Alimentos entre os companheiros

Sumário: 1. Dissolução da união estável e seus efeitos. 2. Alimentos entre os companheiros. 3. Da culpa na dissolução como pressuposto para o dever alimentar. 4. Tempo do dever da prestação alimentícia. 5. Pressupostos legais para os alimentos. 6. Rito da ação de alimentos. 7. Alimentos provisórios e tutela antecipada; 8. Execução das prestações alimentícias. 9. Renúncia e dispensa dos alimentos. 10. Considerações finais.

I.
Dissolução da união estável e seus efeitos

Constitui-se união
estável a associação de pessoas de sexo oposto, que convivam duradoura, pública
e continuamente, com o objetivo de constituir familiar (CC, art. 1.723) e como
se casados fossem, sem sê-lo, contudo, de modo a emanarem, iguais e mutuamente,
direitos e deveres de respeito e consideração, assistência moral e material,
guarda, sustento e educação dos filhos comuns (Lei n. 9.278/96, art. 2º e
incisos). Fundamentalmente, deve-se levar em consideração o convívio em
aparência de casamento, excluindo deste instituto, portanto todos os
relacionamentos de enamorados, sem compromisso, ainda que extremamente
duradouro, ininterrupto e público ou ainda que tenham prole comum.
Extinguir-se-á, segundo a lei, pela morte de um dos conviventes ou pela
rescisão (tecnicamente, por dissolução).

Neste breve estudo, observaremos
problemáticas e lacunas havidas na legislação que rege o direito a alimentos
entre os companheiros, que nem mesmo o novel Código Civil logrará suprir.

A Lei n. 9.278/96 ao falar do fim
da união estável fê-lo como se tratasse de vínculo eminentemente contratual. É
o que nos permite defluir singela leitura do artigo 7º, quando dispôs: dissolvida a
união estável por rescisão”. Isso, porque, como de trivial sabença, rescisão é
instituto de rompimento de contrato. Seria, então, a natureza jurídica da união
estável, contratual? Cremos que não. Houve mesmo atecnia legislativa, que não é
raro. Ademais, tentou-se usar o termo rescisão como sinônimo de ruptura
amigável (ou judicial) da união estável, mas em verdade não foi esta a extensão
dada, pois se falava de alimentos entre os conviventes, e tais dependem do
elemento culpa (como adiante veremos). O termo rescisão, entretanto, deve ser
reservado “para os casos de dissolução judicial do vínculo contratual em que
houve lesão para uma das partes”, lembra-o Fortunato Azulay[1].

É mesmo caso de dissolução do contrato, operando-se a sua
resilição[2]. Trata-se de contrato
avençado por tempo indeterminado, pois assim o são as instituições que tais,
tendo por reforço ao pensamento a vetada disposição legal acerca da denúncia do
contrato por um dos conviventes (Lei n. 9.278/96, artigo 6º), cuja ruptura
abrupta e injustificada redunda em dever indenizatório (com o que pode-se
equiparar o dever de prestar alimentos). Ademais, o reconhecimento da união
estável e a sua extinção só produzirão efeitos depois da declaração judicial
(produz efeito “ex nunc”). Ou, conforme o caso, há resolução, de modo que o
contrato se dissolverá em razão da sua inexecução, ou de seu inadimplemento,
por uma das partes.

Mas não foi o único momento em que a lei tratou da matéria
como contrato. Fê-lo ainda nos vetados artigos 3º, 4º e 6º e no vigente artigo
5º. Aliás, não obstante o veto, pode-se mesmo constituir e extinguir a união
estável através de instrumento público, ou até mesmo particular, sendo
despiciendo o seu registro para surtir efeitos “inter partes”. De efeito, “o
contrato é um meio flexível para garantir os concubinos, nesse mar de incertezas
e de injustiças em que navegaram nossa doutrina e nossa jurisprudência…
Quanto ao veto, se tivesse nosso presidente o intuito de proibir essas
contratações, por completo, tê-lo-ia feito, expressamente. Ao invés, admite a
existência desse contrato escrito, na parte final do caput do art. 5º e de seu
§ 2º… Em verdade, não se cuidou de criar espécie de concubinato contratual,
pois todo ele nasce de um contrato verbal. O certo é que, não sendo escrito,
ele não tem o alcance de proteção de que muitos concubinos necessitam. O
contrato escrito dá, a quem quiser e tiver muitos interesses, a tranqüilidade
em seu relacionamento. Esse contrato já está arraigado no uso social,
principalmente quando existe, em jogo, patrimônio de alto valor”.[3]

No mais, sendo resolução o verbete correto para o caso “sub
studio”, então se deve comprovar culpa? Para Fortunato Azulay, “é irrelevante
para a resolução contratual que haja culpa ou não do devedor”.[4] Entretanto, culpa é
elemento indissociável da resolução contratual, porque aqui se fala em
inadimplemento e este só se verificará se houver culpa de um dos contratantes[5], temos que, ao menos no
tocante aos alimentos após a extinção da união estável, o elemento culpa é
imprescindível. O §3º do artigo 6º da Lei de União Estável cuidaria da rescisão
por violação dos deveres constantes dessa lei
e do contrato escrito, se existente esse. “Neste caso de rescisão,
tem-se em mira o inadimplemento culposo da regra legal ou contratada. Sim, porque
não há que se falar em rescisão, sem que exista a culpa do que a provocou. A
ausência desse parágrafo, assim, em nada altera a situação presente, pois os
deveres dos concubinos estão retratados na lei, ou poderá constar, também, com
outros, do contrato escrito. Havendo descumprimento culposo desses deveres,
está acarretada a ruptura da contratação, escrita ou verbal”.[6]

