato de estarem previstas apenas essas exceções à exclusão das provas ilícitas por derivação não impede que a jurisprudência reconheça outras no caso concreto (SILVA JR. 2009, p. 184).


Derradeiramente, a disposição legal do §3º do art. 157, que faz menção à inutilização das provas declaradas ilícitas por decisão judicial preclusa, também tem sofrido críticas por parte dos doutrinadores. Isso porque, considerando que muitas vezes a prova ilícita foi colhida com violação de direitos e garantias fundamentais do acusado, a legislação em comento desconsiderou que tal prova poderá ser utilizada dentro de procedimento judicial que vise a responsabilizar aqueles que a colheram. Há também a hipótese de essa prova vir a ser admitida pro reo em outro processo, como, por exemplo, em uma revisão criminal, de modo que o arquivamento sigiloso em cartório teria sido uma opção mais razoável (GOMES FILHO, 2009, p. 270-271).


Com efeito, tendo em vista que alguns Tribunais têm admitido a aplicação do princípio da proporcionalidade quando a prova colhida ilicitamente for benéfica ao réu, realmente a previsão de destruição da prova não é a mais condizente com o sistema processual brasileiro.


5. CONCLUSÃO


A reforma processual penal trouxe ao ordenamento jurídico repercussões bastante expressivas no intuito de coadunar os preceitos constitucionais de garantias e respeito ao acusado às regras da persecução penal. Nesse sentido, o legislador finalmente asseverou o que já havia sido pacificado pela jurisprudência acerca da natureza do interrogatório, tornando-o efetivamente um meio de defesa, o que restou evidente pela mudança no momento da sua realização.


Ainda, as alterações repercutiram diretamente no prazo da prisão preventiva, já que, com novos prazos para duração da instrução criminal, o tempo da medida cautelar não mais pode ser atrelado àqueles limites temporais antigos do CPP, não havendo mais que se falar em excesso de prazo após o período de oitenta e um dias, que fora estipulado através de construção jurisprudencial baseada nos procedimentos da Lei de Ritos de 1940. Apesar das alterações trazidas pelo CPP, o legislador mais uma vez se omitiu quanto à fixação de uma regra legal que determinasse de forma objetiva o tempo razoável daquela medida cautelar. Diante dessa “lacuna” legal, o Princípio da Razoabilidade resta como parâmetro para fixação do tempo da medida cautelar preventiva, tendo o intuito de trazer a ela contornos objetivos para determinar possível excesso de prazo.


No que se refere às provas ilícitas, demonstrou-se claramente a intenção do legislador em disciplinar a matéria baseando-se nas diretrizes estabelecidas pela jurisprudência, em consonância com a determinação constitucional e legislação alienígena, trazendo para o Código de Processo Penal regramento sobre o tema e adequando-o à Constituição Federal.


 


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Notas:

1 Já em 1995, Ada Pelegrini Grinover (1995, p. 214) alertava que reformas eram necessárias para transformar o processo penal, de um mecanismo desacreditado, em instrumento eficaz de realização de justiça”. Ainda, ressalta-se que a necessidade das reformas processuais evidenciou-se, primordialmente, pelo descompasso existente entre a codificação processual e a Constituição Federal de 1988, que introduziu no sistema processual penal princípios e regras com as quais o Código processual de 1941 entrou em conflito, “de modo que muitas de suas normas perderam eficácia em face da nova ordem jurídica ou deviam ser interpretadas de modo diverso do tradicional, sob pena de não se coadunarem com a Constituição” (GRINOVER, 2002, p. 01).

[2] A autora Ada Pelegrini Grinover, que desde o início integrou a Comissão nomeada para apresentar as propostas de alteração do Código de Processo Penal brasileiro, destacou que a reforma total teria a seu favor a completa harmonia do novo sistema, entretanto que seria inexeqüível operacionalmente, asseverando que a morosidade própria da tramitação legislativa dos códigos, a dificuldade prática de o Congresso Nacional aprovar um estatuto inteiramente novo, os obstáculos à atividade legislativa do Parlamento militavam contra a idéia de uma reforma global (GRINOVER, 2001, p. 54).

[3] Nesse sentido, de grande valia a lição de Ada Pellegrini Grinover: “o réu, sujeito da defesa, não tem obrigação nem dever de fornecer elementos de prova que o prejudiquem. Pode calar-se ou até mentir. Ainda que se quisesse ver no interrogatório um meio de prova, só o seria em um sentido meramente eventual, em face da faculdade dada ao acusado de não responder. A autoridade judiciária não pode dispor do réu como meio de prova, diversamente do que ocorre com as testemunhas; deve respeitar sua liberdade, no sentido de defender-se como entender melhor, falando ou calando-se, e ainda advertindo-o da existência da faculdade de não responder” (GRINOVER apud MORAES; MOURA, 1994, p. 134).