A Lei n. 8.971/94 ainda, no artigo 1º, verberou que os
companheiros podem se valer do disposto na Lei n. º 5.478/68. Esta lei dispõe
apenas sobre a ação de alimentos e dá outras providências. Quer dizer:
os critérios de direito material não atingem os conviventes? Não atingem porque
o próprio Estatuto dos Concubinos já trata do direito material, ao falar da
necessidade? Em verdade, o Estatuto dos Concubinos não trata essencialmente de
direito material, porque não repetiu as regras do Código Civil e, por ser norma
de caráter especial, afastaria as regras daquele. Entretanto, seguir esta linha
de pensamento eqüivaleria a deixar de lado os princípios, consagrados também no
novo Código Civil, acerca da reciprocidade (arts. 1.694 e 1.696), da
irrenunciabilidade (art. 1.707), da intransmissibilidade do direito e
transmissibilidade das prestações (art. 1.700), da alternatividade (arts. 1.696
a 1.698 403); além dos já conhecidos princípios da impenhorabilidade (art.
1.707), incompensabilidade (art. 1.707), da incessibilidade (art. 1.707) e
irrepetibilidade. Daí porque a módica assertiva do primeiro artigo da lei em
comento é de fácil correção, tratando-se, mais uma vez, de falta de técnica
legislativa. Outro não é o entendimento de Luiz Augusto Gomes Varjão:
“Conquanto se refira a um dos remédios processuais colocados à disposição do
alimentário, a norma institui direito material do ex-convivente à prestação
alimentar”.[7]

II. Alimentos entre os companheiros

Para o instituto da união estável,
paralelamente ao instituto da indenização por serviços domésticos, travou-se
celeuma doutrinária e jurisprudencial no sentido de se conceder alimentos ao
companheiro, quando findada a relação concubinária. Porém, não florescia
pretensão neste sentido, havendo falta de interesse processual e
impossibilidade jurídica do pedido. Arredava-se da esfera do artigo 226, § 3º,
da Constituição da República, a obrigação alimentar entre concubinos, pois tal
dispositivo cria função de assistência para o Estado e não para o companheiro
frente à companheira e vice-versa.

Ventilou-se muito no Tribunal de
São Paulo que, na conjuntura retratada pelo direito normativo à época (antes da
lei de 1994), aflorava-se juridicamente inviável pretensão desfraldada por
ex-concubina a fim de obter pensão alimentícia com fundamento na ruptura da
livre união concubinária acertada durante certo tempo. Isso em São Paulo, não
obstante as razões espelhadas em copioso Aresto do E. Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul[8],
sendo que a primeira concessão de alimentos – que se noticia – foi proferida
pelo E. Tribunal de Justiça fluminense[9].

Como bem lembrado por Luiz Augusto
Gomes Varjão, discutia-se também a obrigação de prestar alimentos assumida
contratualmente pelos concubinos, sem homologação judicial, quando então
poderia ser exigida em ação de cobrança sem o caráter de dívida alimentar.[10]

Enfim, doutrina e jurisprudência,
particularmente da Corte de São Paulo, não vacilaram em arredar da esfera do
citado artigo 226, § 3º, da Carta Magna a obrigação alimentar entre concubinos.
De fato, “o dispositivo cria função de assistência para o Estado, não para
o companheiro frente à companheira e vice-versa”.[11]

Muito caminhou o nosso Direito até
os dias que correm, desde a tênue defesa do concubinato, nos primórdios,
pretendendo alçar a mulher como mera vítima na irregular união, a proteger
tão-só os interesses do parceiro. Ulteriormente, por normas recentes,
variaram-se os direitos de aquinhoamento da mulher. Aparando as arestas,
teve-se que o fundamento central se cifrava na falta de texto expresso em lei
para amparar-se o intento alimentício.

Surrado o uso da condensação
jurídica, a apregoar que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei, no campo dos alimentos, imprescindível era mesmo tal
existência, precisamente[12].
Era a posição majoritária e de quase unanimidade nacional. E com razão. A
obrigação alimentar resulta da lei, da vontade das partes e do delito. Pondera
Paulo Lúcio Nogueira relembra: “A dívida de alimentos provém de várias fontes,
a saber: a) do parentesco (CC, art. 396); do casamento (CC, art. 233, IV); c)
de ato ilícito, em que o causador do dano fica obrigado a pensionar a vítima
(CC, art. 1.537, II); d) da união estável (art. 7º, caput, da Lei n. 9.276, de
10-5-96); e) de contrato entre concubinos com obrigação alimentar em escritura
pública (RJTJESP, 51:30)”.[13]

Resultantes da lei são os
alimentos devidos em razão de parentesco ou do casamento; voluntários são os
decorrentes de declaração de vontade “inter vivos” ou “mortis causa”; como
forma de ressarcimento do dano “ex delicto” são os alimentos previstos no
Código Civil. A obrigação reclamada, antes da lei regente, não se enquadrava em
nenhuma destas três hipóteses. Não eram casados, nem tinham grau de parentesco;
comumente nada havia de estipulação em seu favor (se tivesse lícito e possível
seria o pleito) e não era vítima de delito praticado pelo ex-concubino. Em
suma, direito algum lhe albergava.

Porém, atento à evolução
histórica, veio a lume a Lei n. 8.971, de 1994, dispondo, em seu artigo 1º, in verbis: “a companheira de um
homem solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo, que com ela viva
há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei
n. 5.478, de 25.7.68, enquanto não constituir nova união e desde que prove a
necessidade. Igual direito e nas mesmas condições é reconhecido ao companheiro
de mulher solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva”.
Seguiu-se depois a Lei n. 9.278/96, tratando da matéria no artigo 7º, porém,
diversamente da Lei anterior, esta referendava mais o direito substantivo que o
adjetivo.

Que se podiam pleitear alimentos,
depois de 1994, não se discutia mais. Porém, travou-se nova discussão: qualquer
concubino poderia valer-se daquela lei? Ventilou-se que o texto legal protegia
apenas o concubinato puro, ou simples. Disseram mesmo que estava excluído o
chamado concubinato adulterino, ou impuro, ou ao menos que de alguma forma
estivesse vinculado ao dever de fidelidade pelo casamento. Talvez por falha
legislativa houvessem mesmo sido sugeridas estas idéias, como também que para a
companheira não se exigia que fosse solteira, separada judicialmente,
divorciada ou viúva; mas sim, que o companheiro de quem se pretendia pleitear
alimentos fosse solteiro, separado judicialmente, divorciado ou viúvo
(fundava-se no art. 1º e seu P. único, da Lei 8.971/94).

Quanto à natureza do concubinato,
certamente deve ser puro. Não pode ser adulterino ou incestuoso, pois do
contrário se estaria premiando situações verificadas ao arrepio do primado da
legalidade. Não foi por outro motivo que a lei
arrolou o estado civil do alimentante. Por
identidade de razões, no atinente à situação da companheira, não
obstante a falha do legislador, entendemos que ela também deve ser solteira, separada judicialmente, divorciada ou viúva. Se algum dos
companheiros permanece casado, haverá
inobservância do artigo 1º da Lei nº 8.971, de 1994, sendo por isso inviável o
pleito[14].

E, não obstante o contido no artigo 1º, e
no seu P. único, da Lei nº 8.971/94, se o requerente casado está separado de
fato, quando da vigência da união estável, e preenchidos os demais requisitos,
pode-se conceder os alimentos em seu favor[15].

Relevante requisito, no nosso sentir, que se emerge do
art. 1º, da Lei nº 8.971/94, é que a companheira tenha vivido com o companheiro
“há mais de cinco anos” (o mesmo se diga em relação ao companheiro). A
convivência não basta ser estável, tem de ser no mínimo por cinco anos. Noutras
palavras, a Lei Federal nº 8.971, de 1994, exige, para o ajuizamento da ação de
alimentos, a comprovação da existência do concubinato à época de sua entrada em
vigor. Afastar-se-ia a necessidade de decurso de tempo, para os efeitos da lei
em comento, a existência de prole comum. É no mais o comando do mesmo artigo
1º. Do contrário, permitir-se-ia que, uma pessoa durante curto espaço de tempo,
entrelace-se em tantas quantas forem as uniões estáveis necessárias a lhe
conferir incontáveis direitos decorrentes deste instituto. Vulnerar-se-ia toda
uma segurança jurídica, paz social e, principalmente, os ditames axiológicos e
teleológicos do instituto, dado o caráter de entidade familiar sob o qual se
lhe fez repousar o pálio constitucional.

Acentue-se que, “é entendimento
pacífico na doutrina que o nascimento de filho comum torna dispensável o prazo
mínimo de duração da união, mas não a prova de sua estabilidade e seus demais
requisitos, isto é, inexistência de impedimentos matrimoniais, coabitação,
singularidade, publicidade e affectio
maritalis
. Não fosse assim, chegar-se-ia ao absurdo de se conceder pensão
alimentícia à mulher que tivesse mantido relações sexuais com um homem uma
única vez”.[16]  Francisco José Cahali pondera: “Nestas
condições, o nascimento de filho funciona exclusivamente como um evento
suficiente em si mesmo para dispensar  o
decurso de prazo de convivência fixado na norma, tempo este que seria
indispensável à produção dos seus efeitos, mas que não supre a necessidade de
comprovação da união estável”.[17]
No mesmo sentido a doutrina de Lia Palazzo Rodrigues[18],
J. M. Leoni Lopes de Oliveira[19];
Pestana de Aguiar[20],
Luiz Alberto D`Azevedo Aurvalle[21].

De todo modo, não obstante a
inexistência de equiparação do casamento à união estável para fim de direito
alimentar, porque o artigo 226, § 3º, da Constituição Federal não possui esse
alcance, tal direito aos companheiros ressoa indisputável, porque a Lei
8.971/94 introduziu o direito aos alimentos entre os conviventes, direito que
não se funda no jus sanguinis, nem
decorre de parentesco; resulta do dever de assistência material recíproca.

Porém, sobreveio a Lei n.
9.276/96, tratando igualmente da matéria no artigo 7º. Outra confusão se
instaurou, porque esta trouxe requisitos mais brandos para o surgimento do
direito a alimentos. Não houve mais referência ao estado civil dos conviventes,
à existência de prole comum ou à duração mínima dessa união, como também deixou
de explicitar se a convivência de fato à margem do casamento em vigor seria
protegida.

Quais das Leis então deve ser
aplicada? Sustentou-se que o disposto na Lei n. 8.971/94 restou absorvido pela
Lei n. 9.278/96, dada a maior amplitude desta; que, ante a incompatibilidade
entre o artigo 1º daquela lei com o artigo 7º desta, houve revogação da
legislação anterior[22];
que, com supedâneo no art. 2º, § 1º, última parte, da Lei de Introdução ao
Código Civil, ocorreu ab-rogação da Lei de 1994, pois a de 1996 regulou
inteiramente toda a matéria[23].