[4] Doutrinadores, já na década de 80, explicavam que o prazo de oitenta e um dias anteriormente analisado era alcançado mediante a seguinte metodologia, embasada nos dispositivos do antigo Código de Processo Penal: Inquérito: 10 dias (art. 10 do CPP); denúncia: 5 dias (art. 46); defesa prévia: 3 dias (art. 395); inquirição de testemunhas: 20 dias (art. 401); requerimento de diligências: 2 dias (art. 499); para despacho do requerimento: 10 dias (art. 499); alegações das partes: 6 dias (art. 500); diligências ex officio: 5 dias (art. 502); sentença: 20 dias (art. 800); soma: 81 dias (SOUZA, 2005, s.p.).

[5] Súmula nº 21 do STJ: Com a pronúncia, resta superado o alegado constrangimento ilegal por excesso de prazo na instrução. Súmula n° 52 do STJ: Encerrada a instrução criminal, fica superada a alegação de constrangimento ilegal por excesso de prazo. Súmula nº 64 do STJ: Não há constrangimento ilegal por excesso de prazo se a demora, em feito complexo, decorre de requerimentos da própria defesa.

[6] A Constituição Federal assim estabelece: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” (BRASIL, 2007.). Para Robert Alexy (2008, p. 137), “a atribuição de princípios às disposições da Constituição tem relevância, sobretudo, para a questão de sua hierarquia constitucional”.

[7] Assevera-se que “embora o direito ao prazo razoável já fizesse parte do ordenamento jurídico interno, por força da convenção americana sobre direitos humanas de 1992, com o novo inc. LXVIII do art. 5º da Magna Carta, sobreleva o interessa pelo estudo da razoabilidade do prazo para o término do processo” (LOPES JR;BADARÓ, 2009, p. 44). 

[8] Apesar de ausência de previsão legal sobre o tempo da prisão cautelar na legislação brasileira, chama a atenção a Exposição de Motivos do CPP, o qual informa que “a duração da prisão provisória continua a ser condicionada, até o encerramento da instrução criminal, à efetividade dos atos processuais dentro dos respectivos prazos; mas estes são razoavelmente dilatados” (COUTINHO, 2007, p. 240).

[9] Sobre esse critério, entende-se ser possível estabelecer uma maior compreensão sobre esse conceito, abordando as seguintes questões: “1) quando requeira a atuação de uma quantidade significativa de atos de persecução/investigação; 2) quando compreenda a persecução/investigação de numerosos delitos; 3) quando envolva uma quantidade importante de imputados; 4) quando investiga delitos perpetrados por imputados ou colaboradores de grupos ou organizações criminosas; 5) quando demanda a realização de perícias que comportam uma revisão de uma nutrida documentação ou de complicadas análises técnicas; 6) quando necessita realizar atos de caráter processual fora do país; ou 7) quando deve revisar a gestão de pessoas jurídicas ou entidades do Estado (GOMES, 2007, p. 92). Ainda, entende-se que a complexidade pode ser de caráter objetivo e estrutural; a objetiva ocorre nos processos relativos a certos tipos de delitos, como os delitos econômicos ou falimentares, bem como em processos que necessitam de perícias ou carta precatórias. Já a complexidade estrutural ocorre em  processos com muitas partes e co-réus (LOPES JR.;BADARÓ, 2009, p. 72).

[10] Ressaltam Aury Lopes Jr. e Gustavo Badaró (2009, p. 63) que “o imputado não tem nenhum dever de contribuir ou colaborar para o célere tramite do processo. Nenhum prejuízo poderá advir-lhe da inércia processual, pois protegido pelo direito de silêncio e de não produzir prova contra si mesmo”.

[11] Segundo a doutrina, “o TEDH tem admitido que problemas conjunturais de um Estado possam levar a uma maior duração do processo (LOPES JR.;BADARÓ, 2009, p.72). Por isso, defendem os autores “a diminuição de tempo burocrático, através da inserção de tecnologia e da otimização de atos cartorários e mesmo judiciais”(LOPES JR.;BADARÓ, 2009, p.72).

[12] Segundo lição de Aury Lopes Jr. e Gustavo Badaró (2009, p. 41), nos últimos anos, o TEDH tem acrescentado em suas decisões que, “a duração prolongada da prisão cautelar somente estará justificada se houver uma real exigência do interesse público, que deve prevalecer sobre o direito de liberdade, não obstante a presunção de inocência”. 

[13] Walter Nunes da Silva Júnior (2009, p. 174) menciona a existência de uma terceira corrente, que admitiria a exclusão das provas que fossem adquiridas com a violação de direitos ou princípios expressos na Constituição somente.


Informações Sobre os Autores

Ana Carolina Mezzalira

Advogada; pesquisadora do Centro Universitário Franciscano (Unifra).

Emília Merlini Giuliani

Advogada


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