Washington de Barros Monteiro,
entretanto, entende que “A lei n. 9.278/96 não faz menção ao estado civil dos
concubinos. Nesse ponto, porém, tem aplicação a Lei n. 8.971/94, que, ao
reconhecer direitos sucessórios e alimentos entre os companheiros, determina
que sejam solteiros, separados judicialmente, divorciados ou viúvos. Não se
compadece com os objetivos da lei que pessoas casadas mantenham duas situações
familiares semelhantes e concomitantes, uma sob a proteção do casamento, outra
ao amparo da entidade familiar”.[24]

E continua o saudoso professor: “À
luz da Lei n. 9.278/96, não subsiste a exigência de filhos comuns, pois,
comprovada a união estável, em caso de rompimento, exsurge o direito a
alimentos, de acordo com as necessidades de quem os pleiteia”.[25]

Tendo-se em mira tais preciosas e
judiciosas ponderações, sem embargo dos doutos pensamentos contrários,
entendemos que a segunda lei (9.278/96) não revogou inteiramente a primeira, no
que concerne aos alimentos. O que fez foi apenas complementá-la. Ambas podem
conviver em perfeita harmonia, porque enquanto uma tratou essencialmente da
parte procedimental, da ação; a outra, tratou mais do direito material. A lei
nova que estabelece disposições gerais sobre determinada matéria, a par das já
existentes, não as revoga nem as modifica. O mesmo não se diga em relação ao
novo Código Civil que, nos artigos 1.723 “usque” 1.727 disciplinou a união
estável e, no artigo 1.694 tratou dos alimentos, devidos inclusive entre os
conviventes.

III. Da culpa na
dissolução como pressuposto para o dever alimentar

Conquanto ecoaram algumas vozes
sobre a desnecessidade de culpa pela dissolução da união estável, como
requisito do dever de prestar alimentos, temos que não vinga esta proposição.
Não basta apenas a necessidade de um e a possibilidade do outro. A hipótese
aventada como fim da união estável refere-se à dissolução, por resolução ou
resilição do contrato. Em casos que tais, mormente a resolução, haverá
necessidade de comprovar inadimplemento e, via oblíqua, busca do elemento
culpa. Só há inadimplemento se houver culpa.

Ademais, o novo Código Civil, no artigo 1.702,
insculpiu que na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e
desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz
fixar, obedecidos aos critérios estabelecidos no art. 1.694. E observou no caput do artigo 1.704 que se um dos
cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro
obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha
sido declarado culpado na ação de separação judicial. E o parágrafo único,
ressalvou que se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e
não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o
outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor
indispensável à sobrevivência.

Fê-lo, como se vê, em relação aos cônjuges, nada
dispondo quanto aos conviventes. Se nunca pôde equipará-los, também não poderá
agora. É dispositivo especial, ditado apenas para o cônjuge. Se pretendesse
falar sobre o companheiro, o teria feito, pois o Capítulo está disciplinando
alimentos, inclusive entre os companheiros (v. art. 1.694). Daí porque não
vinga estender direito a quem não tem.

Os conviventes devem alimentos
recíprocos por força do dever familiar. A hermenêutica autoriza defluir que os
conviventes podem pôr fim à união estável sem que se discuta culpa, sem cogitar
de causa. Em casos que tais, acordarão quanto aos alimentos e, em acordo,
certamente não se discute culpabilidade; não será imposição judicial. Nos
alimentos fixados judicialmente, porém, não basta a necessidade para que a
obrigação se ponha. O dever daí decorrente é totalmente compatível com a idéia
de culpa; e, se ambos os conviventes forem culpados, excluído fica, para ambos,
o direito à percepção de alimentos.

Álvaro Villaça Azevedo conclui:
“desse modo, durante a união, os concubinos devem-se, mutuamente, alimentos.
Após a ruptura da sociedade concubinária, serão eles devidos, se houver culpa,
devendo o culpado pagar ao inocente alimentos, se destes necessitar. É expresso
o art. 7º ao assentar que cuida de dissolução da união estável, por rescisão,
que não existe sem culpa.”[26]

É de Luiz Augusto Gomes Varjão a
perfeita síntese da necessidade de culpa, a qual peço vênia para trazer à
baila: “A obrigação entre os conviventes decorre do dever de assistência, que é
obrigação de fazer. Esse dever, após a dissolução da união estável,
transforma-se, em razão dos vínculos de socorro que é obrigação de dar. Não
pode exigir assistência material quem não foi solidário, isto é, na teve
responsabilidade mútua ou interesse recíproco”.

E arremata: “Dessa forma, somente
o convivente não culpado pela dissolução da união estável pode, em princípio,
reclamar do outro pensão alimentícia”.[27]

Poderíamos até mesmo emprestar a
tese da natureza indenizatória dos alimentos entre os cônjuges para reforçar a
necessidade de perquirição da culpa pela dissolução. Isso porque, a tendência
perpétua dos vínculos matrimoniais e convivenciais causam surpresa ao convivente
que, de inopino, vê obstada a assistência material recíproca; vê-se sozinho, no
mundo, tendo senão manter o mesmo padrão de vida até então mantida, ao menos se
adequar às suas possibilidades.

Com a extinção antecipada do dever
de socorro, mister a sua substituição (e não prolongamento, como disseram
alhures), porque o que antes era dever recíproco doravante passará a ser
exclusivo, como cominação imposta ao responsável pela dissolução que, em razão
de sua atitude, presume-se tenha programado a sua vida de molde suficiente a
não navegar à deriva pelas vicissitudes da Terra, o que não se pode dizer em
relação ao companheiro surpreendido.

Não fosse isso o bastante, se
houve culpa pela dissolução, certamente houve infringência de um dever legal.
Afrontando ao dever legal, nasce a responsabilidade civil, desembocando em
dever indenizatório. Daí porque, além de ser necessária a comprovação da culpa
do devedor, também deve ser demonstrada a ausência de culpa do credor.

IV. Tempo do dever da prestação alimentícia

Uma idéia é defendida pela
doutrina: a de que os alimentos devem ser fixados por um período de tempo
razoável para que o credor possa obter os meios para se manter; findo esse
tempo, os alimentos deixarão de ser devidos. Trataram da predeterminação do termo
final da obrigação alimentar. Outra corrente entende que, se o concubinato da
ex-mulher cessar, deve-se estabelecer a pensão alimentícia anteriormente devida[28].
Ambas, contudo, sem razão.

O que se pode fazer, e o fez o legislador, é
condicionar o direito à percepção dos alimentos ao período em que deles
necessitar e enquanto não constituir nova união (Lei n. 8.971/94, art.
1º).  Semelhante significado extrai-se do
artigo 1.708 do novo Código Civil, ao dispor que, com a união estável ou o
concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos e, se tiver
procedimento indigno em relação ao devedor (p. único).

Outrossim, cessada a nova união que deu causa ao
perdimento do direito alimentício decorrente da extinção da primeira união, não
se restaura tal direito[29].
Não se trata aqui da antiga discussão de renúncia ou dispensa dos alimentos,
porque não foi a vontade do credor-beneficiário que se operou, mas sim o
império da lei. Pensar em restabelecimento de direito feriria não apenas a
ética, a moral e os bons costumes, mas também preceitos jurídicos de
inarredável aplicabilidade. Injurídico, pois a lei fala que, com o casamento, a
união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos
(CC, art. 1.708) ou enquanto não constituir nova união (art. 1º da Lei n.
8.971/94).

Cumpre observar apenas que, o Estatuto dos
Concubinos fala em nova união (art. 1º da Lei n. 8.971/94). Mas que tipo de
nova união? Referia-se à estável ou à matrimonial? Ambas, certamente. Não se
mostra crível tenha o intérprete base científica para afirmar que, tratando-se
de lei regente de concubinato, apenas pretendeu referir-se às novas uniões não
matrimoniais. Entender assim eqüivale dizer: o credor receberá alimentos do
ex-companheiro, apenas porque se casou; e, depois, se este casamento se findar,
e do ex-cônjuge começar a perceber pensão alimentícia, poderá aquele antigo
credor ser contemplado com mais uma prestação. Acumular-se-ão os benefícios!
Isso é sofismar a ordem jurídica, situação de todo inadmissível.

Logo, o direito a percepção dos alimentos perdurará
enquanto deles necessitar, puder honrá-los o devedor e até que não haja o
credor constituído nova união, seja matrimonial ou não, quando então cessará
automática e definitivamente o direito à prestação alimentícia.

Extinguir-se-á o dever alimentar, enfim, pela morte
do alimentante ou do alimentário. Da pessoalidade da obrigação alimentícia
decorre a sua intransmissibilidade, o que a faz cessar com o passamento do
devedor. Do mesmo modo, o caráter personalíssimo do direito impõe seja extinta
a obrigação com a verificação do evento morte do credor. Veja-se a não
transmissibilidade da obrigação de prestar alimentos não se confunde com a
disposição legal de obrigatoriedade subsidiária, dos demais parentes que são chamados
a prestar alimentos, na falta ou impossibilidade dos mais próximos. De outra
banda, uma vez fixada a prestação alimentícia, esta (o crédito alimentar)
poderá ser transmitida, por sucessão, quando do passamento da pessoa que foi
judicialmente obrigada ao pagamento.

Neste sentido o artigo 1.700 do novel Código Civil,
ao dispor que a obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do
devedor. Possibilidade que não se verificava na vetusta Lei Substantiva; antes,
vedava-a expressamente no artigo 402, o que já vinha sendo tido como revogado
face ao artigo 23 da Lei n. 6.515, de 1977 (Lei de Divórcio), que determinava a
responsabilidade do espólio pelo pagamento das dívidas do falecido. Donde se
conclui que, uma vez fixado o valor devido a título de alimentos e, não tendo o
devedor honrado tempestivamente com sua obrigação, sobrevindo então o seu
falecimento, os débitos eventualmente deixados são transmitidos ao espólio. Não
é a obrigação alimentar que se transmite, porque esta se finda junto com a
existência do devedor; o que se transmite é dívida já constituída, as
prestações alimentícias atrasadas.

V. Pressupostos legais para os alimentos

Como se pode inferir do arcabouço
jurídico, contenta-se a norma com a existência da união estável e necessidade
do credor. É o artigo 1º da Lei n. 8.971/94. Mas não é só isso. Irrelevante se
mostrará a atual e indisputável necessidade do credor, se do outro lado não
houver relativa possibilidade do devedor. A lei, de hoje e de todos os tempos,
não quer o perecimento do credor de alimentos, certamente. Por outro lado,
também não deseja que o obrigado ao pagamento desfalque sua própria
subsistência, sofra e padeça por inanição. Exige-se equilíbrio, entre
necessidades e as possibilidades.

E a união estável há de ser, no mínimo, de cinco anos,
ou que tenha prole comum. As normas ulteriores não revogaram este preceito
legal, para as uniões que se lhe estão sujeitas. Quanto às que se constituírem
e se sujeitarem ao novo Código Civil, entretanto, não se indagará do elemento
temporal, pois tal não foi objeto de disposição do artigo 1.694 que facultou
aos parentes, cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que
necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive
para atender às necessidades de sua educação.

Não se deslembre que, relativamente à existência de
prole comum, esse só fato não é o bastante para qualificar o relacionamento
como união estável para efeito alimentar, posto imprescindível a comprovação
dos demais requisitos.

Outros tantos requisitos foram abordados no
decorrer do presente trabalho, como a ausência de culpa e a situação de pureza
da união estável, o que torna despiciendo trazer-lhes à baila novamente, sob
pena de se deixar repetitivo e enfadonho o estudo.

VI. Rito da
ação de alimentos

Em regra, seguirá o rito
ordinário. Embora tenha a Lei n. 8.971/94 logo no artigo 1º assegurado a adoção
do rito sumário da Lei 5.478/68, dificilmente será possível a sua aplicação. E
a razão é muito simples: é preciso da inicial constar ao menos pedido de
reconhecimento de união estável para, ao depois, proceder ao de alimentos. São
ações cumuladas de modo sucessivo[30]
e, a cumulação de pedidos aqui é daquelas que, só se conhecerá do subseqüente,
se proceder o antecedente. Ou seja, só poderá se
valer do procedimento sumário especial se houver prova da obrigação, que
decorre do reconhecimento e da dissolução da união estável. Impedem-no ainda a
necessidade de discussão acerca da culpa, o que não cabe nas estreitas vias do
procedimento adotado pela Lei de Alimentos.

Mas a impossibilidade da adoção do
rito sumário não é absoluta. Se houver provas bastantes e pré-constituídas da
obrigação alimentar, pode-se valer do procedimento sumário, inclusive pedindo
os alimentos provisórios. Tem de ser prova documental, como certidão de
casamento religioso, certidão de casamento de brasileiro celebrado no exterior,
adoção do patronímico do companheiro, contrato escrito de concubinato, acordo
extrajudicial de pensão alimentícia, contrato de locação, contrato de
sociedade, nota fiscal com o endereço do casal, requerimentos formulados em
juízo ou em repartições públicas, documentos expedidos pelos Poderes Públicos.[31]
No mais, volta-se ao rito ordinário.

VII. Alimentos provisórios e tutela
antecipada

Quem
estiver pleiteando alimentos no início da lide e sem audiência da parte
contrária, deverá apresentar prova pré‑constituída da obrigação
alimentar. Se a união estável não estiver comprovada, ou a culpa do eleito
devedor, deve o Juízo promover a instrução para caracterização do fato e não
indeferir a inicial e remeter o requerente para as vias ordinárias.[32]

Isso
porque, sem embargo do que preceitua a Lei nº 5.478/68, impondo a fixação desde
logo dos provisórios, salvo se deles expressamente dizer que não precisa o
requerente, há pressuposição de que exista a obrigação alimentar. Não havendo,
porém, impossível é o pleito. Podemos até entender possível a complementação,
por audiência de justificação prévia em que se ouvirá testemunhas, da prova
produzida pelo companheiro, reservando nosso entendimento da prova documental
forte neste sentido instruindo já a inicial como único meio hábil a
possibilitar a concessão dos provisórios.

São assegurados os alimentos
provisórios, portanto, exatamente porque a Lei n. 8.971/94 referendou
expressamente a aplicação da Lei n. 5.478/68. Ademais, constituem forma de
proteção aos integrantes da entidade familiar que a Lei Maior manda proteger. E
tais alimentos são devidos a partir da citação, segundo copiosa jurisprudência,
e não a partir da decisão que os concedeu.

Cumpre observar apenas que, a
impossibilidade do pedido de alimentos provisórios não confere ao autor a
alternativa de recebê-los em sede de tutela antecipada. Dois fortes e singelos
motivos impendem-na: é essência dos alimentos a sua irrepetibilidade, o que já
encontra óbice no § 2º do artigo 273 da Lei de ritos, ao preceituar que não se
deferirá tutela antecipada se houver perigo de irreversibilidade do provimento
antecipado (a impossibilidade de reversão ao “status quo” é jurídica, e não de
fato), no caso não é só risco, mas certeza, não obstante, o princípio consagrado que alimentos pagos a mais são
irrepetíveis, não impede que tais valores sejam computados nas prestações
vincendas[33].

Outro, também de clareza mediana,
diz com a prova inequívoca e verossimilhança do direito alegado; se o autor não
tem tais provas, que devem ser documentais, para se valer do pleito de
alimentos provisórios e do rito especial da Lei n. 5.478/68, também não tem
para a tutela antecipada. Impossível mesmo, portanto, tutela antecipatória em
comento.

VIII. Execução
das prestações alimentícias

Duas são as principais medidas
executórias das prestações alimentícias, ambas, em última análise, buscando a
mesma finalidade, qual seja, a de fazer cumprir a obrigação. É o que se infere
dos artigos 732 e 733 da Lei Instrumental Civil. Ambas aplicáveis à união
estável, quando se busca a percepção de alimentos devidos entre os
companheiros.

Com efeito, com a ameaça de prisão civil o que o
legislador visa é quebrantar uma resistência injusta, constranger o devedor de
alimentos ao cumprimento da obrigação decorrente de lei, reconhecida na
sentença (no caso na decisão) como dentro de suas possibilidades. O seu caráter
é meramente compulsivo. E é o que ocorre na execução.

Ademais, “não é correto o enunciado de que a
prisão civil deve ser precedida do exaurimento dos meios compulsivos. A Lei de
Alimentos, no artigo 16, com a adaptação introduzida pela Lei nº 6.014, de
1973, estabelece que ‘na execução da sentença ou do acordo nas ações de
alimentos será observado o disposto no artigo 734 e seu parágrafo único do
CPC’. O citado artigo 734 e o artigo 17 da Lei nº 5.478, de 1968, prevêem vias
para o recebimento das prestações, que, pela sua rapidez, tem preferência
absoluta. Se no caso ausentes os seus pressupostos, manifesta‑se a
inviabilidade. A hipótese, então, passa a ter regência do artigo 18 desse
diploma legal, segundo o qual não sendo possível a satisfação do débito, pelas
modalidades precedentes, o credor poderá requerer a execução da sentença (no
caso da decisão)” na forma dos artigos 732, 733 e 735 do CPC.

“Daí resulta, às expressas, caber ao credor a
opção entre a execução por quantia certa ou a citação do devedor inadimplente,
para, em três dias, efetuar o pagamento, provar que o fez ou justificar a
impossibilidade de efetuá‑lo”.[34]

E no caso de dívida alimentar decorrente de união
estável, seria a medida do artigo 733 da Lei de ritos o meio destinado à
cobrança coercitiva? Sem dúvida alguma. A Lei não limitou a faculdade
processual apenas aos credores menores, ou às obrigações decorrentes de pais
para filhos. Se não o fez, não cabe ao intérprete fazê-lo.  Neste compasso, tanto pode o convivente
credor pleitear a execução com fulcro no artigo 732, visando expropriar bens do
devedor, como também no artigo 733 e nos demais.

A lei faculta-lhe a escolha, mas, devem-se distinguir duas espécies de execução de alimentos:
uma, com ameaça de prisão, nos termos do art. 733 do CPC, apenas das seis
últimas parcelas vencidas, porque não perderam o caráter alimentar e não
ganharam ares de indenização; outra, sem aquela ameaça, como execução comum, de
acordo com o art. 732 do mesmo estatuto processual, para as parcelas
anteriores, as quais, pelo decurso do tempo, perderam esse caráter para assumir
feição indenizatória. Ou seja, execução com pedido de prisão só se admite se
fundada no inadimplemento das seis últimas prestações.

IX. Renúncia e dispensa dos alimentos

Repetindo disposição já constante do Código Civil
de 1916, o novo preceitua no artigo 1.707 que pode o credor não exercer, porém
lhe é vedado renunciar o direito a alimentos, sendo o respectivo crédito
insuscetível de cessão, compensação ou penhora. Ou seja, pode-se dispensar, mas
não renunciar. Segue-se, aparentemente, a dicção sumular do verbete 379 do
Excelso Pretório, in verbis: “No
acordo de desquite não se admite renúncia aos alimentos, que poderão ser
pleiteados ulteriormente, verificados os pressupostos legais”.

Ocorre, agora, que estamos em nova ordem constitucional,
que provocou profundas alterações no âmbito do Direito de Família. Depois de
1988, surgiu, inexoravelmente, a igualdade entre os sexos, não havendo entre
cônjuges ou companheiros obrigação alimentar exclusiva a cargo de apenas um, em
razão do sexo. Logo, a releitura do sistema jurídico à Luz da nova Constituição
se impõe. Ademais, a própria Suprema Corte aprimorou seu entendimento,
admitindo a renúncia se houve, para o renunciante, reserva de bens e meios
suficientes para manter a própria subsistência.[35]

E o Superior Tribunal de Justiça,
Corte não-eminentemente política, tem entendido eficaz a renúncia, como também
o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Igual posição sustenta
Luiz Augusto Gomes Varjão, acrescendo o incontestável argumento de que a
renúncia vedada pela Lei refere-se apenas a alimentos devidos entre parentes, o
que não ocorre entre os companheiros.[36]

Por tudo isso, entendemos válida e
eficaz a cláusula de renúncia, seja pela em razão da nova ordem isonômica
constitucional, seja pela ausência de parentesco entre os companheiros, seja,
enfim, pela possibilidade de o renunciante ter reservas e meios suficientes
para sua manutenção e sobrevivência.

X. Considerações
finais

E assim chegamos ao cabo.
Provavelmente não alcançamos a solidez do pensamento dos mais célebres
escritores, dos arautos da literatura jurídica e dos agraciados pelo dom da
exteriorização ao papel, dos pensamentos filosóficos, jurídicos e científicos
humanos, nem jamais sonharíamos com esplendor que tal. Mas, certamente,
apresentamos a nossa posição e colaboração acerca da matéria, que tem campos
férteis em dissidência doutrinária e desinteligência jurisprudencial. O que não
se pacificará com o novel Código Civil, cujas lacunas ressoam evidentes.

Especificamente sobre o objeto do
presente estudo, amplíssima ainda é a celeuma, graças à técnica legislativa que
impera no Estado Democrático e de Direito brasileiro. Duas são as leis federais
versando especificamente sobre união estável, sua extinção e os alimentos
devidos entre os conviventes. Não bastassem elas, temos ainda o novel Código
Civil, lei geral, a vigorar a partir de 11 de janeiro de 2003. Estudar união
estável, sobre sua dissolução e os alimentos entre os conviventes, exige
perspicácia e argúcia singulares. A finura da observação será primeiro para se
desvendar qual lei rege a matéria, se a 8.971/94 ou a 9.278/96. Em verdade, a
primeira disciplinou o direito a alimentos e facultou lançar mão do disposto na
Lei regente; e, a segunda, regulamentou o comando constitucional do § 3º do
artigo 226.

De um jeito ou de outro, por
sistemática, axiologia e teleologia, tem-se que: dissolvida a união estável,
por vontade das partes ou por decisão judicial, poderá o convivente que estiver
necessitando, pleitear contra o outro, na medida das possibilidades deste,
valor suficiente para sua própria subsistência enquanto persistir a situação
financeira de ambos e o beneficiário não constituir nova união. Terá o
alimentário, entrementes, de comprovar a existência de algumas condições que
são postas como exigência imprescindível para a consecução do seu objetivo,
entre as quais a existência de convívio em união estável e do binômio
necessidade-possibilidade, bem assim a ausência de sua culpa pela dissolução da
entidade familiar e presença da culpa do requerido. Em regra, a ação seguirá o
procedimento comum ordinário, não obstante o disposto no artigo 1º da Lei n.
8.971/94, porquanto requisito prévio e indispensável para a condenação no
pagamento de alimentos, é o reconhecimento e a declaração da união estável e,
ademais, não cabe antecipar a tutela para conceder aqueles.

 

Notas:

[1] AZULAY, Fortunato. Do
inadimplemento antecipado do contrato. 
RJ:
Brasília/RIO. 1977, p. 39

[2] No Novo dicionário
jurídico brasileiro
(7ª ed., São Paulo: Parma, 1984, p. 793, v. 3) de José
Náufel, ao verbete resilição é dado o significado de ato ou efeito de resolver
ou dissolver um contrato vigente, em virtude da manifestação de vontade
concorde das partes, devido a cláusula contratual. E rescisão é tida como
desconstituição do negócio jurídico, com a conseqüente perda da sua eficácia,
em virtude de defeito no seu suporte fático (defeito no objeto da convergência
nas declarações de vontade – p. 792)

[3] AZEVEDO, Álvaro Villaça. Com a promulgação da Lei n. 9.278, de 10 de maio de 1996, está em vigor
o seu estatuto dos

concubinos. In: Revista Literária de Direito n. 11, maio/junho de 1996.
p. 20.

[4] Ob. cit., p. 42

[5] Araken de Assis verbera que o direito à resolução consiste
no desfazimento da relação contratual, por decorrência de evento superveniente,
ou seja, do inadimplemento imputável
(in: Resolução do contrato por
inadimplemento
. São Paulo: RT, 1991, p. 65), o que reforça a idéia da
necessidade da culpa. No mesmo sentido a célebre doutrina de Agostinho Alvim,
in Inexecução das obrigações e suas
conseqüências
. 4ª ed., São Paulo: Saraiva, 1972, págs. 7 e 11.

[6] Álvaro Villaça Azevedo. p. 21.

[7] VARJÃO, Luiz Augusto Gomes. União estável – requisitos e efeitos. São Paulo: Juarez de
Oliveira, 1999, p. 110.

[8] AI 588048348-Alegrete, 3ª Câm. Cível, Rel. Dês. Flávio
Pâncaro da Silva, j. 6.10.99, in. RJTJRGS 136/139

[9] Apelação Cível n. 37.535-RJ, 4ª Câm. Rel. Dês. Antônio
Assumpção, j. 26.11.85.

[10] ob. cit. p. 105

[11] Oitava Câmara Civil, Relator Desembargador Fonseca Tavares,
in “RT”, vol. 653/105

[12] JTJ 173/212.

[13] NOGUEIRA, Paulo Lúcio. Lei
de alimentos comentada
. 6ª ed. São Paulo: Saraiva.  1998, p. 4.

[14] JTJ 184/24. BAASP, 2030/22‑m,
de 24.11.1997, rel. Des. Álvaro Lazzarini; j. 10.09.1996.

[15] BAASP, 2008/01‑m,
de 23.06.1997; RTJRS 176/438, Rel. Des. Eliseu Gomes Torres; j. 14.09.1995.

[16] VARJÃO, Luiz Augusto Gomes. Ob. cit., p. 110,

[17] CAHALI, Francisco José. União estável e alimentos entre os companheiros. São Paulo:
Saraiva, 1996, p.85

[18] RODRIGUES, Lia Palazzo. O concubinato na Constituição de 1988. São Paulo: Revista de
Direito Civil, n. 53,

jul./set./1990, pp. 17/18

[19] OLIVEIRA, J. M. Leoni Lopes de. Alimentos e sucessão no casamento e na união estável – Lei n. 9.278/96.
2ª ed. ,

Rio
de Janeiro: Lúmen Júris, 1996, p. 101

[20] AGUIAR, Pestana de. União estável, pp. 38/39 apud Oliveira,
J. M. Leoni Lopes de, ob. cit. P. 101

[21] AURVALLE, Luiz Alberto D`Azevedo. A regulamentação infraconstitucional dos alimentos na união estável.

Porto Alegre: Revista AJURIS, v. 22, n.64, jul. 1995,  p. 252.

[22] FILHO, Paulo Martins de Carvalho. Lei n. 9.2.78 (de 10 de maio de 1996) – A união estável. RT 734/17.

[23] FREITAS, Paulo Roberto de Azevedo. O novo regime jurídico da unia estável. A ab-rogação da Lei n.

8.971/94 pela Lei n. 9.278/96. RT 736:42.

[24] MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. 28ª ed, , São Paulo: Saraiva, 1990, vol.
2º. p. 27.

[25] ob. cit., p.
30.

[26] Idem p. 22

[27] ob. cit., pp.
108/109

[28] V. RT 531/236

[29] RT 534/230.

[30] ASSIS, Araken. Cumulação
de ações
. 2ª ed., São Paulo: RT, 1995, p. 233

[31] Exemplos todos de Luiz Augusto Gomes Varjão, ob. cit., p.
114

[32] JTJ 188/9, rel. Des. Egas
Galbiatti; j. 27.03.1996.

[33] JB 171/198 e BAASP, 2030/22‑m,
de 24.11.1997, rel. Des. Ernani de Paiva; j. 28.09.1989.

[34] 1ª Câmara, RJTJSP, 102/253.

[35] Cf. v.g., RT 85/208.

[36] ob. cit., p. 113.

 


 

Informações Sobre o Autor

 

Alex Sandro Ribeiro

 

Advogado, Escritor e Consultor.
Pós-Graduado em Direito Civil pelo uniFMU.
Membro do IV Tribunal de Ética da OAB/SP.
Autor dos livros Ofensa à Honra da Pessoa Jurídica e
Arrematação e Adjudicação de Imóvel: Efeitos Materiais.
Autor de dezenas de artigos e trabalhos publicados.
Consultor especializado em ME e EPP.

 


 

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